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DISCURSO DO DES. ARNALDO BOSON (*)
Arnaldo Boson Paes é desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 22ª
Região.
Senhoras e Senhores,
Início estas palavras
compartilhando a imensa alegria que sinto ao receber a generosa e gratificante
Cidadania Parnaibana, que me acalma a alma e me torna irmanado com todos aqui
presentes.
É tão grande a minha
identificação com esta terra, com esta gente, com estas tradições, que, antes
mesmo de passar a ser parnaibano por decreto legislativo, confesso que eu já o
era pelo coração.
Esta é a cidade que aprendi a
amar, desde meados de 1985, quando aqui estive, pela primeira vez, para
participar de evento acadêmico no campus da então Universidade Federal do
Piauí.
Minha admiração pela invicta e
gloriosa Parnaíba se intensificou entre 1990 e 1993, quando aqui atuei como
magistrado e passei a conviver fraternalmente com figuras ilustres e anônimas
da sociedade local.
Retornei em centenas de ocasiões,
a lazer ou a trabalho, nesta última condição como presidente e corregedor do
Tribunal do Trabalho, ao longo de seis anos de mandato.
A cada dia nesta terra, crescia
meu encantamento com as histórias, as tradições, as imagens, os cheiros, os
sabores, os sentimentos e as emoções que brotam desta altiva e centenária
cidade.
Prezadas e Prezados,
Em Parnaíba, somos magnetizados
por lindas paisagens naturais e humanas, que tocam o coração e fazem deste o
lugar ideal para se viver, sonhar e amar.
Joia encravada no Atlântico, a
cidade assume seu espírito de metrópole. Por seu pioneirismo na adesão à
Independência do Brasil, Parnaíba foi agraciada por Dom Pedro I com o título de
“A Metrópole das Províncias do Norte”.
Hoje articula amplas redes de influência sobre a planície litorânea.
Cortada por rios, encoberta pelo
céu azul, acariciada pela brisa fresca do mar e emoldurada por coqueirais
infinitos, cajueiros imensos e dunas de areia dourada, seu cenário é
paradisíaco, imensa aquarela pintada por mãos divinas.
Para os que a amam, pouco
importam os limites geográficos entre os municípios: do mar aos rios, dos
portos às dunas, do Delta às praias, do casario colonial às cidades adjacentes,
tudo é Parnaíba.
São paisagens que enchem os olhos
e nos convidam a adotá-las como companhias permanentes.
Cito a Pedra do Sal, onde
A natureza ao pôr-do-sol parece
Grandiosa catedral, em cujo seio
O oceano verde reza a sua prece.
(Poema Pedra do Sal, de EDISON
CUNHA)
Cito, na mesma praia, o soberbo
farol,
Vigilante na noite temerosa,
Grave missão cumprindo,
silenciosa,
A pupila crepita e o espaço
sonda...
E, pelo mar em fora, aos seus
acenos,
Deslizam barcos, rápidos, serenos
Baloiçando, tranquilos, dentro na
onda!...
(Poema O Farol, de EDISON CUNHA)
Cito o esplêndido ritual da
revoada dos guarás. No labirinto de ilhas, ao por do sol, lindas aves de
plumagem vermelha vão chegando aos bandos, em festa, em bela coreografia,
decorando a floresta. Ao final do balé, pousam nos galhos das árvores e aninham-se
em suas casas noturnas.
Cito ainda o Delta do Parnaíba, o
Rio Parnaíba, o Rio Igaraçu, a Lagoa do Bebedouro, a Lagoa do Portinho e o
Porto das Barcas, por onde ventos, remos e lemes moviam e continuam a mover
barcos rumo ao progresso.
Na confluência de tantas belezas
naturais, mulheres e homens, trabalhando de sol a sol, de lua a lua, vão
tecendo o espírito empreendedor e cosmopolita do lugar e de sua gente.
Parnaíba, no seu começo, era
muito mais ligada à Europa do que a Oeiras ou a Teresina. Ergueu-se radiosa,
soberana e elegante. Dos seus tempos áureos, permanecem os armazéns do cais, o
casario colonial, as ruas alongadas, as praças arborizadas, as igrejas altas e
bonitas, os palacetes modernos.
Monumentos e personalidades
continuam vivos na memória afetiva da cidade, como testemunhos de seu passado
glorioso e inspiração para novos ciclos de prosperidade, como pilares de um
futuro promissor, descortinando horizontes.
Cito o velho solar dos Dias da
Silva, a Casa Inglesa, os sobrados da Alfândega e do Arsenal de Marinha, o
palacete da União Caixeiral, a Catedral da Divina Graça, a Igreja do Rosário, o
prédio da Santa Casa de Misericórdia, as praças da Graça e de Santo Antônio, o
colégio Nossa Senhora das Graças e o ginásio São Luiz Gonzaga.
A brisa que sopra sobre a
Parnaíba secular, me traz à memória figuras históricas que deram projeção à
terra, tornando-a excelsa e formosa. Entre tantos, sobressaem DOMINGOS DIAS DA
SILVA, SIMPLÍCIO DIAS e JAMES FREDERICK CLARK.
