domingo, 10 de maio de 2020

CÂNTICO DO CORPO AMADO

Fonte: Google


CÂNTICO DO CORPO AMADO

Elmar Carvalho
                                             
Teus cabelos
às vezes são filigranas escorridas
tecidas em pura maciez.
Às vezes são algas e caracóis
encrespados em ondas e espumas
esculpidas pelo vendaval.

Tua tez
revestindo a superfície
veludosa e bela de tua carne
é película de esplêndida
fruta tropical.

Teus olhos
às vezes sombrios
pelos enigmas e mistérios
de tua alma de mulher
às vezes resplandecentes
pelo relâmpago do riso
são dois lagos – calmos ou agitados –
em que os meus imergem e se perdem.

Tuas orelhas
são conchas
em labirinto de perfeito lavor
e nelas escutas e escuto as vozes
dos búzios e o chamado do mar.

Teu nariz
ergue-se em cordilheira
e de suas cavernas
emerge o vento de teu respirar.

Tuas sobrancelhas
são arcadas góticas
e teus cílios tessituras persas
do frontispício de teu altar.

A tua boca
onde as palavras lavras
em forma de canção
são retábulos e ornatos
do sacrário de teu ser.

Teus sorridentes lábios entre-
mostram o dique/arrecife
de concha, ostra e coral
do límpido colar dos dentes.

Pedestal firme e flexível
de teu rosto é o teu pescoço
- belo e singelo colosso.

Teus braços
são baraços que
enforcam e fascinam
serpentes que
atraem e traem.

Tuas mãos
são plumas e verrumas:
afagam e esmagam.

Teus seios
alçados em sublime formosura
de tenras carnes e tênues epidermes
são Olimpos
que meus dedos alpinistas escalam
para (re)colher o hidromel
no céu dos mamilos sensitivos.
Os pomos
de teus seios tomo
e eles me enchem as mãos.

Pelas dunas do deserto
de teu ventre fértil e belo
encontro o oásis na cacimba
de teu umbigo em que naufrago
perigo e me embriago.

De teu umbigo
minhas mãos e meus olhos
correm e escorrem
pelas vertentes e grotões
de tuas passagens/paragens
mais secretas e seletas
e se saciam
no frescor de tuas nascentes,
onde estão o lodo e o húmus
de um Nilo todo dádiva.

Na tecelagem do púbis
- tapete mágico de penugem e babugem –
e na fenda dos lábios
que são pétalas e conchas
recende a maresia
que reacende a velha flama
de um deus pagão.

Minhas mãos apalpam
tuas coxas roliças
de macia carnação
e descem pelas dobradiças
perfeitas de teus joelhos
circundam teus artelhos
e giram ávidas em torno
de teus pés de artesanal contorno.

Tuas pernas formam arcos
de onde são arremessadas
as flechas de meus braços
em busca de outros acidentes
geográficos anatômicos.

Tuas nádegas
às vezes árdegas gazelas
às vezes mansas aves de estimação
às vezes retesas setas acesas
às vezes quedas texturas de veludo e seda
desenham arcos e penhascos
                                   rochedos e penedos
                  desfiladeiros e socavões
em que meus olhos
de tamanha beleza se abismam
na vertigem que alucina e ilumina.

Meus dedos
cegos de tanto encanto
tateiam e tenteiam
se enlevam e se enleiam,
pelos enlevos e relevos
                         mimos e cimos
atavios e baixios
                         côncavos e recôncavos
                         entrâncias e reentrâncias
da geomagia de teu corpo.

Navegam minhas mãos
pela sinuosidade litorânea
da enseada de tuas ilhargas
e do cabo bojador
de tormentas e esperanças
de tuas ancas – âncoras –
e desbravam/devassam
as volutas voluptuosas
de tua coluna (grega) dorsal
e se perdem na voragem/miragem
das ondas revoltas
de teus cabelos.

                             Te.Dez.89   

Nenhum comentário:

Postar um comentário