quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

LEÃO ENJAULADO

Foto do saudoso velho "Jura, na mira de Elmar Carvalho


LEÃO ENJAULADO

Elmar Carvalho
           
Do barzinho onde eu tomava umas cervejas, vi o velho boêmio Jurandir em sua casa defronte. Em companhia de um outro boêmio, fui cumprimentá-lo, aproveitando o ensejo para fazer um “discurso relâmpago” em sua homenagem. O velho fauno, até os oitenta anos de idade, bebeu bravamente, e se gabava de ainda abater umas “lebres”, como dizia um colunista federal das fofocas.

Após as oitenta primaveras, ficou bastante decrépito, e a saúde já não lhe permitia as libações etílicas, como costumava dizer o popular Pacamão, que serviu de título a um livro do romancista Assis Brasil, e que conheci a perambular na Praça da Graça, com a sua indefectível e emblemática bengala. O médico lhe proibira a ingestão de álcool, sob pena de ele ser convocado mais cedo pela velha ceifadora.

Sua filha, parece ter fechado o portão gradeado como se fora uma gaiola, porque de minha mesa eu observava o Jurandir a voltear no pátio, de um lado para outro, como um pássaro engaiolado ou como um velho leão, já sem juba, sem garras e sem dentes, saudoso de sua liberdade, nostálgico dos tempos em que percorria as savanas da África, como um legítimo Rei dos Animais.


Certamente, o velho boêmio estava a recordar os áureos tempo das boas talagadas de calibrinas e dos tempos em que desbravava virilmente as curvas de um corpo feminino. A tela de arame dava ainda mais ao portão o aspecto de uma gaiola ou de um viveiro. Contudo, o velho galo-de-campina já não cantava de galo.

17 de janeiro de 2010

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Missiva endereçada a meu pai

Fonte: blog Folhas Avulsas

Missiva endereçada a meu pai

José Pedro de Araújo Filho
Historiador, romancista e cronista

Levei muito tempo, meu querido, para escrever algumas linhas sobre a sua pessoa, pois, sempre que começava algo assim, a emoção se abatia sobre mim com a força de um tornado e dominava tudo com força irremovível. E isso se deu por um longo período. Somente poucos anos atrás consegui super as emoções e dei início à redação de algumas passagens sobre o senhor e chegar até ao fim do que redigia, à custa de muita fadiga. Assim aconteceu com a crônica “Atravessando o Parnaíba no Lombo da Maria Fumaça”, ou mesmo o texto “Um Exímio Contador de Histórias”, ambos publicadas no blog Folhas Avulsas. Hoje, as lembranças continuam muito fortes, mas já consigo, se não acostumar-me com a sua perda, pelo menos conviver com mais tranquilidade com isso. Não foi uma tarefa das mais fáceis, como pode ver, mas consegui avançar desta vez e conclui o que me propunha a fazer. Hoje, dia do seu nonagésimo aniversário de nascimento, (completado nesse dia 17/02), envio-lhe a presente missiva para lhe dar conta de como andam as coisas por aqui.

E começo dizendo que a família deixou está em franco crescimento. Desde a sua partida para a glória, alguns netos nasceram, e os primeiros até já constituíram suas próprias famílias, e também geram os seus primeiros bisnetos. Oito no total, para ser mais preciso. Seis dos quais do sexo feminino, e, diferentemente da sua própria prole, na qual havia uma supremacia masculina, agora nos veio uma ampla maioria de mulheres. Pra exemplificar como este crescimento está sendo constante, basta dizer que já temos mais um, ou uma, a caminho. De forma que o que começou com cinco, já são vinte e oito, e ainda esperamos por muitos mais. Outro fato interessante nisso, é que todos os seus bisnetos residem no seu estado natal, fizeram o caminho de volta, caminho que palmilhaste lá pelo distante ano de 1951.

Do mesmo modo, como era da sua vontade, todos os netos, com exceção de um lindo rapazinho que nos veio com a formatação um pouco diferente dos demais, mas que é um dos mais queridos de todos nós, os outros cursaram ou cursam uma faculdade. O esforço que o senhor empreendeu para nos enviar para a capital para que pudéssemos continuar os estudos valeu demais. Não restam dúvidas que alcançamos um patamar diferente do que o que nos estaria reservado se permanecêssemos no interior, e ao seu gosto. Estão todos em busca do seu próprio lugar ao sol também e com boas perspectivas.

A sua marca continua sendo forte e respeitada; quanto ao seu legado, tentamos honrar e conferir-lhe novas vitórias. Mas, não posso negar, a sua falta é sentida a cada dia que nasce, a cada manhã que nos recebe com raios solares brilhantes e aquecedores. Tentamos conviver com isso da melhor maneira possível, mas, muitas vezes, sucumbimos às nossas fraquezas e nos abatemos muito para, em seguida, levantar a fronte e seguir adiante com altivez e denodo, como era do seu feitio também. Não repare nisso, pois nos acostumamos a tê-lo como nosso comandante, abrindo caminhos e facilitando as nossas vidas. Foi necessário, assim, que nos reinventássemos como pessoas, e passássemos a abrir as nossas próprias picadas nessa selva difícil que é o mundo. Estamos conseguindo, pois, um Araújo jamais baixa a fronte e se dá por vencido.

Acredito que o senhor ficaria satisfeito com os rumos que demos às nossas existências. Acredito mesmo que o jovem que saiu do sertão do Piauí para se estabelecer naquele interior de difícil acesso, no sertão mais profundo do Maranhão, àquela época também em começo de ascensão como município recém-instalado, ficaria satisfeito com o que conseguiu fazer com muita determinação, coragem e honestidade. A propósito disto, em certo município piauiense, testemunhei um fato inusitado - e até mesmo exagerado e de muito mau gosto – levado a cabo por um pai orgulhoso da família que constituiu: na parede frontal da sua casa, mandou constar em letras em caixa alta e devidamente esculpidas na argamassa, o nome de cada um de seus filhos, a sua formação profissional e o cargo que ocupava. Estava lá, desenhado no reboco, a marca da sua própria vitória. Orgulhava-se aquele homem de ter conseguido aquele feito notável para uma família constituída de tantos filhos e em local tão ermo. Feliz e realizado, queria ele que todos tomassem conhecimento das suas lutas travadas e vencidas. Como já afirmei acima, achei naquele momento algo de extremo exagero e uma ostentação desnecessária. Depois, quando os meus próprios filhos começaram a vencer as suas próprias batalhas, divulgava os feitos alcançados por eles aos amigos com desusada paixão e orgulho. E acredito mesmo que tivesse coragem suficiente para estampar o nome de cada um deles, além das suas glórias, na parede frontal da minha casa, não estivesse ela escondida por trás de um muro.