Parnaibanos ilustres, de passado
mais recente, contribuíram para o seu florescimento: EVANDRO LINS E SILVA, JOÃO
PAULO DOS REIS VELLOSO, CHAGAS RODRIGUES, ALBERTO SILVA e MÃO SANTA.
Evoco, sobretudo, a memória de
marinheiros, pescadores, canoeiros, vareiros, estivadores, barqueiros,
vaqueiros, lavradores, prostitutas, trabalhadores em geral, gente simples e
gente humilde, gente sem eira nem beira, cujo trabalho fez a riqueza de poucos
e a pobreza de muitos.
Entre esses heróis anônimos, está
MANDU LADINO: ao longo do tempo, seus algozes tentaram varrer seu nome da
história gloriosa da terra que viria a ser Parnaíba, sede de tantos atos de
bravura em busca da justiça. Esta, tantas vezes negada por aqueles que se
julgavam senhores do destino de uma maioria entregue à própria sorte.
Robusto e astuto, MANDU LADINO
comandou legiões de guerreiros com o intuito de conquistar para o seu povo o
direito de existir. Tombou em combate, golpeado por caçadores de índios, ao
tentar atravessar a nado o Rio Iguaraçu, em frente à então vila de Nossa
Senhora de Monserrathe da Parnahyba.
Durante longo tempo, a saga desse
herói ficou esquecida sob camadas de lodo impostas por seus opressores.
Contudo, a sua bravura rompeu essas barreiras insidiosas, e hoje seus feitos heroicos
ecoam por todos os rincões, a mostrar que nada é impossível quando se tem
coragem e determinação.
Queridas e Queridos,
A história de um lugar e de seu
povo é em boa parte a história contada por seus literatos: historiadores,
romancistas, contistas, cronistas, poetas. O universo cultural, a atmosfera
poética local, gerou escritores e obras de grande valor literário.
OVÍDIO SARAIVA DE CARVALHO E
SILVA escreveu Poemas, marco inicial da Literatura Piauiense. LUÍZA AMÉLIA DE
QUEIROZ, autora de As Parnaibanas, é a primeira poeta do Piauí. HUMBERTO DE CAMPOS
evocou Parnaíba para perenizar seu cajueiro no célebre conto Um amigo de
infância. RENATO CASTELO BRANCO produziu vasta obra literária ambientada em
Parnaíba, a exemplo dos romances O Rio Mágico e Teodoro Bianca.
ASSIS BRASIL, um dos mais
fecundos romancistas brasileiros, publicou mais de uma centena de livros, com
destaque para os romances da Tetralogia Piauiense, em especial Beira Rio Beira
Vida, marcado por forte denúncia social. Ambientado no bairro Tucuns, hoje São
José, às margens do Rio Igaraçu, o romance ganhou o prêmio Walmap de 1965.
A poesia parnaibana é extensa e
virtuosa. Sobressaem, entre antigos e novos poetas, JONAS DA SILVA, ALARICO
JOSÉ DA CUNHA, EDISON CUNHA, R. PETIT, JEANETE DE MORAES SOUSA, ALCENOR
CANDEIRA FILHO, ELMAR CARVALHO, V. DE ARAÚJO, ISRAEL CORREIA, DIEGO MENDES
SOUSA e PÁDUA SANTOS.
Estimadas e Estimados,
Parnaíba não se releva apenas no
seu passado de glórias. Há também um presente de prosperidade e um futuro
radioso que se avizinha, cenário que se abre para uma realidade venturosa.
Para as glórias da Luz e da
Prosperidade, como prenuncia a poesia Parnaíba, de JESUS MARTINS DE CARVALHO, a
cidade já vive um novo ciclo de desenvolvimento.
A cidade experimenta uma explosão
imobiliária, expande seu perímetro urbano, multiplica seus condomínios
residenciais de alto padrão e bairros sofisticados vão se somando aos mais
antigos e aos mais populares.
O seu mosaico econômico ganha
amplitude e diversidade ao reunir variados polos de desenvolvimento, como são
exemplos os polos comercial, de serviços, de turismo, do agronegócio,
universitário e tecnológico.
Com a estruturação da ZPE - Zona
de Processamento de Exportações e do Distrito Irrigado dos Tabuleiros
Litorâneos, Parnaíba habilita-se para se integrar às cadeias globais de valor,
com potencial para atrair novos negócios e conquistar novos mercados.
O Piauí passa por grandes
transformações em sua matriz econômica e energética, sob a liderança do
governador RAFAEL FONTELES. O Estado lança-se ao mundo para atrair
investimentos e estruturar na planície litorânea um HUB de produção de energias
renováveis, à base de hidrogênio verde, destinadas à exportação.
Parnaíba está no centro destas
transformações. Com a conclusão das obras do Porto de Luís Correia e de seu
sistema intermodal, que vai conectar ferrovias, hidrovias e rodovias, a região
sediará dois dos maiores projetos de produção de hidrogênio verde do mundo, com
investimentos estimados em U$ 200 bilhões.
