sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

O SIM E O NÃO


O SIM E O NÃO

Jacob Fortes

Esses velhos opositores, advérbios de afirmação e negação, embora se destaquem por seus aspectos semânticos dissonantes, há neles nuances infinitesimais, quase imperceptíveis.

O sim é colorido; o não, pardacento. O sim tem o semblante alegre de quem bebe o vinho; o não, do médico que, contrafeito, o proíbe. O sim é leve, gracioso; o não, pesado, desgracioso. O sim tonifica o ânimo; o não, acabrunha. O sim surge infrene; o não, refreado. O sim é luminoso; o não, opaco. O sim é expansivo; o não, recatado. O sim denota preferência; o não, antipatia. O sim faz cantar; o não, emudecer. O sim remete para o regozijo; o não, para condolências. O sim exprime o passaporte, a carta de alforria, o livramento; o não, a detenção, porteira fechada.

Apesar das suas oposições vigorosas nem o sim, nem o não se proclamam vencedores; apenas cada qual acredita dispor de fármaco capaz de potenciar o escoramento de medidas deliberativas. Cada qual se esmera em defender as suas cores, o seu milagre. Aos que não se alinharem nem ao sim nem ao não resta o atalho do irresoluto advérbio de dúvida, alheado, desfibrado, sem tomar propósito, também conhecido por Múcio ou Laissez-faire: deixa como estar para ver como fica.

A esses pequenos gigantes monossilábicos, aliás, consagrados ao ofício relevante de comunicar por meio da expressão oral ou escrita em países lusófonos — deixo aqui o sorriso de saudação de um fã. Ainda que esses garnisés magistrais sejam dignos de todos os louvores, essencial é dizer que, por vezes, maior benefício faz o não, que não lisonjeia, do que o sim lisonjeador. E nessa asserção inclua-se também o brocardo pelo qual é preferível o não da lealdade que o sim da hipocrisia.

Até o próximo encontro ocasião em que o advérbio de dúvida, ofendido com as tachas atiradas à sua honra, em tom de mofa, irá defender-se. Alegará em seu libelo que, de conformidade com a ciência, a dúvida é o ponto de partida para chegar-se à verdade. No concernente às pechas de apassivado e vacilante, aliás, calúnias radicadas na inveja, serão demolidas mediante o emprego de expressiva via judicial. Para esse efeito invocará um recurso regimental protelatório de grande valimento, os embargos infringentes.     

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