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SOBRE SOGRAS E MADRASTAS
Elmar Carvalho
O grande Machado de Assis disse que teria meia dúzia de
leitores. Ora, se Machado que era o Machado dizia isso, que direi eu? Bem, o
fato é que um de meus poucos leitores, no caso o professor Nelson Rios, de
Regeneração, dizendo que amanhã será o dia do sogro, e que ele gosta muito do
seu, o senhor Raimundo Rodrigues Coimbra, pediu-me escrevesse alguma coisa
sobre esse nosso parente por afinidade.
Inicialmente, devo dizer que nunca fui dado a escrever poemas
de circunstância ou a pedido. Nunca tive habilidade para isso, mas desta feita
abrirei uma exceção, mesmo porque o texto será em prosa. Por falar em parente
por afinidade, se realmente houvesse afinidade, entre genro e sogro, sem dúvida
seria uma grande dádiva e bênção. E se houvesse amizade, melhor ainda.
O fato é que não escolhemos nossos parentes, simplesmente
nascemos em determinada família. Já os amigos, não; nós os escolhemos, pelas
afinidades, pelas identidades, simpatia e admiração. Diz-se que os opostos se
atraem. Isso pode ser verdade na física, no eletromagnetismo, mas não creio ser
na amizade e nem no amor. Por que um homem bom e de bem seria amigo de um
bandido, sobretudo perverso? Não creio haver motivo para isso, mesmo porque um
homem mau e do mal não é amigo de ninguém, mas apenas cultiva os seus
interesses e finge amizade, na defesa de suas conveniências momentâneas.
Agora, a mulher ou o marido são escolhidos por nós.
Consequentemente, vamos ser genro ou nora de um parente de nosso cônjuge, que
ele não escolheu, e que veio de contrapeso com o casamento. A Bíblia diz que,
quando uma pessoa casa, deixa o pai e a mãe, para ir ser carne da mesma carne
de outra pessoa. Claro, o texto sagrado não está recomendando a ninguém o
abandono de seus pais, mas advertindo-o de que a sua preocupação, em primeiro
lugar, deve ser com a família que irá constituir, principalmente com a vinda
dos filhos.
No Brasil, seja por brincadeira ou por preconceito, as sogras
são estigmatizadas, e consideradas verdadeiras megeras, vítimas das mais
sarcásticas piadas. Em outros países, essas parentas afins são consideradas uma
espécie de segunda mãe, e até são chamadas e tratadas como tal. No Brasil,
talvez a sogra seja considerada uma espécie de mãe postiça, e muito desse
preconceito venha de velhas estórias infantis, em que as madrastas maltratavam
os enteados, sendo que uma delas enterrou uma orfãzinha, que, com um fio de
voz, sumida e chorosa, vinda das entranhas da terra, pedia ao capineiro de seu
pai para não lhe cortar os cabelos, que haviam nascido e crescido do ventre da
terra.
Esse conto cortava o coração dos lacrimejantes pequenos que o
ouviam. Há o ditado popular que diz: “Mateus, primeiro os meus”. Quiçá, em
muitas mulheres, haja mesmo uma nítida preferência pelos seus filhos do que
pelos enteados, mas isso não pode ser generalizado. Muitas madrastas foram mães
extremosas para os enteados, e cuidaram deles com todo o desvelo de uma mãe de
verdade.
A mesma coisa sucede em relação a sogros e sogras: muitos são
verdadeiros pais para seus genros e noras, e lhes dedicam um verdadeiro amor
familiar. Estimo que o meu leitor Nelson Rios, professor de matemática, mas
versado em Humanidades, nesse aspecto seja um privilegiado, por ter um sogro de
sua máxima estima e benquerer.
9 de março de 2010
Lindo texto: Beleza pura, como dizem os mais novos. Eu digo: Texto com a marca registrada do meu poeta predileto. Parabéns Elmar! Suas crônicas são como seus poemas - maravilhosas.
ResponderExcluirMuito obrigado, caro amigo, por suas palavras cheias de estímulo e bondade.
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