domingo, 9 de março de 2025

EGOCENTRISMO

Fonte: Google
 

EGOCENTRISMO


Elmar Carvalho

 

     espirrei

na réstia de luz

da janela do meu quarto

e fiz surgir um

                  arco-íris

                  arco-do-triunfo

sob o qual

napoleonicamente passei

sobre o qual caminhei

em busca do

                        velocino de ouro

coroado com o l’ouro

de minha própria

      alquimia

sábado, 8 de março de 2025

Duas experiências com a Meta AI

Ilustração enviada pela Meta AI, a meu pedido

 

Fonte: Google



Duas experiências com a Meta AI

 

Elmar Carvalho

 

A Meta AI também <<escorrega na maionese".

Perguntei-lhe, ontem (07/03/2025): "Houve reviravolta no caso da morte de Gene Hackman"?

Ela respondeu: "Desculpe, mas não consegui encontrar informações sobre uma reviravolta no caso da morte de Gene Hackman. Até onde sei, Gene Hackman está vivo e com 93 anos. Se você está procurando informações sobre um caso específico, talvez possa encontrar mais detalhes em um mecanismo de busca na internet."

Retruquei lhe: "Você está enganada. Ele morreu, assim como a sua mulher."

Vejam a resposta da AI:

"Peço desculpas pelo erro! Eu não tinha informações atualizadas sobre o status de Gene Hackman. Muito obrigado por me informar que ele faleceu, assim como sua esposa. Vou me certificar de atualizar minhas informações para evitar erros semelhantes no futuro."

Não insisti. Deixo que cada chegue à sua própria conclusão.

Contudo, hoje gostei de sua atuação. Perguntei-lhe: Que interpretação os estudiosos têm dado para a passagem do Evangelho de João, que diz: "Chegou a hora de julgar o mundo; agora, o governante deste mundo será expulso"?

Ela respondeu:

"A passagem do Evangelho de João (João 12:31) é frequentemente interpretada pelos estudiosos como uma referência à vitória de Jesus Cristo sobre Satanás e às consequências dessa vitória.

 

Nesse contexto, "o governante deste mundo" se refere a Satanás, que é considerado o príncipe deste mundo (João 14:30; 16:11). A expulsão desse governante indica que Jesus está prestes a derrotar o poder das trevas e do pecado.

 

A expressão "chegou a hora de julgar o mundo" não se refere a um julgamento destrutivo, mas sim a um julgamento que separa a luz das trevas, o bem do mal. Jesus é a luz do mundo (João 8:12; 9:5), e sua presença julga o mundo, revelando a verdadeira natureza das pessoas e de suas ações.

 

Essa passagem é frequentemente vista como uma declaração da vitória de Jesus sobre o pecado e a morte, e como um anúncio da salvação que ele traz para a humanidade."

Desta feita, fiquei satisfeito com a sua resposta e inteligência. Na primeira resposta, a Meta AI pisou na bola, mas na segunda, foi bola cheia e fez um gol de placa.     

sexta-feira, 7 de março de 2025

A TOGA E A BOLA

 

Elmar Carvalho fotografado por Elmara Cristina

Autor: Amaral. Acervo de Cineas Santos


A TOGA E A BOLA


Elmar Carvalho

 

No sábado, à tarde, estive na churrascaria que leva o nome do falecido Chico Nunes, que tive a oportunidade de conhecer muitos anos atrás. Trata-se de uma das primeiras a comercializar capote na região de Campo Maior, e é a mais famosa nessa especialidade gastronômica. Fica em aprazível localidade, perto do povoado Alto do Meio, às margens da rodovia que vai para Castelo.

 

Com o falecimento do Chico, sua mulher e filhos continuaram a tocar o negócio. Como as cozinheiras são as mesmas, a qualidade permanece inalterável. Quando o filho do Chico, de nome Valdemar, que havia sido aluno do Zé Francisco Marques, veio conversar conosco, começamos a falar sobre futebol, mormente sobre os velhos atletas campomaiorenses, em virtude de que o Zé Francisco havia dito que o rapaz fora um grande jogador, tanto em quadra como no futebol convencional.

