sábado, 24 de janeiro de 2015

"Hoje tem espetáculo?"


"Hoje tem espetáculo?"

José Maria Vasconcelos
Cronista, josemaria001@hotmail.com

          Tem, sim, senhor! E como tem. Primeiramente, permita-me uma passagem da infância. Em seguida, convido você a assistir ao circo das palhaçadas políticas.

Bons tempos aqueles, na minha Piçarra. A garotada acompanhava, pelas ruas, o palhaço vestido de frouxas e coloridas roupas, equilibrando-se em duas longas pernas de pau, a empunhar longo instrumento afunilado, colado à boca, servia de microfone, convidava a população a assistir ao show do circo, logo mais. “Hoje, tem espetáculo?“ E a meninada exaltada: “Tem, sim, senhor!” Circo e palhaço, ninguém resistia, na minha terra sem televisão. Outra diversão, o alto-falante, instalado na ponta de enorme madeira, a sala de locução com discoteca, que disputava audiência com a única rádio, a Difusora.

         “Hoje, tem espetáculo?” Tem muito mais. O circo foi reinventado na política e administração pública, para engabelar cidadãos comuns, desinformados.

         Divertido Circo Assembleia: milhares de lagartas a devorar a folha de pagamento, para, em seguida, voarem como libélulas. Só comparecem ao trabalho à hora do contracheque. Deputados a disputar o picadeiro da presidência ou cargos de comissão. No mais, a louvação mixuruca com títulos de cidadania a duvidosos méritos. Ou dizer amém às imposições do Palácio do Karnak.

Hoje, tem espetáculo?” Tem, sim, senhor, a promessa de construir seis aeroportos. Sonho de ícaro, cujas asas de cera se desfazem ao tentar aproximar-se do sol, com seus monstros, touros e minotauros. “O show já terminou/ Vamos voltar à realidade/Não precisamos mais/Usar aquela maquiagem”. Não terminou, meu caro Roberto Carlos. Não se desfez a maquiagem de dois bombásticos “aeroportos internacionais”, de onde decolam mais urubus que pássaros de aço.

Tem, sim, senhor. Depois dos apagões, Brasil afora, ministro de Minas e Energia diz que “o sistema energético está robusto”, que Deus é brasileiro e que vai chover. Um apagão deixou metade do Brasil em trevas. Graças ao envio de energia da Argentina, restabeleceu-se o sistema elétrico. Deus também é dos argentinos.

Hoje tem espetáculo?” Claro, Governo solicita forças federais e 82 milhões para segurança pública. Não percam mais um show de pirotecnia com dinheiro público. Enquanto explodem rojões, a comunidade do Açude dos Algodões permanece muda, com a tragédia e falsas promessas.


E vem mais espetáculo: o novo presidente da Companhia Metropolitana de Transportes do Piauí demitiu 27 funcionários. Juntando aos que permaneceram, davam para encher um vagão do metrô e passear pelos 23 km da capital. Pena que o insaciável apetite de contracheques prejudique a segurança e refrigeração dos trens. Haja folha para tanta lagarta. Medida certa, se os demitidos não fossem substituídos pelos que vestem gravata vermelha do partido. A prefeita de Esperantina reduziu centenas de lagartas famintas. Tomara que as borboletas não ponham mais larvas. Na minha infância, os palhaços vestiam-se de toscas roupas, identificavam-se com a simplicidade e inocência da população. Éramos felizes. Hoje, os circos viram círculos fechados, corruptos, dão as caras nos meios de comunicação com a cara mais limpa. Em vez de rir, a plateia vaia.     

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