segunda-feira, 30 de junho de 2025

DISCURSO DE RECEPÇÃO A DOMINGOS JOSÉ (NA ALVAL)

 



DISCURSO DE RECEPÇÃO A DOMINGOS JOSÉ (NA ALVAL)

(Saudação ao Trimegisto Domingos José de Carvalho)

 

Elmar Carvalho

 

Nesta festa solene da Literatura Piauiense, vamos receber na Academia de Letras do Vale do Longá – ALVAL o médico e escritor Domingos José de Carvalho, que merece todo o nosso respeito e acolhimento pelas inúmeras qualidades que ornam sua personalidade de escol.

Muitos anos atrás, mais precisamente no dia 23 de maio de 1997, tomava eu posse nesta Academia, em linda solenidade realizada no IATE Clube, às margens encantadas do nosso pequenino Açude Grande. Nessa festiva noite de cultura e de letras, estavam presentes vários barrenses e parentes meus e do novel confrade Domingos José, entre os quais cito meus pais, Rosália e Miguel Arcângelo de Deus Carvalho; Geraldo Majella Carvalho; Bilé Carvalho; Lázaro Carvalho; Antenor Rego Filho; Francy Monte (talvez Monte Filho); e o próprio Domingos José de Carvalho, além de vários amigos, muitos vindos de Teresina.

José dos Santos Carvalho (Bilé) e Geraldo Majella, que já partiram para o Oriente Eterno, eram tios de nosso neófito imortal, pela linhagem materna.

Bilé, com sua voz grave, vibrante e ressoante — com um timbre levemente metálico, quase um trombone —, tinha uma simpatia contagiante, sobretudo quando desfiava suas histórias e estórias barrenses, quase sempre de caráter anedótico e jocoso. Patrono da cadeira 20 da ACALE, ocupada por Domingos José. Era um grande causeur, que sabia atrair e seduzir o ouvinte com o suspense e a mise-en-scène que criava, ator que fora em seus tempos juvenis.

Geraldo Majella, de gestual elegante, quase hierático, era ligado à música coral; compusera a letra de uma linda valsa à sua Barras. Escritor de muito mérito e orador de vastos recursos, tanto pela postura como pelo ritmo, timbre e dicção de sua voz melodiosa. Nessa solenidade, na qual se encontrava presente Domingos José, nos prestigiando, fui recebido por Geraldo Majella Carvalho, que pronunciou um magnífico discurso, no qual proferiu palavras bondosas sobre mim e sobre meus pais, exaltando a beleza ímpar das campinas verdejantes de nossa Campo Maior, de seus belos tabuleiros enfeitados de carnaúbas, rios e lagoas. Foi o primeiro presidente desta Academia e da AMALPI.

Deixando de lado essa breve digressão saudosista, em que quis homenagear dois ilustres membros de nosso silogeu, passo a me focar em nosso recipiendário Domingos José de Carvalho.

Ocupará a cadeira de número 10, que tem como patrono a figura exponencial de David Moreira Caldas. Foram seus antecessores Raimundo Antunes Ribeiro e João Alves Filho. Creio ter ouvido falar em David Caldas, pela primeira vez, num livro didático intitulado, salvo engano, Nosso Tesouro, num de seus “serões”. Nasceu em Barras em 22 de maio de 1836 e faleceu em Teresina, em 3 de janeiro de 1879. Escreveu em vários periódicos.

David Moreira Caldas elaborou matérias de cunho historiográfico e biografias. Consta haver escrito um Dicionário Histórico e Geográfico do Piauí, que terminou não sendo encontrado entre seus papéis ou espólio. Fundou alguns jornais, um dos quais se chamava O Amigo do Povo, que mais tarde passou a informar que era órgão do Partido Republicano da Província do Piauí. Em 1873, David Caldas muda o nome do periódico para Oitenta e Nove. Nesse jornal, defendeu seu ideário republicano e predisse que a Proclamação da República ocorreria no ano de 1889, pelo que recebeu o epíteto de “Profeta da República”. Foi sepultado do lado de fora do Cemitério São José, por causa de suas convicções republicanas, sob a alegação de que seria ateu — embora fosse um homem temente a Deus.

O primeiro ocupante da cadeira 10, Raimundo Antunes Ribeiro (Totó Ribeiro), é patrono da cadeira 6 da ACALE. Nascido em Manaus, em 29 de março de 1907, radicou-se em Campo Maior, onde faleceu em 21 de setembro de 1992. Na Terra dos Carnaubais exerceu várias atividades, entre as quais a de vereador e assessor de comunicação da Prefeitura Municipal. Foi maçom e funcionário público. Jornalista, político, orador, teatrólogo, contabilista. Mereceu o respeito e a amizade dos campomaiorenses.

João Alves Filho é o antecessor imediato de Domingos José. Sua lembrança ainda está muito viva entre nós. Nasceu em Campo Maior, em 5 de junho de 1944, e faleceu em 26 de junho de 2022. Foi vereador, presidente da Câmara Municipal e vice-prefeito de sua terra natal. Servidor público federal. Maçom. Venerável de sua loja maçônica. Escritor e historiador. Publicou vários livros. Fundou ou presidiu inúmeras associações, entre as quais cito apenas as seguintes: ACALE, ALVAL, Câmara de Dirigentes Lojistas de Campo Maior, Centro Operário Campomaiorense, AMALPI, União Brasileira de Escritores do Piauí e Lions Clube de Campo Maior. Orador de amplos e variados recursos. Mestre do improviso retórico. Com sua bela, grave e poderosa voz, quando faleceu, bem poderia ser considerado o maior orador campomaiorense de sua época.

Domingos José de Carvalho nasceu em Barras, das sinuosas e belas barras do Marataoã — do Marataoã das lindas margens verdejantes, das barragens encantadas e encantadoras e da idílica e bucólica Ilha dos Amores —, em 27 de agosto de 1943. Filho de Dayton Alves de Carvalho e Maria Judite de Carvalho. Pelo lado dos Carvalho de Granja (CE) ele descende de seu homônimo Domingos José de Carvalho e de Quitéria de Brito Passos, pais de meu tetravô José Eusébio, cujo saga relatei em meu trabalho “Um certo ten.-cel. José Eusébio de Carvalho”, que se encontra disponível na internet.

