segunda-feira, 23 de setembro de 2024

A Casa que Só, Ri

Foto da autoria do autor do texto


A Casa que Só, Ri


Fabrício Carvalho Amorim Leite (*)


A imagem de um passarinho cuidando do ninho, uma lâmpada apagada, uma casa abandonada. Ela vive sem mim, carregando seus temores e ardores.

Vive sem mim, com seus tijolos derretidos, guardiões de recordações — boas, ruins, esquecidas, despedaçadas — daqueles que um dia a habitaram.

A velha casa abriga ninhos de certos ratos, serpentes, baratas, morcegos e formigas que se nutrem sem medo.... Assim como as minhas memórias, que ali ainda se mexem e dormem no escuro.

O chão, corroído por cupins embriagados, azulejos manchados pelos cuspes de bebidas amargas, feridas fétidas e nunca cicatrizadas, testemunha de brigas desalmadas e o eco da solidão de uma família desfeita.

O cheiro de velho, de museu esquecido, daquilo que um dia foi útil e agora jaz em escombros, pairava pelos cômodos como um mau assombro. O Tempo, devorava tudo de dentro para fora, em sua lenta e inevitável transformação.

Mas, numa noite qualquer, a casa, antes morta, voltou a sorrir. Tanto que as telhas, antes deitadas, caíram de pé ao chão como lágrimas de alívio: do ovo do passarinho, nasceu um filhote. A luz se acendeu.

A Casa, Só, Ri, (s)em mim.

 (*) contista e cronista.

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