O goleiro Elmar visto por Gervásio Castro
DESPEDIDA DE GOLEIRO
Elmar Carvalho
O colega e amigo Thiago Brandão,
grande matador, no sentido futebolístico da palavra, respondendo a um e-mail
que lhe enviei, em que lhe explicava que pretendia publicar, em formato
impresso, este Diário Incontínuo em 2016, quando terei sessenta anos de idade,
escreveu-me pela internet: “Grande Poeta! Achei que, pela sua agilidade na
atividade futebolística, mais precisamente em envidar esforço homérico evitando
gols, estivesse Vossa Excelência ainda bem distante de atingir a sexagenária.
De toda sorte, parabéns pela vitalidade física, mental e profissional”.
Embora sabendo que a mensagem é
fruto de sua bondade e lhaneza, não pude deixar de recordar os meus tempos de
goleiro amador – amador do esporte e da vida, e amador porque nunca fui um
profissional pebolista. Respondi-lhe nos seguintes termos, com certa autoironia: “o pior, ou o melhor, senão já terei partido
desta para uma melhor, é que ainda vem a expulsatória ou compulsória ou
septuagenária”.
Parece que essa posição
futebolística, além de ingrata, é um tanto maldita. Primeiro, um golquíper é o
único atleta a jogar, sobretudo, com as mãos; segundo, uma falha sua é quase
sempre fatal, e, depois, as televisões
só se preocupam em exibir os gols, em que o goleiro é visto em situação
desfavorável. Pouco são mostradas as belas e difíceis defesas de um goleiro.
Para completar a esdruxularia, até sua farda é diferente da dos demais atletas.
Agora, estourou a notícia de que o goleiro Bruno teria mandado matar a sua
amante Eliza Samudio.
Assim que assumi a Comarca de
Regeneração, andei comentando que fora goleiro em minha juventude, mas que,
depois dos quarenta, e mesmo depois dos cinquenta anos, ainda jogara no time da
AMAPI. Acrescentei, com certa ponta de vaidade, que as pessoas que me viram
jogar diziam que eu era um bom arqueiro, com atuações quase sempre regulares ou
boas. Diante disso, fui convidado pelo advogado Luzmanell Teixeira Absolon para
disputar uma partida em seu campo particular, conhecido como Teixeirão.
Arrependi-me de haver sido linguarudo e um tanto fanfarrão, mas, para não
passar por mentiroso, fobista ou falastrão, aceitei participar de um jogo.
Para não encompridar a conversa,
devo dizer que foi uma ótima partida, com torcedores e bons atletas
regenerenses da idade madura. Tive sorte. Atuei bem, e fiz pelo menos três boas
defesas, em que executei “voadas” ou “pontes”, uma das quais estaiada. Inclusive,
um dos torcedores, no final do entrevero, disse que uma das minhas defesas
merecia ter sido filmada, e fazia a mímica correspondente, usando um telefone
celular como se fosse uma câmera. Também disseram, mas acho que apenas por
venenosa brincadeira, que eu fui poupado, em razão de meu cargo. Essa
afirmativa não procede, pois os chutes foram violentos, verdadeiros torpedos, e
bem no cantinho da trave.
Surpreendi-me com o doutor
Luzmanell. Pensei que ele só jogasse por ser o dono da bola e do campo, por
sinal agradável, arborizado e bem gramado, mas percebi que ele tem intimidade
com a pelota e conhece os segredos e macetes da arte futebolística.
Posteriormente, fui convidado
para novo jogo. Preferi declinar. Dizem que a primeira imagem é a que fica, mas
eu acho que é a última. Assim, prefiro, como poeta, encerrar um soneto com uma
chave de ouro, e, na qualidade de goleiro, prefiro pendurar as chuteiras, ou
melhor, arquivar as luvas de golquíper, com uma boa atuação.
14 de julho de 2010
Meu caro Poeta, é verdadeira a sua quase reclamação de que as TVs só se preocupam com as falhas ou situações vexatórias dos goleiros. Até o cantor e compositor Belchior fez referência a infelicidade do arqueiro em uma das suas canções quando ele diz "estava mais angustiado que goleiro na hora do gol". De fato, não é das mais fáceis a vida de um goleiro.
ResponderExcluirUm excelente texto. Agradável de ler. Ironias pertinentes que dão um realce ao conto/crônica e prende a atenção de quem está lendo.
ResponderExcluirMeu caro Elmar vc atua muito bem, tanto nas quatro linhas quanto sob o travessão. No seu texto, a bola corre célere e sem impedimento e a plateia aplaude suas seguras intervenções. Vc está sempre bem colocado e devolve a pelota com maestria e não faz cera. Sou mais um aqui aplaudindo.
ResponderExcluirAgradeço aos amigos pelos pertinentes comentários. A lembrança da música do Belchior sempre me ocorre quando me lembro de minhas atuações goleirísticas.
ResponderExcluirCaro Octavio César suas me deixaram muito contente.
Gratidão a todos.