domingo, 27 de fevereiro de 2022

Guernica

 

Guernica, de Pablo Picasso   Fonte: Google
Cartaz do filme O Pianista, que mostra muito bem o que uma guerra causa
Pintura de Socorro Ramalho, baseada em meu poema, enviada por WhatSapp



GUERNICA

(ou versos extraídos da guerra)

 

Elmar Carvalho

 

Cogumelo de fogo

para o céu erguido

como um cálice

de lágrimas e fel.

 

Dragão de ferro encouraçado

a cuspir fogo e bala

pela boca de morte dos canhões.

 

Órfãos famélicos indigentes

de olhos desvairados e pidões

e mãos esquálidas estendidas.

 

Escombros de argamassa

e de ferros retorcidos

como expostas

vísceras dilaceradas

pelas ruas mortas e abandonadas.

 

Horda de famintos

revolvendo os detritos fétidos

dos monturos espúrios da cidade.

 

Rajadas e metralhas

de homens contra homens

que nunca se viram,

na impessoalidade

do ódio imotivado.

 

Letíferos fogos de artifício

de macabra pirotecnia.

Bolas e bólidos de fogo na noite

de aéreos mísseis e baterias antiaéreas.

Foguetes de mortíferas

lágrimas incandescentes

belas bélicas indecentes

belicosas pétalas de rosas

de novas hiroshimas e nagasakis.

 

Desolação. Insolação. Solidão.

Insólita busca da sombra

de árvores dilaceradas

de galhos decepados

de copas mutiladas.

Sombras que não dão sombra.

 

Corpos empilhados

na espera das aves de rapina

ou da boca desdentada das covas rasas.

 

Legiões de famintos e mutilados:

seios drenados até a última gota;

olhos de fontes exauridas;

braços sem mãos, mãos sem braços;

filhos sem mães, mães sem filhos;

pernas sem pés, pés sem pernas;

filhos sem pais, pais sem filhos.

Tudo sem pé nem cabeça:

cabeças degoladas rolam nas estradas.

 

Guerra: garra, gárgula, grilhões, gosma, guetos,

genocídio, gritos, grude, gorja, gonococos,

ganância, gotas de lágrima, gotas de sangue,

grogue, gogue/magogue, Gólgota: Guernica.

 

Desassossego até de inocentes e indefesos animais.

 

Guerra: essência de sandice e ponto final +  

OBS.: tomo a liberdade de transcrever abaixo o comentário do advogado Fernando Rocha, pela sua profundidade e pertinência:

"A pujança do ordenamento das palavras postas neste poema traduz a dor e o horror da guerra! A brutalidade do cenário está exposto com a veemência verbal do seu talento oratório. Sou capaz de ouvir o metálico estalido das engrenagens das metralhadoras cuspindo balas ao som da sua horripilante música da morte.

A intempérie causada pela chuva de bombas esconde em seu negrume a paisagem outrora fascinante. O olor de fogo e fumaça está exalando deste texto como se eu estivesse presente ali. Conseguiu o condão de uma visão tridimensional do contexto.

A pintura de Socorro Ramalho externa com exatidão o meu sentimento!
Sinto, ainda, a dor das personagens!
Sem mais palavras diante da arte descrevendo a morte.
Parabéns!"

sábado, 26 de fevereiro de 2022

Raimundo Gomes Vieira Jutaí, comandante-em-chefe das forças Bem-te-vi

Busto do vaqueiro Raimundo Gomes na cidade de Caxias. Créditos: Kristiano Simas


Raimundo Gomes Vieira Jutaí, comandante-em-chefe das forças Bem-te-vi 


Reginaldo Miranda[1]

 

O recrutamento forçado era um terror entre as famílias pobres de nosso sertão e uma arma poderosa ao arbítrio dos governantes, desde o tempo colonial. Segundo Odilon Nunes, “no Piauí, como por toda parte, a classe mais visada era a que constituía a arraia-miúda, a ralé inerme, incapaz de reação: o caboclo, o mulato e o cabra (esse último, o resultado do cruzamento do negro com o mulato, conforme o dicionário da época). Era poupado o branco. Na primeira relação de recrutas que, ao acaso, se nos apresenta à mão, em 81 cadastrados há apenas 8 brancos. Todo o resto é composto de mestiços”[2].

 

Evidentemente, essa prática deletéria causava insatisfação entre os estratos mais baixos da sociedade, insatisfeitos com esse recrutamento e envio de seus filhos para distantes províncias, verdadeiro desterramento, sem falar nas constantes prisões disciplinares. Às vezes, também era utilizado o recrutamento forçado para punir adversários políticos, invadindo-se fazendas e casas para prender e desterrar quem lhes causava incômodos. Era uma infeliz arma a serviço do despotismo de governantes descompromissados com a causa pública. Era uma medida impopular, mas praticada comumente por toda parte, não somente no Piauí ou Maranhão.

 

Nessas circunstâncias, em 12 de dezembro de 1838, o vaqueiro piauiense Raimundo Gomes Vieira Jutaí[3], alcunhado pejorativamente de Cara Preta, conduzia uma boiada do padre Ignácio Mendes de Morais e Silva, vigário de Arari, no Maranhão, com destino a Parnaíba, no Piauí. No entanto, na passagem pela vila da Manga, no vale do rio Munim, teve sua marcha interrompida pelo subprefeito local, José Egito Pereira da Silva Coqueiro[4], que era adversário político do pároco. Sob a égide do recrutamento interrompeu a marcha, prendendo diversos jovens tangerinos que lhe auxiliavam na condução da boiada, inclusive um seu irmão, que seriam destinados ao serviço militar, fora da província. Raimundo Gomes, então, suplica às prepotentes autoridades locais para que os libertassem, vez que a prisão estava causando-lhe prejuízos e ao patrão. Foi tratado com desdém. Então, dar meia-volta, monta em seu bom cavalo de cela e sai a todo galope, prometendo que no dia seguinte estaria de volta para libertar sua gente.

 

Era homem de palavra. Também de coragem. Destemido rebento de nosso sertão. Cumprira o prometido. No dia seguinte, à frente de 9 vaqueiros, de armas em punho, em plena luz do sol, adentram a vila no trotar dos cavalos. Era esta defendida por 23 guardas nacionais, que debandaram com os primeiros tiros. Então, o valente Raimundo Gomes invade a cadeia, liberta os presos e lança um protesto contra os prefeitos e subprefeitos, manifestando-se favorável ao restabelecimento das prerrogativas dos juízes de paz. Foi o estopim da revolta. Era 13 de dezembro de 1838. Logo mais, temendo castigo militar, os 23 guardas-nacionais, inclusive dois ou três soldados de linha que existiam no destacamento, retornaram à vila e aderiram ao movimento rebelde[5]. “O movimento toma um outro aspecto. É a força mantenedora da ordem que se une aos provocadores da desordem: quer dizer que havia, portanto, um elo comum de aproximação entre os vaqueiros e os soldados”, conclui Astolfo Serra. Um ofício da autoridade local, coronel Henrique Pereira da Silva Coqueiro, comunicando a revolta diz:

 

“À treze deste mês apareceu na Manga um cafuz por nome Raimundo Gomes, acompanhado de nove homens, e, sem respeito às autoridades, arrombou a cadeia, soltou os presos”[6].

 

Logo em seguida, na vizinha povoação de Enjeitado, termo de Tutóia, Isidoro Carvalho, que era responsável pelo recrutamento local, envia 7 recrutas apreendidos ao prefeito de Parnaíba, no Piauí, José Francisco de Miranda Osório, pedindo-lhe que os conservasse na cadeia daquela vila, pois temia que fossem libertados violentamente, com fizera, há pouco um tal Raimundo Gomes. Atendeu Miranda Osório à solicitação. No entanto, quando retorna a escolta é surpreendida com a notícia de que o rebelde João Cardoso atacara a casa de Isidoro Carvalho e libertara outros 4 jovens recentemente recrutados. Ao mesmo tempo as autoridades parnaibanas recebiam preocupantes notícias de que os rebeldes se preparavam para assaltar a vila piauiense e libertar os recrutas locais. Conforme se vê, o brado de Raimundo Gomes recebeu eco e fazia seguidores.

