Fonte: Pinterest/Google |
CORES, FLORES E
DOLORES
Elmar Carvalho
Nesta manhã, a
caminho do fórum, reparei num pé de lírio, nascido no pequeno jardim de uma
casa simples, de esquina. A copa da pequena árvore se transformou em puras
flores, de alvura imaculada. Flores níveas, pequenas, de quatro pétalas. Em
seguida, perlonguei o muro da casa do advogado Gilberto Nunes, recentemente
falecido.
É quase uma
chácara, em pleno centro comercial e histórico de Regeneração. A residência
fica no centro do terreno, do tamanho de um quarteirão, rodeada de árvores
diversas, várias frutíferas, entre as quais um pernalta e esgalhado
jenipapeiro; algumas, grandes e copadas. Sobre o muro vetusto, de tijolos
aparentes, se debruçam arbustos ornamentais, a derramar suas belas flores, de
coloração e feitios diversos, como um presente aos transeuntes, que muitas
vezes sequer reparam na beleza desse pequeno jardim botânico, no coração da
cidade.
Essa vivenda,
referta de plantas ornamentais, como madressilvas, buganvílias, margaridas e
flamboyants é uma catilinária florida e contundente ao poema de Cesáreo Verde,
utilitarista, a cantar com entusiasmo as árvores exclusivamente frutíferas da
quinta. Os lírios miúdos me fizeram lembrar os grandes lírios de São José, que
conheci na minha meninice, em José de Freitas.
De suas grandes
taças era exalado um suave, porém embriagante perfume, que deixava siderados os
poetas simbolistas, a cometerem seus versos melódicos, sugestivos, cheios de
brancuras liriais, de níveas brancuras nebulosas, que lhes faziam sonhar com as
peles alvas de monjas ciliciadas, e com castas donzelas inalcançáveis em suas
torres ebúrneas, ou com fogosas damas, na consumição de desejos interditos.
Os lírios me
fizeram lembrar o caramanchão da casa do professor Lima Couto, em Parnaíba, com
quem tantas vezes conversei sobre poesia, cultura e educação, em minha
juventude sonhadora. O velho mestre era um poeta bissexto, admirador de
Longfellow, cujos versos traduzira de forma admirável, pois fora professor de
inglês. Fora também livreiro e diretor de colégio público. Admirava, creio, o
ex-governador Chagas Rodrigues, sobretudo porque ele, numa administração
avançada para os padrões da época, com a implantação do planejamento e da
criação de empresas públicas, estadualizara o Ginásio Parnaibano.
Os lírios, as
flores e os cheiros me fizeram viajar no tempo e no espaço, e eu retornei ao
país de minha infância, e senti o cheiro forte dos alecrins pisados na
procissão do Senhor dos Passos, em que eu me comovi demasiadamente com o seu
sofrimento, com o sofrimento de sua mãe, na cerimônia do encontro, em que a
púrpura e o roxo das vestes era a própria exteriorização dos corações
lacerados, das chagas vivas das lanças e dos cravos.
5 de maio de 2010
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