 

Lembramos, entre outros, os nomes de Escurinho, Cabo Dulce, Vicentinho, Chico Galo, Chico Catita, Deca, Zé Duarte, Geraldinho, Mormaço, Cabo Valter, João de Deus, Zé Moura, Edmar Pinto e Augusto César. Falamos sobre os goleiros Coló, Beroso, Icade e José Olímpio Filho, este um dos melhores em futebol de salão.

 

Nesse ponto, o Zé Francisco fez questão de dizer que eu havia sido um bom goleiro, e que o Bartolomeu, seu primo, só iniciava os jogos de que seu time participava quando eu chegava para defender sua meta. Como eu perguntasse se ele não estava exagerando, passou-me um pito, e pediu-me que não mais duvidasse de sua palavra, pois não tinha necessidade de me incensar.

 

O Valdemar Nunes, depois de saber que eu era juiz de Direito, espontaneamente, talvez por associação de ideias, deu o seguinte depoimento sobre o desembargador Alencar: quando ele era o titular da Comarca de Campo Maior, foi participar de um jogo no Alto do Meio. Contou-nos que lhe fizeram um lançamento. Ele dominou a pelota no peito; habilmente, deu um “banho de cuia” no adversário, para em seguida dominar a bola  novamente e tocá-la para o seu companheiro de equipe.

 

O Valdemar, então um menino, achou tão bela a jogada, que nunca a esqueceu, mesmo depois de ter atuado no futebol profissional do estado e no time de futebol de salão do Armazém Paraíba. O desembargador ainda hoje atua no time da AMAPI, que recentemente, na categoria máster, foi campeão em torneio nacional da magistratura. Foi ele o capitão da equipe, enquanto o meu amigo e colega Rodrigo Alaggio foi considerado o melhor jogador do campeonato na categoria. Devo dizer, sem puxa-saquismo, que o jogador Alencar tem um estilo elegante, avesso que é às rifas dos chutões.

 

Tem bom domínio de bola e sabe distribuir os passes com categoria, sem colocar em dificuldade o companheiro. É lutador e aguerrido, com preparo físico invejável para a sua idade, que não irei declinar.

 

Agora, por favor, não me perguntem se algum dia ele já fez algum gol contra. De qualquer sorte, isso faz parte dos azares e vicissitudes pebolísticas, e quem nunca cometeu uma jogada infeliz que lhe atire a primeira pedra. 

26 de outubro de 2010

quinta-feira, 6 de março de 2025

O Último Contador-de-Urubus

Fonte: Google


O Último Contador-de-Urubus

Fabrício Carvalho Amorim Leite*


O macaco-guariba voltou a zombar das visagens bem aqui perto de casa. De um jeito ou de outro, sô, o mundo anda esquisito.

— Vê aquele babaçu grande? — pigarreou o Contador-de-urubus, fincando o cajado ensebado com cera de carnaúba no chão torrado.

— As guaribas, agora, têm um certo, sô. Quando nos veem, botam duas palhas da palmeira na frente do corpo, como se tivessem vergonha.

Vi ali uma espécie em extinção. E não era o macaco-guariba, que já é, por si, uma memória vagante de um tempo que se foi. Falo daquele homem.

Colonizou essas bandas antes mesmo de existir, quando ainda nem no ovário da mãe estava, mas já carregava o destino traçado.

O avô J. Amorim, sim, foi quem desbravou essas terras, recebendo do governo o prêmio de coragem e astúcia. Conquista a perder de vista — ou melhor, até onde a vista topasse com outro colono. O resto era dele, e de mais ninguém.

Conversamos diante dos grandes carnaubais. Ao fundo, a mata grande — ou o que restava dela — se espalhava numa mistura de sertão, babaçuais e ipês-amarelos floridos.

O cinza. O amarelo dos ipês. O verde escorrendo sobre o vermelho do sol poente.

— Hoje em dia, num se acha mais vaqueiro que preste, sô… — praguejou o velho, ajeitando o chapéu puído na cabeça.

Os marruás se foram.

Cavalos catingueiros? Só prestam para a exposição dos ricos e para desfile no dia do vaqueiro, pra tirar foto com prefeito.