 

O vaqueiro piauiense retirou-se “voluntariamente e sem violência alguma”, levando consigo oito granadeiras, 498 cartuchos e mais algumas armas e munições que apreendeu no destacamento local[7]. Foi para Chapadinha, em cujo caminho reforçou sua tropa com a adesão de muitos seguidores. Dali, em 22 de janeiro, liderando 180 homens, marchou para Tutóia, onde entrou sem resistência. Em seguida, dirigiu-se para Mariquita, distante apenas quatro léguas de Parnaíba, onde reuniu-se com a gente de João Cardoso, sob seu comando. Era sinal eloquente de que ousariam invadir Parnaíba. Nesse propósito, atravessam o rio Parnaíba, na fazenda Várgea, e pisam pela primeira vez, naquelas circunstâncias, o solo piauiense.

 

No entanto, Parnaíba não era uma localidade qualquer. O prefeito Miranda Osório tinha sob seu comando considerável tropa. Também, não era homem de tergiversar. Ao saber dos fatos partiu ao encontro dos vaqueiros rebelados, à frente de 120 praças de 1ª linha, guardas nacionais e demais força montada que pôde organizar.

 

Por outro lado, ao tomar conhecimento da força liderada pelo prefeito de Parnaíba, Raimundo Gomes torceu caminho e foi ocupar a Barra do Longá[8], algumas léguas rio acima, para onde seguiram parte montada em seus cavalos e o maior número navegando numa barca que encontraram ancorada no porto. Então, ao chegar à Várgea, soube Miranda Osório do destino dos vaqueiros insurretos, para onde seguiu depois de curto repouso. Assim, às 6 horas da manhã do dia seguinte, depois de 5 horas de marcha forçada, os surpreende em Barra do Longá. Era 31 de janeiro de 1839. Ataca violentamente o primeiro grupo que alcança em terra firme, supondo ser o grosso dos adversários, que, sem meios para resistir fogem ao primeiro recontro. Porém, a maior parte da tropa estava acampada na ilha do Meio, de onde o chefe rebelde viu seus liderados fugirem. Além da inferioridade de armas e ausência de formação militar não houve tempo para estratégias e reação. Em seguida, foi atacado o próprio Raimundo Gomes, que, embora resistindo a princípio, viu sua tropa debandar desordenadamente, precipitando-se sobre o rio em rumo do Maranhão. Morreram dois afogados. Ao alcançar a margem maranhense do Parnaíba, no lugar S. Paulo, tomam a estrada de Angico, perdendo, porém, toda a bagagem, 20 cavalos, 21 armas e deixando 3 mortos,  2 feridos e 18 presos. Nesta batalha, tendo conhecido seu antagonista escreveu Miranda Osório ao presidente da província, o Barão da Parnaíba:

 

“... esse tal Raimundo Gomes é um cabra negro, que nem ao menos sabe ler, e é este o herói que tem abalado uma não pequena parte da província do Maranhão”[9].

 

O historiador Odilon Nunes, faz reparo a esse julgamento de Miranda Osório, nos seguintes termos:

 

“Melhor teria dito mal sabe ler, pois talvez não fosse, de todo, analfabeto. Sem instrução regular (não encontramos notícia de que tenha tido, de fato, secretário), redigia, entretanto, suas cartas e ofícios, que eram escritos com letra esparramada, em que se via algo de indecisão. E admirável que tenha sido de todos o mais persistente, aquele que provocou a luta e o último a render-se”[10].

 

O presidente da província vai noticiando esses fatos ao governo central, dizendo das medidas tomadas e solicitando o auxílio necessário para o combate. Nessa altura, a revolta se fortalece com a adesão de outro líder maranhense que forma seu grupo na região de Coroatá e Itapecuru-Mirim, Manuel Francisco dos Anjos Ferreira, por alcunha “o Balaio”, em virtude de tirar seu sustento da fabricação e venda de balaios. Consta que entrou na luta revoltado tanto pelo recrutamento de filhos quanto pelo defloramento de uma filha por um militar. Deu nome ao movimento, que ficou conhecido por Balaiada. Também os negros e escravos se rebelaram, liderados pelo negro Cosme Bentos das Chagas, que se autointitulava “D. Cosme, tutor e imperador das liberdades Bem-te-vis”. Porém, a falta de unidade e estratégia comum os enfraqueceu na luta contra as tropas legalistas. No Maranhão, tinha o partido liberal ali chamado Bem-te-vi, que a princípio fomentou e apoiou a revolta. No Piauí, além das camadas pobres e médias, esta última formada pelos vaqueiros, também apoiaram a revolta alguns graúdos que faziam oposição ao governo provincial. O movimento tem caráter diferente no Piauí, sendo liderado por parte da elite insatisfeita com o governo de Manoel de Sousa Martins, agraciado com o título de Barão, depois Visconde da Parnaíba.

 

Não se demora Raimundo Gomes em Angico. Ressabiado pela derrota em Barra do Longá, segue na companhia de três vaqueiros de sua confiança, atravessa o rio Parnaíba, pega veredas pelo termo de Piracuruca, alcançando a vila de Campo Maior, onde nascera para confabular com seus parentes e amigos. Hospedou-se com Joaquim da Costa Araújo, com quem mantinha correspondência. Nesta oportunidade, mantém interessante contato com Lívio Lopes Castelo Branco e Silva, de importante família local, que logo adere ao movimento e ocupa posição de relevo nas lutas que se sucedem. Depois dessa breve estada em sua terra natal, Raimundo Gomes retorna ao Maranhão, à frente de 50 homens, atravessando o Parnaíba no lugar Boqueirão. Era seu desejo vingar-se da derrota sofrida em Barra do Longá. Ao tomar conhecimento desses fatos o presidente da província repreende severamente o prefeito de Campo Maior, por ter deixado o líder rebelde transitar livremente naquele termo, ao que este defende-se dizendo que a visita fora imprevista e as chuvas torrenciais impediram a vigilância. Na verdade, as autoridades de Campo Maior eram simpáticas aos rebeldes. De Campo Maior saíram diversos líderes da rebelião, entre os quais: Raimundo Gomes Vieira Jutaí, o vaqueiro que liderou o movimento rebelde; Lívio Lopes Castelo Branco e Silva, o de maior ascendência social e política; João da Mata Castelo Branco e Francisco Lopes Castelo Branco, por antonomásia “o Ruivo”, os três últimos pertencentes à família dominante do lugar, sendo que os demais parentes que não aderiram explicitamente foram coniventes, fizeram vista grossa a toda a movimentação dos parentes, agregados e amigos.

 

Em fins de fevereiro, saindo da Chapadinha, “uma diligência de 13 soldados para o Mocambo a fim de prender a Francisco Ferreira, um dos sequazes de Raimundo Gomes, que ali se achava com bastante gente reunida, aconteceu ser ela atacada por uma guerrilha um tanto numerosa do dito Ferreira, dando em resultado a morte de um soldado de 1ª linha e quatro feridos, inclusive o comandante. Trinta homens dessa guerrilha atacaram ainda, em seguida, a casa de um certo Calixto, resultando o ferimento deste, a morte de um rapaz e a de um dos da guerrilha”.[11]

 

Em março, o prefeito da cidade do Brejo, coronel Severino Alves de Carvalho, foi batido pelos rebeldes, deixando 2 mortos e 10 feridos.

 

Por esse tempo, o prefeito Miranda Osório suspendeu o recrutamento em Parnaíba, para evitar desgostos. O mesmo fizera o subprefeito de Piracuruca, em face do aparecimento de “indivíduos armados e arrogantes”. Na localidade Matões[12], daquele termo, cerca de 40 indivíduos armados com facas, cacetes, terçadas e quatro ou cinco armas de fogo, enfrentam as autoridades e reagem ao recrutamento forçado. Os índios de Ibiapaba, no Ceará, recusam convocação para virem combater os rebeldes no Piauí, chamando Raimundo Gomes de “nosso irmão”[13]. Não há dúvidas, pois, de que o destemido vaqueiro piauiense fazia história e afirmava-se como herói popular.