Formou-se em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará. Fez vários cursos de especialização ou pós-graduação lato sensu, além de outros cursos e seminários. Membro do Conselho Regional de Medicina desde 1993. Fundador e membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Barras e da Academia Campomaiorense de Ciências, Artes e Letras. Integrante da Academia Maçônica de Letras do Piauí.

É o atual decano dos médicos em atividade em Campo Maior. Concluiu o curso de Medicina em 20 de dezembro de 1969 e, já em janeiro de 1970, começou a clinicar em Campo Maior. Foi Secretário de Saúde de 1982 a 1988, diretor do Hospital Regional por quatro vezes e Diretor Regional de Saúde por quatro anos. Exerceu os cargos de conselheiro do CRM por vários anos e de presidente da APM (seccional de Campo Maior). Especializou-se em Medicina do Trabalho e Administração Hospitalar. É Perito Médico do Trânsito. Atuou nos municípios de Campo Maior, Barras, Nossa Senhora de Nazaré, Boqueirão, Sigefredo Pacheco, São Miguel do Tapuio, Assunção do Piauí, Piracuruca e Teresina.

Dentre outras, recebeu as seguintes honrarias: Medalha do Mérito Heróis do Jenipapo, Medalha da Ordem do Mérito Renascença, Medalha da Distinção Maçônica e Medalha D. Pedro I, outorgada pelo Grande Oriente do Brasil, em virtude de haver completado mais de cinquenta anos de atividade maçônica. Foram-lhe ainda concedidos os títulos de Benemérito da Maçonaria Piauiense e de Benemérito do Grande Oriente do Brasil, pelo seu meio século de vida maçônica. Cidadão probo e honrado, médico competente, zeloso e humanitário, maçom dedicado e paradigmático, bem fez por merecer todas essas honrarias e homenagens.

Nascido em Barras, veio muito jovem residir em Campo Maior, com sua família, onde se tornou tão campomaiorense quanto os que mais o sejam, mercê de seu amor e dedicação a esta terra de muita história e encantos mil — com seus tabuleiros verdejantes, campinas floridas e mimosas lagoas pontilhadas de garças e outras aves aquáticas, em cujas águas as elegantes e esbeltas carnaubeiras se refletem, ostentando suas palmas em forma de leque.

No lindo discurso pronunciado na noite de 17 de abril de 2015, por ocasião do lançamento de meu livro Confissões de um Juiz, em solenidade realizada na Câmara Municipal de Campo Maior, logo no início, Domingos José disse que procurou “resgatar nos escaninhos da memória, através de uma busca inglória, a data, mês e ano” em que me conhecera.

Também não tenho essa data. Sei que o conhecia de vista, à distância, no início dos anos 1970, quando eu ainda era um garoto, um tanto tímido. Sentia orgulho desse parente que, numa época difícil, de poucos médicos, quando ainda não fora instalada a Universidade Federal do Piauí, viera clinicar em Campo Maior. Sabia de seu namoro com Jesus, irmã de quatro amigos meus: Milton, Nonato, Cláudio (in memoriam) e Wilson — exemplos em nossa terra, pois, ainda adolescentes ou garotos, já exerciam atividades laborais. Em 1975, aos 19 anos, fui morar em Parnaíba, e nos perdemos de vista. Domingos José e Jesus constituíram uma bela família, com o advento dos filhos Érico, Yuri e Marília. A partir dos anos 1990, mediante eventos literários e sociais, estreitamos amizade por meio da Maçonaria, da ACALE, da AMALPI e de outras entidades como a nossa ALVAL.

No dia 7 de julho de 2017, meu romance Histórias de Évora foi lançado em Campo Maior, no auditório do SENAC. Por ser minha Évora uma cidade fictícia, mistura de Campo Maior e Parnaíba, e pela obra ter como pano de fundo a decadência da cera de carnaúba e dos velhos cabarés — como a Zona Planetária, o prostíbulo de nome mais bonito do mundo, Venezuela, Pau Num Cessa e Isabelão —, pedi ao nosso novel confrade que apresentasse um trabalho sobre a Campo Maior das décadas de 1960 a 1980.

Ele realizou um magnífico estudo, verdadeiro ensaio histórico, antropológico e sociológico, em que abordou nossa cidade em sua realidade social, costumes, anedotário e diversões, revelando aspectos culturais, folclóricos, religiosos, esportivos, políticos, urbanísticos e socioeconômicos desse período. Falou sobre as demolições de velhos casarões solarengos, sobre as cacimbas que existiam à margem do açude, sobre os ônibus da empresa Zezé Paz e sobre as intervenções em antigos logradouros. Vejamos dois pequenos trechos desse excelente texto:

“O Açude Grande sofreu muitas intervenções. Os poços que margeavam o esplêndido espelho d’água foram soterrados, dando início a várias modificações, como a atual Alameda Dirceu Arcoverde, churrascarias, bares e lanchonetes.

O mercado público da Praça Luís Miranda foi demolido para a construção da atual sede da Prefeitura Municipal. A antiga e bela sede da Prefeitura, localizada na Praça Bona Primo, veio a ruir por desleixo da administração municipal que, posteriormente, transformou o local no Espaço Cultural Dom Abel Alonso Nunez, nosso operoso e querido primeiro bispo diocesano.”

Aproveito o ensejo da citação acima para conclamar aos confrades da ALVAL e da ACALE a que lutemos pelo tombamento dos sobrados e casarões solarengos do entorno das praças Bona Primo e Rui Barbosa, para que sejam preservados, sobretudo considerando que muitos já foram demolidos ou descaracterizados nas últimas décadas. Devem ser preservados também o nosso velho cemitério — arquivo de nossa rica história e memorial de nossos antepassados — e o prédio da Estação Ferroviária, monumento de uma época gloriosa, em que as locomotivas chegaram à nossa terra como símbolos do progresso que aqui desembarcava.