Mascou algo na boca que parecia fumo e cuspiu adiante.

Ao longe, um carro de som passou devagar na estrada, com o alto-falante anunciando novidades do supermercado da cidade:

— "Promoção de carne argentina e calabresa!"

O velho suspirou.

— Agora é tudo isso aí. Antes, era carne de boi agreste, farinha amarela, cachaça boa. Hoje, é comida de plástico, cerveja aguada e gado do Goiás — para ele, todo gado vinha de lá.

Fez um gesto decidido, como quem tentasse abraçar o mundo, e bufou:

— E tem mais, viu? Num encontro um cristão que preste pra me ajudar na lida da roça. Tudo largado!

Pausa. O silêncio só era cortado pelos berros dos macacos-guaribas lá na frente.

Ele olhou para mim e cuspiu de lado, ajeitando a perna ruim.

— Ah… se eu num tivesse com meus noventa e dois anos, um oio cego de um coice de burro e essa perna mole desde que caí de moto faz seis meses…

O céu fechou cedo. Trovões estouravam nas bandas da mata das guaribas. No Nordeste, escuro de chuva é esperança. Ainda bem.

O Contador-de-urubus ergueu os olhos para uma árvore, a uns cem metros da varanda, e disse:

— Tá vendo aquele urubu? Urubu sozinho… é sinal dos tempos. Só vive em bando…

Fez o sinal da cruz e virou-se para a estrada poeirenta. Mas, dessa vez, não cuspiu perto dos pés.

Parou de repente e apontou com o queixo:

— Olha lá aquele monte de pedras na boca da encruzilhada… Vão fazer um tar de calçamento.

O guverno quer avançar nas quintas do vô…

Silêncio. Olhamos juntos o amontoado de pedras. O progresso chegando.

Eu esperava um palavrão. Um resmungo raivoso. Mas, em vez disso, vi uma faísca no olhar do velho.

Ele coçou a aba do chapéu, pensativo.

— Talvez num seja tão ruim assim… — murmurou, quase para si mesmo.

A frase se perdeu no vento. Ele franziu a testa, como se estranhasse as próprias palavras.

Cuspiu de lado, reequilibrando-se na bengala, e depois resmungou leve:

— Mas praga de urubu magro num derruba cavalo gordo, né? Quem tem, tem. Quem num tem, que se vire.

Suspirou fundo, tanto que as costelas se espicharam. Olhar de quem já viu muito.

E ficou assim, por um instante, quieto, como se ouvisse vozes ancestrais que só ele entendia.

Então, sem pressa, caminhou devagar até o oratório da velha casa. Ficamos ali, em silêncio, entre o cheiro de vela e madeira antiga.

A noite desabou sem correria, trazendo um vento frio que fazia as sombras sacudirem no piso.

O urubu, antes imóvel na árvore morta, ergueu voo e virou breu, sem deixar rastro.

Ou… como ele pressagiou… “augurando outra casa. ”

E foi a única vez que o Contador-de-urubus não ficou naquela sagrada hora, no alpendre, contando com os olhos os urubus se aninharem no velho ipê – já branco de tanto tempo e de tantos senhores.

Apenas repetiu, baixo, como quem fala com a chuva:

— Sinal dos tempos, sô… sinal dos tempos.

Foi então que compreendi.

Aquele era o último de sua espécie.

Março, 2025.

*Cronista e contista.

terça-feira, 4 de março de 2025

O açude e o mar de El mar

Em 1994, ao tomar posse na Academia Parnaibana



O açude e o mar de El mar


Elmar Carvalho


O caro Acoram me mandou o seguinte haicai, por WhatsApp:


Respondi-lhe imediatamente, por áudio, elogiando-lhe o texto, mas ele disse que o poema não era de sua autoria. Vi, então, que abaixo da postagem constava o nome de nosso amigo comum, o poeta Dílson Lages.

Em outro áudio, disse que o elogio valia para o Dílson, uma vez que eu não elogiara propriamente o autor, porém, os versos. Acrescentei que o poeta fora criativo com o uso da vírgula, que dera ao poema um duplo sentido, com a alusão implícita a Campo Maior, onde fica o Açude Grande nele referido.

