quinta-feira, 29 de abril de 2010

DIÁRIO INCONTÍNUO

Elmar Carvalho




28 de abril

O PATO E O FAZ-TUDO

Após o término da audiência, o senhor Valdemiro Sousa confessou-me ser uma espécie de faz-tudo, pois é cabeleireiro, encanador, marceneiro, pedreiro, lavrador, e talvez mais alguma coisa que eu possa haver esquecido. Disse-lhe que ele era um polivalente, e lhe perguntei se poderia contar a anedota do pato. Demonstrei-lhe que um pato faz muitas coisas, como andar, nadar e voar, mas que nenhuma dessas atividades ele faz com eficiência. Tem choto lento, pois tem as pernas curtas, os pés em forma de palmas ou pás e o corpo pesado e um tanto parecido com o casco de um barco, o que lhe faz ser algo desengonçado; o voo é curto e rasteiro, o que não lhe dá muita vantagem no caso de uma fuga; o seu nado, embora gracioso, é lerdo, o que lhe torna uma presa fácil de um predador como um jacaré, por exemplo. Sousa, entendendo o meu recado brincalhão, não lhe passou recibo e nem se deu por achado, e imediatamente respondeu, bem-humorado, que fazia bem-feito as coisas que fazia. É claro que temos o chamado homem de sete instrumentos, que geralmente não é exímio em nenhum deles ou, na melhor das hipóteses, só domina um ou dois, mas dificilmente vindo a ser virtuose ou mestre. Elevado ao paroxismo, o especialista é aquele que sabe tudo de nada, e o generalista é o que sabe nada de tudo. Ora necessitamos das profundidades abissais e quase obscuras de um especialista, ora precisamos da visão rasa, mas ampla e geral de um mestre das superficialidades. O mundo é composto e plural, e assim o devemos aceitar.

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