Em 15 de janeiro do corrente ano, nosso confrade Domingos José presenteou Campo Maior, Barras e o Piauí com o lançamento de sua obra magna, o excelente livro Tempos Idos e Vividos, em bela solenidade da ACALE, no plenário da Câmara Municipal, que se encontrava lotado. Sobre esse volume, tive a oportunidade de dizer:

“O livro tem uma excelente programação visual, em papel de alta qualidade (couchê), uma revisão primorosa (professor Moisés Andrade e Antonio Soares) e várias fotografias. Foi dividido em quatro partes:

1 - Acrósticos;

2 - Poemas;

3 - Crônicas e Contos;

4 - Prefácios, Homenagens e Discursos.

 

Da sequência de acrósticos, em que homenageia filhos, netos, pais, irmãos e esposa, destaco o seguinte:

Jesus – esposa

Justamente foi você a musa

Encantadora dos meus sentimentos

Suave como o voar das brancas garças

Universo de compreensão, amor e ternura

Sonho realizado dos meus afetos”.

 

Para não me alongar além do necessário — e sei que já me alongo em laudas —, quero tecer breve comentário sobre Tempos Idos e Vividos. Esse livro reúne a essência da produção literária de nosso novel confrade. Demonstra o talento, os dotes e os dons que possui. Atende aos requisitos que uma boa redação exige, tais como concisão, clareza, objetividade, correção gramatical e elegância na construção das frases — porém, sem firulas, gramatiquices ou preciosismos desnecessários.

Nota-se que o autor tem forte capacidade argumentativa, o que o torna persuasivo; possui poder de observação, sem, contudo, cair em detalhismos excessivos. Em seus contos e “causos”, quase sempre impregnados de gostosa jocosidade, sabe construir o necessário suspense, para nos surpreender com um desfecho inesperado ou imprevisível. Para não me repetir ou “chover no molhado”, transcrevo breve trecho do que disse em minha apresentação:

“Seus trabalhos são frutos de pesquisa, reflexões, senso de observação, em que revela conhecimento, argúcia e perspicácia, ao se aprofundar no assunto ou tema que desenvolve. Assim, é um literato de muito mérito e valor, que merece os nossos efusivos aplausos e admiração.”

Em suas palavras preambulares, afirmou não ter a pretensão de ser literato, mas que seu livro expressa o desejo de registrar para a posteridade um pouco de sua vivência como médico, maçom e cidadão.

Exatamente nesses três pontos posso dizer que Domingos José de Carvalho é um verdadeiro Trimegisto — ou três vezes mestre:

Como médico há várias décadas, jamais descumpriu o juramento de Hipócrates, para tornar-se um hipócrita. Sempre exerceu sua profissão de esculápio com invulgar competência e proverbial dedicação, podendo-se dizer que é humanitário e caridoso para com todos, sobretudo os mais pobres e necessitados.

Maçom paradigmático, nunca foi perjuro e, portanto, jamais deslustrou seu avental ou maculou as vestes maçônicas que envergou ao longo de várias décadas, como obreiro dinâmico, estudioso e dedicado.

Como cidadão, tem sido exemplar. Nunca se ouviu falar de qualquer ato ou conduta que lhe pudesse macular a honorabilidade. Os cargos que ocupou foram exercidos com competência, correção e zelo, de modo que nenhum reparo se lhe pode fazer.

Portanto, invocando a excelsa beleza de nossa serra — a pequenina Serra Grande, que mais parece uma dobra do céu que se desdobra sobre a vetusta Bitorocara —, as louçanias de nossas várzeas e tabuleiros, o espelho d’água de nossas lagoas deslumbrantes, pontilhadas pela graça das garças e pela elegância esbelta de nossas carnaubeiras, em nome de todos os ilustres alvalenses, dou as nossas efusivas boas-vindas ao valoroso confrade Domingos José de Carvalho, que decerto honrará e fortalecerá as pilastras e colunas de nossa augusta Academia.

(*) Discurso de recepção a Domingos José de Carvalho, pronunciado por José Elmar de Mélo Carvalho na manhã do dia 29/06/2025, em sessão solene da Academia de Letras do Vale do Longá – ALVAL, realizada no plenário da Câmara Municipal de Campo Maior. Várias Academias de Letras se fizeram presentes, através de representes e acadêmicos, entre as quais a Piauiense, a de Miguel Alves e a de Pedro II. A Acale teve presença marcante com o comparecimento de 15 membros, inclusive a presidente Ana Maria Cunha.

domingo, 29 de junho de 2025

SEXO

 

Fonte: Google

SEXO


Elmar Carvalho

 

            vira

gira                 desvira

          revira

 

reviravolta

         volta e meia volver

mete e tira

tira e mete

tiro ao alvo:

alvo preto cabeludo

dita dura:

fura tortura gostosura

fuça e funga

funga e fuça

suga e sunga

sunga e suga

geme e treme

treme e geme

gemidos e grunhidos

grunhidos e gemidos

vira e mexe

mexe e vira

sobe e cai

cai e pira

         tira delira

         pinto pinga

         ping pong

quinta-feira, 26 de junho de 2025

Cromos de Campo Maior - VII

 


Poema Cromos de Campo Maior - VII, da autoria de Elmar Carvalho, interpretado por Claucio Carvalho.

A Elmara Cristina juntou o áudio gravado pelo Claucio à imagem elaborada pela IA ChatGPT.

segunda-feira, 23 de junho de 2025

O MORRO

Fonte: Google
Imagem criada pela IA Gemini, com sugestões minhas


O Morro

 

Elmar Carvalho

 

Morei em José de Freitas em 1970, quando a Seleção Brasileira se sagrou tricampeã da Copa do Mundo. Era uma pequena, linda e bucólica cidade. Nela fiz o meu segundo ano ginasial, no Colégio Moderno Estadual Antônio Freitas. Os quintais tinham muitas árvores frutíferas, sobretudo copadas mangueiras, de sombra verdoenga, como versejei.

