sexta-feira, 8 de julho de 2022

A Insônia e a pedra no meio do caminho

Arte de Elmara Cristina

A Insônia e a pedra no meio do caminho

 

Elmar Carvalho

 

Nesses dias publiquei o meu poeminha Insônia no meu blog e em vários outros sítios da Internet, inclusive no grupo de WhatsApp da Academia Piauiense de Letras. O pequeno poema foi escrito, creio, no final dos anos 80 ou nos 90. Sua gênese, como o nome sugere, foi mesmo uma insônia, que me acontece muito raramente. Hoje me deparei com a seguinte postagem do Comandante Jônathas Nunes, confrade de muita inteligência e argúcia, e de notável sinceridade e franqueza, que considerei pertinente:

“Comandante Elmar,

Mesmo sem rima e sem métrica, seu sugestivo poema INSÔNIA traz a marca inconfundível da veia poética. Desde criança, aprendi a ser reticente a toda poesia desprovida de rima e de métrica. Fui despertado desde bem jovem a admirar o ritmo e a cadência dos poemas de Castro Alves, Casimiro de Abreu, Olavo Bilac, Gonçalves Dias e tantos outros luminares da pirâmide literária brasileira. Sempre vi e vejo, com justa apreensão, ainda hoje, a Semana de Arte Moderna de 1922, no que ela pretendia trazer, no campo da literatura, de ruptura com o passado romântico do sec. XIX. Nesse sentido, cultuo com especial desvelo a produção literária pré-Semana de Arte Moderna, de fevereiro de 1922. A Arte Lusófona desde então, se torna especialmente exigente ao mergulhar nas águas lustrais da crítica literária. Se tudo que é belo é rítmico,  como mergulhar no sentimento de beleza de um poema pós- semana de arte moderna? Inobstante, Drummond conseguiu com maestria e altivez atingir a glória literária, com o poema, hoje universal – No Meio do Caminho Tinha uma Pedra!

 

No meio do caminho tinha uma pedra

Tinha uma pedra no meio do caminho

Tinha uma pedra

No meio do caminho tinha uma pedra.

 

Nunca me esquecerei desse acontecimento

Na vida de minhas retinas tão fatigadas.

Nunca me esquecerei que no meio do caminho

Tinha uma pedra.

Tinha uma pedra no meio do caminho,

No meio do caminho tinha uma pedra.

 

Pasme! Sem métrica e sem rima! Feito pra poucos! Muito poucos! Pouquíssimos!

E agora, décadas após, já em pleno sec. XXI, o nosso estimado Acadêmico Elmar, no poema - INSÔNIA, reedita o fascínio de – NO MEIO DO CAMINHO TINHA UMA PEDRA, de Drummond.

 

INSÔNIA

 

No silêncio abissal

Da noite estagnada

A engrenagem pesada

Do tempo se desenrola

E desaba sobre mim.

 

As botas cadenciadas

Das horas, marcham

- lentas lesmas -

Marcham Infinitamente

Na noite sem fim.

 

DRUMOND deve ter se valido do clima das Alterosas.

ELMAR deve ter provado o Veneno das Horas de Hardi Filho em alguma madrugada mal dormida em Parnaíba.

A  APL  ESTÁ  DE  PARABÉNS.”

 

Em seguida o presidente Zózimo Tavares, um mestre da palavra e da concisão, sem perder o seu senso de humor, cravou o seguinte comentário, que muito me desvanece: “Vê-se, confrade Jônathas, que, em matéria de poesia, o vate Elmar não dorme no ponto.”

Ato contínuo, ao receber o exímio e milimétrico passe, o confrade Reginaldo Miranda, com a sua argúcia e olhos de águia e de Argos, que um bom historiador como ele deve ter, chutou para fazer um gol de placa ou cinematográfico: “Excelente análise e oportuna a comparação com o poema de Drummond. No entanto, percebo pela hora da postagem que o comandante Jônatas também estava com insônia, o que demonstra a produtividade literária nas noites indormidas dos nossos acadêmicos.”

O acadêmico e poeta Luiz Ayrton, não menos apetrechado que os demais colegas, ao receber a pelota, emendou de primeira, em primoroso voleio: “Ótima reflexão. Seria um conflito de gerações? Sou apaixonado pelos poemas não rimados, o poema que brinca com as sílabas e palavras soltas, a poesia visual, a literatura underground…”

Zózimo Tavares voltou à contenda para comentar o comentário do Reginaldo: “E o confrade Reginaldo, como bom fazendeiro, é madrugador.” E, logo em seguida, o do Luiz Ayrton: “Em ambos os casos, a luta com as palavras, como ensinava o Drummond.” Fazendeiro, estudioso e pesquisador, acrescento eu, referindo-me a Miranda.

Não me restou opção, senão agradecer os amigos e confrades pelos seus comentários, todos pertinentes e untados de certa jocosidade, conquanto tenha me dirigido mais ao amigo Jônathas Nunes, que foi o estopim de tudo isso:

“Excelentes e muito inteligentes as suas análises e observações ensejadas pelo meu poeminha Insônia, e muito lisonjeado fico por ele ter sido comparado ao celebérrimo poema drummondiano titulado "No meio do caminho tinha uma pedra".

Devo dizer que lanço mão de rimas, só que sem rigidez, e vez ou outra; e que, embora não use propriamente a métrica, procuro e, às vezes, alcanço polimetrias em certas composições, bem como não dispenso o ritmo das palavras ajustadas e rejuntadas.

Gostei das postagens subsequentes dos confrades. Assim, peço licença a todos para fazer um alinhavado de montagens e compor um texto a várias mãos, que publicarei aqui e em outros sítios internéticos. Obrigado a todos os amigos e confrades!”

Espero tenha saído esse texto uma aconchegante colcha de retalhos, embora sem a beleza das confeccionadas pelas artesãs, já que este costureiro não lhes tem a habilidade e perícia; e tampouco seja um monstro de Frankenstein, por falta de preparo e perícia deste cirurgião.

 

P.s.: após ter enviado o texto acima para os meus contatos, recebi, por WhatsApp, o seguinte comentário do poeta Walter Lima:

“Pesadas de valor e levíssimas palavras no reconhecimento do teu valor de poeta; (A)Note-se Poeta e dos bons da galeria de tantos Vates piauienses.

Nada foge, nada deve,  na produção, na qualidade, no esmero com a Palavra,  aos outros confrades da finíssima arte do poetar....

Parabéns pela riqueza que já tem produzido e também pelo muito que ainda tem a produzir, não no sentido quantitativo, mas sim, no sentido da qualidade.

Muito comparo um poeta a abelha que no silêncio faz seu trabalho tão importante, não precisa do alarde como das hienas, que só vivem de risos histéricos e o apropriar-se da caça alheia.

Avoé Poeta El-Mar!”

Recebi também a seguinte mensagem do Irm.: Fernando Rocha:

"Pela primeira vez, ouso opor minha opinião à sua.  O trabalho traçado por suas palavras, de certo modo, trouxe à minha mente a figura do ponto Paris - utilizado pelas exímias bordadeira da Parnaíba para unir peças da arte do bordado alinhavadas em tecidos avulsos, revelando a beleza do conjunto sem, contudo, desmerecer a beleza individual de cada parte agora unida por este enlace - uniu a singeleza de cada comentário, transformando-os em um único corpo, porém, mantendo-se fiel ao estilo individual de cada pena que os escreveu. Fantástico!

Com um fraterno abraço,

Fernando Rocha

Cadeira 32 da AMALPI

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