No reino dos jabutis trepados
José Maria Vasconcelos
Cronista,
josemaria001@hotmail.com
Entrei na livraria para completar o estoque da obra, Escorregões no
Português. Logo me deparei com notável jornalista que folheava uma obra de
Graciliano Ramos: “Zé, sou devorador de livros. Não admito exercer a profissão
sem cultivar as letras, apreciar grandes escritores, dos quais extraio lições e
modelos de produção de texto”.
A conversa desembarcou na análise de conhecidos jornalistas e
colunistas de textos enxutos e profundos; ou de outros de períodos longos e
tortuosos, argumentação rasa. Estes até conseguem postos de trabalho,
frequentam banquetes, amealham prosperidade. Inserem-se no reino de jabutis
trepados. Categoria de outras patentes, por aí, que arrota poder e fortuna,
sabe Deus de qual origem, sem mérito nem dignidade.
Adágio popular explica o sucesso e
prosperidade da classe de oportunistas, políticos, gestores públicos,
empresários: “Jabuti trepado, foi por enchente ou mão de gente”. Inebriados por
se instalarem no alto da árvore – diga-se, pirâmide – confundem a opinião
pública com certificados de mérito nenhum. Privilegiados posando de chefes,
magistrados, ministros, diretores, secretários, sem talento.
O poder político age de forma
organizada. É um verdadeiro exército de políticos e executivos, que marcham
sobre o erário público, sem piedade. E nada lhes acontece, porque as forças da
oposição são impotentes para convocar e colocar esses ratos no banco dos réus.
Com dinheiro alheio é fácil se
fazer política, prosperar a empresa, conquistar prestígio social. Jabutis trepados,
à custa das mãos calejadas dos que trabalham.
A população, em geral, desconhece
e afaga jabutis trepados, hoje proprietários de pomposas empresas. Que
iniciaram negócio, vendendo para prefeituras, Estado e secretarias, em cretinas
transações. Quando fisgados por fiscais fazendários, ameaçam transferirem-se
para outros rincões. Ou corrompem autoridades.
Em encontro com amigo, em
churrascaria de Teresina, competente professor universitário confidenciava-me
que fora escolhido pelo governador para assumir a Secretaria de Administração.
Fui curto e direto: “Quer conselho? Não aceite! Sua ética e moral não combinam
com a esperteza do governador e de alguns empresários corruptos.” Dito e feito.
Meses depois, empresário de revenda de carros entrou no gabinete do gestor,
final de expediente de sexta, exigiu-lhe que assinasse, urgentemente, uma nota
de empenho e compra de carros oficiais. O secretário pediu-lhe que aguardasse a
semana seguinte, para analisar a compra. O arrogante empresário cobrou-lhe
pressa. O secretário bateu-lhe a porta: “Cai fora, seu corrupto!” O arrogante
ameaçou-o: ”Na próxima semana, quem vai sair daqui será você!”. E foi.
No reino dos jabutis, não há
vagas para consciências puras. “Vós não sois deste mundo, por isso, o mundo vos
odeia, como odiou a mim.” Eis um grande adágio de Cristo.
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