Obviamente, isso é apenas uma forma de lhe dizer o quanto estamos orgulhosos e agradecidos com o que Deus nos tem proporcionado. E continuamos batalhando dia-a-dia, mês-a-mês, ano-a-ano, para consolidar esses ganhos. Essa é outra coisa que aprendemos com o senhor: nunca esperar que as coisas aconteçam por si só; que a providência nos dê de mão beijada, e de graça, tudo o que almejamos. Vamos atrás das nossas conquista com ardor, mas sem açodamento, sem pisar em ninguém, e sem desejar o que é do próximo, como sempre nos ensinavas ao enunciar a passagem bíblica em que o rei Acabe desejou e tomou para si a vinha de Nabote.

Os tempos por aqui estão difíceis. O mundo está cada vez mais competitivo, e nesse aspecto, mais injusto também. Mas, vamos remando o nosso barco sob o comando da nossa timoneira que aqui ficou e tomou nas mãos a liderança: a nossa mãe, a sua venerada esposa, já agora um pouco alquebrada e afligida por doenças próprias da idade, mas ainda com muita fé e confiança no Nosso Senhor e no futuro. Sob a sua liderança vamos seguindo sobranceiros.

Vou encerrar dizendo que gostaríamos imensamente que estivesse por aqui para festejarmos juntos o seu aniversário de 90 anos. Exatamente no dia em que uma de suas bisnetas completa o seu primeiro mês de vida.  Seria a glória suprema. Mas, respeitamos e glorificamos os desígnios de Deus, mais um dos seus ensinamentos. Então, até o nosso próximo encontro.

Com amor.


Do seu filho mais velho.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

METAPOEMAS COMENTADOS (conclusão)

Fonte: Google

METAPOEMAS COMENTADOS (conclusão)

Alcenor Candeira Filho

7.7  -  ESPÉCIES

          écloga               para o diálogo
          nênia                 para o pranto
          ode                    para o tributo
          hino                   para o canto
          haicai                 para o resumo
          idílio                   para o campo
          elegia                 para o luto
          soneto                para a gaiola
          rondó                  para o estribilho
          acróstico             para o nome
          parlenda             para a criança
          epigrama            para o crítico
          acalanto              para o sono
          pantum               para o quarteto
          pastorela            para a estrofe
          vilanela               para o terceto
          vilancete             para a glosa
          ditirambo           para o vinho
          epitalâmio          para o noivo 
          barcarola            para o rio
          madrigal             para o amor
          parábola             para a lição
          tenção                 para o desafio
          epicédio              para a dor.

  C O M E N T Á R I O     Nº  31 
•             ÉCLOGA – Poesia campesina com diálogo, muita usada no século XVIII, sob a vigência do Arcadismo.

•             NÊNIA  -  Canto fúnebre.

•             ODE  -  composição  singela em louvor de uma pessoa, fato ou coisa.

•             HINO  -  Composição própria para ser cantada, em louvor de um fato religioso (sacro) ou patriótico (cívico).
     Identifica-se no hino patriótico, isto é, no canto de louvor ou de veneração a um país e a seu povo, características marciais ou solenes, traduzidas na retumbância de sons de clangor.

•             HAICAI  -  Composição de origem japonesa (“haiku”) constituída de três versos, o segundo com sete sílabas e os outros com cinco.
•             IDÍLIO  -  Composição campesina sem diálogo.

•             ELEGIA  -  Canto lamentoso repleto de ternura e de tristeza.

•             SONETO  -  Composição de forma fixa constituída de dois quartetos e dois tercetos.

•             RONDÓ  -  Poema de forma fixa, com pequenas variações. No livro PRQUENO DICIONÁRIO DE ARTE POÉTICA, Geir Campos destaca “o RONDÓ SIMPLES (14 versos) distribuídos  em dois quartetos e um sexteto, repetindo sempre os dois versos finais, segundo o esquema  ABAB/ABAB, ABABAB) e RONDÓ DUPLO (uma estrofe de cinco versos, uma de três e outra de cinco, acrescentando-se à segunda e à terceira, à guisa de “ quebrado”, o hemistíquio inicial da composição, segundo o esquema AABBA/AABQ/AABBAQ), além  de um novo tipo, inexatamente chamado RONDÓ REDOBRADO, que seria talvez um RONDÓ QUÁDRUPLO, formado de quatro estrofes e cinco versos e três de três, todas com “quebrado”, exceto a primeira, segundo o esquema  AABBA/AABQ/AABBAQ/ AABQ/AABBAQ/ AABQ/AABBDQ.

•             ACRÓSTICO – Composição de pouco valor literário cujas letras iniciais de cada verso formam, numa leitura vertical, uma palavra.

•             PARLENDA  -  Composição ritmada e divertida muito apreciada pelo público infantil.

Exemplo clássico:

                             “Amanhã é domingo,
                             pé de cachimbo
                            .................................”

*EPIGRAMA  -  Poema curto e satírico.

*ACALANTO  -  Canto suave para embalar o sono.

•             PANTUM  -  Poema estrófico formado por uma sequência de quartetos.
•            
•             PASTORELA  -  Poema que pode ter seis ou mais estrofes, não ultrapassando o número de trinta.


•             VILANELA  -  Composição estrófica constituída de uma sequência de tercetos.

•             VILANCETE  -  Forma arcaica de glosa.

•             DITIRAMBO  -  Composição que exalta os prazeres do vinho e da mesa.

•             EPITALÂMIO  -  Composição que celebra o matrimônio ou o noivado.

•             BARCAROLA  -  Poema sentimental e melodioso relacionado com as águas.

•             MADRIGAL  -  Pequena composição poética que encerra um galanteio.

•             PARÁBOLA  -  Narrativa alegórica que encerra um ensinamento moral.

TENÇÃO  -  Segundo Massau Moisés (DICIONÁRIO DE TERMOS LITERÁRIOS), tenção é a “modalidade poética medieval, originária da Provença, constituída de um debate ou discussão
   
entre dois trovadores, cada qual a defender um ponto de vista ou ideia. Poema dialogado, girava sobretudo em torno de questões amorosas, mas acolhia temas políticos, morais ou imaginários.”

•             EPICÉDIO  -  Espécie de poema elegíaco que entre os gregos designava o canto plangente.

8.8  -  ESTROFES

        parelha
        terceto
        quarteto
        quintilha
        sextilha
        setena
        oitava
        novena
        e décima.

C O M E N T Á R I O   N]  32

     Estrofe é um conjunto de versos. Uma linha em branco separa uma estrofe  de outra.
     O poema classifica as estrofes quanto ao número de versos:
     - parelha: 2v.
     - terceto: 3v.
     - quarteto: 4v.
     - quintilha: 5v.
     - sextilha: 6v.
     - setena ou setilha: 7v.
     - oitava: 8 v.
     - novena: 9v.
     - décima: 10v.

 8.9  -  MEDIDA

          ...........................
          redondilha menor
          redondilha maior
          ..........................
          hendecassílabo
          dodecassíllabo.

C O M E N T Á R I O     Nº 33

     Para não ficar enfadonho, o poema relaciona apenas quatro tipos:

     - redondilha menor: v. de 5 sílabas
     - redondilha maior: v. de 7 sílabas
     - hendecassílabo: v. de11 sílabas
     - dodecassílabo: v. de 12 sílabas.                       

