NASCENTE, ZÊNITE E MORRENTE
Na quarta-feira, recebi a informação de que a família de uma interditanda não teve condição de trazê-la ao fórum, para o interrogatório, em virtude de sua doença e debilidade. O advogado, em nome da família, pediu-me que fosse fazer o ato na própria casa dela. Considerando sua idade, de mulher de quase um século de vida, fui imediatamente, em companhia do causídico, da promotora de Justiça e do serventuário. Morava em casa humilde, quase na periferia da cidade. Logo na chegada, constatamos que ela havia defecado na roupa e estava tomando banho em seu próprio quarto, com a ajuda de parentes. Quando o banho terminou, e pude iniciar o interrogatório, pronunciei o seu nome. Ela não teve a menor reação. Fiz outras perguntas, apenas para cumprir o ritual, às quais ela não fez o menor esboço em respondê-las. Uma das coisas mais sagradas para uma pessoa é o seu nome, que a identifica e é a sua grande referência na sociedade e na família. É o símbolo de sua própria pessoa, de sua própria personalidade, de sua história pessoal. Por mais bem administrado que seja um ego, o nome é algo muito forte, é como uma marca, como um emblema do seu dono, tanto que, outrora, quando um franciscano fazia seus votos de fidelidade à ordem, a primeira coisa que abandonava era seu nome, como símbolo de seu rompimento com a sua vida passada. Adotava outro nome, pelo qual passava a ser chamado e conhecido. Pela falta de reação a seu nome, entendi que seu caso era grave, e ao que tudo indicava o seu mal de Alzheimer era já muito avançado. Tudo isso foi para mim uma consequência da condição e vicissitudes humanas, a que todos estamos sujeitos. Jamais aquela senhora, assim como qualquer outra pessoa, no apogeu de sua juventude radiosa, referta de sonhos e de rosas, poderia imaginar passar por uma situação desse tipo. Por isso mesmo, minha mãe, sempre que ouve falar em pessoa enfatuada, cheia de petulância e empáfia, como uma advertência a si mesma e aos outros, repete que sequer sabemos como será nossa morte. Talvez por essa razão, quando no passado se tinha o costume de pedir bênção aos pais e avós, hoje costume quase em desuso, os velhos desejavam ao pedinte que Deus lhe desse uma boa morte. Faz parte da vida humana as alegrias do alvorecer da juventude, tão prenhe de risos e esperanças, as lutas e labor da maturidade, já temperadas pelas experiências, em que as ilusões foram sendo esfolhadas pelo caminho, como disse o poeta, e o crepúsculo do envelhecimento, que pode ser belo, que pode ser majestoso, mas a que não falta nunca uma pitada de melancolia, seja pelas coisas e pelos amores perdidos, seja pela proximidade da morte. E é por isso mesmo, que devemos passar por todas as fases da vida, para que nossa experiência neste nosso planeta seja completa, com nascente, zênite e morrente. Por tudo isso chego à conclusão que uma velhice saudável e uma boa morte, com que nos abençoavam os antigos, são duas dádivas maravilhosas, são um glorioso e sublime por-de-sol.
Poeta, contista, cronista, romancista, memorialista e diarista. Membro da Academia Piauiense de Letras. Juiz de Direito aposentado. *AS MATÉRIAS ASSINADAS SÃO DE RESPONSABILIDADE DE SEUS AUTORES, E NÃO TRADUZEM OBRIGATORIAMENTE A OPINIÃO DO TITULAR DESTE BLOG.
sexta-feira, 9 de abril de 2010
DIÁRIO INCONTÍNUO
Elmar Carvalho
Quando a morte chega, cada um leva o que tem, muitos levam os tesouros das virtudes guardados no coração, outros não levam nada porque nada puderam guardar.Ao final da vida a colheita obrigatória nos aguarda,usemos hoje a sabedoria e plantemos o bem, ao final não nos peocupemos, a justiça divina nos aguarda, nos dando tudo que merecemos.
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