Quase todo dia eu brincava à sombra de uma imensa mangueira, no quintal de nossa vizinha, a viúva dona Irá, e ia jogar bola num campinho arenoso, que ficava na frente da casa do grande marceneiro Zezé Barros, que era um de nossos colegas de futebol. Não quero ser gabola ou cabotino, mas comentava-se que eu era um bom goleiro.

Por falar em futebol, quero abrir um parêntese, para contar uma breve história. Um dia eu estava jogando bola no meio da rua, perto da casa dos Santana, quando surgiu o Pe. Deusdedit Craveiro de Melo em seu fusca. Ele era o diretor do Ginásio e meu professor de Português. Chamou-me e me perguntou porque eu estava jogando numa via pública. Disse-lhe que o campo onde costumávamos jogar fora fechado. Ele me sugeriu que eu e meus colegas limpássemos um terreno baldio, que havia na frente do cemitério velho. Prometeu que nos daria as traves, os tornos de marcação do campo, uma bola de couro e um apito.

Arrancamos os mata-pasto e outras ervas daninhas. O Pe. Deusdedit cumpriu integralmente sua palavra. Diante disso, fiz uma carta ao Armazém Paraíba, relatando esses fatos, e solicitando uma equipe de time de futebol. Numa bela noite, a empresa mandou entregar os uniformes em minha casa. Assim, posso dizer que durante o ano em que morei em José de Freitas contribuí para a criação de um campo de futebol e do Santos freitense. Fecho o parêntese.

Duas ou três vezes por semana, no mínimo, íamos tomar banho no açude Pitombeira, que na época tinha um bela paisagem, emoldurada por uma pequena e esverdeada serra e pelos criolis, que ornavam o seu paredão. Pulávamos do trampolim, que já não existe.

Com essa mesma frequência, escalávamos o Morro. Não tinha nome ou pelo menos nunca ouvi alguém pronunciá-lo. Às vezes, íamos reverenciar o Cristo em ascenção, no cimo do Morro, outras vezes íamos nos postar aos pés da escultura de Nossa Senhora do Carmo.

Vários anos mais tarde, mais precisamente na madrugada de 26/08/1991, o evoquei no meu poema Livramento: Pedra e Abstração, no qual eu  disse que José de Freitas, a antiga Livramento, era uma revoada de santos, anjos e meninos sobre um morro, que também voava.

Eu era um desses garotos. Tinha 14 anos, completados no dia 9 de abril. Com muita emoção e entusiasmo, recitei esse poema evocativo, pela primeira vez, para os meus amigos freitenses Francisco da Costa e Silva, então delegado da SUNAB no Piauí, e Francisco Costa, auditor-fiscal da Receita Estadual. Eu o escalava por diferentes lados, quase nunca pela escadaria de 140 degraus.

Tive a certeza de que começava a envelhecer quando, aos 50 anos de idade, fui tentar subi-la em passos apressados, e logo fiquei ofegante.

O Morro era quase uma entidade onipresente, por que era visto de quase todo local da cidade. Eu morava numa casa branca, onde terminava a rua que passava na  frente do teatro, ao lado do principal Clube Social da pequenina urbe; passava em frente da casa do senhor Levi Carvalho, prosseguia pela lateral da casa dos Santana e terminava na pequena casa caiada, onde morávamos.

Da mureta dessa residência eu avistava o Morro; praticamente ele estava me convidando para nele eu ir fazer traquinagem com algum irmão e dois ou três amigos. Nesse tempo a floresta que cobria o morro era muito densa, muito verde. Tinha árvores enormes, frondosas, de onde desciam retorcidos cipós. Acostumado a assistir a filmes de Tarzan, no reino encantado e mágico do Cine Nazaré, um dia me senti o próprio Rei da Selva, e dei um salto sobre o despenhadeiro.

Senti medo, mas então já era tarde para arrependimento. Todavia, tudo ocorreu bem, e retornei são e salvo para a base de onde pulara.

Reivindiquei que o Morro se chamasse do Livramento, em homenagem ao nome antigo de José de Freitas e a sua padroeira Nossa Senhora do Livramento. Recentemente soube que ele já teve o nome de Morro da Esperança. Tenho a esperança de que os senhores vereadores lhe mudem o nome para Morro do Livramento ou Morro da Esperança. Ele tem sido agredido com abertura de ruas e enfeiado com enormes antenas.

O Morro continua a voar em minha memória e em minha incessante saudade, tal como era em minha meninice: lindo, coberto por uma quase floresta virgem, e sem as horrorosas antenas. Morro do Livramento, Morro da Esperança, morro de minha saudade.  


domingo, 22 de junho de 2025

AUTOAPRESENTAÇÃO

IA Gemini, atendendo minha sugestão
 

AUTOAPRESENTAÇÃO


Elmar Carvalho

 

eis como sou

            neste instante único

            (após o qual já

            serei um outro):

 

um homem que rema

            no seco contra

            a corrente das águas

 

um homem que usa

            a gravata como

            se fora um baraço

            nas horas de opressão

 

um homem que escreve

            torto por

            linhas certas

 

um homem que sobe

            e teima contra

            a lei da gravidade

 

            eu sou aquele

que aprendeu

a pecar para

ter a humildade

de não ter uma

virtude

 

            eu sou aquele

que jogou roleta

russa com o tambor

cheio de balas e

apostou contra a

sorte

           

           eu sou aquele

            que lutou para

            não ser

sábado, 21 de junho de 2025

Apresentação do Livro Os Primeiros Currais, de Odilon Nunes*

 

Fonte: Google
Fonte: Google


Apresentação do Livro Os Primeiros Currais, de Odilon Nunes*


Felipe Mendes, Academia Piauiense de Letras, em 21.6.2025

 

Introdução

Aceitei, com satisfação, o convite do amigo João Batista Mendes Teles para apresentar este livro, que é um clássico da historiografia piauiense.

