O Piauí na Confederação do
Equador
Reginaldo Miranda
Historiador, escritor e membro da APL
Proclamada e consolidada a
independência do Brasil do jugo português, em que o Piauí, ao contrário de
outras unidades do novel país, galhardamente, pagara seu tributo de sangue,
fez-se necessária a elaboração da nova Carta Magna, para a qual o país eufórico
se reuniu em Assembleia Nacional Constituinte. Todavia, o imaturo e despótico
Imperador em total revelia ao processo democrático, em 12 de outubro de 1823,
houve por bem dissolver a citada Assembleia Nacional Constituinte outorgando
uma carta constitucional a 25 de março do ano seguinte, sem legitimidade do
apoio popular. Esse ato autoritário do Imperador recebeu total censura, sendo
aceito a contragosto pelas mais diversas províncias brasileiras. Contudo, contra
essa aberração democrática se levanta em luta a altaneira província de
Pernambuco, levando consigo Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Sob a
alegação de que D. Pedro I retornaria o Brasil ao decaído regime colonial era
disseminada a propaganda revolucionária pelo jornal Typhis Pernambucano que
contava com a briosa colaboração de frei Joaquim do Amor Divino. Então, a 2 de
julho de 1824, rebenta a revolução republicana sob o comando do presidente da
província, Manoel de Carvalho Paes de Andrade, herói de outras refregas. É
proclamada a Confederação do Equador. A ela também aderiu Alagoas.
Por esse tempo o Piauí ainda se
refazia dos estragos ocasionados pela Guerra da Independência. Porém, a
litorânea vila de Parnaíba recebia emissários do Ceará, mandados pelo líder
revolucionário cearense, Tristão Gonçalves de Alencar Araripe. Não tardou,
pois, aos idealistas da Parnaíba, que por primeiro abraçaram a causa da
Independência, também aderirem à Confederação do Equador, cuja proclamação
solene pela Câmara Municipal deu-se a 25 de agosto do mesmo ano sob a
presidência do Dr. João Cândido de Deus e Silva, e a participação efetiva do
tenente-coronel Domingos Dias da Silva Henrique, major Bernardo Saraiva de
Carvalho, comandante do corpo de milícia da vila, major José Francisco de
Miranda Osório, João Rodrigues Falcão, Veridiano Sousa, José Ferreira Meireles,
José de Sales, João Cardoso Batista, Pe. Francisco de Paula Barros e outros
insurretos. Insuflados por essa vila, também a Câmara Municipal da vila de Campo
Maior aderiu à mesma revolução a 8 de setembro seguinte. É que haviam marcado
essa data para jurarem a Constituição outorgada pelo Imperador. Porém,
orientados pelos insurretos da Parnaíba, ao se reuniram nessa data, ao invés de
jurarem a Constituição como pretendiam, também aderiram ao movimento secionando
o norte da província em franca adesão ao regime pernambucano. Era a influência
do Ceará, de onde chegavam notícias alvissareiras. Contudo as demais vilas
permaneciam reticentes. Oeiras, sob o comando do presidente da Província,
Manoel de Sousa Martins, agia com dubiedade, fazendo vista grossa aos
insurretos do norte e se comunicando permanentemente com a imperial Bahia, em
busca de notícias esclarecedoras. O velho político queria bem decidir e conservar
seu poder. E ao saber pela Bahia que Pernambuco caíra, fato que desconheciam as
duas vilas do norte porque se comunicavam apenas com os revolucionários
cearenses se decidiu pelo partido do Imperador. Enquanto isso, os insurretos do
norte despacharam o major José Francisco de Miranda Osório, para em missão
melindrosa se dirigir até Oeiras em busca do apoio do presidente da Província,
que com eles mantinha contato. Porém, este já sabedor do malogro pernambucano
prendeu Miranda Osório na mesma noite em que chegara a Oeiras, 27 de outubro, e
apreendeu toda a sua bagagem que, mais tarde, foi examinada publicamente pelo
Ouvidor-geral. Nada encontraram e adversários acusaram Sousa Martins de retirar
papéis comprometedores. De fato, parece que o silêncio de Miranda Osório
interessava a Sousa Martins, pois ainda sob custódia foi nomeado selador da
Alfândega de Parnaíba por provisão de 15 de janeiro de 1825. A devassa posteriormente procedida concluiu
que ele fora a Oeiras apenas tratar desse assunto.
E diante da frustração do
movimento nas outras províncias, em 28 de outubro e 7 de novembro,
respectivamente, as vilas de Parnaíba e Campo Maior abdicaram de suas
anteriores proclamações e juraram a Constituição do Império do Brasil outorgada
por D. Pedro I. Estava, assim, encerrada a participação do Piauí na
Confederação do Equador, e que ficara circunscrita apenas às duas vilas
nortistas. Contudo, essa participação ainda não foi devidamente reconhecida
pelos historiadores pátrios. O historiador piauiense Anísio Brito, em 1920,
publicou na Revista do Instituto Geográfico e Histórico Piauiense um artigo
sobre esse tema sob o título Adesão do Piauí à Confederação do Equador
(Teresina: Papelaria Piauiense, 1920. Tomo 1º. p. 241/248). Lamenta ele os
erros e lacunas que existem sobre esse assunto. No ano seguinte, outro ilustre
escritor piauiense, Abdias Neves(1876-1928), publica interessante livro com o
título O Piauí na Confederação do Equador, reeditado em 1996. Também ele se
insurge contra essa ignorância de alguns escritores à participação piauiense
nesse movimento, acrescentando que, embora sem projetar heróis, sem os lances
dramáticos das grandes paixões, se afirmou positivamente em atos de
manifestações de rebeldia ao governo constitucional. Diz: “Convenho que o concurso
do Piauí não foi ruidoso. Faltou-lhe o lado sugestivo das agitações das ruas –
o fragor das refregas, a perturbação das derrotas, as surpresas alucinadoras do
imprevisto. Não contribuiu, também, com o tributo de sangue, de enforcados e
fuzilados. Mas, isto, se não desperta a sentimentalidade lírica do historiador,
não condena a realidade histórica do fato” (p. 147). Faça-se justiça, pois, ao
Piauí, o incluindo entre as seis províncias que participaram da histórica
Confederação do Equador.
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