Fonseca Neto
Há exatos
250 anos – 24 de setembro de 1762 – a seiscentista povoação do
brejo da Mocha ganha a denominação de “Oeiras do Piauí”. Mais
significativo: ganha essa vila a condição de capital. Tais fatos se
expressam por decretos do rei e do governador da capitania, João
Pereira Caldas, então solenemente executados. Melhor ver um deles.
“João
Pereira Caldas, alcaide-mor, comendador de São Mamede de Troviscoso
na Ordem de Cristo, coronel de cavalaria, governador da capitania de
São José do Piauí. Porquanto havendo-me Sua Majestade mandado
erigir em vilas todas as freguesias desta capitania, por carta
firmada pela sua real mão, e datada de 19 de junho do ano próximo
passado; foi juntamente servido determinar-me na mesma carta que logo
que as ditas vilas fossem estabelecidas, havia por bem criar esta em
cidade capital delas. E porquanto, havendo eu concluído a fundação
de todas as referidas vilas; e havendo-me presentemente recolhido a
esta, se acha ela nos termos de poder principiar a gozar do
generosíssimo efeito daquela clementíssima e real resolução.
Ordeno, que em observância dela, se fique esta vila conhecendo de
hoje em diante por cidade, e denominando-se com o mesmo nome de
Oeiras do Piauí, que proximamente lhe impus de novo. [...]. Dado
nesta nova cidade de Oeiras do Piauí, sob o meu sinal e sinete de
minhas armas, aos 24 dias do mês de setembro do ano do nascimento de
Cristo de 1762. E eu Joaquim Antunes, secretário do governo desta
capitania o fiz. – [as.] João Pereira Caldas.”
Fácil
notar que o governador praticara ato emanado da régia vontade, que
vinculara sua nomeação e exercício da governança local à
implementação de uma estrutura político-administrativa mais
racional e arrojada nos sertões do Piauí. Isto implica, como é
sabido, a implantação definitiva da própria capitania – criada
pela mão régia quatro décadas antes, em 1718, reinado de João V –
e a posse do próprio Caldas, em setembro de 1759.
Então,
três anos depois, o governador cumpre parte importante de sua
missão: estabelecer as vilas, isto é, emancipar do município do
Mocha, com a eleição de governos civis, seis novas municipalidades,
as quais, todas, já se encontravam territorialmente distritalizadas
em governos paroquiais. De fato, a velha Mocha, estabelecida enquanto
distrito de vara eclesiástica desde 1697 e sede municipal efetivada
em 1717, e já comarca, desde sempre fora a “capital” e maior
referência do governo dos sertões do Piauí. O que acontece nesse
24 de setembro é a formalização de tudo. No sentido de todos os
tempos, não haveria capital, isto é, “cabeça”, sem um corpo
dotado de membros, no caso, os municípios, delimitados entre os
sertões de muito em cima, de Rodelas, e as praias atlânticas, muito
embaixo, onde o Punaré desemboca no mar, em delta. Daí observar
Caldas que somente após isso poderia Mocha ser criada em “cidade
capital delas”, “com o mesmo nome de Oeiras do Piauí, que
proximamente [1761] lhe impus de novo”. As vilas-municípios
estabelecidas por ele nos meses anteriores e que culminam com essas
solenidades do dia 24, são: Parnaguá, em 3 de junho de 1762;
Jerumenha, 22 de junho; Campo Maior, 8 de agosto; Parnaíba (na
Piracuruca), 18 de agosto; Marvão (agora Castelo), 12/13 de
setembro; Valença, 20 de setembro. Nessa época, por Antonio
Galúcio, já ele cartografara a capitania, à perfeição, e dela já
fizera o censo demográfico e sócio etnográfico.
Toda essa
movimentação se dá no contexto do governo maior de Sebastião José
de Carvalho e Melo, conde de Oeiras, depois (1769) marquês de
Pombal. Acontecimentos mediados por um seu irmão que governava o
Estado do Grão-Pará e Maranhão, a cuja estrutura era subalterna a
capitania real do Piauí.
Como é de
todos sabido, a denominação “Oeiras” homenageia Tião de Melo,
em vida. E chamar-se a capitania, de “São José”, honra José I,
o rei, filho de João V, criador dela.
Sobre a
cidade diz Tito F.° esta joia, no ótimo “Passeio a Oeiras”, de
Dagoberto, jr.: “... nascida nos sertões de dentro, com a bravura
de suportar vácuos sem fim e solidões insolentes. Capital do mundo
de outrora. Capital perene das tradições do Piauí”.
Solidões?
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