8.10  -  RIMA

         perfeita ou imperfeita
         identidade sonora
         em início em meio
         ou em fim do verso.

  toante  -  se se dá  a partir de vogal tônica
  de derradeira palavra de cada verso,
  consoante  -  se ocorre só entre vogal tônica
  de derradeiro signo de cada verso.

  mais:
  rara
  rica
  pobre
  grave
  aguda
  esdrúxula
          A
          B
          A
          B

          A
          B
          B
          A

          A
          A
          B
          B.

C O M E N T Á R I O     Nº  34

     Rima é a identidade sonora entre palavras dos versos, podendo ocorrer no início, no meio ou no final deles.
     O poema enumera vários tipos de rima:

- PERFEITA: Identidade sonora e gráfica a partir da vogal tônica da palavra: mistério/cemitério.

- IMPERFEITA: Falta de identidade  quanto ao timbre: museu/céu.

- CONSOANTE: A que só apresenta semelhança na vogal tônica: forte/ocorre

- TOANTE: A que apresenta semelhança de consoantes e vogais: vida/querida.

- RARA: Ocorre entre palavras com sonoridade incomum: arriba/Parnaíba.

RICA: Entre palavras pertencentes a diferentes categorias gramaticais: povo /novo.

- POBRE: Entre palavras da mesma categoria gramatical: povo/ovo.

- GRAVE: Entre palavras paroxítonas: menino/sino.
- AGUDA: Entre palavras oxítonas: caju/tatu.

- ESDRÚXULA: Entre palavras proparoxítonas: árvore/mármore.

     Em seguida o poema classifica as rimas quanto à disposição:

     - alternadas: a-b-a-b
     - encadeadas: a-b-b-a
     - emparelhadas: a-a-b-b.

 8.11.  -  FIGURAS DE PALAVRAS
          
            o que compAra: metáfora                     
                      o que nomEia: antonomásia
                      o que aproxIma: comparação
                      o que relaciOna: metonímia
                      o que sUpre: catacrese

               C O M E N T Á R I O     Nº  35

     As figuras de linguagem ou de estilo constituem formas elegantes de expressão do pensamento.
     Além das citadas na série de três poemas, há muitas  outras figuras, como as de construção (anadiplose, anáfora, anástrofe, antanáclase, epanáfora, epístrofe, epizeuxe, etc.) e as de efeito sonoro: aliteração, assonância, onomatopeia.
     O poema em análise trata das figuras de palavras,  que consistem na mudança ou troca no significado das palavras, sendo também chamadas de tropos.
     Observe-se  que os poemas sobre figuras apresentam caprichosamente em destaque as vogais tônicas na sequência A-E-I-O-U.
      A composição relaciona as seguintes figuras de palavras:

•             METÁFORA: De acordo com Aristóteles (POÉTICA), “a me-
táfora consiste no transportar para uma coisa o nome de outra, ou do gênero para a espécie, ou da espécie de uma para a espécie da outra, ou por analogia”. Em outras palavras: metáfora é o uso de um termo com significado de outro em razão de uma relação de semelhança entre ambos. É uma comparação implícita ou subentendida, sem a presença dos elementos comparativos.
     No exemplo abaixo temos uma sequência de quatro metáforas, todas relacionadas com a ideia de morte:

                     por que te chamam a megera fria
                     ou das trevas a eterna namorada
                     ou a amante de garras assassinas
                     ou a ignorada das ignoradas?
                                 (Alcenor Candeira Filho  -  MORTE)


•             ANTONOMÁSIA: Designação de uma coisa ou pessoa, não pelo seu nome mas pela qualidade que a notabiliza.
•                  Exemplo: Moro na Princesa do Igaraçu (por Parnaíba).

•             COMPARAÇÃO: É a aproximação de dois termos entre os quais existe alguma relação de semelhança. Distingue-se da metáfora porque se utiliza de conectivos comparativos.

•             Exemplo:

                                   mergulho nos quarenta anos de idade
                                   como um lobo raivoso e descontente.
                        (Alcenor Candeira Filho  -  SONETO DOS   QUA-
                        TA ANOs)


*METONÍMIA: Consiste no emprego de uma palavra em lugar de outra por haver entre elas alguma relação.
     Ocorre quando se usa:
     -o autor pela obra: Ler Camões.
     - o  possuidor pelo possuído: Ir ao barbeiro.
     -  o possuído pelo possuidor: Na Síria não descansam as armas.
     - o lugar pela coisa: Ir ao banco.
     - o lugar pelo produto: Tomar champanha.
     - o continente pelo conteúdo: Comer todo o prato de arroz.
     - o singular pelo plural: Todo homem é livre.
     - a parte pelo todo: Procuro um teto para morar.


•             CATACRESE:  Uso de uma palvra em sentido diferente do real para suprir uma deficiência  da língua.
Exemplo: Braço  de cadeira.
    
8.12.  -  FIGURAS DE SINTAXE

          se desgArra: anacoluto.
          se excEde: polissíndeto
          se mÍngua: assíndeto
          se transpÕe: hipálage
          se ocUlta: elipse


C O M E N Á R I O     Nº  36

•             ANACOLUTO:  Consiste em deixar um termo solto na frase, sem função sintática definida.
•             Exemplo: A vida, eu não quero discutir sobre isso.

•             POLISSÍNDETO:  Repetição do conectivo.

Exemplo:

                    (...)
                e o morto
                é murcho
                e mudo
                e surdo
                e cego
                e vento
                e frio
                e nuvem
                e tudo,
                

                aqui
                            ali
                                     além
               amém.
          (Alcenor Candeira Filho  -  O MORTO)


•             ASSÍNDETO: Supressão de conectivo.
Exemplo: Maria brincava, Pedro dormia.


•             HIPÁLAGE: Transposição de termos na frase.
No último verso do  poema abaixo o adjetivo “pressurizado” caracterizaria normalmente o “avião”, que de fato é pressurizado, e não o “vôo”:

                     no aeroporto de Parnaíba
                     (por lei agora internacional)
                     só se vêem acrobáticos vôos
                     de urubus rolinhas gaviões
                     - não o vôo pressurizado de aviões.          
                                       (Alcenor Candeira Filho  -  AEROPORTO)
  

•             ELIPSE: É o ocultamente de um termo, que fica subentendido pelo contexto.
Exemplo: Sou parnaibano; ele, teresinense.
  
