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INTOLERANTE, QUEM NÃO O É UM
POUCO?
Antônio Francisco Sousa – Auditor-Fiscal (afcsousa01@hotmail.com)
Não,
não é verdade: nem tudo que aqui se faz, aqui se paga. Até em se tratando de
religiosidade, de crença ou fé, há que se dizer, por mais intolerante que possa
soar, mesmo com relação ao tratamento dado, supostamente, pela natureza, por
Deus, para os ainda mais crentes, ou àqueles que se sintam injustiçados, que
essa história de compensação não é coisa divina; sim, o que nos acontece de bom
ou ruim, às vezes fica assim, sem uma contrapartida ruim ou boa; a gente má
acontecem boas coisas, como péssimas se abatem sobre os pios; todos, claro,
sofremos nossos perrengues, tanto quanto gozamos de momentos que consideramos
felizes. É verdade que alguns se julgam mais felizes do que muitas pessoas que
conhecem; acontece, por vezes, também a essas, de fato, pensarem ou concordarem
com aqueles.
Por
que, de repente, questionar essa quase pétrea opinião ou conceito que permeia
as atividades ou decisões humanas e suas relações com as de cunho sobrenatural?
Com as devidas escusas pela particularização, citarei um: há algumas décadas
sou cobrador de impostos, um publicano seria nos áureos tempos romanos,
contemporâneos de Jesus e seus discípulos; e o que menos, ou quase nunca
encontro, quando aprofundo certas auditorias, é alguém totalmente adimplente
dos tributos que deve; ou seja, compra-se, produz-se ou se toma serviço, mas
não se quita corretamente as obrigações tributárias; quer dizer, nem todas as
dívidas aqui feitas são pagas ou liquidadas Pode até parecer brincadeira,
ironia ou gozação, mas não é. Vejam, observem o ror de incentivos,
refinanciamentos, reengenharias que os governos, vira e mexe, oferecem ou
disponibilizam no intuito de fazer com que os devedores contumazes recolham os
tributos devidos; fato é que, grandes inadimplentes ou exímios caloteiros pagam
um tantinho de suas dívidas – o que, geralmente, deixa os governos felicíssimos
-, depois dão uma parada enquanto esperam as próximas benesses estatais;
pequenos devedores ou os mais recalcitrantes, parece que preferem esperar que
seus débitos cresçam, e o círculo vicioso se realimenta. Aí vem aquele cidadão
que se acha mais esperto e inteligente
que a média, e dispara: também, é “imposto” demais, ninguém aguenta; ao que um
cobrador de tributos, já calejado e cansado de tanta lengalenga, refutaria:
alguns aguentam, sim, amigo: os bons pagadores, aqueles que, muitas vezes,
mesmo sendo vítimas de concorrência desleal, e sabendo que, para eles, quase
nada é oferecido, continuam cumprindo suas obrigações, não apenas tributárias,
mas junto a fornecedores, empregados; é que esses acreditam que o estado não
sobrevive sem tributos; e é graças aos que assim pensam, que os governos vão
tocando o barco; se essa corja de legisladores que, só demagógica e,
hipocritamente, se diz defensora de uma tributação justa – mas que somente fica
no plano das ideias – , pusesse mãos à obra, certamente, todos teríamos vida
mais fácil; o pior é que eles sabem como conseguir isso, bastava que fizessem
sua parte, criando regras, aprovando ou estabelecendo métodos, critérios,
normas tributárias que permitissem a todos – senão à maioria – contribuir de
forma proporcional a suas riquezas; isso evitaria ou, no mínimo, não permitiria
que uns pagassem por outros, sendo que esses outros seriam os que deveriam
pagar por uns.
Por
falar em cobrador de impostos, que em vez de publicanos, ganharam a pomposa
alcunha de auditores e/ou fiscais, dizem que não há quem deles goste,
verdadeiramente. Desconfio um pouco de qualquer regra ou norma que prega ou
busca a generalização como objetivo último; conheço algumas pessoas que, ou
apareceram nos meus caminhos antes de me tornar um fiscal de tributos, ou
depois, e que dizem ter um grande apreço por essa categoria de servidores
públicos; tomara estivesse equivocado quando digo que, particularmente,
acredito que menos desgostam de nós aqueles aos quais conhecemos antes de
ingressarmos no fisco ou de adotarmos essa profissão que, desculpem-me, ainda
muito nos apraz.
De
fato, é normal, até porque há registros históricos que comprovam isso, colocar
ao rés do chão mais sujo a espécie dos cobradores de impostos, as próprias
escrituras sagradas fizeram isso; e olhem que, tanto ou mais no tempo dos
césares do que hoje, os governantes cobravam tributos até de quem não os devia;
ou alguém nunca ouviu ou leu que César tal, por haver gastado além da conta
naquele evento particular, lançaria seus publicanos na praça para tentar
recuperar a riqueza diminuída?
No livro Tratado sobre a Tolerância, a respeito dos cobradores de impostos, citando São Mateus e, depois, concluindo, Voltaire assevera: “” Quem não escuta a igreja seja visto como um pagão e publicano”. Eles são malditos, é verdade, mas não são entregues ao braço secular. Longe de retirar desses cobradores de impostos qualquer prerrogativa de cidadão, foram-lhes dados os maiores privilégios. É a única profissão condenada na Escritura, e é a mais favorecida pelos governos”. Melhor não citar a edição nem a tradução do livro para que, pelo menos, os fiscais tributários mais irascíveis ou os que não leram a obra, não tomem o autor por um grande mentiroso, além de um hipócrita intolerante.
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