Fonte: Todo Estudo/Google |
DIÁRIO
[Elegia prosaica com pitadas crocantes de Bandeira]
Elmar Carvalho
20/07/2020
Nesta
semana, talvez por influência do “clima” da quarentena covidiana, estive
apático, sem ânimo, indisposto, com forte tendência a ficar quieto; sem ânimo e
sem motivação sequer para ler, quanto mais para escrever.
Parece que
esse estado espiritual me afetou até fisicamente, porque me senti como se
estivesse doente, com certo mal-estar em minha saúde. Isso me provocou uma
espécie de cansaço, uma moleza no corpo, uma lassidão geral, que me empurrava
para a inércia. Como no primeiro verso de
Desalento, belo e melancólico poema de Manuel Bandeira, parecia se abater sobre
mim “Uma pesada, rude canseira”. Até me parecia que a sua merencória estrela me
sussurrava “que assim fazia / Para dar uma esperança / Mais triste ao fim do meu
dia.”
Não era bem
uma tristeza e muito menos a famigerada e terrível depressão, mas, como disse,
uma apatia, uma indiferença, uma vontade de nada fazer, de não agir. Talvez
fosse a busca de uma espécie de nirvana sem tristeza e sem alegria, do não ser,
do nada desejar, e por isso mesmo me quedava no tédio dos saciados. Acaso tudo
poderia ser resumido numa simples expressão: falta de vontade.
Uma pequena e fugaz dose de tristeza
pode ser benéfica, por vários motivos, que não desejo aqui enumerar, mas apenas
dizer que ela nos enriquece espiritualmente, porque serve para que
compreendamos a tristeza de nosso próximo e para que valorizemos as nossas conquistas
e os nossos momentos de mais genuína alegria.
O sublime poeta Manuel Bandeira, que
chegou a se classificar, talvez por simples modéstia ou apenas por blague, como
poeta menor, em sua tristeza de tísico e solitário, que conseguiu driblar a
morte, naquele tempo em que a tuberculose ainda não tinha tratamento muito
eficaz, dizia que “Só a dor enobrece e é grande e é pura”, e nos exortava:
“Aprende a amá-la que a amarás um dia.” E ele percebia tristeza até nas “Sempre
tristíssimas (...) cantigas de carnaval”, tão cheias de paixão e traição,
encontros e desencontros e de amores não correspondidos.
Mas no sábado, dia 18, quando iniciei
este registro um tanto elegíaco, comecei a recuperar a minha energia vital.
Aliás, o carregador dessa energia é invisível, e não tem plugues, nem tomadas,
como os de nossos aparelhos eletrônicos.
Sacudi para longe de mim essa lenta
lesma gosmenta, que se me grudava como um velocino venenoso, que me deixava
nessa letargia, nessa sonolência doentia, que não era sono, e vigília não era.
Bandeira, no poema “Não sei dançar”,
afiançou que “Eu já tomei tristeza, hoje tomo alegria”. Eu, admirador de sua
alta poesia, lhe seguindo o exemplo e o conselho, tomei um grande gole de
alegria, e mandei o desalento “da mais profunda melancolia” da Orquídea Negra
de Zé Ramalho para os quintos do inferno, ou, se o leitor preferir, para o
bilinguinguim do inferno de nosso estimado Carlos Said.
E até poderia tocar, como em
Pneumotórax, um tango argentino.
Caro amigo e colega. Primeiro parabéns para nós pelo dia do amigo, segundo parabéns por esta linda crônica que tal como Garcia Marquez ambientou seu romance no tempo do cólera, sua crônica está eivada do sentimento da peste chinesa, da quarentena, do isolamento social e principalmente dos amigos.
ResponderExcluirUm grande abraço digital.
Obrigado pelo seu generoso comentário.
ResponderExcluirRetribuo-lhe os cumprimentos pelo Dia do Amigo.
De uma forma ou de outra, essa pandemia termina nos afetando, mais ou menos.
Abraço.
Parabéns pelo texto bem escrito e atualizado. Dilma
ResponderExcluirMuito obrigado, amiga Dilma.
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