8.13.  -  FIGURAS DE PENSAMENTO

              quando abrAnda: eufemismo
              quando exagEra: hipérbole
              quando contradIz: paradoxo
              quando opÕe: antítese
              quando fUnde: sinestesia


C O M E N T Á R I O     Nº  37

     Conforme Massaud Moisés (DICIONÁRIO DE TERMOS LITERÁRIOS), as figuras de pensamento “dizem respeito aos pensamentos (auxiliares) , encontrados pelo sujeito falante para a elaboração da ‘matéria’ e, por conseguinte, são, em princípio, objeto da ‘inventio.’”
     Além das citadas no poema, podem ser lembradas ainda a ALEGORIA, ANTÍFRASE, APÓSTROFE, LITOTES, PROLEPSE, etc..
     Cuidemos  das figuras de pensamento mencionadas nos versos:

•             EUFEMISMO:  Atenuação de ideia ou  de expressão. Adocicação de termos.
Exemplo:

                        ainda que marcado encontro
                        sem chance de desencontro                    
                        haverás de ser para sempre
                        bem para além de bem-amado.
                              (Alcenor Candeira Filho  -  SONETO
                              DO MARCADO ENCONTRO)


•             HIPÉRBOLE: Consiste em exagerar para mais ou para menos as quantidades dos objetos.
Exemplo:

                           o chumbo
                           das armas covardes
                           pesava toneladas
                           ..............................
                           (Alcenor Candeira Filho  -  PASSANDO
                           EM REVISTA)


*PARADOXO:  Proposição aparentemente absurda, resultante da reunião de ideias contraditórias.
Exemplo:

                            larga estrada enquanto curta,
                            estreita se quilométrica,
                            ó sinuosa linha reta,
                            - via imensa e diminuta.
                                  (Alcenor Candeira Filho  -  FUNDO E FORMA)

                      
•             ANTÍTESE: Emprego de termos de sentidos opostos.
Exemplo:

            Ó lírios brancos deste mundo negro!
                    (Alcenor Candeira Filho  -  MOMENTOS DE
                    ANGÚSTIA


•             SINESTESIA: É a interpenetração de planos sensoriais (auditivos, visuais, olfativos...)
•             Exemplo:  Um doce abraço (doce=sensação gustativa; abraço= sensação tátil).


                           BIBLIOGRAFIA          
                                                                         
A)           RELATIVA À ”INTRODUÇÃO”
                                            
ANDRADE, Carlos Drummond de. “Reunião”  -  10 Livros de Poesia. – Rio de Janeiro, J. Olympio, 3ª edição, 1973.

ARISTÓTELES. “Arte Retórica e Arte Poética”. Rio de Janeiro, Edições de Ouro, s/d..

BAUDELAIRE, Charles. “As Flores do Mal”. Tradução de Ivan Junqueira. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1985.

BILAC, Olavo. “Olavo Bilac”  -  Literatura Comentada -, Abril Educação, 1980.

DIAS, Gonçalves. “Gonçalves Dias”  -  Literatura Comentada -, Abril Educação, 1982.

FAUSTINO, Mário. “Poesia Experiência”. São Paulo, Editota Perspectiva Ltda., 1976.

MELO NETO, João Cabral de. “Poesias Completas”. Rio de Janeiro, J. Olympio, 2ºª edição 1975.

MOTA, Mauro. “Antologia em Verso e Prosa”. Rio de  Janeiro, Editora do Autor, 1966.

PESSOA, Fernando. “Guardador de Rebanhos e Outros Poemas”. São Paulo, Círculo do Livro S.A., s/d.

POUD, Ezra. “A Arte da Poesia”. São Paulo, Editora Cultrix Ltda., 1976.

QUINTANA, Mário. “Antologia Poética”. Rio de Janeiro, Editora do Autor, 1966.

SOUSA, Cruz e. “Cruz e Sousa” (Nossos Clássicos). Rio  de Janeiro, Agir, 7ª edição, 1994.



B)           RELATIVA AO RESTANTE DO LIVRO

ARISTÓTELES. “Arte Retórica e Arte Poética”.  Rio de Janeiro, Edições de Ouro, s/d.

CAMPOS, Geir. “Pequeno Dicionário de Arte Poética”. Rio de Janeiro, Conquista, s/d.

CANDEIRA FILHO, Alcenor Rodrigues. “Das Formas de Influência na Criação Poética”. Teresina, Secretaria da Cultura Desportos e Turismo/Fundação Cultural do Piauí, 2ª edição, 1988.

          - “O Crime da Praça da Graça”. Parnaíba. Gráfica e Editora SIEART, 2008.

          - “No Reino da Poesia  -  Exercícios de Metalinguagem”. Teresina, Academia Piauiense de Letras, 2001.

          “Teoria do Texto e Outros Poemas”. Parnaíba, Gráfica e Editora SIEART, 2006.

COUTINHO, Afrânio. “Notas de Teoria Literária”. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1976.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. “Novo Aurélio Século XXI: o dicionário de língua portuguesa”. Rio de Janeiro, 3ª edição, 1999.

HOUAISS, Antônio e Villar, Mauro. “Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa”. Rio de Janeiro, Objetiva, 1ª edição, 2001.

MOISÉS, Massaud. “A Criação Literária. São Paulo, Edições Melhoramentos, 1973.

          - “Dicionário de Termos Literários”.São Paulo, Editora Cultrix, 2ª edição, 1978.

MOURA, Francisco Miguel de. “Literatura do Piauí”. Teresina, EDUFPI, 2ª edição, 2013.

PARA GOSTAR DE LER: Crônicas/ Carlos Drummond de Andrade...[et al.]. São Paulo, Editora Ática S.A., 1980.

POUND, Ezra. “A Arte da Poesia”. São Paulo, Editora Cultrix Ltda., 1976.

PROENÇA FILHO, Domício. “Estilos de Época na Literatura”. Rio/São Paulo, Editora Liceu, 2ª edição, 1969.

                     N O T Í C I A    S O B R E    O    AUTOR

     Alcenor Rodrigues Candeira Filho: parnaibano (1947).
     Pais: Alcenor Rodrigues Candeira e Maria de Lourdes Castelo Branco Candeira.
     Esposa: Ana Lúcia Cerqueira Candeira.
     Filhos: Dina, Diana e David de Carvalho Candeira.
     Professor, escritor, advogado e procurador federal aposentado.
     Foi professor nos seguintes estabelecimentos de ensino: Colégio Comercial União Caixeiral, Escola Roland Jacob, Colégio Cobrão e Campus Ministro Reis Velloso/Universidade Federal do Piauí.
     Outros cargos exercidos: assessor jurídico da Federação das Indústrias do Estado  do Piauí, vice-diretor do Campus Ministro Reis Velloso, agente da previdência social em Parnaíba, procurador regional do INSS, secretário municipal de educação e secretário municipal da gestão.


OBRAS  PUBLICADAS:

A)           POESIA: “Sombras entre Ruínas” (1975), “Rosas e Pedras” (1976), “A Insônia da Cidade” (1991), “Antologia Poética” (2004 e 2016), “Parnaíba: Meu Universo” (2014)
B)           PROSA: “Das Formas de Influência na Criação Poética” (1980 e 1985), “Aspectos da Literatura Piauiense” (1994),  “Redação no Vestibular” (1996-2000), “Literatura Piauiense no Vestibular (1996-2000).

C)           PROSA  E  VERSO: “Memorial da Cidade Amiga” (1998), “No Reino da Poesia” (2001), “O Crime da Praça da Graça (2008), “Seleta em Prosa e Verso” (2010).

domingo, 19 de fevereiro de 2017

Seleta Piauiense - Nelson Nunes


Clarice

Nelson Nunes (1954)

Clara mente a se alimentar do plasma.
Plástica sensação a vibrar-me o corpo.
Paralelo traçado entre o perfeito e o sublime. 
Cada palavra composta no fluxo do instante-já.