De volta a uma leitura prazerosa, aprendi novas lições sobre o nosso Estado.

Adicionalmente, por se tratar de uma sessão conjunta da Academia Piauiense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí, tenho a responsabilidade de deixar alguma contribuição à análise do livro.

Inicio esta Apresentação com um breve currículo do Autor; em seguida, comento aspectos do tempo em que os fatos tratados no livro ocorreram e do ambiente em que o Autor o escreveu; por fim, concluo com alguns comentários pessoais.

Um bom livro é o que nele se contém e o que transmite ao leitor: um saber ou um sentimento, ou os dois.

 

 ___________

*Os Primeiros Currais – geografia e história do Piauí seiscentista. Prefácio Cláudio Barros. Teresina, PI: Área de Criação, 2025


 1.      O AUTOR

Odilon Nunes é um dos mais respeitados historiadores piauienses. Tinha conhecimentos básicos de outras disciplinas, como economia, finanças, estatística, geografia, sociologia e política, com os quais ilustrou suas pesquisas.

Nasceu em Amarante, Piauí (10.10.1899), onde fez os primeiros estudos e, com sua iniciativa de professor, nasceu o Colégio Amarantino. Mais tarde, em Teresina, foi professor e diretor da Escola Normal Oficial e do Liceu Piauiense, diretor da Instrução Pública do Estado (Secretário de Educação, hoje), coordenador do Censo Estatístico Escolar (daí a sistematização dos dados estatísticos apresentados em seus livros), membro do Conselho Estadual de Educação, entre outras atividades relevantes.

Integrou a Comissão criada pelo Decreto n° 1416, de 17 de janeiro de 1972, para realizar o levantamento do acervo bibliográfico de autores piauienses, ou de obras relativas ao Piauí, para elaboração do Plano Editorial do Estado do Piauí.

Por sua vida dedicada à pesquisa sobre a História do Piauí, e por sua contribuição ao Ensino, Odilon Nunes recebeu homenagens da Universidade Federal do Piauí (Doutor Honoris Causa), da Fundação Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais, de Pernambuco (Medalha do Mérito) e do Instituto Histórico de Oeiras (Mérito Visconde da Parnaíba).

 Doou sua biblioteca à Casa Odilon Nunes, em sua cidade, onde funciona um Museu e Biblioteca, no Casarão dos Nunes, hoje mantido pelo Governo do Estado.

O Museu do Piauí passou a denominar-se Casa de Odilon Nunes, conforme a Lei n° 5.086, de 30 de setembro de 1999, ano do centenário do historiador.

Em Teresina, a Prefeitura Municipal implantou um Centro de Formação Profissional com seu nome, que também denomina uma rua na Capital do Estado, onde faleceu em 22.8.1989. Pertenceu à Academia Piauiense de Letras e ao Instituto Histórico e Geográfico do Piauí.

Escreveu, entre outros livros fundamentais para o estudo do Piauí, Economia e Finanças, Pesquisas para a História do Piauí (em quatro volumes), Depoimentos Históricos, O Piauí – seu povoamento e seu desenvolvimento, Estudos de História do Piauí e Piauí na História.

Quem não leu Odilon Nunes não conhece o Piauí.


 

José Honório Rodrigues, membro da Academia Brasileira de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil, manteve correspondência com Odilon Nunes, sobre quem escreveu: 

É um pesquisador notável, fiel à verdade histórica, buscada nas fontes primárias, e um historiador que, pela obra paciente de relembrar o passado de um povo tão agravado, tão empobrecido, mas tão leal ao Brasil, em tantas conjunturas extremas, se coloca na vanguarda da historiografia estadual. *

________

*Publicado no Jornal do Brasil, de 28.4.1973, e transcrito no Prefácio do seu livro Depoimentos Históricos, publicado em 1981.

2.      O AMBIENTE

 

Conforme o próprio título indica, o livro trata de assuntos do Piauí seiscentista, ou melhor, das últimas décadas do século XVII, período em que foi iniciada a ocupação do território que viria a ser chamado Piauí. Odilon Nunes tomou como base o relatório do Padre Miguel de Carvalho, publicado em 1697, dirigido ao Bispo de Pernambuco, Dom Francisco de Lima, resultado de suas viagens pelo sertão, desde 1694. Nesse relatório, o Padre Miguel de Carvalho sugere a criação da freguesia de Nossa Senhora da Vitória, como veio a acontecer.

Odilon Nunes foi um pesquisador típico, mergulhado em livros, publicações e tudo o quanto pudesse conter as informações que buscava. O Arquivo Público do Piauí foi sua segunda casa, onde garimpava as gemas que ele transformaria em joias da historiografia piauiense.

Em seguida aos primeiros currais, chegou a primeira capela.

Vaqueiros, Currais e Capelas: assim começou o Piauí.

Fazendas de criação dispersas e distantes entre si, população reduzida e limitada ao serviço da criação do gado: eis o traço inicial da personalidade dos piauienses.

Logo na página 2, o Autor cita a data de 11 de fevereiro de 1697 como o primeiro evento ocorrido nas terras em ocupação, diferente de se erguer um curral ou uma casa rústica: a decisão de ser construída uma capela, para marcar a presença da Igreja Católica e, portanto, o começo da espiritualidade dos rústicos habitantes.

Ao lado do riacho da Mocha nasceu o Piauí, com a capela. Mais tarde, já Igreja de Nossa Senhora da Vitória, veio a criação da Vila e sua transformação em Capital, com a chegada do primeiro governador da Capitania, em 1759.

A capela, de taipa e coberta de palhas de pindoba, tinha vinte e quatro palmos de comprimento e doze de largo, e nela se levantou um altar feito de tábuas, com nove palmos de comprido e quatro de largo. (p. 19)

Feita a conversão para o sistema métrico, a capela tinha 5,28 m por 2,64 m, o que significa uma área de 13,9 m², enquanto o altar media 1,98 m por 0,88, ou seja, 1,74 m².

