Fonte: Google/oglobo |
Cambota
e Fogoió, os dois meninos
Pádua Marques
Escritor e jornalista
Eles foram o terror do
bairro onde moravam quando crianças e já engrossando o talo da pinta
continuaram dando trabalho a todo mundo e vergonha aos pais. Nessa época de São
João, naquele tempo, eles se danavam a correr numa venda pra comprar toda sorte
de fogos, desde os inocentes peidos de velha às terríveis e poderosas bombas de
quinhentos, capazes de levantar por mais de vinte metros uma lata de querosene.
Cambota foi criado cheio
de vontades pelo pai porque nem a mãe aguentou as peraltices dele. Filho único
de um quitandeiro, se esteve algum dia à escola foi somente pra bater nos
outros e no segundo dia de aula ser expulso. O pai achava de dizer que ninguém
precisava estudar pra ganhar dinheiro. Ele mesmo tinha tudo e nunca passou um
dia sequer sentado em banco de escola. Tinha dinheiro na burra e muitos burros
lhe obedecendo.
O menino se criou sozinho
feito bicho bruto, batendo e apanhando na rua e quando era contrariado se
armava de um caco de vidro e corria a rua pra tomar satisfações com o desafeto.
Nesse período de festas juninas ia ele direto na gaveta da quitanda, tirava o
apurado e ia até a esquina comprar traques e bombas. Negócio dele era bomba,
daquelas mais potentes e que incomodavam a vizinhança. Noite toda.
Era um menino feio,
baixo, gordo, cambota, cabelo raspado, calção imundo, fedendo a pena de galinha
molhada. Mesmo tendo todos esses defeitos não era desrespeitoso com os mais
velhos. Algum adulto ralhasse com ele, metia o rabo entre as pernas e procurava
o caminho de casa.
Agora Fogoió não. Fogoió
Azedo como outros e muitos o chamavam pelas costas. Também foi um menino criado
por uma mãe e um pai que faziam tudo aquilo que ele queria. Os vizinhos, quando
ele era ainda criança, passaram poucas e boas com as travessuras dele. Assim
como Cambota, nessa época de São João, transformava a vida do bairro onde
morava num inferno.
Toda a cidade temia pelo
que poderia acontecer quando aqueles dois maus elementos um dia se
encontrassem. Aí o diabo iria sair da garrafa por cima ou por baixo. E este dia
aconteceu num dia de junho. Colocaram o mundo de cabeça pra baixo e tocaram
fogo. Amarraram traques em rabo de cachorros, soltaram bombas debaixo de latas
e dentro de garrafas e explodiram até o muro da igreja. Coisa pouca pra eles.
Este Fogoió Azedo, nunca
foi cria de gente. Criado sim à imagem e semelhança do cão. Quando adulto se
transformou num grande negociante, cheio de enrolada, venda de tudo em quanto
achasse pela frente. Vendia e trocava de tudo, desde geladeira velha, bateria
de carros, pneus, móveis antigos, moedas, terrenos, material de construção,
vergalhão, madeira e se bestasse, até arma de fogo, tudo. Esta semana passada
eu vi dois sujeitos parecidos se cumprimentando na televisão, Trump e Kin-Jong
Um. Meteu medo.
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