Fonseca Neto
Já
uma dúzia de anos vividos para dentro do século 21, a pessoa que
nasce atualmente tem perspectiva de alcançar o século 22. Caso mude
a forma de marcar a passagem das eras –quem sabe outra maneira de
calendariar a experiência humana– aportará ao tempo que a tanto
for equivalente. E viverá a fluente centúria quase que
inteiramente.
Dois
bons exemplos: Oscar Ribeiro de Almeida Niemeyer Soares Filho
(1907-2012) e Eric John Ernest Hobsbawm (1917-2012), homens que
nasceram no alvorecer de um século e transpuseram os umbrais do
seguinte; existem, sem dúvida, outros exemplos, noutros cantos e
recantos do ecúmeno.
Aliás,
faz-se oportuno invocar essas duas figuras humanas solares para falar
de vida e do século que foi, que passa e que vem, pois artistas
sensíveis às coisas que correm nas vagas do tempo. Lembrou Oscar, à
poética do simples aparente, amante de todas as curvas: “A vida
nos leva pra onde ela quer. Cada um vem, escreve sua historinha e vai
embora. Não vejo segredo em levar a vida [mas a] gente tem que
sonhar, senão as coisas não acontecem”.
Já
Eric, cerebral, o coração ferido pelas guerras da “era dos
extremos”, ensinou: "A revolução cultural de fins do século
XX pode assim ser mais bem entendida como o triunfo do indivíduo
sobre a sociedade, ou melhor, o rompimento dos fios que antes ligavam
os seres humanos em texturas sociais". E aponta uma tarefa: “A
injustiça ainda precisa ser denunciada e combatida. O mundo não vai
melhorar sozinho”.
Estamos
no ano de número 2.013 na contagem proposta pelos cristãos, num
mundo cujas forças atemporais em movimento, seus viventes tentam
decifrar e dominar. Universo que relampeja e trovoa, e, assim,
inspira novas vidas e sugere finitudes abissais. Num lugar particular
a que chamamos Piauí, onde correm os rios, idem, Parnaíba e Poty
–três nominações aprendidas dos falares da humanidade ancestral
que aqui viveu em tempos longos e não contados.
O
agora chegado por aqui, semana chuvosa que passou, tem, descortinado
ante si, um mundo sem idade, pois o leito em que se move é uma “via”
lactante e em translação parece que perene. Mundo que explode em
vidas, em formas formidáveis delas. Claro, em mortes. Enfim, pois, a
província e os provincianos que passam são “o pó dos pósteros”,
tal nos lembra, do ludovico Maranhão, o iluminado equinocial poeta,
Nauro Machado.
Tramas?
É viver o receituário de Oscar e Eric; sonhar e lutar: par
vocabular, cheio de polissemia, que abriga campos de possibilidades
infindas para elaborar caminhos a seguir. Ainda que já feitos,
caminhos a fazer com os pés que nascem para novas jornadas. Sonhar,
porque é preciso existir amanhã; lutar, porque o ontem e o hoje,
criadores de belezas e modos indescritíveis de existir, legaram,
porém, estoques de desesperança na construção do Justo.
Perfeição?
O Deus da fé de cada criatura e coletividade; sopro esperançoso de
todo vivente. Vivente, só? As pedras seriam as esquecidas Dele? Não,
as maravilhas preciosas esculpidas no coração delas, fartas em cor
e consistência, encerram partículas vagantes do Cosmo.
O
que há pela frente, por vir? O “retornar eternamente”? Ninguém
tem a resposta que não seja apenas um modo de desejar. O chamado
“progresso científico” é escravo das forças da vida quanto da
morte, nisto não inovando nessa espécie de busca da condição
perfeita, pós Sol e pós Lua, isto é, superada a dualidade que move
matéria e alma na História, as forças vívicas, solares, e as
forças danadas, lunares...
Mas
algo integra as sensações do cosmos e confere sentido à
experiência dos viventes: a própria vida, ainda que seu significado
seja realçável, para não poucos, quando fina, inexorável.
Agora
nasceu o Henrique Fonseca Ayres. Terá um século para viver. E se
advinda alguma forma de imortalidade-corpo? Queira somente se a
quiser servida a todos os viventes essenciais à caminhada. Seja
sonhador e lutador; seu século um palco luminar. Amar/ante, antes:
beira-rio, franciscana, é uma sua referência avoenga e “é um
céu, se há um céu sobre a terra”.
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