 

O presidente da província do Maranhão, nomeia o capitão Pedro Alexandrino para combater os rebeldes naquela banda ocidental do rio Parnaíba. Foi este, porém, batido nas matas do Angico, depois de três dias de perseguição, rendendo-se ao chefe rebelde Antônio José do Couto Pinheiro, vulgo Mulungueta, na manhã de 22 de abril de 1839. À tarde foi assassinado com tiros, quando se dirigia ao aquartelamento dos chefes rebeldes; também, “o tenente-coronel João José Alves, que jazia molestado e quebrantado numa rede foi cosido a facadas e os três oficiais restantes, dois alferes de polícia e um ajudante de segunda linha, teriam a mesma sorte se lhe não valessem os seus próprios rogos, os pareceres em contrários dos rebeldes em disputa e o seu capricho sanguinário já satisfeito por então as duas vítimas”[14].

 

Com esse fato aterrorizante, as principais famílias e autoridades do Brejo, inclusive seu prefeito, abandonam suas posições e vão alojar-se em Parnaíba, no Piauí. Esse fato teve funda repercussão, dando confiança aos rebeldes, que em pouco ficaram senhores das vilas do Brejo, Tutóia, Miritiba, Iguará e Coroatá, no norte do Maranhão, abalando o moral dos legalistas. Logo mais, também senhores de toda a faixa ocidental do rio Parnaíba, desde o litoral até os confins dos sertões de Pastos Bons e ribeira de Balsas. Agiam em forma de guerrilha, sem combate aberto, mas sempre surpreendendo as forças legais em assaltos e tocaias. Por essa razão, queixa-se o comandante-em-chefe Antônio de Sousa Mendes ao Barão da Parnaíba:

 

“É tal o sistema de guerra desses ladrões, que nunca as nossas forças puderam vê-los e eram recebidas com fogo em todas as picadas de dentro das matas [...], e sendo perseguidos fogem desesperadamente [...] e logo depois voltam a seus postos.

 

‘Eu não tenho forças para tomar as estradas: bato-os, porém eles voltam. E quem me assevera que nestes termos eles não me reduzirão ao apuro?”[15]

 

Em 1º de julho de 1839, Raimundo Gomes se encontra entre os rebeldes que tomaram “a importante cidade de Caxias, ou o mais rico empório dos sertões do norte”[16]. Consta que tentou controlar a situação, pondo rédea nos mais afoitos. Era da mesma linha ponderada de Lívio Lopes.

 

Mais tarde, com a mudança de rumos no Maranhão, os rebeldes resolvem se concentrar nas matas de Curimatá e Egito, na estrada que vai do Estanhado, hoje cidade de União, para Barras, então pertencentes ao termo de Campo Maior. Foi uma estratégia de João da Mata Castelo Branco, que era influente naquela região. Nesse tempo foram vistos naquelas estradas os rebeldes Francisco Lopes Castelo Branco, por antonomásia “o Ruivo”, Ladislau, Branquinho, Adão Pinto, Antônio da Costa Campos, João Nunes e Florêncio. Organizavam-se para, sob o comando de João da Mata, atacarem o presídio da Boa Vista e se assenhorearem daquelas posições, cujas matas estratégicas eram ricas em água e boiadas, para a manutenção das tropas. Raimundo Gomes promete ao conterrâneo vir para esta trincheira à frente de 1800 homens. De fato, depois de perder suas posições no posto de S. Mamede, no Maranhão, não lhe restava alternativa, assim como a outros líderes rebeldes, senão transpor o rio Parnaíba em busca do território piauiense.

 

No entanto, as forças governistas acorreram para aquela região com todos os comandos, enfrentando-se dois mil guerreiros de cada lado, diferenciado pela disparidade de armas e estratégia militar em favor dos legalistas. O recontro deu-se em 7 de maio de 1840. Foi uma derrota completa dos rebeldes, “comandados pelo seu general em chefe Raimundo Gomes”[17], dispersando-se pelas matas, com muitas mortes. Porém, esses principais líderes[18] conseguiram transpor o rio de volta para o Maranhão. Derrotado, Raimundo Gomes toma a direção do Olho d’Água, depois de perder 500 homens, entre mortos, feridos e prisioneiros. Da força legal, além de não pequeno número de mortos, são feridos o coronel-comandante José Feliciano de Moraes Cid[19], o major Antônio de Sousa Mendes, o tenente José Luiz de Queiroz e 45 praças[20].

 

 Em seguida, Raimundo Gomes retorna ao Maranhão, à frente de mil homens, com o objetivo de atacar Miritiba. Contudo, o novo presidente da província do Maranhão, Luís Alves de Lima e Silva[21], futuro Duque de Caxias, manda dar-lhe combate em Ribeiro e Matões Grandes.

 

Por esse tempo, Raimundo Gomes caiu preso nas mãos de outro líder rebelde, o negro Cosme, que se autodenominava “D. Cosme, tutor e imperador das liberdades Bem-te-vis”. Aproveitou-se dele para fabricar pólvora, de que tinha excelente prática e ia fuzilá-lo se não tivesse alcançado a fuga. Esse episódio foi narrado, mais tarde, pelo próprio Gomes e é assim colocado por Ribeiro do Amaral:

 

“Foi sempre política do presidente, diz Dr. Magalhães, impedir a junção dos rebeldes com os escravos, indispondo-os contra os segundos, o que de certo foi uma felicidade para a província. Raimundo Gomes, que se achava preso na Lagoa Amarela em poder do Cosme, e que por este fora afinal sentenciado à morte, achou ocasião de evadir-se no dia mesmo em que, segundo ele depois narrou, devia das mãos daquele criminoso receber o castigo dos seus crimes: quis porém sua fortuna que nesse dia fossem atacados os negros que, como ele, só procuravam em precipitada fuga furtar-se à morte, e dali foi ele embrenhar-se na Miritiba”[22].

 

Em 1º de novembro, Raimundo Gomes delibera dirigir-se com toda a sua tropa para a vila do Rosário, também no Maranhão, então comandada militarmente pelo major Augusto César da Rocha. Esse movimento foi percebido pelo comandante militar do Icatu, que, no dia seguinte envia portador com mensagem a Rocha, “de que se punha em marcha para aquela vila a força rebelde da Miritiba, capitaneada por Domingos da Silva Matroá”; o portador chegou no dia 3 e logo “no dia 7, às oito horas da noite, teve ainda o major Rocha nova participação do comandante do Icatu, em que lhe informava achar-se também em marcha para o Rosário o facinoroso Raimundo Gomes”. De posse dessas informações, o major Rocha tomou todas as providências que estavam ao seu alcance, determinando algumas providências a serem feitas nos pontos que estavam sob seu comando, inclusive de recolhimento das embarcações para dificultar a travessia dos rebeldes; e oficiando à capital e as vizinhas vilas de Itapecuru-Mirim e Icatu, nesta última para que o mantivesse informado da movimentação rebelde.

 

De fato, às 2 horas da madrugada de 10 de novembro, o vaqueiro Raimundo Gomes entra com sua tropa na povoação de “Pai Simão”, tendo surpreendido o destacamento de S. Miguel, onde existiam 50 praças, armamento e munições. Ainda “da vila de S. Miguel, de marcha para a vila do Rosário”, envia Raimundo Gomes correspondência ao major Rocha, datada daquele dia, dizendo-se amante da pátria, da coroa e da religião católica; “e espero em V. Sª, como bom brasileiro que devemos nos reunir como brasileiro que somos, pois já basta de vermos correr tanto sangue brasileiro”; “pois não é de bem que desgraçamos a nossa pátria pela pátria alheia”; “eu acho-me com uma grande força à frente das forças de V. Sª”; “e esperanço Deus e na Nossa Mãe Maria Santíssima, que V. Sª nos havemos reunir”; “protesto com palavra de honra que não há de haver insulto, nem roubo, pois trago os melhores oficiais para me ajudarem a bater o despotismo e V. Sª, fará ver os brasileiros amantes do nosso sagrado partido”; assina “Raimundo Gomes Vieira Jutaí, comandante em chefe das forças Bem-te-vis”[23].

 

Tendo recebido esta correspondência às 17 horas daquele dia, o major Rocha, por medida de precaução, responde incontinenti a Raimundo Gomes, que esperasse a resposta do pedido de anistia ali mesmo em “Pai Simão”, conservando-se pacífico, até que o presidente da província chegasse de Caxias, ou desse alguma providência sobre eles; acrescentou que mandaria o necessário alimento para toda a sua gente.

