armadilha
Jamerson
Lemos (1945 - 2008)
a
música escorre pela noite
como
estreito regato
igualmente
minha mente
escorre
pela noite.
isso
ou aquilo, antes, depois,
uma
rua tortuosa,
pequena
cidade a ferver
distante.
Quanto
tempo fui tolo?
A
música escorre pela noite,
pulsa
como um coração.
Caro poeta Chico Miguel,
Ao abrir ontem o seu importante blog cultural e
literário, fui surpreendido com a informação de que o Jamerson
Lemos havia falecido. Era um poeta de muito talento, que trazia a
poesia à flor da pele e da alma.
Durante muito tempo fui seu amigo
assíduo. Sempre nos encontrávamos, ocasião em que conversávamos
longamente sobre a vida e sobre poesia. Em diversas ocasiões fui a
seu sítio do Gameleira, onde tomava banho num riacho, que o cortava,
serpenteando entre palmeiras e árvores frondosas, muitas das quais
se debruçavam sobre o córrego.
Ali havia uma pequenina ilha, que me
lembrava as ilhas do Tesouro, da Fantasia e da Utopia. O poeta
mergulhava nas frias águas, escarafunchava o fundo do riacho, e de
lá voltava com um pequeno búzio, em que talvez ouvisse o murmúrio
e o marulho do mar de sua terra natal.
Muitas vezes, o poeta, com o
seu sotaque pernambucano e o seu gestual de ator e intérprete de
seus poemas, recitava-me seus belos versos, com muita emoção e
encantamento. Às vezes, eu me "vingava", e revidava com um
poema de minha autoria, apenas para variar, porquanto em nada me
diminuía ficar como uma ave muda a ouvir o mestre e encantado
Uirapuru, de mágico gorjeio.
Seus versos eram cantantes,
de-lirantes, musicais, cheios de ricos ritmos e de sólido conteúdo.
Em algumas oportunidades, o vi e ouvi pedir uma caneta e um
guardanapo de papel, e imediatamente escrever um poema, que já
nascia perfeito, sem uma mácula, pronto para ser dado à estampa da
publicidade. Era escrito num verdadeiro “repente” esferográfico,
sem pausas, vacilações ou titubeios. Sua excelente matéria lhe fez
justiça.
Sentirei saudade desse grande bardo piauiense nascido no
Pernambuco de Manuel Bandeira e Carlos Pena Filho. Sentirei saudade,
sim, mas sempre poderei reler os seus versos, e ao relê-los,
lembrar-me-ei de sua pessoa e de sua voz, a cantar lindas melodias e
a recitar os belos poemas que sempre me encantaram.
Elmar Carvalho
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