sábado, 26 de maio de 2012

O LUXO ONEROSO E A LIÇÃO DE LANDRI SALES



Jesualdo Cavalcanti Barros*


Na mesma data em que assumiu o governo do Piauí (21.05.1931), na qualidade de Interventor Federal, o tenente Landri Sales Gonçalves tomou uma medida verdadeiramente revolucionária: baixou decreto suprimindo as Secretarias de Estado. Ao mesmo tempo, criou a Secretaria Geral, para superintender “todos os ramos da administração”, a ela diretamente subordinando Diretorias encarregadas das atividades-fim (Fazenda, Interior e Justiça, Agricultura, Viação e Obras Públicas, Instrução Pública, Saúde Pública e Chefatura de Polícia).
Para usar uma expressão tão em voga nos dias atuais, Landri enxugou a máquina administrativa, tornando-a leve, ágil e funcional. Por quê? Ele mesmo justificou a drástica medida perante o chefe Getúlio Vargas, em relatório de 1932, entregue por intermédio de Juarez Távora: “as condições financeiras do Piauí não comportavam o luxo de Secretarias de Estado.”
Bons tempos aqueles em que, em nome da racionalidade e do combate ao desperdício, se considerava um “luxo” o uso da estrutura de secretaria, sempre pesada e onerosa, sobretudo para setores ou atividades que mal cabem nos limites de um simples projeto ou programa. Ou mesmo de uma seção. Pois secretaria significa, a grosso modo, toda uma parafernália de departamentos, divisões, assessorias, gerências, coordenadorias e quejandos, com seus chefões e chefetes  não raro arrotando pose e mordomias (gabinetes, secretárias, carros e telefones), tudo por conta do contribuinte. E assim o dinheiro some. Em suma:  para organizar a atividade-meio, gasta-se o dinheiro que deveria ser investido na atividade-fim.
O Piauí de hoje, seguindo o mau exemplo do Planalto, abusou desse “luxo”. Daí o gigantismo do aparelho estatal, com  suas consequências desastrosas: o paralelismo de ações, a superposição de órgãos, o inchaço da folha, a evaporação das receitas. Enfim, o desperdício de tempo e de dinheiro. Face à ineficiência administrativa resultante desse verdadeiro “samba do crioulo doido”, pipocam as brigas por espaço, os confrontos de vaidades, as ciumeiras, as rivalidades. E as consequências todos sofremos.
Economizando para poder investir, Landri tornou-se um dos melhores administradores que o Piauí teve até os dias de hoje, inclusive pelo combate sistemático a mordomias. Sem comentários, reproduzo nota contida na resenha dos ofícios expedidos pelo Secretário Geral, publicada no Diário Oficial de 2 de setembro de 1931, sobre  uso de carros oficiais pelos altos dignitários do Estado:
Ao Sr. Diretor da Fazenda, mandando providenciar para que sejam devidamente descontadas em folha, pela Tesouraria daquela repartição, as importâncias abaixo discriminadas, provenientes de corridas feitas em carro do Estado pelas autoridades que se seguem:
         Ten. Landri Sales Gonçalves................19$600
         Ten. Antonio Martins de Almeida          12$600
         Sr. Heráclito Souza                             3$500
         Prof. Felismino Freitas Weser .              2$800
         Cap. Torquato Pereira de Araújo           2$100
         Ten. Bruno Jansen Meireles                 4$900
         Prof. Martins Napoleão                       4$200
         Cel. João Bastos                               7$700
         Dr. Luiz Mendes Ribeiro Gonçalves      49$700
                               Total .....................107$100.”
E assim ocorria todo mês, com esses e outros nomes. Na publicação do mês seguinte (4 de outubro), por exemplo, o valor descontado subiu para 153$600.
Assim, a contar do todo poderoso chefão Landri, pagavam do próprio bolso pelo uso de carros oficiais as mais altas autoridades do Estado, como as citadas acima: Antonio Martins de Almeida, Secretário Geral; Martins Napoleão, Diretor Geral da Instrução Pública; João Bastos, Diretor da Fazenda; e Luiz Mendes Ribeiro Gonçalves, Diretor da Agricultura, Viação e Obras Públicas. Sem nenhum desdoiro.
Por isso é que o dinheiro dava.

*Ex-presidente da Assembléia Legislativa e do Tribunal de Contas do Estado

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