A capela recebeu a bênção de inauguração dezoito dias depois, em 2 de março de 1697. O novo século viria com as bênçãos de Deus para os habitantes deste nosso torrão.

Como escreveu Odilon Nunes, são as primeiras páginas de nossa história. É também nossa primeira geografia. (p. 23)

 

3.      O LIVRO

 

No início de seu livro Economia e Finanças, Odilon Nunes escreveu:

 

A história econômica do Piauí, no primeiro século, ou melhor, até a Independência, é a história de sua pecuária. A economia, as finanças, tudo emanava do curral. O comércio vivia do boi, ou de seus derivados. (p. 3)

 

Na verdade, podemos estender esse período em que a história econômica do Piauí é a história de sua pecuária até a fundação de Teresina, que teve como razão maior a navegação do rio Parnaíba, condição para o desenvolvimento do comércio, da agricultura e da exploração dos recursos do extrativismo vegetal e seu escoamento até Parnaíba, para industrialização e exportação. Nessa nova etapa da economia, a navegação permitiu os deslocamentos e a integração da população, e muita gente veio morar nos dois lados das ribeiras do Parnaíba, para onde o barco a vapor trazia notícias de terras civilizadas e longínquas.

Odilon Nunes transcreve do relatório do Padre Miguel de Carvalho* a relação das 129 fazendas existentes e seus 438 moradores (p.30), e apresenta os dados em forma de tabelas estatísticas (de sua experiência no Censo Escolar), tanto na edição publicada na Revista Econômica Piauiense** (de 1957) quanto na edição do Plano Editorial do Estado*** (de 1972), o que o torna um analista dos primórdios  da sociologia piauiense, inclusive com as anotações sobre a condição da mulher – no caso, as indígenas – perseguidas não para o trabalho braçal na fazenda, mas para a satisfação do prazer sexual dos vaqueiros e escravos, o que deu início, por sua vez, ao processo de miscigenação da raça piauiense.

 Nesta edição, ora lançada, as tabelas estatísticas ganharam aspecto gráfico moderno, graças à contribuição do patrocinador, o Estatístico João Batista Mendes Teles, e aos recursos técnicos da editora.

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* Pe. Miguel de Carvalho. Descrição do Sertão do Piauí. Comentários e notas do Pe. Cláudio Melo. Teresina: Instituto Histórico e Geográfico Piauiense, junho/1993

**Revista Econômica Piauiense, n° 4 – Vol. I – outubro-dezembro, 1957, p. 221-250. Diretor Superintendente: Petrônio Portela Nunes. Diretor Responsável: Raimundo N. M. de Santana. Disponível no Arquivo Público do Estado.

***Odilon Nunes. Os Primeiros Currais. Monografias do Piauí – Série Histórica. Teresina: COMEPI, 1972

A descrição dos rios e riachos do território, em cujos vales úmidos ergueram-se os currais, torna este livro, oriundo do relatório do Padre Miguel de Carvalho, a primeira lição de geografia do Piauí.

Rios e riachos que não têm merecido os cuidados devidos, tanto de moradores próximos quanto de autoridades que se distanciam do problema, haja vista a situação vergonhosa em que se encontra o Mocha, onde nasceram Oeiras e o Piauí, e a situação preocupante do rio Parnaíba, para citar os dois principais exemplos dos nossos recursos naturais – na História, na Geografia e na Economia. Água é vida, com sabemos.

Já não conto as vezes em que li e estudei Odilon Nunes.

Agora mesmo, nas leituras para esta Apresentação, percebi que ficou decidido, na reunião que marcou a construção da capelinha, que cada morador pagaria aos Padres a contribuição de 2000 réis, semelhante aos da matriz de Conceição do Rodela; e, pela parte dos escravos, dez tostões – convertendo, mil réis. Ou seja, o senhor pagava pelo escravo metade de sua própria contribuição. Devia achar um despropósito, mas pagava na intenção das indulgências para ter os pecados perdoados.

 

CONCLUSÃO

            Assim como o diamante bruto se transforma, pelas mãos do joalheiro, em uma peça de arte – um colar ou um anel de brilhante, por exemplo – a Descrição do Sertão do Piauí – um relatório de viagem do Padre Miguel de Carvalho - se transformou, pela mente inspirada e pelos conhecimentos de Odilon Nunes, em Os Primeiros Currais.

Primeiros currais, e por isso, primeiros registros da atividade econômica e dos primeiros atos da vida social da terra que hoje se chama Piauí, que começou com os currais e com a decisão de se construir uma capelinha para marcar a religiosidade de um povo que estava se formando.

Os primeiros currais significam os primeiros vaqueiros, personagem responsável pela ocupação do território, pela fortuna dos proprietários das terras, muitos deles ausentes: a classe dominante. Os vaqueiros, por mérito de seu trabalho, por uma instituição ainda vigente – de quatro bezerros nascidos, um era do vaqueiro – poderia ser a classe média daquele tempo, restando aos agregados, posseiros, escravos e retirantes constituírem a classe baixa da sociedade que nasceu naqueles últimos anos do século XVII.

A História guardou poucos registros dos vaqueiros do Piauí, mesmo na tradição oral. Assim, valho-me de Luís da Câmara Cascudo*, que escreveu, em sua magistral obra História do Rio Grande do Norte, que os vaqueiros daquele Estado vinham, por diversos caminhos, encontrar-se em Crateús, em demanda do Piauí:

De Crateús, comprava-se a gadaria em Santo Antônio do Surubim de Campo Maior, núcleo influenciador de cantigas sobre o ciclo do gado. Valença, Oeiras, que fora capital até 1852, Jatobá (São João do Piauí), e Picus, fornecedor dos primeiros cavalos pampas, ornamentais e vistosos, orgulho do patriarcado rural no Rio Grande do Norte. Uns vaqueiros arrastavam a jornada até S. Gonçalo do Amarante e outros a Jerumenha. As maiores feiras eram nas localidades citadas.