Entre mentes sobressai a ponta da estrela
a brilhar em girassóis da terra distante. 
Sangue sangue sugo tinto vinho verde musgo
da veia aberta de teu coração de riso russo.

Ferido feliz perto do coração selvagem,
desperto na noite de um sonho acredoce. 
E do parto sofrido das entranhas do tempo
parto pungido na direção de tua claridade.  

Fonte: site Jornal de Poesia            

sábado, 18 de fevereiro de 2017

METAPOEMAS COMENTADOS (continuação)

Fonte: Google

METAPOEMAS  COMENTADOS (continuação)

Alcenor Candeira Filho

5.            CRÔNICA       
     
     flagrante da vida real                   
     notícia do dia a dia
     para revista ou jornal.

     fino texto bom na lavra
     de Machado de Drummond
     de Veríssimo de Braga...

     crítica sempre num ponto:
     mesmo muito semelhante
     não se confunde co’o conto.

C O M E N T Á R I O     Nº 23

     Como está escrito na primeira estrofe, crônica é o registro de fatos cotidianos, sendo publicada via de regra em jornais, revistas, blogues, portais.
     Um dos maiores críticos literários do Brasil, Antônio Cândido,
diz no prefácio de um livro que reúne crônicas de quatro grandes cultores do gênero:

                                         “A crônica não é um gênero maior. Não
                    se imagina uma literatura feita de grandes cronistas,
                    que lhe dessem o brilho universal dos grandes ro-
                    mancistas, dramaturgos e poetas. Nem se pensaria
                    em atribuir o Prêmio Nobel a um cronista, por me-
                    lhor que fosse. Portanto, parece mesmo que a
                    crônica é um gênero menor.
                                            (...)

                                            Graças a Deus, - seria o caso de dizer,
                     porque sendo assim ela (a crônica) ficou perto de
                     de nós. E para muitos pode servir de caminho não
                     apenas para a vida, que ela serve de perto, mas para
                     a literatura.”

     A segunda estrofe faz referência a grandes cronistas brasileiros  -  Machado de Assis, Carlos Drummond de Andrade, Luís Fernando Veríssimo e Rubem Braga  -, enquanto a derradeira lembra que, apesar das semelhanças, crônica e conto não se confundem.

6.            CRÍTICA
       
     crítica aberta
     crítica autônoma
     impressionista
     historicista
     ideológica
     reflexiva
     não dogmática...
     sobretudo
     texto
     sobre
     texto
     a pretexto
     de opinar.

C O M E N T Á R I O      Nº  24

     A crítica literária tem por objetivo o estudo dos gêneros literários.
     A crítica tradicional até recentemente era voltada para a análise dos elementos extrínsecos  ou exteriores da obra literária: meio, raça, momento. É a crítica de feição histórica, sociológica e biográfica.
     A crítica moderna é a crítica estética, voltada para os elementos intrínsecos da obra literária.
     Das modalidades de crítica mencionadas no poema destaca-se a crítica impressionista, “expressão das impressões despertadas no espírito do crítico pelo contacto com as obras”, segundo Afrânio Coutinho.

7.            POEMA
         
7.1          – TEORIA DO POEMA – I
            
                          intuitiva arte
                          da tinta na folha
                          branca de papel.
                          arte da palavra

                          carregada em parte
                          de significado
                          e em parte repleta
                          de significante

                           que harmonicamente
                           unem-se e completam-se
                           a fim de que o poema

                          (através de um verso
                          que seja somente)
                          sobreviva ao poeta.

C O M E N T Á R I O     Nº  25

     O soneto acima se propõe definir o poema: arte da palavra carregada de significado (fundo) e de significante (forma) que harmonicamente convivem.
     Se de certa forma literatura é “ânsia de imortalidade” e se “a vida é breve e a arte longa”, então o poeta deseja que pelo menos uma linha poética a ele sobreviva.

7.2          – TEORIA DO POEMA  -  II
      
                  melodiosa palavra
                  não melosa entretanto
                  palavra com ideia
                  tão livre quanto vento.

                  palavra para o ouvido musical
                  palavra para a imaginação visual
                  palavra para o pensamento real
                  código para se decodificar.

                  palavra que na síntese
                  das sínteses poundianas
                  é sinal igual a

                  melopeia
                  fanopeia
                  logopeia.

C O M E N T Á R I O     Nº  26 
                         
     A poesia é um fenômeno linguístico e estético destinado a ser lido ou ouvido e decodificado pelo leitor.
     Poesia é expressão rítmica do belo, sendo elaborada com palavras melodiosas mas não melosas, palavras livres como o vento, palavras para:
     - o ouvido musical (melopeia)
     - a imaginação visual (fanopeia)
     - o pensamento real (logopeia).
     O soneto em tela contém uma referência ao poeta e ensaísta Ezra Pound, que no livro A ARTE DA POESIA: ENSAIOS ESCOLHIDOS ensina:

                                                “Se eliminarmos as classificações que
                    se aplicam à forma exterior da obra, ou à sua cir –
                    cunstância, e se examinarmos o que realmente acon-
                    tece, digamos, na poesia, verificaremos que a língua-
                    gem está carregada, ou energizada, de várias manei-
                    ras.
                                                 Vale dizer, há três espécies de poe-
                   sia:
                   Melopeia, na qual as palavras estão carregadas, aci-
                   ma e além de seu significado comum, de alguma qua-
                   lidade musical que dirige o propósito ou tendência
                   desse  significado. Fanopeia, que é uma atribuição de
                   imagens à imaginação visual. Logopeia, a dança do
                   intelecto entre palavras, isto é , o  emprego das pala-
                   vras não apenas por seu significado direto mas levan
                   do em conta, de maneira especial, os hábitos de uso,
                   do contexto que esperamos encontrar com a pala-
                   vra, seus concomitantes habituais, suas aceitações
                   conhecidas e os jogos de ironia.”   
             
7.3          – INFLUÊNCIAS LEGÍTIMAS

                              paráfrase
                              paródia
                              centão
                              alusão
                              tradução
                              imitação.
                              poema:
                              tudo de velho
                              sob o céu
                              tudo de novo
                              sobre a terra.

C O M E N T Á R I O     Nº  27
 
     Embora cientes de que a expressão escrita criativa é um fenômeno pessoal, subjetivo e intransferível, - não se conhecem escritores que se abasteçam só em seus próprios celeiros. Direta ou indiretamente, consciente ou inconscientemente, todos se nutrem em obras alheias.
     No livro DAS FORMAS DE INFLUÊNCIA NA CRIAÇÃO POÉTICA, reporto-me às várias formas de influência citadas no poema em análise:

•             PARÁFRASE: No DICIONÁRIO AURÉLIO SÉCULO  XXI está
registrado:

                                            “PARÁFRASE. [Do grego ‘paráfrasis’, pe-
                                   do latim ‘paraphrase’] S. f.  1. Desenvolvi-
                                     do texto de um livro ou de um documento
                                     conservando-se as ideias originais; metá –
                                     frase.”

