Ivanildo de Deus, Batista Rios e Elmar Carvalho |
João Batista Rios |
Na cadeira, o saudoso patriarca Nestor Rios, em seu centenário. Em pé: Batista Rios, ladeado por Eduarda (filha), Vera Lúcia (esposa), e os seus filhos Batista Filho e Saulus |
Nestor Rios e as madeixas de Getúlio
Elmar Carvalho
Dois ou três domingos atrás, fui à casa de meu colega e amigo
João Batista Rios, juiz aposentado, teólogo e agora diácono, além de membro do
Tribunal Eclesiástico da Arquidiocese de Teresina. Estava acompanhado do
historiador e poeta Ivanildo de Deus, que o conhecia de Luzilândia, quando nessa
cidade Batista Rios exerceu a judicatura por um breve período, na qualidade de
juiz substituto, no início de sua carreira.
Tive a oportunidade de recordar a minha amizade e admiração
pelo seu saudoso e venerável pai, Nestor Rios. Vale a pena repetir o que já
contei alhures: Nestor passava mensalmente na agência da ECT, onde eu
trabalhava, a exemplo do que fazia em outras repartições e empresas, para
recolher irrisórios óbolos, entre os quais os meus, para alimentar e vestir os
seus velhinhos, na qualidade de homem de boa-vontade e vicentino convicto. Como
se fora uma nova multiplicação de peixes e pães, Nestor, com esses parcos recursos,
construiu uma pequena vila de casas para abrigar os seus pobrezinhos.
Em meio a essa conversa, Batista Rios nos contou que elaborava
um aluá, em receita própria que ele, por não ser egoísta, não esconde de
ninguém. Enche várias garrafas ou botelhas, para presentear algumas pessoas,
que lhe admiram e louvam o sabor. Para comprovar o que dizia, encheu três cálices
com esse exótico néctar. Dou aqui o meu testemunho: foi o melhor e mais
requintado aluá que já sorvi, ou melhor, degustei em toda a minha vida.
Portanto, não era fanfarronice e muito menos propaganda enganosa o que ele nos
afiançara. Assim, Batista Rios, além de notável anfitrião e causeur, é também
um extraordinário alquimista, e seu aluá jamais será assaz louvado.
Dando sequência à conversa, o nosso anfitrião nos contou um
caso interessante sobre seu pai, e que tem uma pitada histórica, anedótica e
jocosa, de que farei abaixo um apertado resumo.
Quando Getúlio Vargas esteve em Parnaíba, em sua campanha
eleitoral para presidente da República, hospedou-se na casa do médico João
Orlando de Moraes Correia, ex-prefeito do município. Por causa das demoradas e
por vezes penosas viagens da campanha, notou-se que ele estava com o cabelo um
tanto comprido, razão pela qual os anfitriões resolveram mandar um positivo à
melhor barbearia da cidade, para que viesse um barbeiro com a finalidade de
aparar as madeixas getulinas ou varguenses. Contudo, nenhum dos barbeiros se
achou com coragem suficiente para cumprir a missão.
Esse receio dos mestres parnaibanos da tesoura e do pente até
me fez recordar – e por isso abro aqui este pequeno parêntese – um episódio
anedótico, em que um barbeiro da Marinha Brasileira anunciara desejava matar o
almirante e comandante da armada. Este, ao saber da ameaça, de forma ousada e
corajosa, se apresentou ao barbeiro, para que lhe fizesse a barba. O barbeiro, ao
empunhar a navalha, tremia tanto, que admitiu não ter condições de executar o
serviço. Desse modo a ameaça tornou-se apenas uma vexatória bravata e nada
mais.
Os fígaros de Parnaíba, ante o impasse criado pelo medo,
informaram que apenas Nestorzinho, o nosso pequeno e bravo Nestor, teria
perícia suficiente para cortar os fios capilares do pequenino grande homem. O
mensageiro foi à sua cata, que na época trabalhava na EFCP – Estrada de Ferro
Central do Piauí. Nestor não se fez de rogado, e muito menos temeu, e menos
ainda tremeu ao cumprir a missão. Manipulou a tesoura e a navalha com a perícia
de sempre. Cabe-me esclarecer que ele não era um profissional, mas aprendera o
ofício, do qual se tornara virtuose, apenas para servir ao próximo, sobretudo
amigos, colegas e vizinhos.
Ao terminar o serviço, foi indagado por Gegê (também
conhecido por “pai dos pobres” ou “pequeno ditador”, conforme a simpatia ou
ideologia de quem assim o chamava), sobre quanto lhe devia. Nestor lhe
respondeu que nada. Getúlio insistiu, e lhe perguntou se ele não desejava algum
favor ou se não tinha alguma pendência para com o governo federal. O nosso
fígaro lhe respondeu, então, que a União devia uma verba trabalhista aos
servidores da Estrada de Ferro em que trabalhava.
Vargas lhe disse que, se fosse eleito, um de seus primeiros
atos seria pagar esse débito. Recomendou que um assessor anotasse a
reivindicação. Com efeito, no primeiro ou num dos primeiros números do Diário
Oficial da União, ele determinava o pagamento dessa verba laboral. Isso até nos
causa admiração e mesmo perplexidade, numa época em que os políticos, em sua
quase totalidade, se excedem em não cumprir o que prometem; em que prometem já
com a intenção de não cumprir as suas falaciosas promessas eleitoreiras.
Nestor Rios, em sua humildade de homem bom, de homem do bem,
pai de meu amigo e colega Batista Rios, foi ovacionado por seus colegas, e
carregado nos ombros, em verdadeira apoteose, em legítima procissão gloriosa,
como se fora um dos césares romanos em seus dias de triunfo imperial.
Meu preclaro colega/amigo Dr. Elmar Carvalho. Sua erudição se faz manifesta até mesmo em matéria alheia ao que se lhe é habitual. "Nestor Rios e as madeixas de Getúlio" nos massageia o 'ego'doméstico, não o dele, face seu despojamento pessoal mesmo que vivente fosse, singularmente porque vive nas "plagas" celestiais. Em nome da minha familia, registro a nossa pura e verdadeira gratulação. Que Deus continue sendo pródigo para com o colega e amigo abrindo-lhe as comportas da sua graça, agraciando com favores estilisticos da sua sabedoria. Grande abraço. Batista Rios.
ResponderExcluirCaro amigo Rios,
ResponderExcluirAgora quem massageou meu ego foi meu nobre colega.
Na verdade você foi pródigo em palavras agradáveis, e quase me transforma num ególatra.
Ocorre que meu tema era muito bom: você e seu saudoso pai.
Abraço,
Elmar