 

No entanto, no dia seguinte, ainda “em marcha”, assegurou Raimundo Gomes que não haveria “assassinos e nem roubos” e as tropas se conservariam “debaixo da boa ordem”. Em nova resposta esclareceu o comandante militar que poderia entrar, porém, depondo as armas e “entrando em porções, porque deste modo, estou persuadido, de que não quer outra cousa mais do que a união brasileira, único fim a que nos propusemos, para assim podermos melhor sustentar o nosso Monarca o Senhor Dom Pedro Segundo, e nossa Santa religião”[24].

 

Nessas circunstâncias, naquele mesmo dia 11 de novembro, Raimundo Gomes chega com sua tropa às portas da vila do Rosário, sendo, porém, intimado pelo comandante do primeiro ponto de guarnição, capitão Fernando César Pereira de Castro, a que fizesse alto, não podendo entrar na vila armado, sob pena de abrir-lhe fogo. Para segurança da vila, às 23 horas daquele dia, chegou um vapor com 120 praças. No dia seguinte, seu capitão intimou os rebeldes a se decidirem, pedindo esses algum tempo para pensar. É que faltava confiança de parte a parte. Não acreditavam os legalistas que Raimundo Gomes quisesse, de fato, render-se em benefício da anistia concedida pelo governo central, desde o último mês de agosto. Por outro lado, estava viva na lembrança dos rebeldes o suplício e morte feita a alguns dos seus que caíram nas mãos de comandantes das forças legais.

 

Em meio a esse clima de desconfiança, retorna Raimundo Gomes com os seus comandados à Miritiba. Para ali foi mandado o capitão Tomás José Pereira, com 80 soldados, a fim de juntamente com a força local dar-lhe combate. No entanto, permaneceu Raimundo Gomes firme como sempre e muito trabalho ainda daria se a luta continuasse, mas estavam todos cansados, de ambos os lados. Finalmente, em 15 de janeiro de 1841, à frente de 700 vaqueiros e lavradores, inclusive de seu fiel amigo o velho Domingos da Silva Matroá, depôs as armas e apresentou-se ao presidente da província e comandante das armas do Maranhão, coronel Luís Alves de Lima e Silva, que foi pessoalmente encontrá-lo em Miritiba[25]. Foi o primeiro que começou a luta e o último a render-se, saindo honrado do campo de luta. Como consequência, seguiu com aquela autoridade para a cidade de S. Luís, onde chegaram no dia 18, com o compromisso de ausentar-se da província por oito anos, “para o que já assinou termo no Juízo de Paz do 1º Distrito”. Ao todo, naquele mês depuseram as armas cerca de 2.500 rebeldes, tendo fim a Balaiada.

 

Esse mesmo episódio foi narrado pelo escritor Domingos José Gonçalves de Magalhães, depois agraciado com o título de Visconde de Araguaia, que secretariava aquela autoridade, em seu livro A Revolta. No entanto, ao contrário do seu chefe que tratou as lideranças rebeldes com respeito e alguma admiração, Magalhães de forma apaixonada, parcial e externando todo o cego preconceito da época, disse:

 

“Dali seguiu o presidente Duque de Caxias para Miritiba, onde se embrenhava Raimundo Gomes, e por uma escolta o mandou buscar a sua presença. Insignificante era sua figura: quase negro, a que chamamos fula, baixo, grosso, pernas arqueadas, testa larga e achatada, olhar tímido e vacilante, pouco atilado de entendimento, voz baixa e humilde, nenhuma audácia de conspirador; e posto fosse o chefe dos sediciosos, mais obedecia do que mandava e nunca marchou à frente dos seus em momento de peleja e na retaguarda se conservava, prestes sempre a fugir; nem foi de todos o mais ladrão e cruel, antes, comparado a outros parecia humano”[26].

 

Ora, ninguém em sã consciência pode negar que o vaqueiro Raimundo Gomes, tinha carisma, capacidade de liderança, identidade de classe, senão jamais teria convencido seus patrícios a pegar em armas e segui-lo. Chegou a liderar pessoalmente três mil homens, de armas em punho contra os governantes de duas províncias. Embora pudesse ser tímido, como quase todo sertanejo, de voz baixa, pausada, era audaz, bom de entendimento e sabia conspirar, assim como fazer amigos; pela sua falta de formação militar e pela disparidade de armas e munições, evitou o confronto aberto, de frente, preferindo a estratégia do ataque surpresa, sistema de guerrilha, assim como fizeram os outros líderes; no entanto, desse depoimento podemos perceber o tipo físico do nosso vaqueiro: moreno, baixo, grosso, pernas arqueadas, testa larga e achatada. Certamente, nesse aspecto há verdade, objetividade, no mais sendo subjetividade, concepção do autor, que externou o preconceito da épica.

 

Raimundo Gomes Vieira Jutaí[27] nasceu cerca de 1798, no termo de Campo Maior, Piauí, “filho dessa raça cruzada de índios e negros”, “criado no campo entre o gado que pastoreava, prestando a sua faca às vinganças próprias e alheias, leigo nas letras humanas”[28]. Esse conceito, o escritor Astolfo Serra coloca entre aspas dizendo ser extraído de documento contemporâneo. Para Carlota Carvalho, tratava-se de “um administrador de fazenda, homem de reconhecida probidade e merecedor de toda confiança para depositar na mão dele o valor monetário das boiadas”[29]. Segundo José Ribeiro do Amaral, “era parente bastardo” e “antes do rompimento” fora “digno guarda-costas” do “subprefeito José do Egito”, que lhe prendera os recrutas, na Manga do Iguará[30]. 

 

Para Domingos de Magalhães, “Raimundo Gomes, o vaqueiro assassino, converteu-se em chefe do partido Bem-te-vi”[31].

 

Inobstante o conceito social de que gozava o vaqueiro na sociedade sertaneja, desde as primeiras notícias da revolta da Manga, foram seus protagonistas tratados como gente “da ralé mais ínfima”, “da última ralé da sociedade”, “da mais baixa ralé”, “do proletariado”, “das massas indisciplinadas”, “das classes inferiores”, “homens embrutecidos e ignorantes”, “um bando de miseráveis manchados com roubos e assassínios”, etc.; e seu líder Raimundo Gomes “um miserável baldo de tudo”, “homem de cor assaz escura”, “um desgraçado vândalo”, “um insignificante aventureiro”, “malvado”, “ignorante”, “analfabeto”, “cafuzo”, “mestiço”, “ladrão”, “assassino”, “criminoso”, etc.

 

Ora, Raimundo Gomes era semialfabetizado como a maioria dos fazendeiros de seu tempo, sabendo, porém, ler e escrever sofrivelmente, conforme se depreende de suas correspondências. Certamente, também tinha conhecimento das operações aritméticas, pois levava e comercializava boiadas para o seu patrão. Na qualidade de vaqueiro, era remunerado pelo sistema de “sorte”, sendo que de cada quatro crias nascidas uma era dele. Logo, de 100 bezerros ele tinha 25, constituindo-se, assim, em pequeno fazendeiro. Quem tem familiaridade com o sertão sabe que quase todo vaqueiro é também um pequeno fazendeiro, por cuja razão o vaqueiro sempre ocupou uma escala social intermediária entre o rico patrão e o pobre lavrador. Não é empregado, mas sócio do patrão nos lucros da fazenda, em cuja parceria o patrão entra com as matrizes bovinas e o vaqueiro com o trabalho.

 

O prestígio de que gozavam os líderes rebeldes era tamanho entre as camadas sociais, que, em 29 de agosto de 1840, tendo havido na vila de Viana, “um Te-Deum”, pela exaltação de Sua Majestade Imperial, “a par dos vivas ao nosso Monarca, houveram vivas ao Balaio, Raimundo Gomes e outros malvados!!”[32].

 

Em síntese, a Balaiada foi uma rebelião de massas, disse Astolfo Serra, onde se levantaram cerca de onze mil camponeses unidos em seu espírito de rebeldia contra os desmandos da época. Uniu “elementos os mais heterogêneos, vindos das mais ínfimas camadas sociais”, “criaturas anônimas dos campos e das cidades, das vilas abandonadas e das senzalas, das casas de farinhada e dos canaviais, dos chapadões e dos currais, toda a vasa fermentada e indócil que de um dia para o outro, surge arrebatada, fanatizada, e em estranhos arremessos de crimes e heroísmos. Não sei porque continuar a caluniar essa gente através da história se nela um impulso patriótico se manifesta”[33].