Amigas e Amigos,
As cidades são como as pessoas,
com o tempo mudam de fisionomia. Na paisagem social e urbanística de nosso
tempo, a nossa gloriosa Parnaíba, hoje, são várias Parnaíbas, que convivem em
um mesmo espaço geográfico.
A Parnaíba das mansões de luxo e
a dos casebres. A Parnaíba rica e a dos bolsões de pobreza. A Parnaíba pacífica
e a tomada pelas facções. A Parnaíba das oportunidades, com milhares de
universitários, e a Parnaíba que busca um lugar ao sol no mercado de trabalho.
A Parnaíba moderna e a Parnaíba antiga.
A qual destas Parnaíbas
pertencemos? De qual destas Parnaíbas somos cidadãos? Pertencemos a todas essas
Parnaíbas. Somos cidadãos de todas elas. Por todas elas temos grandes
responsabilidades sociais, políticas e culturais.
Senhoras e Senhores,
Neste instante, abre-se para mim
uma janela do tempo. Rememoro os momentos de vivência profissional e afetiva
que construí no território parnaibano.
No exercício da magistratura,
convivi com autoridades locais, empresários, trabalhadores, líderes de classe,
advogados e servidores públicos. Com espírito cooperativo e trato cordial, com
eles criei laços afetivos que os conservo até hoje.
Cito o juiz classista JOSÉ WILSON
FERREIRA, com quem mantenho longa amizade. Frequentava sua casa na Rua Duque de
Caxias, hospedava-me no seu sítio às margens da Lagoa do Portinho e por meio
dele conheci e me tornei amigo de muitos parnaibanos. Aprendi com JOSÉ WILSON
que amigo é para sempre.
Esta homenagem enche meu coração
de graça e afeto. Duas razões mais recentes, porém, reforçam meus vínculos com
esta terra. Ambas conectadas por laços de família.
Pesquisei recentemente sobre
MONSENHOR BOSON, meu tio-trisavô, a quem dediquei uma biografia. Aqui estive
escarafunchando arquivos para reconstituir a época, a vida e a obra do parente.
Após 40 anos dedicados à Igreja e à educação, ele escolheu Parnaíba para
continuar sua obra sacerdotal e educacional.
Aqui viveu por 16 anos, entre
1929 e 1945. Aqui instalou e foi capelão da Capela da Santa Casa de
Misericórdia. Aqui foi inspetor federal de ensino e contribuiu na gestão do
Ginásio Parnaibano, na criação de colégios, no aperfeiçoamento da educação
local e na formação da juventude.
Aqui vive um parente querido, o
parnaibano ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO DOS SANTOS, ex-promotor de justiça e
defensor público aposentado, neto do maestro JOSÉ BOSON RIBEIRO, que
imortalizou o bombardino da saudade. PÁDUA é um legítimo Boson, mas, na curta e
sinuosa travessia do Buriti dos Lopes a Parnaíba, seus antepassados deixaram
para trás o sobrenome da família.
O honroso título de Cidadão
Parnaibano que agora recebo é filho da bondade do parente PÁDUA SANTOS. Como
vice-prefeito e vereador desta cidade, ele foi tecendo uma teia de amizades.
Como poeta, contista e cronista, ele conserva um coração sensível e uma alma
generosa. Ao parente, fica a minha
gratidão e a minha amizade.
Prezadas e Prezados,
É hora de agradecer e finalizar.
Então, ao ser-me concedido o
honroso título de Cidadão Parnaibano, pela Augusta Câmara Municipal, expresso
meus agradecimentos à terra e à gente parnaibana, na pessoa do vereador DANIEL
JACKSON, por todos os seus ilustres pares.
Agradeço aos conselheiros OLAVO
REBELO DE CARVALHO FILHO e JAYLSON FABIANH LOPES CAMPELO pela alegria e honra
desta acolhida conjunta, fruto da conspiração do acaso e de nossas amizades.
Agradeço aos ilustres convidados
que me honram com a sua presença fraterna, em especial aos que vieram de
Teresina para celebrar comigo este momento especial.
Agradeço aos meus diletos amigos
e queridos familiares e a todos estendo a homenagem que recebo da Câmara
Municipal de Parnaíba, na certeza de que eles também se sentem homenageados
comigo, nesta noite memorável.
Para concluir, evoco trechos do
poema O centenário de Parnaíba, de ALARICO JOSÉ DA CUNHA, que nos conclama a
cultivar as tradições e a acreditar no futuro luminoso desta terra e de sua
gente:
A invicta Parnaíba, erguendo-se
radiosa,
Excelsa, soberana, elegante e
formosa,
[...]
Ó Parnaíba invulgar! És tu que
tens a dita
De ser, neste nordeste, a mais
cosmopolita,
A mais empreendedora, a mais
hospitaleira;
[...]
Bendita, gloriosa, altiva e
centenária!
Sagrada pelo povo, que em preces
te bendiz
Assegurando-te a Paz de um século
mais feliz.
Muito obrigado!
(*) Pronunciado pelo Des. Arnaldo Boson, por ocasião do recebimento do Título de Cidadão Parnaibano, que lhe foi outorgado pela Câmara Municipal de Parnaíba, no dia 14/06/2024.