     Exemplo:
       
              PARÁFRASE DO POEMA “MEMÓRIA”, DE C. D. A

                                    Realizar a paz
                                    não pode,  jamais,
                                    o homem, meu irmão.

                                    Nada pode o horror
                                    contra a ordem de amor
                                    à pátria, à nação.

                                    As coisas terríveis
                                    tornam-se insensíveis
                                    ao pé do canhão.

                                    E as guerras sangrentas,
                                    bem mais que violentas,
                                    permanecerão.

                                            MEMÓRIA
                                                 (Carlos Drummond de Andrade)

                                    “Amar o perdido
                                    deixa confundido
                                    este coração.

                                    Nada pode o olvido
                                    contra o sem sentido
                                    apelo do Não.

                                    As coisas tangíveis
                                    tornam-se insensíveis
                                    à palma da mão.

                                    Mas as coisas findas,
                                    muito mais que lindas,
                                     essas ficarão.”


•             PARÓDIA – Palavra oriunda do grego “paroidia”, canto ao lado de outro. “Designa toda composição literária que imita, cômica ou satiricamente, o tema ou/e a forma de uma obra séria. O  intuito da paródia consiste em ridicularizar uma tendência ou um estilo que, por qualquer motivo, se torna conhecido e dominante” (Mas-
soud Moisés  -  DICIONÁRIO DE TERMOS LITERÁRIOS).
Exemplo:

                       “Minha terra tem palmares
                       Onde gorjeia o mar
                       Os passarinhos daqui
                       Não cantam como os de lá.
                                  (...)
                        Não permita Deus que eu morra
                        Sem que volte pra São Paulo
                        Sem que veja a Rua 15
                        E o progresso de São Paulo.”

                                   (Oswald de Andrade  -  CÂNTICO DE RE-
                                   GRESSO `PÁTRIA)

                        Minha terra tem palmeiras,
                        Onde canta o Sabiá.
                        As aves, que aqui gorjeiam,
                        Não gorjeiam como lá.
                                        (...)
                        Não permita Deus que eu morra,
                        Sem que eu volte para lá;
                                         (...)
                        Sem que ainda aviste as palmeiras,
                        Onde canta o Sabiá.”

                               (Gonçalves Dias  -  CANÇÃO DO EXÍLIO)

•             CENTÃO  -  Do latim “centone” (espécie de manta feita de retalhos cosidos uns aos outros para vários fins), o centão é o tipo de poema constituído mediante o agrupamento de versos de vários autores.
     Exemplo:
                               
             Estou contigo, Drummond:
             “A vida não presta.”
             Estou contigo, Bandeira:
             “A vida
             não vale a pena e a dor de ser vivida.”                          
             Estou contigo, Casimiro:
              “A vida é um deserto aborrecido.”

             Mas não nos matemos.
             Não nos matemos de jeito algum.
             Afinal de contas
             (e aqui estou contigo, Oliveira Martins),
             Cumpre-nos “perceber que da vida
             Nem vale a pena nos desfazermos dela.”

                                  (Alcenor Candeira Filho  -  QUASE CEN-
                                  TÃO)

     O poema remete aos poetas brasileiros Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Casimiro de Abreu e ao escritor português Oliveira Martins.

•             ALUSÃO  -  Do latim “allusione” (chegar brincando, indiretamente), alusão é o recurso de estilo de referência, intencional ou não, a outro texto literário.
Exemplo:

                                “Nem um botão de ca-
                                misa nem um fiapo de
                                roupa nem um simples
                                relógio de pulso pra
                                identificar o homem
                                e sua hora.”

                       (Cassiano Ricardo – O HOMEM E SUA HORA)

     O texto faz alusão ao livro O HOMEM E SUA HORA, do grande poeta piauiense Mário Faustino, falecido precocemente em desastre aéreo no Peru, em 1962.

•             TRADUÇÃO – A arte de traduzir não consiste simples-
mente na substituição de palavras de um idioma por palavras de outro, mas no trabalho consciente da passagem
de um texto para outra língua, exprimindo um cunho artístico.
     A tradução de um texto poético, principalmente, requer uma habilidade artística toda especial, exigindo do tradutor
a assimilação do espírito do texto original e um profundo conhecimento dos segredos do seu aspecto formal, a fim de que possa alcançar não somente a equivalência semântico-expressiva, mas sobretudo o equilíbrio nos efeitos sonoros.
     Tratando das dificuldades que surgem no ato/arte de traduzir obra literária, Kurt Clason  -  citado em FENOMENOLOGIA DA OBRA LITERÁRIA por Maria Luíza Ramos – exemplificou a questão com uma passagem de GRANDE SERTÃO: VEREDAS, em que o romancista dizia que os cavaleiros passavam “feito faca, feito flexa, feito fogo”. A tradução literal destruiria a imagem acústica presente na frase, pois desapareceria a aliteração fricativa que, seis vezes repetidas, traz conotação de velocidade. Preferiu então o tradutor substituir as palavras do original, de modo a “criar” nova imagem acústica dentro do mesmo campo semântico estabelecido pelo romancista. E a frase transformou-se em “Wie die Welle, Wir der Wind, Wie der Wille, ou seja, como “como a vaga, como o vento, como a vontade”.
     A transformação efetuada no texto alemão através da alteração de palavras do original não configura exemplo do aforismo italiano  -  “traduttori, traditori” –, significando em
verdade que o tradutor penetrou com intensidade no espírito do romancista, captando-lhe o pensamento tal como  vivido interiormente.

•             IMITAÇÃO  -  Do latim “imitatione”, que significou inicialmente “cópia”, passando depois a referir-se a inúmeras diversidades semânticas.
     A imitação pode configurar-se só quanto ao aspecto formal, ou seja, quanto à linguagem, entendida  como a expressão de palavras, frases, fonemas e imagem visual. Exemplo: Camões que, em OS LUSÍADAS, seguindo uma das características do classicismo, imitou a Virgílio. E foi o que fez Frei José de Santa Rita Durão, cujo poema épico CARAMURU apresenta quase a mesma estrutura das epopeias tradicionais, particularmente OS LUSÍADAS.
     O poema “Influências Ilegítimas” reafirma no final o fecho do poema “Forma e Fundo”, já comentado neste livro:

                               poema: cabeça        
                                         tronco membros:
                                         nada mais velho
                                         nada mais novo                 

7.4.   -  INFLUÊNCIA  ILEGÍTIMA

                     no  rude
                     reino da hipocrisia
                     onde nada se cria
                     e tudo se copia
                     - não reina a poesia.

