Fonseca
Neto
“É um bom tipo meu velho / Que anda só e carregando / Sua tristeza infinita / De tanto seguir andando”. “Eu o estudo desde longe / Porque somos diferentes / Ele cresceu com os tempos / Do respeito e dos mais crentes”.
“Velho,
meu querido velho / Agora caminha lento / Como perdoando o vento / Eu
sou teu sangue meu velho / Teu silêncio e o teu tempo”. “Seus
olhos são tão serenos / Sua figura é cansada / Pela idade foi
vencido / Mas caminha sua estrada”. “Eu vivo os dias de hoje / Em
ti o passado lembra / Só a dor e o sofrimento / Tem sua história
sem tempo”.
“...
Agora caminha lento / Como perdoando o vento /... / Teu silêncio e
teu tempo”.
Repercutindo
a “passagem ao silêncio” de Ademyston Rodrigues Alves, com muita
consternação, assisti uma entrevista, na tevê, de um irmão dele,
na qual tecia doídas considerações sobre a terrível tragédia
ocorrida no antigo Porto da Lenha. Nele, entrevistado, no timbre da
voz, no semblante, nas lembranças, percebi a própria voz, a
fisionomia e o rosto do seu grupo familiar inteiro.
Chamou-me
a atenção, em particular, um detalhe de sua fala sobre o irmão:
disse que ele “tinha muito medo de morrer”, “um extremado amor
à família” e que “queria envelhecer” –ao ouvir isto, pensei
direto nos filhos que ficaram, que, crescidos, não cantariam para o
pai, no presente, esses versos do Altemar. Naquela via dolorosa
acabou a vida física dele. Todavia, quando a vida vivida é guiada
em luz e sinaliza paz, tal a de Ademyston, as memórias sementadas no
futuro são cultivadas em poesia. Teve ele a vida interrompida
conforme temera: seus três filhos, crianças, não o verão
envelhecer. Mas, com certeza, envelhecerão eles próprios, imersos
na memória e na história bonita do pai, um brasileiro como
milhares: do Sertão, filho dileto, sonhador, lutador. Sabia ele (e
se fez prova e exemplo a ser seguido) que o estudo é um caminho para
vencer desafios que o viver vai colocando. Aos 34 anos, claramente,
já, um vitorioso. No BB, este ícone tão querido por tanta gente.
Que a sociedade que o eliminou aprendamos as lições.
“Queria
envelhecer”: por que o jovem Ademyston queria envelhecer, como
lembrou o irmão, emocionado? Por que alguém quer envelhecer? É a
busca da realização humana em plenitude e da contemplação feliz
do caminhar na História. Viverá em seus filhos, os quais poderão
tomar esses versos feitos ao “velho” e cantá-los, assim, com
diversas misturas.
Ademyston:
bom tipo este jovem. Com certeza, a velhice, de amanhã, perdeu um
candidato que iria vivê-la construindo experiências do mundo novo
da paz. Andava só, nos caminhos de Miguel, carregando a saudade
infinita da Pimenteiras natal –de Itaueira, Floriano...
Esperançava seguir andando, voltar para Teresina.
Cresceu
com o tempo esperançoso esse jovem trabalhador. Aos 12 anos no
batente. E não conhecendo a idade de caminhar lentamente, não
alcançou o tempo de perdoar o vento. Sua figura não cansou e assim
a idade não o venceu. Mas naquela estrada o impediram de seguir. E
daí que não o alcançaram os dias de hoje. Naquela estrada seu
futuro se transfundiu em matéria do passado e seu passado de risos e
vitórias será signo e matéria no futuro dos que amou e que o
amavam.
(Ademyston:
em ti a dor e o sofrimento foram além das insinuações inseguras
das quais desconfiastes. E se anteciparam, por mentes e mãos
pulsando em torpes razões, na subtração do tempo de viver outros
capítulos de tua história. Teu silêncio e teu tempo contarão,
eloquentes, tantas histórias. E se tua história, dor e sofrimento,
e o sofrimento e a dor dos que ficaram na saudade, servirem na
construção de outras histórias fundadas na paz, essa será a
lembrança essencial dos que envelhecerem nos cultivos e leveza de
teu exemplo).
Afinal,
quem no silêncio galga o espaço fluido das nuvens, sem tempo,
entregue está ao domínio da memória cósmica, infinitiva.
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