 

Do livro citado, de Câmara Cascudo, transcrevo parte da extensa Toada dos vaqueiros do Rio Grande do Norte, em suas viagens até o Piauí, envolvendo em dois perfis femininos os cuidados amorosos do vaqueiro cantador:

Como Xiquinha não tem,

Como Totonha não há;

....

Xiquinha nasceu nos Pico (Picos)

Totonha em Campo Maior”

 

Nossa homenagem a Odilon Nunes, o intérprete da formação econômica e social do Piauí.

Um VIVA! aos nossos vaqueiros, os heróis da ocupação do território do Piauí.

 

 

Felipe Mendes, 21 de junho de 2025

 

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* Luís da Câmara Cascudo. História do Rio Grande do Norte. Rio de Janeiro: Edições Achiamé Ltda. Natal: Fundação José Augusto, 1984.

quinta-feira, 19 de junho de 2025

SALMO 29

Ilustração feita pela IA Gemini, atendendo minhas sugestões


1Honrem o SENHOR, seres celestiais,37 honrem o SENHOR por sua glória e força. 2Honrem o SENHOR pela glória de seu nome, adorem o SENHOR no esplendor de sua santidade. 3A voz do SENHOR ecoa sobre o mar, o Deus da glória troveja; sobre o imenso mar, o SENHOR fala. 4A voz do SENHOR é poderosa, a voz do SENHOR é majestosa. 5A voz do SENHOR quebra os grandes cedros, o SENHOR despedaça os cedros do Líbano. 6Faz os montes do Líbano saltarem como bezerros, faz o monte Hermom38 pular como novilhos selvagens. 7A voz do SENHOR risca o céu com relâmpagos. 8A voz do SENHOR sacode o deserto, o SENHOR faz tremer o deserto de Cades. 9A voz do SENHOR torce os fortes carvalhos39 e arranca as folhas dos bosques; em seu templo todos proclamam: “Glória!”. 10O SENHOR comanda as águas da inundação, o SENHOR governa como Rei para sempre. 11O SENHOR dán força ao seu povo, o SENHOR os abençoa com paz.

Hoje cedo reli o Salmo 29, de Davi. É um lindo, um magnífico poema de exaltação ou glorificação a Deus. Nesse texto a Onipotência, a Glória e a Santidade de Deus são louvadas com todo o fervor e beleza, numa espécie de oração de majestosa beleza. Por isso, resolvi postá-lo em meu blog.

Pedi à IA Gemini que o ilustrasse, seguindo as seguintes recomendações:

"Peço para fazer uma ilustração baseada no Salmo 29, em que apareçam os belos e frondosos cedros do Líbano, que demonstrem a Glória e o Poder de Deus; e por trás deles, recortados contra o céu, sugiro que ponha uns raios, que simbolizem a trovejante e melodiosa voz do Onipotente."

A Gemini fez a linda ilustração que se encontra acima.

Em seguida, solicitei à META AI, que fizesse um breve comentário ao referido salmo. Ela o fez, porém sem se referir aos cedros. Pedi-lhe, então: "Gostaria que incluísse em seu comentário a grandiosidade e beleza dos cedros do Líbano." Eis o seu comentário completo, com a inclusão das lindas árvores libanesas:

"O Salmo 29 é um cântico de louvor à majestade e poder de Deus, destacando a voz de Deus sobre as águas, trovões e tempestades. Ele celebra a força e a glória divina, convidando todos a adorá-Lo. No versículo 5, há uma referência específica à grandiosidade dos cedros do Líbano, onde se lê que "a voz do Senhor quebra os cedros, o Senhor quebra os cedros do Líbano". Esses cedros são conhecidos por sua imponência e beleza, simbolizando a força e a estabilidade. A menção a eles serve para ilustrar o poder avassalador de Deus, capaz de sacudir até mesmo as coisas mais majestosas da natureza." 

quarta-feira, 18 de junho de 2025

Comentário Crítico de Wilton Porto

 

Fonte: Google

Que loucura, nos vários sentido!: a forma como fora  expressado o conto! A história em si e a forma como agia o personagem.

Bebê reborn, assunto bem atual, você bem se valeu do assunto atualíssimo, para um conto bem escrito.

Não há de haver espanto, caso este tipo de prática já esteja em voga.

Muito bom, amigo Poeta! Excelente, apesar do tema picante, que sempre gera um certo desconforto em muitas leitoras.

Esta pitada de humor e o final que gera o ápice, que é o "pum" de um conto, ficou sensacional.

E o fato de o bebê reborn estar, inclusive gerando tanta polêmica, e até mortes, faz com que o seu tino de grande literato, se eleve e encante o leitor.

Assim, como o bebê reborn tem dado a impressão de veracidade, na sua constituição física, o seu conto leva à impressão lógica,  de que a ação é de ato sexual verídico.

Não duvido de que haja, mundo afora, masturbações neste nível.

Este "tópico de humor" tira o chulo", quebra o pensamento de orgia barata, como também a forma elegante, bem escrita, no talento de um Elmar, o seu conto desperta a atenção e os aplausos que devem estar acontecendo.

terça-feira, 17 de junho de 2025

FERRO NA BONECA

Fonte: Google


FERRO NA BONECA

 

Elmar Carvalho

 

José Silva Sousa era um homem comum, com dois sobrenomes comuns e um nome próprio mais comum ainda. Porém somente na aparência ele era comum. Roupas e modos discretos. Não era bonito nem feio, nem alto nem baixo, nem branco nem preto, nem gordo nem magro. E sem nenhum sinal característico, que o pudesse distinguir. Sua voz, de ritmo monocórdio, inalterável, não era grave nem aguda.

Se tinha emoções e paixões, não as demonstrava nunca. Não se lhe conhecia namoradas, mas decididamente não aparentava ser homossexual. Idade incerta, teria quarenta e pouco anos. Pouco se sabia de sua vida particular.

