NO ANO de 1985, quando lancei meu primeiro livro, ele, que mantinha a coluna “Ponderações Literárias” na “Folha do Litoral” - jornal que circulou em Parnaíba por muitos anos, presenteou-me com um elogioso comentário sobre minha pessoa e o meu trabalho, terminando por transcrever um dos poemas ali publicados.
O autor, na sua humildade de poeta bissexto, e a obra, que se intitula “Viração”, não têm as ótimas qualidades que lhes foram dadas pelo competente comentarista. Atribua-se os méritos ali alinhados à força da amizade que nos unia. Amizade de muitos anos de foro, de muitos meses de atendimentos aos carentes de justiça, e de muitos dias de audiências na Vara da Família onde atuava-mos juntos: ele como Juiz e eu como Defensor Público.
No ano de 1986, mais precisamente no dia 16 de abril, publiquei no mesmo jornal, onde ele tanto escreveu, uma crônica denominada “Por quem choram as desvalidas”, que foi lida na missa realizada na Catedral de Nossa Senhora da Graça, em sufrágio de sua alma que a partir do dia 10 daquele mês passara a morar com as estrelas do céu.
Nesta matéria de hoje não se pretende tecer comentários sobre sua ilibada atuação como Juiz de Direito, função que sempre a exerceu com o elevado propósito de servir os mais necessitados.
Não se vai, também, comentar sua vasta atuação literária. Fica tal assunto para ser exposto e debatido no SALIPI – Salão do Livro do Piauí, 8ª edição, evento que acontecerá em Teresina a partir do próximo dia 31 de maio, onde será ele, com merecida justiça, o grande homenageado.
Tratar-se-á, aqui, de uma pequena ocorrência envolvendo esta personagem invulgar e que a guardo, indelével, no fundo de minha memória. Aconteceu o seguinte:
Estava eu em minha sala, no foro, atendendo a grande fila formada por pessoas carentes de justiça, aquelas que sempre procuram como única salvaguarda a Defensoria Pública, quando entra uma senhora, agoniada e suada, que logo foi dizendo o que lhe trazia até ali:
- Doutor, eu tenho um processo contra o meu marido, ele está pagando muito pouco e isto não pode continuar!...
Aquela necessitada, mãe de família aflita, trazendo na cabeça os enfeites dos cabelos brancos que lhe dera a idade somada ao desprezo de um marido que lhe trocara por uma mais moça, pretendia ajuizar uma Ação de Revisão de Alimentos.
Alegou que o marido, ao contrário do tempo do ajuizamento da inicial e da sentença, havia conseguido emprego mais rendoso e que podia pagar, para ela e filhos ainda menores, uma pensão maior.
- Minha senhora – falei – em primeiro lugar vamos localizar o processo e depois a senhora vai me trazer uma prova de que seu marido, atualmente, vem recebendo um salário maior e capaz de...
Ela, como a maioria daquelas que procuram a Defensoria Pública, não esperou a conclusão do meu parecer prévio e foi logo dizendo:
- Prova de que ele vem ganhando mais eu tenho é muita, agora onde está o processo, é com o senhor!
Não há dúvida – ponderei – mas me diga uma coisa: - a senhora se lembra em que ano foi a audiência, ou qual foi o cartório?...
Nada. Ela nada podia informar neste sentido. O ano ela não tinha certeza, já fazia tempo, e quanto ao cartório, foi assunto que eu nem devia ter falado. Este povo carente da Assistência Judiciária, raramente, sabe o que é e para que servem Cartório ou Secretaria.
Diante deste impasse, lhe fiz mais uma pergunta, tentando localizar os autos:
- A senhora se lembra quem foi o juiz do processo?
Ela então, mostrando-se um tanto desconfiada, me disse através de uma leve ponta de sorriso desdentado:
- Doutor o nome mesmo eu não sei. Só sei que o apelido dele era Nonon!
E assim termina esta história forense, com a localização do processo que teve, como muitos outros, um acordo quanto ao pagamento de alimentos. Feito que tramitou pela 2ª Vara da Comarca de Parnaíba, com o característico parecer ministerial da época, elaborado em duas palavras: “de acordo” ou “nada a opor”; ajuizado pela Defensoria Pública e com sentença homologatória proferida pelo saudoso Juiz e escritor João NONON de Moura Fontes Ibiapina.
Parnaíba, 23 de abril de 2010.
Poeta, contista, cronista, romancista, memorialista e diarista. Membro da Academia Piauiense de Letras. Juiz de Direito aposentado. *AS MATÉRIAS ASSINADAS SÃO DE RESPONSABILIDADE DE SEUS AUTORES, E NÃO TRADUZEM OBRIGATORIAMENTE A OPINIÃO DO TITULAR DESTE BLOG.
domingo, 25 de abril de 2010
O APELIDO DO JUIZ
Pádua Santos
Fontes Ibiapina
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