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Foto meramente ilustrativa Fonte: Google |
Procissão do Fogaréu em Campo
Maior
Elmar Carvalho
Em 29 de abril
de 2019 publiquei em meu blog uma crônica em que sugiro ao bispo da Diocese de
Campo Maior, Dom Francisco de Assis, a criação da Procissão do Fogaréu. A
semente caiu em terreno fértil, pois hoje recebi a seguinte mensagem por
WhatsApp, enviada pelo amigo e parente Dr. Domingos José Carvalho, católico
praticante e fervoroso:
“Meu prezado
irmão e parente, lhe informo que na quinta-feira santa teremos o FOGARÉU, sua
ideia foi acatada pela paróquia e diocese.”
Desnecessário
dizer o quão contente fiquei. Assim, julgo oportuno republicar o texto referido
acima:
Em recente conversa com o
professor e multi-instrumentista José Francisco Marques, lhe informei que pedi
ao médico Domingos José de Carvalho, meu parente e amigo, para que apresentasse
ao bispo da Diocese de Campo Maior uma minha sugestão, qual seja, instituir a
Procissão do Fogaréu.
A velha cidade, depois de Oeiras,
creio, é a mais antiga freguesia ou curato do Piauí, que teve seus primórdios
na antiga igreja de Santo Antônio do Surubim, construída pelo último mestre de
campo das Conquistas do Piauí e do Maranhão, a pedido de seu parente e amigo
padre Tomé de Carvalho, primeiro vigário de Oeiras, e que bem pode ser
considerado o fundador ou, pelo menos, um dos fundadores daquela velha urbe,
primeira capital de nosso estado.
Quando eu tinha finalizado a
versão que eu considerava definitiva deste texto, encontrei na sala a revista
Cidade Verde, edição 213, de 21/04/2019, que traz uma matéria do Fonseca Neto,
na qual consta um documento recentemente vindo a público. Trata-se da Resolução
expedida da Mesa da Consciência e Ordens, datada de 20 de maio de 1740,
assinada pelo bispo Dom Manuel da Cruz, que criava as freguesias da
Caatinguinha (Valença do Piauí) e a do Gurgueia (Jerumenha) e elevava à
categoria de freguesia os curatos de Piracuruca, do Surubim (Campo Maior),
Parnaguá e Poti (depois, Marvão, e hoje Castelo do Piauí). Por via de
consequência o curato de Campo Maior, cuja primeira igreja data de 1712, só
passou a freguesia em 20/05/1740.
Julgo importante dizer que a
Festa do Divino é realizada em Amarante (PI) há mais de 110 anos, mas depois,
de certa forma, caiu no esquecimento. Faz cerca de uma década, suponho, foi
reativada com toda pompa e circunstância, como se costuma dizer para realçar um
fato, por Marcelino Leal Barroso de Carvalho, que foi meu professor no curso de
Direito (UFPI). Portanto, uma tradição pode ser retomada ou criada.
Marcelino, que foi diretor geral
do Instituto Camillo Filho e auditor-fiscal do Estado do Piauí, a suas expensas
comprou um vetusto casarão na Avenida Des. Amaral, e nele instalou o Museu do
Divino. Os fiéis carregam um lindo estandarte e envergam uma bela veste talar,
uma espécie de opa ou túnica.
Também promove eventos culturais
na época da festa, uma espécie de serenata pelas ruas da bucólica e mimosa
Amarante, inclusive com a participação do instrumentista professor Melquíades,
seu irmão. Eu mesmo, mais de década atrás, tive meu livro Lira dos Cinquentanos
lançado por ele, em um solar da Des. Amaral, pertencente a familiares dos
irmãos Álvaro e Raimundo Luiz Cutrim Costa. Posteriormente, ele me prefaciou o
livro Amar Amarante, que tem uma bela capa de sua filha Ana Cândida Nunes
Carvalho. Este opúsculo foi lançado no dia 6 de dezembro de 2013, na solenidade
em que recebi o título de Cidadão Amarantino. Seu exemplo teve seguidor,
porquanto, em Oeiras, novamente Oeiras, viva Oeiras, Olavo Braz Barbosa Nunes
Filho fundou o Museu do Divino, no qual, além das várias peças sacras, há
placas com vários poemas de oeirenses ou que falam na velhacap, inclusive o meu
Noturno de Oeiras.
Voltando à minha sugestão da
criação do Fogaréu, quero dizer que essa procissão é mais do que centenária em
várias cidades mineiras e em Oeiras, que tem uma das mais belas Semanas Santas
do Brasil, já que a sua procissão de Bom Jesus dos Passos é comovente,
sobretudo por causa da multidão que aglutina e do canto melancólico e doloroso
de Maria Beú, que nos rasga a alma e nos parte o coração, mormente no momento
da lancinante passagem, que parece nos ecoar como um estribilho de miserere,
que dilacera e fere:
“Caminheiros, que passais por
este caminho, parai um pouquinho, e olhai, por favor, se neste mundo existe uma
dor assim tão grande, como a dor de minha dor”.
Contudo, enfatizo que toda
tradição começa com a sua primeira vez, com o seu primeiro passo. E a nossa
episcopal Campo Maior mostra seu fervor católico no Festejo de Santo Antônio do
Surubim, que, no gênero, é a maior festa religiosa do Piauí, pelo menos sob a
invocação desse santo, que além das trezenas, tem ainda a solenidade de
condução e levantamento do mastro, com o seu folclore e crendice.
Ainda me recordo da procissão de
Bom Jesus dos Passos. Quando Nossa Senhora se encontrava com Jesus a carregar o
pesado lenho, monsenhor Mateus nos comovia com um vibrante sermão, que falava
nas dores de Cristo e no acerbo sofrimento de Maria. Essa cerimônia religiosa
me fez escrever estes versos, que fazem parte de meu poema Vida in Vitro,
apresentado pelo poeta e ator José Teixeira Pacheco como um monólogo, em mais
de uma ocasião:
sentes ainda o cheiro dolorido e
pisado dos alecrins / da paixão do senhor morto, do horto das agonias, / das
chagas vermelhas, maceradas, da túnica / roxa, brilhante, da coroa de espinhos,
dos cravos, / não os de cheiro, mas os de ferro, que ferem... / eras infante,
então, e como sofreste / e como fizeste sofrer tua mãe, madona, / mater
dolorosa e pietá sofrida e consoladora / de teus sofrimentos de então e de
sempre.
Na minha sugestão, além de
estandarte, de vestes talares, como opas ou túnicas, a que não poderia faltar a
imprescindível lamparina ou tocha, poderiam ser incorporados ou não máscaras e
elmos, se for o caso. As vestes e as lamparinas poderiam ser vendidas por uma
loja do bispado, tanto para financiar as despesas do evento, como as obras
sociais diocesanas, ou cada participante faria a sua própria roupa e tocha,
conforme modelo padrão elaborado pela Diocese. E, sem dúvida, ainda haveria o
benefício econômico do turismo.
Sei que Dom Francisco de Assis,
simpático e dinâmico, que por sinal me foi apresentado pelo Dr. Domingos José,
haverá de apreciar a nossa sugestão com cuidado e zelo, sem dúvida levando em
conta a tradição e a antiguidade da Igreja Católica Apostólica Romana em Campo
Maior, onde fica sua cátedra pontifical.