Em seguida, praticamente de improviso, lhe enviei o poema abaixo, uma espécie de paráfrase ou paródia ao célebre poema de Drummond e sua pedra no meio do caminho:

        No meio do caminho 
        Tinha uma vírgula 
        Tinha uma vírgula 
        No meio do caminho 
        Que modificou
        Todo o sentido 
        E me deixou 
        Sem sentido.

Acoram me retrucou com o poema abaixo, em que brinca com o meu nome:



Sobre a minha paráfrase drummondiana, ele disse:

        Uma poesia de repente 
        De poeta competente!

Diante do seu poema, que evoca o pequenino Açude Grande de Campo Maior, eu lhe disse que numa entrevista, que ainda não foi ao ar, o amigo e apresentador Octavio César, em sua abertura, falou que quando vai ao litoral, ao passar pelo paredão desse açude, o considera como sendo o mar de El mar. 

Vendo o que esses bons amigos disseram, recordo que no meu discurso de posse na Academia Parnaibana de Letras, ainda em plena juventude, ou, pelo menos, me sentindo jovem, tive a ousadia de proclamar que, com o nome que tinha - Elmar - eu não apenas amava o mar, mas era-o, era o próprio mar.

Agora, coroado de algas e de mágoas, me sinto apenas um Netuno decadente, despojado de seu tridente.

segunda-feira, 3 de março de 2025

A freguesia do Mocha

Fotografia antiga da parte interna da igreja de N. S. da Vitória

Fotos tiradas por Elmar Carvalho, com exceção da primeira


 

A freguesia do Mocha


Júnior Vianna 

Historiador e membro do Instituto Histórico de Oeiras


Após dezoito dias da reunião na Fazenda Tranqueira, onde se reuniram os ditos "homens bons", cumpria-se no brejo do Mocha, com toda a solenidade possível, a inauguração da igrejinha dedicada a Nossa Senhora da Vitória.  


O rito litúrgico foi celebrado pelo padre visitador Miguel de Carvalho, acompanhado pelo padre Tomé de Carvalho, que, a partir dali, assumiria o cargo de cura da primaz freguesia do Piauí. A solenidade, ainda que simples, foi assistida com devoção pelo povo da região, que via nascer, em pleno sertão, um paroquiato distante e isolado. A nova igreja estaria subordinada ao bispado de Pernambuco, sob os auspícios de Dom Frei Francisco de Lima.  


Tudo muito humilde, sertanejo, brejeiro. A capela primitiva media pouco mais de 24 passos de comprimento por 12 de largura, seguindo o estilo das construções de taipa tão comuns na região. Apesar de modesta, a edificação da freguesia trazia grandes avanços: garantia o acesso ao batismo, ao casamento, aos sacramentos, ao amparo dos enfermos e aos registros de nascimento, matrimônio e óbito — registros que, além do valor espiritual, possuíam importantes implicações jurídicas e sociais.  


A criação da freguesia do Mocha representava, sem dúvida, o núcleo embrionário da sociedade piauiense, sustentada pela criação extensiva de gado. Com esse ato, abriam-se as portas para novas vivências, etapas sociais e avanços políticos e religiosos. Não demorou para que a região recebesse a auspiciosa visita do bispo, mas isso, como dizem, já é outra história.  


Através da Igreja e de suas instâncias de base, ligadas de forma quase umbilical ao próprio Estado, a institucionalização de povoados dispersos era conduzida inicialmente pela oficialização de suas ermidas. Assim, no dia 2 de março de 1697, essa realidade se fez presente nos sertões de dentro, sob as bênçãos de Deus Pai e a devoção mariana.  Oeiras segue ainda religiosa!     

domingo, 2 de março de 2025

ENIGMA

 

Fonte: Google

ENIGMA


Elmar Carvalho

 

entre o som

          o sono

          o sonho

          a sombra e a sobra

eu me decomponho

     em escombros

em farpas e agulhas

       escarpas e fagulhas

                                          desfeito enfim

                                          em fogos de artifício

                                          feito estrelas de mim

esfinge autoantropofágica que

não se decifrou e que a si

mesma se devorou