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Oeiras, trezentona
Reginaldo Mirada *
A cidade de Oeiras, no sertão do
Piauí, engalana-se para comemorar trezentos anos de vida política no próximo
dia 26 do corrente mês. Nessa efeméride quero associar-me à gente daquela
terra, que também posso chamar de minha, porque foi em seu antigo termo que se
situaram os primeiros membros de nossa família na época de fundação do lugar.
Longe vão os dias em que ali
chegou o vigário e demais moradores, construindo a capela de taipa e palhas de
pindoba para celebrar as primeiras missas. Desse ato fundador distam trezentos
e vinte anos.
Foi no dia 11 de fevereiro de
1697, na fazenda Tranqueira, residência de Antônio Soares Touguia, que
reuniram-se os moradores indicados na Pastoral do Reverendo Bispo D. Fr.
Francisco de Lima, além de outros sob a liderança do Pe. Miguel de Carvalho,
para eleger o local onde deveria ser edificada a nova igreja matriz. Depois de
discutirem a matéria, “assentaram, votaram e determinaram que se fizesse a
igreja no Brejo chamado a Mocha, por ser a parte mais conveniente aos moradores
de toda a povoação, ficando no meio dela com iguais distâncias e caminhos para
todos os riachos e partes povoadas”. Também acordaram “para lugar da igreja e
casa do Rev. Cura, o tabuleiro que se acha pegado à Passagem do Jatobá para a
parte do Canindé, e para roças e passais do Rev. Cura, e igreja, consignam os
moradores todo o brejo do sobredito riacho da Mocha”. Em seguida lançam-se à
obra, construção simples mas decente, medindo 24 palmos de comprido e 12 de
largo, construída de taipa e cobertura de pindoba. O altar foi feito de tábua,
com 9 palmos de comprido e quatro de largura.
Dezoito dias depois, em 2 de
março de 1697, no Brejo da Mocha, há solenidade de bênção da nova capela e
posse do vigário, Pe. Tomé de Carvalho e Silva. Benzeu também o vigário um
quadro que de redor da capela consignou com marcos de pedra para a sepultura de
defuntos e donde se haveria de edificar a nova igreja, a qual tem cem passos de
comprido e sessenta de largo.
No entanto, esse pároco iria
passar em seus primeiros dias as maiores privações e vexames. Por muitos dias
comeu praticamente apenas farinha e sem sal, dada à falta de alimento. No ano
seguinte, Domingos Afonso Serra, que residia na referida fazenda Tranqueira e
em represália não comparecera à reunião, por ser sobrinho do sesmeiro Julião
Afonso Serra, em cujas sesmarias estava sendo edificada a igreja, desacata o
vigário e destrói “todos os ranchos que estavam sendo levantados para a fábrica
da igreja”.
Intemerato e destemido, o vigário
resiste e os reconstrói com apoio dos fiéis católicos. Em 1699, agrega alguns
moradores ao lugar, que os ajudam a edificar outro templo maior e mais seguro,
este de pedras e saibros. Nesse templo viu-se sitiado com alguns moradores
pelos índios Timbiras, que lançam sobre o mesmo “vários fachos de fogo,
instrumento com que o gentio desbarata aos desprevenidos, mas contra toda a
ordem natural se apagaram”, relatou o vigário.
Em 1700, foi ele colado na matriz
por ato do rei D. Pedro II, de Portugal, cujo ato lhe garantia ser sustentado
pelo recebimento de côngruas da Real fazenda. Porém, esse pagamento nunca
chegava obrigando-o a formular várias cobranças.
Dada à violência praticada por
Domingos Afonso Serra, em 1704 foi enviado o desembargador Carlos de Azeredo
Leite para apurar os excessos cometidos e executar alvará para repartição das
terras das aldeias dos índios e para passais do vigário. Foi então por esse
magistrado concedido ao pároco dessa freguesia de Nossa Senhora da Vitória o
direito aos passais na fazenda da Passagem, com três léguas de terras.
Porém, em face de queixas do
proprietário, em 12 de novembro de 1710, foram revogados esses passais e
permitido ao vigário conservar apenas “a terra que bastasse para o pasto de
três ou quatro cavalos, e outras tantas vacas”.
Em seguida, Domingos Jorge
Afonso, sobrinho e herdeiro do sesmeiro Julião Afonso Serra, através de Carta
Precatória exarada pela Relação da Bahia, notifica os moradores a suspenderem o
pagamento de côngrua ao pároco e pagarem renda a ele proprietário.
Evidentemente, os moradores e os oficiais da câmara opõem embargos alegando
que, na confirmação das sesmarias, Sua Majestade mandava reservar terra para a
fundação das vilas e as mais de que acrescessem os conselhos delas. Finalmente,
esta contenda é vencida por este proprietário em grau de recurso na Corte, cujo
acórdão é publicado em 1732, de toda sorte, garantindo o direito dos
embargantes nas áreas necessárias para manter as edificações e desenvolvimento
da vila.
Aliás, a freguesia foi elevada em
vila por carta régia de 30 de junho de 1712. Porém, em face de alguns problemas
somente foi instalada em 26 de dezembro de 1717, com a denominação de Mocha do
Piauhy e posse dos oficiais da câmara e demais autoridades. É este ato político
de alta significação que ora se comemora: 320 anos de fundação da freguesia e
três séculos de ereção em vila, hoje cidade de Oeiras. Parabéns, oeirenses!
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* REGINALDO MIRANDA é membro da
Academia Piauiense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí e do
Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-PI.
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