 

Segundo Astolfo Serra, “de tudo isto que aí fica resta-nos uma conclusão: e é a de que o vaqueiro Raimundo Gomes, primeiro chefe dos balaios não fez desordem pelo gosto do crime, por instinto primário de banditismo”; ao contrário, “cansado de sofrer injustiças de todos os lados resolve com a sua agressividade de homem inculto, reagir por si mesmo, já que os mantenedores da ordem, as autoridades da época se fizeram os camartelos de todas as injustiças sociais. (...). Há na alma desses milhares de sertanejos um quixotismo rude, primitivo, mas, também, capaz de grandes lances de heroísmo e sacrifício”[34].

 

A maranhense Carlota Carvalho, num rasgo de revisionismo apaixonado, assim se expressou:

 

“Guilherme Tell e Raimundo Gomes, o lendário pastor suíço e o vaqueiro do padre Inácio Mendes, irmanaram-se nos gestos de altivez e decisão. Como Arnaldo Melchtal, Raimundo Gomes Vieira ‘abriu uma rua à Liberdade’.

 

‘Na memória dos vindouros perdurará o exemplo. E naquele sertão, nas noites trevosas, nos rugidos das tempestades, ao clarão fugaz dos relâmpagos supõem ouvir o tropel do cavalo do destemido vaqueiro. Raimundo Gomes cumpriu um dever de cidadão e usou um direito concedido pela Natureza. Reagiu ao despotismo”[35].

 

Com essas notas trazemos à baila o vaqueiro Raimundo Gomes Vieira Jutaí, realçando seu papel na revolução social a que se denominou Balaiada. Foi um vaqueiro piauiense que teve a capacidade de unir a sua classe e outras que se irmanavam no sofrimento e na opressão para dar um brado de liberdade no Meio-Norte brasileiro. Sua luta fez eco, fazendo cair governantes e ruir as estruturas do sistema opressor de antanho. Dessa luta nasceu o conceito de povo, a identidade piauiense, maranhense, brasileira, de pertencimento à terra comum, trazendo visibilidade para a gente pobre do sertão, que não era dona de grandes cabedais. Por isso houve toda uma luta para calar essa gente e uma escrita para desqualificá-la, somente sendo aos poucos reabilitados para a luz da história depois de século de sua luta. Raimundo Gomes Vieira Jutaí, merece figurar nessa galeria de figuras de nossa terra, que se notabilizaram por algum relevo de personalidade. 


[1] Advogado e escritor. Membro da Academia Piauiense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí.

 

[2] NUNES, Odilon. Pesquisas para a história do Piauí. 3º vol. Coleção Grandes Textos. Teresina: FUNDAPI-FCMC, 2007. Pág. 21. Casa Anísio Brito. Livro 163. Doc. 8.5.1840.

 

[3] Aparece também Jutahy.

 

[4] O Despertador, 8.7.1852. O Publicador Oficial, 29.12.1838.

 

[5] AMARAL, J. R. do. Apontamentos para a história da Revolução da Balaiada. 1839. Vol. I. Pág. 27 e segs. In: NUNES, Odilon. Pesquisas para a história do Piauí. 3º vol. Coleção Grandes Textos. Teresina: FUNDAPI-FCMC, 2007. Pág. 25. SERRA, Astolfo. A Balaiada. 3ª Ed. Parte II. Rio de Janeiro: Dedeschi, 1948.

 

[6] O Publicador Oficial, 29.12.1838.

 

[7] O Publicador Oficial, 1838.

 

[8] Hoje povoado do município de Buriti dos Lopes, então termo de Parnaíba.

 

[9] Arquivo Público do Estado do Piauí. L. 152. Doc. 6/2/1839. L. 153. Doc. 22/4/1839 e 30/4/1839. In: NUNES, Odilon. Pesquisas para a história do Piauí. 3º vol. Coleção Grandes Textos. Teresina: FUNDAPI-FCMC, 2007. Pág. 26.

 

[10] NUNES, Odilon. Pesquisas para a história do Piauí. 3º vol. Coleção Grandes Textos. Teresina: FUNDAPI-FCMC, 2007. Pág. 26.

 

[11] SERRA, Astolfo. A Balaiada. 3ª Ed. Parte II. Rio de Janeiro: Dedeschi, 1948. P. 158.

 

[12] Hoje cidade de Pedro II.

 

[13] NUNES, Odilon. Op. cit. P. 28-31.

 

[14] SERRA, Astolfo. A Balaiada. Op. cit. P. 160.

 

[15] Arquivo Público do Piauí. L. 153. Doc. 11/12/1838 e 15.12.1839. In: NUNES, Odilon. Op. cit. P. 86.

 

[16] Almanak Histórico de Lembranças Brasileiras, 1863. A Revista, 13.6.1850.

 

[17] AMARAL, José Ribeiro do. História da Revolução da Balaiada na Província do Maranhão. 3ª Parte. Maranhão: Tipografia Teixeira, 1906.

 

[18] Retornando Francisco Lopes Castelo Branco, por antonomásia “o Ruivo”, para reanimar os remanescentes foi traído por três desertores, que indicaram sua posição, sendo assim preso no lugar “Salobro”, pelo Tte. Antônio da Costa Araújo. José Feliciano de Moraes Cid, que então comandava as tropas do Piauí, aplica-lhe terrível surra, cujas consequências protelaram seu embarque para Caxias, onde chegou nos primeiros dias de agosto.

 

[19] Durante a campanha, substituiu o major Antônio de Sousa Mendes no comando geral das tropas piauienses.

 

[20] AMARAL, José Ribeiro do. História da Revolução da Balaiada na Província do Maranhão. 3ª Parte. Maranhão: Tipografia Teixeira, 1906.

 

[21] Nomeado por carta imperial de 12.12.1839, em substituição a Manoel Felizardo de Souza e Mello.

 

[22] AMARAL, José Ribeiro do. História da Revolução da Balaiada na Província do Maranhão. 3ª Parte. Maranhão: Tipografia Teixeira, 1906. P. 64.

 

[23] Chronica Maranhense, 7.12.1840.

 

[24] AMARAL, José Ribeiro do. Op. cit. P. 85-86.

 

[25] Arquivo Público do Piauí. L. 195B. Doc. 21/12/1840. L. 195D. Doc. 31/12/1840. L. 193. Doc. 30/4/1841. L. 194. Docs. 23/1, 27/1, 30/1/1841 e 26/2/1841. In: NUNES, Odilon. Op. cit. P. 183 e 184. AMARAL, José Ribeiro do. História da Revolução da Balaiada na Província do Maranhão. 3ª Parte. Maranhão: Tipografia Teixeira, 1906. P. 97-98.

 

[26] MAGALHÃES, Domingos. A Revolta. P. 114. In: SERRA, Astolfo. A Balaiada. 3ª Ed. Parte II. Rio de Janeiro: Dedeschi, 1948. P. 198.

 

[27] Segundo o jornal O Guajajara, em tom de crítica, era sobrinho do “coronel Coqueiro ou Miguel dos Pombos”, a quem muito ajudou nas eleições de 1836 (O Guajajara,12.9.1840).

 

[28] SERRA, Astolfo. A Balaiada. Op. cit. P. 129.

 

[29] SERRA, Astolfo. A Balaiada. Op. cit. P. 130.

 

[30] In: SERRA, Astolfo. Op. cit. P. 199.

 

[31] A Revista, 31.10.1850.

 

[32] O Legalista, 17.9.1840.

 

[33] SERRA, Astolfo. A Balaiada. Op. cit. P. 125.

 

[34] SERRA, Astolfo. A Balaiada. Op. cit. P. 201 e 229.

 

[35] CARVALHO, Carlota. O Sertão – subsídio para a história e a geografia do Brasil. 2ª Ed. Imperatriz: Ética, 2000.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

UMA LEMBRANÇA ANTIGA DO FONSECA NETO

Posse de Elmar Carvalho, no D. Acad. 3 de Março: Jorge Luís, Elmar, Fonseca Neto, Horácio da Costa Mourão e Lindalva.

Antônio, Mariano, funcionário do CMRV, sargento Ribamar, Elmar Carvalho, professor Cândido de Almeida Athayde e Antônio de Albuquerque Monteiro. Formatura no Curso de Administração de Empresas, turma de 1980.