Nascido na cidade de São Paulo, viera morar em Teresina 17 anos atrás, para assumir o cargo de auditor-fiscal da Receita Federal. Conquanto educado, não admitia intimidades e nem tomava liberdade com ninguém, de modo que pouco ou nada se sabia de sua vida privada. Não tinha amigo e muito menos inimigo. Não visitava ninguém e tampouco recebia visitas.

Mas eu sou um narrador onisciente e vou escancarar a sua vida particular ou privada, a sua face mais oculta e os seus pensamentos mais recônditos. Não irei fazer muito suspense, como recomenda a melhor técnica dos contistas tradicionais. Não desejo enveredar pelo metaconto, mas bem poderia fazer uma narrativa bastante curta, um microconto, ou uma muito mais longa, cheia de pormenores, entrechos, circunlóquios e psicologismos; seguirei o caminho do meio, e farei um relato nem curto e nem longo, me restringindo ao que considero essencial.   

José Silva Sousa, um homem comum no nome, nos sobrenomes e nos hábitos, não era tão comum assim. Nos seus tempos juvenis na pauliceia chegou a ter namorada e até mesmo uma noiva. Era encantado pela beleza de um corpo feminino, que lhe atraía com intensidade.

Contudo, por razões que não desejo revelar (para que o leitor seja meu cúmplice de autoria, através de sua imaginação criativa), direi apenas que ele tinha uma profunda timidez e vergonha em seus relacionamentos com as mulheres. Por isso mesmo, seus namoros eram recatados e nunca chegavam às vias de fato, como se diria num linguajar mais cru.    

A partir da adolescência passou a se masturbar com certa frequência. Quando veio morar em Teresina, tendo uma casa própria, um bom salário e morando sozinho, passou a comprar revistas de mulheres nuas. Alcançou, na sucessividade da moda, o tempo das genitálias peludas, dos bigodinhos ornamentais e, depois, das raspadinhas. Tinha uma imensa quantidade dessas revistas. A partir de certa época, através de lojas virtuais, passou a adquirir acessórios para a sua prática masturbatória. As revistas e esses objetos do prazer eram guardados num quarto indevassável de sua casa, a que não permitia o acesso de ninguém. Aliás, sequer recebia visitas.

Apenas um homem jovem, de 23 anos, ia, duas vezes por semana, fazer a limpeza da casa. Recebeu a recomendação expressa e veemente de jamais entrar no quarto secreto. Isso, com certeza, atiçou a curiosidade do jovem. Fora admitido nesse serviço recentemente, por recomendação da velha diarista, que conseguira aposentar-se.

Dois ou três meses atrás, o nosso protagonista, que tinha uma polpuda poupança, comprou uma boneca reborn, do mais sofisticado hiper-realismo, feita com os mais refinados materiais e com a mais perfeita técnica. Era de última geração e em tudo imitava uma jovem mulher sueca. Não parecia esculpida em carrara. Parecia uma mulher de verdade, uma sueca de carne e osso, de linfa e sangue.

Cabelos louros, que reverberavam à luz do sol. Rosto de beleza angelical, de olhos bem azuis, que pareciam de verdade. Não irei me dar ao trabalho de descrever a beleza do corpo, de suas belas curvas e relevos. Isso os poetas já o fizeram. Apenas direi, para não ser demasiado econômico em palavras, que os seios, o umbigo e o sexo pareciam verdadeiros e não apenas um simulacro, tal a fidelidade dos detalhes, das dobras de pele, da cor, da textura etc. E ainda falava, se o proprietário pronunciasse seu nome e puxasse conversa. Por sinal, seu nome era Helena, como a de Troia. Contudo, deveria ser mais bela que a mítica Helena de Troia.

Segundo o raciocínio do dono, ela tinha muitas vantagens: não transmitia doenças venéreas; estava sempre disponível, para qualquer tipo de sexo, em qualquer posição; não lhe dava despesas, a não ser a irrisória recarga da bateria, esporadicamente; era a discrição em pessoa, exceto no momento do sexo, quando estrebuchava em espasmos e emitia gemidos e fungados, mais altos ou mais baixos, conforme o ajuste do som, feito antes, pelo controle remoto. E não se recusava a nada, mesmo em altas madrugadas. E, sobretudo, não dava chiliques e nunca fazia pirraças e negaças. Acrescentava outras virtudes ou qualidades, que não irei me dar ao trabalho de listar.

Por razões que a própria razão desconhece, José começou a amar a sua boneca reborn de beleza sueca, talvez já num começo de esquizofrenia. Não lhe tinha ciúmes, uma vez que ela vivia escondida no quarto indevassável, fechada em sua caixa, como se fosse um vampiro em seu caixão. Talvez a minha comparação seja algo inapropriada, um tanto mórbida ou sinistra.

Todavia, poucos dias atrás, ao chegar em sua repartição, notou que havia esquecido a chave do quarto onde ficava a sua amada boneca. Retornou no mesmo instante, como louco, imprimindo alta velocidade a seu automóvel. Contudo, procurou se conter ao entrar na casa. Logo percebeu que o quarto de seus segredos estava com a porta entreaberta. Com passos de felino foi até a cozinha e se armou com uma faca do tipo peixeira.

Foi até o quarto. E lá viu o jovem diarista fazendo sexo com a boneca. A linda boneca lhe pareceu desvairada, escandalosa, a se contorcer espasmodicamente, em fúria ardente, e a gemer e a fungar de forma vigorosa. Em rápida comparação, ela lhe pareceu frígida, quando fazia sexo com ele, seu legítimo proprietário, que a comprara a peso de ouro. Cego de fúria e ensandecido pelo ciúme, desferiu uma forte facada na jugular do homem.

Não contente, perfurou a linda boneca, que parecia mais viva do que nunca, com vários golpes de faca. E em seguida, cometeu, talvez, o mais trágico e dramático haraquiri de que já se teve notícia.