A BOA LEMBRANÇA DE CLÁUDIO DENIS
Elmar Carvalho
Com surpresa e consternação, no dia 2
deste mês, no começo da tarde, recebi a notícia do falecimento do primo e amigo
Cláudio Denis de Melo Andrade. Eu e meus irmãos residentes em Teresina combinamos participar de
seu velório, em Piripiri. Imediatamente seguimos para essa cidade, em companhia
de nosso pai, não obstante os seus noventa anos.
Na Capela Ecumênica Mortuária, onde
seu corpo estava sendo velado, vestido em traje maçônico, já que ele foi
dedicado e exemplar obreiro, encontramos seus amigos, parentes, sobrinhos e
irmãos. À cabeceira da urna, encontravam-se minha tia Maria José e uma de suas
filhas. De uma grande prole, as tias Mazé e Maria do Carmo, residente em São
Paulo, são as únicas vivas.
Quando ele nasceu, em sinal de seu
regozijo materno, minha tia enviou para minha mãe um pequeno cartão impresso
comemorativo, no qual se encontrava a sua fotografia de infante. Por toda a
vida, mamãe guardou essa singela e amável lembrança de seu sobrinho e de sua irmã.
Nos contrastes que a vida nos oferece, eu via agora tia Mazé, como uma madona
do sofrimento, a velar o filho morto, mas de forma contida, resignada, sabedora
de que a morte nada mais é do que o começo de uma nova vida, mais rica e mais
bela.
Cláudio era um paradigmático cidadão,
filho, irmão e amigo. Exercia natural liderança em sua família, mormente após o
falecimento de seu pai, em virtude de sua inteligência emocional e de seu temperamento
cordato e agregador. Sem egoísmo e ambição, tinha espírito associativo e gostava
de compartilhar as suas ideias e capacidade laboral. Por isso, criou em sua
região uma associação de defesa dos apicultores. Graças a seu considerável conhecimento
nessa seara produtiva, ministrava aulas, inclusive no Pará, para onde se
deslocava com frequência.
Sua maneira mansa de falar e de agir,
além do seu senso de humor, inspiravam confiança e simpatia. Por tal razão, era
um fazedor e conservador de amizades. Com acentuada inclinação para o bem, era
prestativo, atencioso e gostava de ajudar as pessoas. Tinha prazer em ser útil.
De notável dedicação à família gostava de localizar parentes e de se comunicar
com os primos através da grande rede. Os sucessos e conquistas dos amigos eram
como se fossem também realizações suas, já que desprovido de egoísmo e inveja.
Para que se tenha uma pequena ideia
de sua alma boa, contarei um episódio que me foi relatado por um dos
protagonistas. Seu filho, Armilo Neto, estava cevando um peba, com o objetivo
de tomar umas pingas com uns amigos. O bicho ficava dentro de uma caixa de
cimento. Quando Cláudio Denis viu o indefeso animal, alegou que ele estava se
ferindo na estrutura de cimento, e que era melhor fosse solto. Armilo Neto
respondeu que passaria a ter mais cuidado, e que não deixaria que o peba
voltasse a se machucar.
No sábado, véspera em que o bicho
seria abatido e transformado em tira-gosto, Armilo encontrou a caixa vazia. Desconfiou
que seu pai o soltara, e o inquiriu a respeito, mas ele retrucou que no imóvel
andara um larápio, que levara vários outros objetos. Desconfiado dessa
justificativa, pediu ao vizinho para que visse as gravações de suas câmeras de
segurança, a fim de descobrir o autor da subtração do peba. Terminou
descobrindo, que Cláudio Denis, com muito cuidado, retirara o animal da prisão,
o envolvera em uma espécie de toalha, para lhe devolver à floresta. Esse fato
aconteceu perto de sua morte.
Aproveito o ensejo, para relatar
outro fato pitoresco de nosso saudoso Cláudio. Ele amansara um arisco burro. Mesmo
manso, o muar ainda tinha os seus caprichos e venetas, e conforme seu imprevisível
humor ainda se mostrava brabo em muitas ocasiões. Por causa disso, ainda deu
uma boas quedas em seu dono, que gostava de montá-lo. Apesar disso, Cláudio lhe
tinha afeição e nunca maltratou Neymar, que esse era seu nome, por causa de sua
crina estilizada. Seu filho, Armilo Neto, meio brincando e meio para valer,
temendo contusão séria em seu pai, disse-lhe que iria matar o árdego e ardiloso
animal, antes que ele o matasse. Mas o pai o exortou a jamais fazer tal ato.
Portanto, Cláudio Denis, além de
preservar a amizade humana, era também um amigo dos animais e amante da
natureza. Era um ambientalista, mesmo que não ostentasse esse rótulo. Com frequência
ia a sua Fazenda Boa Lembrança. E foi ao voltar dela que veio a morrer, quando
a sua motocicleta se chocou com uma máquina de encher caçambas.
Dele guardarei para sempre a boa
lembrança, nome de sua amada fazenda. A boa lembrança de um homem bom, de um
bom amigo, de um bom parente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário