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Macacos me mordam!
José Maria Vasconcelos
Cronista, josemaria001@hotmail.com
Verão de lascar este segundo semestre de 2016. Nem os ipês floraram, nem chuvinha generosa para despertar os maturis dos cajueiros e mangueiras. O fenômeno vem se repetindo há pouco mais de três anos. A mesma secura de anos atrás, início da década de 1980. Porém 2016 vem exaurindo a última seiva das florestas e quintais. Para completar a dramática paisagem desértica, multiplicam-se queimadas, causadas por instintos selvagens e irracionais.
Meti-me na densa mata de cajueiros e mangueiras, garranchos espinhentos, poucas árvores e arbustos verdejantes, resistentes coqueiros carregados de cachos de babaçus, 15 km de Teresina. Facão, celular, chapéu de palha, 7 da manhã. Abrindo veredas tortuosas, de repente percebi que não acertava caminho de volta. Já passava da 10, cansado, sol ardente, sombras ralas, sedento, garganta seca, perdido. Odor forte de fumaça trazido pelo vento de distantes queimadas apavorava-me. Bando de macacos-prego e soinhos assustados pulavam galhos dos coqueiros com gritinhos afinados e alarmantes. Temi provável ataque. Prece.
Buscava socorro por celular, não atendia. Enfim, o contato: “Estou perdido na mata... avise meus filhos e minha Rita... venham depressa... estou exausto... gritem, e eu retornarei!” Vinte minutos, milagroso encontro, beijos, abraços, louvores aos céus.
Dia seguinte, o fogo devoraria centenas de hectares de mata em toda aquela região. Graças à atuação do Corpo de Bombeiros, do helicóptero e avião em voos rasantes, o inferno virou purgatório.
Dois dias depois,voltei ao local da paisagem cinzenta e desolada. Macacos e soinhos tinham razão para tanta gritaria e desespero. Clamavam socorro, não para me ofender. Além deles, os bem-te-vis, sabiás, rolinhas, mil seres vivos que o Criador enche a natureza para servir de contemplação, e não de holocausto. Logo eu, que desembolso, semanalmente, dinheirinho para lhes distribuir ração, no fundo do quintal. Acordam-me na aurora para o canto de louvor e prece ao Senhor da vida. Chegam, aos bandos, final da tarde, querendo jantar.
Pouco se sabe da origem da expressão, MACACOS ME MORDAM! Em seriado de desenhos da TV, a personagem Popeye usa-a com frequência. Cronista Stanislaw Ponte Preta criou uma história utilizando o mesmo título: um cientista pesquisava macacos, no interior de Minas. Encomendara, por telegrama, centena de símios a criador de Amazonas. Pedido atendido, chegaram muito mais do que o solicitado. O cientista desesperou-se. Os macacos fugiram, invadiram praças e residências, atacavam, famintos.
Macacada assombrada e barulhenta, pulando coqueiros, apavorando-me. Macacos me mordam, se for mentira o que me ocorreu, quando retornei ao local da devastação: descobri restos de cocos roídos. Nossos habitantes da floresta tinham feito a última refeição, antes de partir, sabe Deus para onde. Doeu-me fundo, movido de saudade. Fugiram, talvez para fazer justiça ,com afiados dentes aos assassinos da criação, porquanto, se as leis dos homens não funcionam, a justiça da mãe natureza chega mais cedo que nunca. Repito, macacos me mordam se estou mentindo.
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