 

UMA LEMBRANÇA ANTIGA DO FONSECA NETO


Elmar Carvalho


Após sua concorrida festa de posse, encontrei ontem, na APL, o novel acadêmico Fonseca Neto. Perdi o posto de “benjamim” para ele, que fica agora na extremidade dos modernos, enquanto a professora Nerina Castelo Branco continua na extremidade dos mais antigos, ocupando o decanato. Seu longo discurso, foi bastante encurtado pela emoção e beleza do conteúdo, que nos prendeu a atenção e nos arrancou aplausos. Tive a honra e a satisfação, na qualidade de 1º secretário da Academia, de ler o seu termo de posse, e fiz questão de fazê-lo em alto e bom som.

Conheço-o faz mais de trinta anos, quando ele esteve na solenidade em que tomei posse do cargo de presidente do Diretório Acadêmico “3 de Março”, em Parnaíba. Depois, o apoiei em sua campanha vitoriosa para o Diretório Central dos Estudantes – DCE-UFPI. Em 1979, encontrei-me com ele na praia de Atalaia, oportunidade em que sorvemos umas cervejas, e entramos em altos “papos”, de conteúdo cultural, político, ideológico, histórico, que a nossa ardente e emotiva juventude impulsionava.

Estiveram conosco outras pessoas, que as brumas do tempo já diluíram em nossa memória, mas, eu e ele, achamos que poderiam ser, entre outros, o Reginaldo Costa e o Bernardo Silva, do jornal Inovação, e talvez o poeta Alcenor Candeira Filho. Afinal, assim já se passaram mais de trinta anos. No calor e empolgação da conversa – e por que não confessar? – da libação etílica, perdemos a noção da passagem do tempo, e o fato é que o nosso bravo e novel acadêmico Fonseca Neto perdeu o bonde (no caso, o ônibus que o transportara ao litoral), mas não perdeu a esperança, como Drummond, em seu poema.

Seguiu comigo para Parnaíba, em minha motocicleta CG-125. Mas, para novo infortúnio do Fonseca, quando nos aproximávamos da cidade, minha moto parou de funcionar por falta de gasolina. Para atenuar a minha culpa, pela possível imprevidência, devo esclarecer que esse modelo de veículo não possuía, na época, mostrador de combustível, mas apenas um dispositivo manual para colocação na reserva.

Quando nos sentíamos desamparados, eis que um automóvel Brasília parou ao nosso lado. Era o deputado Elias Ximenes do Prado, meu conhecido, que nos oferecia carona. Aliás, em muito boa hora, pois o Fonseca conseguiu embarcar em ônibus da extinta empresa Marimbá, cuja agência ficava na avenida Capitão Claro, quase no cruzamento com a Álvaro Mendes. Consta que no outro ônibus, que trouxera o Fonseca, os seus colegas voltaram entristecidos, achando que ele teria se afogado ou teria sido arrebatado por alguma entidade marinha, e ido para as encantadas terras do sem fim.

O deputado Elias me levou a um posto de combustível, onde adquiri gasolina, e me conduziu até onde ficara minha motocicleta, que voltou a funcionar a pleno vapor. E voltei a varar o tempo e o vento, parafraseando um poema de Alcenor, dos nossos bons tempos de motociclistas.

7 de março de 2010

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

ILUSTRE DESCONHECIDO



ILUSTRE DESCONHECIDO


José Expedito Rêgo


Passava férias em Luís Correia. A caminho da praia, parei numa farmácia, a fim de comprar um tubo de Aerolin-Spray, que uso para alívio de minha asma crônica. Recebi o medicamento e indaguei do farmacêutico se poderia emitir um cheque de valor superior ao preço da compra, necessitava de dinheiro em espécie, uns trocados para gastar com água de coco e caranguejos cozidos. O homem aquiesceu facilmente. Preenchido o talão, assinei, entreguei-o ao vendedor, e pedi à minha esposa que recebesse o troco, fui esperar no carro.


A mulher chegou sorridente, disse que o farmacêutico, ao ler o meu nome no cheque, perguntou se eu era o escritor José Expedito Rêgo, autor do romance Né de Sousa. Obtida a confirmação, comentou para a outra pessoa que estava ali perto: “Taí, meu primeiro freguês hoje foi um romancista e dos bons!”


Naturalmente, fiquei satisfeito de ser reconhecido assim numa cidadezinha afastada, por um leitor esclarecido. Não que me julgue realmente bom romancista, mas o fato gratificaria qualquer um.


Moro em Floriano há quase vinte anos e continuo um ilustre desconhecido. Um dia desses, fiz umas compras em um supermercado, coisa pouca, apenas umas frutas. Na ocasião, estava também sem dinheiro em moeda corrente. Perguntei à moça da caixa registradora se podia trocar um cheque maior que o devido, os bancos recomendam não soltá-los muito pequenos. A rapariga fitou-me os olhos atentos, mirou bem o meu rosto e respondeu: “Só se o senhor falar com o gerente!”


Mas a culpa é minha. Reconheço que sou esquisito, arredio, de poucos amigos. Meu relacionamento social é minguado, não vou a festas, nem a velórios. Não frequento as igrejas, não pertenço a nenhum clube social ou de serviço. E naturalmente a mocinha do supermercado não tem obrigação de conhecer os meus livros, talvez nem de ler.


Parece mesmo que a boa leitura, uma das práticas mais agradáveis desta vida ruim, não é bastante apreciada pelo povo de Floriano, de um modo geral.   

domingo, 20 de fevereiro de 2022

Seleta Piauiense - Luiz Lopes Sobrinho

Fonte: Google


Cachaça

 

Luiz Lopes Sobrinho (1905 – 1984)

 

Bendita és tu, cachaça, que aviltando

E destruindo personalidades,

Levantas templos, formas até frades,

Que só de ingratos vão te condenando!

 

Por que, depois de andar dias boiando,

Das pluviais águas nas imensidades,

Noé, poisando em terra, com saudades

Do quente vinho, a vinha foi plantando?!

 

Por que nas bodas de Caná, Jesus,

Ele que é bom! que é justo! é Deus! é Luz!

No primeiro milagre que operou,

 

Sendo a cachaça tão paradoxal

Que nos fazendo bem, causasse o mal,

Por que, tanta água, em vinho transformou?!

sábado, 19 de fevereiro de 2022

UMA DIFÍCIL DECISÃO E O PRINCÍPIO DA BAGATELA

Fonte: Google

 

UMA DIFÍCIL DECISÃO E O PRINCÍPIO DA BAGATELA


Elmar Carvalho


Finalmente, entreguei ontem o meu trabalho, para que possa ser avaliado pelo professor Luís Carlos Martins Alves Júnior, que ministrou o curso O Positivismo Jurídico e a Jurisprudência, para qualificação de magistrados do Piauí. O mestre é procurador da Fazenda Nacional, junto ao Supremo Tribunal Federal, é lente de alto gabarito de universidade do Distrito Federal, e é meu conterrâneo de Campo Maior, filho de um amigo meu.

Cada juiz deveria ter como base para esse trabalho a sua mais difícil decisão judicial. Entre outras sentenças em causas complexas, escolhi uma em que o impetrante do mandado de segurança fora demitido de seu cargo de motorista oficial do município porque supostamente teria se apropriado indevidamente da importância de dez reais. Segundo ele, na petição inicial, viajou a Teresina, conduzindo a ambulância municipal e quatro pacientes, portando a verba de sessenta reais, fornecida pela Secretaria de Saúde.

Logo na consulta do primeiro paciente, gastou cinquenta reais. Diante dessa situação, comprou um cartão telefônico para pedir instrução a seu chefe, sobre o que deveria fazer. À tarde, com fome, gastou a bagatela restante. Alegou que não recebeu diárias e nem suprimento de fundos para pagamentos de pequenas despesas.

Em suas informações, o prefeito alegou que ele se apropriara indevidamente dos dez reais, e que por essa razão fora demitido, através de processo administrativo, em que lhe fora dado o direito à ampla defesa, e em que fora observado o princípio do contraditório, mas que ele, embora intimado, se mantivera inerte. Nada disse sobre os fatos alegados pelo impetrante e muito menos os negou. Não juntou o tal processo administrativo. Ora, ao longo de meus mais de doze anos de magistrado já vi grandes ignomínias, e já vi, algumas vezes, o gestor municipal, por questiúnculas pessoais e picuinhas políticas, querer massacrar humilde barnabé municipal, que, não raras vezes, só tem por si a razão e o direito.

Entendi que não cabia na cabeça de ninguém, detentor de um mínimo de raciocínio, que um servidor público, tendo recebido apenas sessenta reais, fosse ter a insanidade de fazer um alcance de dez reais, pois isso daria logo na vista da pessoa a quem prestaria conta, quando retornasse da viagem, pelo imediatismo e visibilidade do fato. Também seria rematada loucura que ele fosse arriscar o seu emprego por causa da ínfima quantia de dez reais. Seria um completo bocó, um consumado beócio.

O lógico é que ele pretendia que a administração arcasse com essa despesa, como seria o correto, já que o gasto ocorrera em virtude da viagem, ou pelo menos, na pior hipótese, que esse “astronômico” gasto fosse descontado da diária que o município lhe devia, posto que não lhe pagou diária e nem suprimento de fundos para pequenas despesas. Portanto, tudo bem equacionado e sopesado, o município é que lhe devia, e não ele à unidade administrativa.

Afirmei, sem dúvida com certa dose de ironia, que nem o célebre sensor romano Catão estaria à altura da exação administrativa de Cocal de Telha; que nem mesmo o rigorismo do formidável e legendário legislador Dracon equiparar-se-ia ao fundamentalismo, quase diria xiita, da austeridade da referida administração.

Terminei por acrescentar que esse rigor atingira o paroxismo, pois superara a famosa Lei de Talião, da vida por vida, dente por dente, olho por olho, uma vez que o emprego, mesmo de um barnabé municipal, excedia incomensuravelmente em importância a bagatela de dez reais. Não houvera a menor proporcionalidade entre a aplicação da pena e a falta cometida, que a meu ver sequer existira, pelas razões que explanei acima.

Considerei que, talvez, a exação do gestor do município de Cocal de Telha só encontrasse paralelo no apego formalista dos fariseus à lei mosaica. Os fariseus se celebrizaram pela ostentação exagerada de suas pretensas virtudes, pois se compraziam na aparência e nas exterioridades, e não na essência espiritual, pelo que mereceram umas boas sovas e vergastadas verbais de Cristo, que deles disse serem semelhantes a sepulcros, caiados por fora, mas podres por dentro.

Da mulher de César se disse não bastar ser virtuosa, mas também que deveria aparentar sê-lo. Da administração impetrada, disse esperar, sinceramente, o contrário: esperava que não apenas aparentasse, mas que, de fato, fosse impoluta, como quisera deixar transparecer ao demitir o seu servidor, em consequência do suposto desfalque de dez reais. Diante dos mensaleiros, valeriodutos, sanguessugas e outros ralos e buracos negros em que o dinheiro público se esvaía, asseverei que estava certo de que essa demissão por causa do pretenso desvio de dez reais, diante das circunstâncias em que teria ocorrido, não passava de uma descomunal ironia ou de um formidável e desconcertante blefe.

Invocando princípios do Direito Penal, aduzi que poderia falar em estado de necessidade, quando o impetrante teve que comprar o cartão para fazer o telefonema, no próprio interesse do serviço público, em decorrência da falta de suprimento para pagamento de pequenas e eventuais despesas, e que poderia falar em estado famélico, quando o impetrante precisou saciar sua fome, já que não lhe foi paga a sua diária, como igualmente poderia invocar o princípio da insignificância ou da bagatela, ante a “desmesurada” importância de dez reais.

Em suma, além de usar outros argumentos, fundamentei minha decisão, em seara do Direito Administrativo, com princípios do Direito Penal, e mandei que o humilde servidor fosse reintegrado em seu cargo.

6 de março de 2010

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

ENTRE A FICÇÃO, O SONHO E A IRREALIDADE

Fonte: Google

 

ENTRE A FICÇÃO, O SONHO E A IRREALIDADE


Antônio Francisco Sousa – Auditor-Fiscal (afcsousa01@hotmail.com)

 

                Neste primeiro parágrafo, vou tentar interpretar a suprarrealidade ou irrealidade transcrita em texto jornalístico que li, travestida na forma de publicidade oficial feita pelo estado, visando enfatizar o muito mais que poderia ser feito caso fosse eleito governador o candidato que o atual e seu partido apoiam como sendo o substituto natural. Hiperboliza o informe publicitário, quero dizer, a notícia, que o presente inquilino do palácio de Karnak autorizou fosse publicado, não ousaria dizer se como restou impresso, que em dois mil e três, quando assumiu o primeiro dos seus vários mandatos governamentais, apenas sessenta e seis municípios mafrensinos eram servidos ou interligados pela malha rodoviária do estado, ainda assim, com cerca de mil e quinhentos quilômetros de estradas em situação muito ruim; já, agora, em dois mil e vinte e dois, até o final de sua gestão, ele garante que os duzentos e vinte e quatro municípios estarão servidos de boas estradas, algo em torno de seis mil e quinhentos quilômetros de rodovias inteiramente asfaltadas. É como se afirmasse: não fosse ele, já que os demais gestores nada fizeram em relação aos cento e cinquenta e oito municípios abandonados, no que tange a construção, restauração ou recuperação da malha viária – não é difícil chegar a essa dedução a partir da leitura do texto que serviu de base a este arrazoado –, tais cidades e seus povoados ainda estariam sendo servidos por estradas de péssima qualidade, isso caso muitas delas não houvessem sucumbido ante o desgaste e envelhecimento que, naturalmente, vêm com o transcurso do tempo, principalmente, se nenhuma intervenção do poder público ocorre. Claro que não foi o que aconteceu, diversos de seus sucessores e antecessores, e, até por conta disso, ele, o atual governante, pode se dar ao luxo de vangloriar-se às escâncaras, açambarcando todas as glórias para seu governo - vai falar bem dos outros por que, se a intenção, senão subliminar, sub-reptícia é engabelar, isto é, ganhar a confiança e o a apoio do eleitor desavisado? -, reformaram, restauraram, deixaram que piorassem outras, mas melhoraram muitas delas, enquanto ampliavam a malha viária com milhares quilômetros de novas estradas, ou deixando recursos para que pudessem ser feitas, construídas, pelos que lhes seguiriam.

                Neste parágrafo meto-me em elucubrações e divagações feitas a partir de reportagem disponibilizada pela rede mundial de computadores, a que vi e li, sobre o jogador Cristiano Ronaldo e seu filho Cristiano Júnior, que já é frequentador das escolinhas mantidas pelo clube inglês que contrata o pai, Manchester United. Dizia lá o pai do garoto que “Cristianinho” não seria forçado a nada, faria aquilo pelo que demonstrasse mais aptidão, vocação, maiores pendores. Aí, ocorreu-me o seguinte, suposto e fictício diálogo entre os dois, ante a possibilidade, tão recorrente em casos semelhantes, de o filho não puxar ao pai, sendo este um atleta ou artista fora de série, muito bom: - Pai, e se eu não conseguir jogar tão bem quanto o senhor, como é que fica? – Esquente não, filho. Antes de seu pai, o mundo do futebol viu craques maravilhosos: Pelé, Maradona, Zico, Zidane; dois xarás: Ronaldo Nazário (Fenômeno), Ronaldinho (gaúcho); um baixinho infernal chamado Romário ... – Mas pai, eles jogaram tanto quanto você? - Filho, alguns deles, sim, até mais; inclusive, serviram de inspiração para mim. – Ah! Assim fico mais tranquilo; afinal, o senhor mesmo está dizendo que existiram outros melhores, antes de você. E hoje, pai, reconhece que haja alguém melhor? – Uns poucos outros talvez pensem ou se vejam como tão bons quanto seu pai. – Quem, pai, daria para citar nomes desses caras? – Um polonês de nome difícil, Robert Lewandowski, um francês, de nome e caráter mais complicados ainda, Kilian Mbappé, e um ótimo brasileiro, Neymar, como você, júnior. – Que bom, pai, então posso tentar ser, senão como o senhor, semelhante a um desses jogadores que citou. – Filho, como já lhe falei, pouco importa se você será ou não um grande futebolista, um cientista competente, um engenheiro renomado, um respeitado e respeitável professor; a qualquer profissão a que se dedicar vai sempre poder contar com meu apoio e minha torcida. O que quero, de fato, tanto para você, quanto para seus irmãos, é que sejam todos felizes. – Obrigado, pai, vou fazer tudo para ser bom em alguma coisa, como o senhor foi e é no futebol. – É assim que deve pensar, filho. -Todavia, se no final das contas você terminar optando pelo futebol, eu iria ficar extremamente feliz e, certamente, deveras realizado, se, aos olhos do mundo, meu filho, Cristiano Ronaldo Júnior, jogasse tanto quanto um argentino miúdo que ainda anda por aí. – Quem é ele, pai? - Um tal de Lionel Messi. – De esse você havia esquecido, papai. – Na verdade, nem havia lembrado; mas deixa para lá... 