C O M E N T Á R I O     Nº  28

     A influência ilegítima se dá através do plágio.
     Do grego “plágios”, pelo latim “plagium”, significando em princípio o que rouba os escravos alheios ou o que compra e vende como escravo uma pessoa livre  -  plágio é um fenômeno diferente de tudo o que foi visto em páginas anteriores, principalmente por ser próprio dos que não têm talento criativo, nem pudor.
     O plágio é a “imitação servil”, consistindo em fazer um autor passar por sua, obra que, na realidade, é de outro. O plagiador esmiúça sempre um estilo alheio, desmonta-o, penetra em seus segredos e peculariedades, esforçando-se para assimilar (para em seguida utilizar) todas as utilezas de técnica de  estilo empregadas pelo escritor-modelo.
     O plagiato é crime, porque não passa  de uma tradução nada judiciosa com que alguém  procura impor-se na vida literária às  custas de talento alheio. O plagiador constrói sempre obras banais, vulgares, imprestáveis.
     Todo autor tem o direito  de ter a obra como sua, sem modificação ou deturpação. Trata-se de   direito perpétuo e inalienável, vinculado à própria personalidade do autor e amparado pela lei civil e pela lei penal. E tal proteção legal não abrange apenas o estilo em si. A criação literária  decorre de dois elementos: a ideia e a palavra, razão pela qual a lei não permite que alguém se aproveite das ideias ou do estilo do autor. “Para os efeitos legais, ensina-nos Carvalho Santos, o atentado representa a mesma gravidade, numa ou noutra hipótese, porque o todo em si, e cada parte desse corpo, merece por igual a proteção da lei. Assim como não permite a lei que  mate alguém e que também se faça  ferimento em qualquer parte do corpo do homem, assim também  não permite a lei que se copie servilmente a obra alheia ou dela se aproprie alguém da ideia, da concepção, da sua alma, na qual muitas vezes está o seu encanto, o seu valor.”
     Abordando o assunto sob o prisma jurídico-penal, Nélson Hungria, em COMENTÁRIOS AO CÓDIGO PENAL, vol. VII, ensina “que só  é criminoso o plágio quando alguém usurpa, pelo menos, trechos importantes da obra alheia ou essenciais de sua estrutura psicológica.”

7.5.   -  ESTILOS DE ÉPOCA

                  pré-barroco
                  barroco
                  (neo)clássico
                  romântico
                  parnasiano
                  simbolista
                  modernista
                  concretista.

C O M E N T Á R I O     Nº  29

     Com esquema rimático  a-a/b-b-b/c-c-c, o poema é uma enumeração  dos principais estilos de época em sequência cronológica:

•             PRÉ-BARROCO  -  Estilo de época que antecedeu o Barroco, iniciado em Portugal em 1580, com a unificação da península Ibérica, e no Brasil em 1601, com o poema épico PROSOPOPEIA, de Bento Teixeira.

•             BARROCO  -  O Barroco, iniciado em Portugal e no Brasil, entre  fins do século XVI e início do XVII, terminou em Portugal em 1756, com a fundação da Arcádia Lusitana, e no Brasil entrou em decadência no século XVIII, terminando em 1768 com a publicação de OBRAS POÉTICAS, de Cláudio Manuel da Costa, livro inaugural do Arcadismo no país.

Características:
- temas contraditórios
- cultismo: jogo de palavras
- conceptismo: jogo de  ideias
-  forte influência do catolicismo
- linguagem complexa: inversões sintáticas, linguagem  
  ornamentada
- malabarismos verbais 
Principais representantes no Brasil: o poeta Gregório de
Matos e o orador sacro  Antônio Vieira.

•             (NEO)CLÁSSICO  - 
     Neoclassicismo, também chamado de arcadismo, é o estilo de época predominante no Brasil a partir da segunda metade do século XVIII.    
          Características:
          - bucolismo e pastoralismo, isto é, o ideal de uma vida
            simples, integrada à natureza
        - o racionalismo: o uso da razão em contraposição à  fé cris-
           tã predominante no barroquismo
        - linguagem simples em substituição ao rebuscamento bar-
          Roco
        - exploração de formas clássicas: soneto, ode, écloga, idílio,
           rondó, madrigal.
     Principais representantes no Brasil: Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga, Alvarenga Peixoto, Silva Alvarenga, Basílio da Gama e Frei José de Santa Rita Durão.


•             ROMÂNTICO  -  O  romantismo nasceu na Europa (Alemanha, Inglaterra e França) em fins do século XVIII e começo de XIX.
•                  Em Portugal: 1825, com o poema “Camões”, de Almeida Garrett.
         No Brasil: 1836,  com “Suspiros Poéticos e Saudades”, de Gonçalves de Magalhães.
     Características:
     - subjetividade: expressa uma visão particular da realidade
     -Idealização: motivado pela fantasia e imaginação, o romântico tende a idealizar vários temas como a mulher, o índio, a pátria
     - paisagismo/ natureza
     - sentimentalismo
     - nacionalismo
     - abrasileiramento da linguagem.
     Principais representantes no Brasil: Gonçalves de Magalhães, Gonçalves Dias, Fagundes Varela, Casimiro de Abreu, Álvares de Azevedo, Junqueira Freire, Castro Alves;  na prosa de ficção: Joaquim Manuel de Macedo e José de Alencar.


•             PARNASIANO  -  O parnasianismo nasceu na França em 1866, com a publicação da coletânea de poemas PARNASSE CONTEMPORAIN.
     No Brasil consolidou-se a partir da década de 1880 com poemas de Alberto de Oliveira, Raimundo Correia e Olavo Bilac.
     Características:
     -  arte pela arte: o objetivo da arte é alcançar a perfeição formal
     - o objetividade: distanciamento da subjetividade romântica
     - rimas ricas e raras
     - o gosto pelo soneto
     - impassibilidade do artista
     - ausência de preocupação social


•             SIMBOLISTA  -  Nascido na França  em fins do século XIX (Verlaine, Mallarmé, Rimbaud), o simbolismo foi introduzido na Brasil pelo poeta catarinense Cruz e Sousa (“Missal”  e “Broqueis”).
Características:
     - reação ao descritivismo parnasiano
     - culto da vaguidade, do mistério, da transcendência, do oculto
     - retorno ao subjetivismo
     - religiosidade
     - linguagem sugestiva: sugerir a realidade e não retratá-l     - fascínio pela cor branca
Principais representantes no país: Cruz e Sousa, Alphonsus de Guimaraens, Da Costa e Silva.


•             MODERNISTA  -  O modernismo foi instaurado no Bradsil em 1922, com a realização em São Paulo  da Semana de Arte Moderna.
Características:
     - valorização poética do cotidiano
     -  utilização incontida do verso livre, isto é, verso que não segue os padrões da metrificação tradicional
     - rompimento com a tradição, com o academicismo
     - nacionalismo
     -renovação e abrasileiramento da linguagem

     O modernismo no Brasil apresenta três fases ou momentos:

- PRIMEIRA FASE:  Corresponde à época iconoclasta do modernismo (1022/1930) em que surgiram movimentos como o PAU-BRASIL (Oswald de Andrade), o ANTROPÓFAGO (Oswald de Andrade), o VERDE-AMARELO (Cassiano Ricardo, Menotti del Picchia e Plínio Salgado)
     Principais representantes: Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Manuel Bandeira, Cassiano Ricardo, Menotti del Picchia, Guilherme de Almeida (poetas); Antônio de Alcântara Machado (romancista e contista).


- SEGUNDA FASE :  Corresponde a 1930/1945, quando surgiram grandes romancistas regionalistas como José Américo de Almeida (A BAGACEIRA), Rachel de Queiroz (O QUINZE), Jorge Amado (SUOR, CACAU, CAPITÃES DE AREIA), Graciliano Ramos (SÃO BERNARDO, VIDAS SECAS), José Lins do Rego (MENINO DE ENGENHO, FOGO MORTO), Érico Veríssimo (CAMINHOS CRUZADOS, OLHAI OS LÍRIOS DO CAMPO).
     Na poesia destacam-se Carlos Drummond de Andrade, Murilo Mendes, Cecília Meireles, Vinícius de Moraes, Jorge de Lima.


-  TERCEIRA FASE :  A partir de 1945.
     Principais representantes:
a)            Na poesia: João Cabral de Melo Neto e Ferreira Gullar
b)           No romance/conto: Clarice Lispector, Guimarães Rosa.

•             CONCRETISTA – A poesia concreta foi iniciada em 1956 no Brasil, tendo como maiores teóricos e poetas Décio Pignatari e os irmãos Augusto e Haroldo de Campos.
Características:
     - poemas curtos, com grande economia de palavras
     - aproveitamento do espaço em branco na folha do papel como elemento orgânico do poema
     - rejeição ao verso e à sintaxe tradicionais
     - poesia visual ou verbivocovisual
Exemplo:

                                     nasc
                                               ente
                                     cresc
                                               ente
                                     do
                                               ente
                                     po
                                               ente.

                                      (Alcenor Candeira Filho  -  VIDA)

     Quando surgiu em meados do século XX a poesia concreta, muitos perceberam nela a marca da originalidade na medida em que se abandonou o elemento rítmico do poema tradicional, com desprezo aos esquemas analítico-discursivos da sintaxe clássica.
     Mas um exame mais rigoroso do assunto mostra que essa técnica do aproveitamento do elemento visual, que põe o estrato fônico em plano secundário, não exprime originalidade absoluta.
     No Egito já se cultivava a arte figurativa, assim como na Época Medieval.
     No Brasil, à época do romantismo, já se conhecia o poema visual, como neste exemplo de Fagundes Varela, em que o espaço gráfico apresenta função orgânica no poema, dando-lhe a forma de uma cruz:

                                “Estrelas
                                Singelas,
                                Luzeiros,
                                Fagueiros,
          Esplêndidos orbes, que o mundo aclarais!
          Desertos e mares, - florestas vivazes!
          Montanhas audazes que o céu tapetais!
                               Abismos
                               Profundos:
                               Cavernas
                               Eternas!
                               Extensos,
                               Imensos
                               Espaços
                               Azuis!
                      Altares e troncos,
          Humildes e sábios, soberbos e grandes!
          Dobrai-vos ao vulto sublime da cruz!
           Só ela nos mostra da glória o caminho!
           Só ela nos fala das leis de – Jesus!”
    
     Da Costa e Silva, parnasiano e simbolista, também empregou esse processo de solução formal na poesia “Madrigal de um Louco”, pertencente ao livro ZODÍACO.

7.6  -  GÊNEROS

      bucólico para o pastor
      épico para o herói
      satírico para o alédico
      lírico para o sonhador
      didático para o professor
      dramático para o ator.

C O M E N T Á R I O     Nº  30

     No PEQUENO DICIONÁRIO DE ARTE POÉTICA, registra Geir Campos no verbete “Gêneros Poéticos”: “Aplicando  à sua  classificação as funções da linguagem (‘representativa’, ‘expressiva’, ‘atuativa’) a estilística moderna divide os GÊNE-
ROS  POÉTICOS em três: ÉPICO, LÍRICO e DRAMÁTICO. Os gregos contavam cinco, acrescentando a estes três o BUCÓLICO e o DIDÁTICO; e os latinos somavam mais um, o SATÍRICO. Modernamente colocam-se o BUCÓLICO e o SATÍRICO como espécies de LÍRICO, e o DIDÁTICO como espécie do ÉPICO ou do próprio lírico.”
     Cada verso do poema evidencia a pessoa que preferencialmente é a destinatária.
     Temos assim:

•             BUCÓLICO -  D o grego “boukolikós”, relativo aos pastores, à vida campestre.
     O bucolismo é uma das características marcantes do Arcadismo ou Neoclassicismo, estética literária introduzida no Brasil a partir da segunda metade do século XVIII.
     São poetas representativos do bucolismo no Brasil Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga e Ovídio Saraiva de Carvalho e Silva.


•             ÉPICO  -  Do grego “epikós”, palavra, narrativa, poesia.
      Gênero criado por Homero, com os poemas do século IX a. C. ODISSEIA e ILÍADA.
     Outras grandes obras épicas: DIVINA COMÉDIA, de Dante (século XIV), OS LUSÍADAS, de Camões (1572), ORLANDO FURIOSO de Ariosto (1516) e JERUSALÉM LIBERTADA, de Milton (1580).
     O maior poeta épico em língua portuguesa é Luís Vaz de Camões, autor de OS LUSÍADAS, monumental poema de exaltação ao ilustre  povo português e à sua história, como se vê na abertura (CANTO I, lª e 2º  estrofes):

               “As armas e os barões assinalados
               Que da ocidental praia lusitana,
               Por mares nunca de antes navegados,
               Passaram ainda além da Taprobana,
               Em perigos e guerras esforçados
               Mais do que prometia a força humana,
               E entre gente remota edificaram
               Novo Reino, que tanto sublimaram.

               E também as memórias gloriosas
               Daqueles reis que foram dilatando
               A Fé, o Império, e as terras viciosas
                De África e de Ásia andaram devastando;
                E aqueles que por obras valerosas
                Se vão da lei da morte libertando
                - Cantando espalharei por toda a parte,
                Se a tanto me ajudar o engenho e arte.”

     O poema é constituído de dez cantos, que se desenvolvem através de 1.102 estrofes de oito versos decassilábicos, com o total de 8.816 versos.
     A obra de Camões obedece à estrutura da epopeia clássica ou tradicional, apresentando as seguintes partes:
a)            PROPOSIÇÃO : Apresentação resumida do assunto.
b)           INVOCAÇÃO: O poeta pede a proteção divina para que possa realizar a extensa obra.
c)            DEDICATÓRIA: Dirigida ao rei D. Sebastião, morto precocemente em sangrenta batalha.
d)           NARRAÇÃO: Desenvolvimento dos episódios. Parte mais extensa do poema.
e)           EPÍLOGO: O fecho do poema.


*SATÍRICO  -  Segundo Massaud Moisés, em DICIONÁRIO DE TERMOS LITERÁRIOS,  do “latim ‘satira(m)’, de lanx satura, prato cheio de frutos sortidos que se ofereciam a Ceres, deusa das  sementeiras (‘satum’).”
     A obra satírica visa a ridicularizar defeitos  ou vícios individuais ou coletivos.
    
(Continua na segunda-feira, dia 20.02.2017)