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2022

Prática do ciclobol em Parnaíba

 

Foto meramente ilustrativa    Fonte: Google

Prática do ciclobol em Parnaíba


No grupo Acadêmicos – APC, da Academia Piauiense de Cultura, fundada em 14/01/2022, o confrade Paulo Silva levantou uma questão interessante e curiosa sobre antiga prática do ciclobol em Parnaíba, de que tomou conhecimento através de seu pai, o ex-governador Alberto Silva, na esperança de que alguém lhe desse maiores esclarecimentos sobre essa importante sociabilidade esportiva, provavelmente praticada no Piauí apenas em Parnaíba.

Vejamos o que escreveu Paulo Silva:

Desde o começo da década de vinte, do século vinte, os ingleses introduziram em Parnaíba esse jogo, disputado em quadra, todos montados em bicicleta sem poder tocar o pé no chão. O objetivo era fazer gol com bola, em um aro posicionado verticalmente em cada lado. Competição muito concorrida de plateia de jovens.

Papai me disse que foi contratado aos dez anos de idade, para animar os jogos com o piano. Coisa que já fazia com a orquestra do cinema mudo desde o ano anterior. Se tinha dez ano, foi em torno de 1928. Não sei onde era jogado, mas depois do piano triplicou o público e passaram a cobrar ingresso.

Também não sei até quando foi praticado e quem eram os atletas. Mas é uma curiosidade que gostaria de esclarecer.   

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

OS PRAZERES DA VIDA



OS PRAZERES DA VIDA


José Expedito Rêgo


Quem primeiro desenvolveu uma teoria, segundo a qual a matéria seria formada de pequenas partículas, foi Leucipo, filósofo grego que viveu nos anos 500 antes de Cristo. Demócrito, seu discípulo, chamou de átomo a essas diminutas porções de matéria, que seriam indivisíveis, e criou o Atomismo, em filosofia.

Epicuro, seguidor de Demócrito, foi o primeiro filósofo materialista conhecido no Ocidente. Nasceu em Samos, no ano de 342 antes de Cristo. Seus ensinamentos podem ser seguidos ainda hoje e eu, pessoalmente, concordo com ele em muitos pontos.

Muita gente pensa que Epicurismo é a procura dos prazeres materiais mais baixos, as delícias do sexo ou da mesa farta. O sexo saudável e a boa alimentação são importantes, é claro, para a busca do equilíbrio na vida. Mas o prazer, na teoria de Epicuro, seria alcançado pela serenidade da alma. A dor é o mal, o prazer é o bem. Podemos encontrar tal serenidade ouvindo boa música, lendo um poema de Drummond, um romance de Machado de Assis, dançando, tomando um bom vinho, contemplando um quadro de Leonardo, uma estátua de Fídias ou pela simples meditação bem orientada.

Atingindo a serenidade da alma, o homem se libertaria de temor dos deuses e do temor da morte. De acordo com Epicuro, os deuses não têm qualquer interesse nas relações humanas. E a morte é o fim da vida, que deve ser aceita com tranquilidade. A alma não é imortal, desaparece com a vida. Nada existe no Além.

A vida é o que de mais belo aconteceu neste planeta chamado Terra e, naturalmente, deve ocorrer em outros mundos, pelo Universo afora. Deve ser vivida intensamente, aproveitada ao máximo, gozando os prazeres bons pregados por Epicuro, não os prazeres inferiores. O amor ao próximo, preconizado por Jesus Cristo, pode ser uma forma dessa busca de prazer, visando a serenidade da alma. Podemos muito bem amar o próximo, sem ter em vista uma recompensa eterna.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

O Modernismo Brasileiro

Fonte: Google


O Modernismo Brasileiro

 

Elmar Carvalho

 

Durante dez décadas vem se propalando no Brasil a ideia de que o Modernismo foi deflagrado no Brasil pela Semana de Arte Moderna de 1922, em São Paulo. Não é bem a verdade ou não é a verdade em sua inteireza.

Não poderia uma semana, que na verdade sequer foi uma semana, de palestras e manifestações artísticas e literárias ter esse condão, ter esse poder, sobretudo num país da dimensão do nosso e com tanta diversidade.

Alguns bisonhos acham que a Semana foi como uma chave que ligou a energia e a luz do Modernismo, que se espalhou incontinenti por todo o território brasileiro, como um imenso e milagroso FIAT LUX bíblico. Faça-se a luz, e a luz modernista se fez, instantaneamente. Não, não foi assim ou pelo menos não foi bem assim.

Para início de conversa, devemos observar que as escolas e movimentos literários, com os seus próceres e mestres contribuíram para a nossa Literatura chegar ao patamar onde chegou. Há que se atentar para as contribuições do Romantismo, do Parnasianismo, do Realismo e do Simbolismo, cada um com as suas peculiaridades e características mais marcantes, com os seus expoentes como José de Alencar, Gonçalves Dias e Castro Alves; Raimundo Correia, Alberto de Oliveira e Olavo Bilac; Machado de Assis, Raul Pompeia e Lima Barreto; e Cruz e Sousa, Alphonsus de Guimaraens e o nosso Da Costa e Silva.

Não se pode esquecer de certos precursores, penumbristas e experimentalistas, que podem delimitar os antecedentes de nosso Modernismo, e entre os seus praticantes poderia citar Manuel Bandeira, Da Costa e Silva (em certos poemas de feição modernista), Murilo Araújo, Augusto dos Anjos, Hermes Fontes e Duque Costa, numa enumeração meramente exemplificativa, e não exaustiva.

O poeta Ledo Ivo, no artigo “Os modernismos do século XX”, publicado na Revista Presença, ano XIX, nº 32, 2º semestre/2004, preleciona: “Seria impostura admitir a versão de que todos os processos estéticos vigentes no Brasil decorrem daquela Semana de Arte Moderna financiada pela alta burguesia cafeeira paulista e dos Prados e Penteados, e apoiada por Washington Luís, então presidente de São Paulo. E só uma visão bisonha do fenômeno artístico se afeiçoaria ao juízo de que Brecheret é mais brasileiro do que o Aleijadinho, Tarsila mais revolucionária do que Eliseu Visconti, ou Mário de Andrade mais moderno do que Machado de Assis.”

Por outro lado, a eclosão de vários “ismos” europeus, com suas variadas manifestações, postulados, profissão de fé e características, entre os quais o futurismo de Marinetti, e, mais ligada a nós, a poesia moderna portuguesa de Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro, Almada Negreiros, José Régio etc., que chegaram ao Brasil por diferentes vetores, também se espalharam em vários nichos do país, em que tomaram diferentes texturas e colorações.

Por exemplo, o romance de 30 pouco ou nada tem a ver com o Modernismo de São Paulo. O mesmo se pode dizer da geração de 45, com seu formalismo e característica própria. A literatura moderna feita no Rio de Janeiro também tinha as suas nuanças e história próprias. O modernismo no Recife, inclusive com as novas fórmulas e ideias preconizadas por Gilberto Freyre e outros, nada deveu ao modernismo paulista.

E isso ocorreu em outros rincões, que aqui poderia citar, mas não o farei. Poderia referir, para exemplificar, o Grupo do Estrela de Belo Horizonte e o Grupo Verde de Cataguases, em Minas Gerais, ou a Padaria Espiritual no Ceará, surgida ainda no final do século XIX, que apresentava características do Modernismo. Por essas três agremiações literárias foram publicados os periódicos A Revista, a Revista Verde e o jornal O Pão, respectivamente.  Mas não o farei, repito.

Assim, o Modernismo no Brasil não foi um simples Big Bang ou “fiat lux” do Modernismo de São Paulo; foi uma consequência e contribuição de vários “ismos” e das peculiaridades e características dos diferentes regionalismos do Brasil, bem como do talento de vários artistas nascidos e/ou vivendo nessas diferentes regiões.