PEQUENA HISTÓRIA DA FESTA
DO DIVINO DE AMARANTE
Marcelino Barroso [1]
A Igreja Católica celebra o Dia de
Pentecostes no 50º dia depois da Páscoa, uma das mais importantes festas móveis
do calendário litúrgico, também chamada Festa do Divino. Tendo começado em
Portugal, no Século XIV, essa devoção se espalhou pelas colônias portuguesas e
pelo mundo ibérico, e, atualmente, pode considerar-se como uma festa universal
das mais ricas em simbologia. Em várias partes do mundo, as comemorações são
feitas com grande pompa e/ou com manifestações populares, antecedidas de
peregrinações ou peditórios.
Variadas são as manifestações religiosas
alusivas ao Dia de Pentecostes, de Norte a Sul do Brasil. No Piauí, algumas
cidades, como Oeiras, Valença, Simplício Mendes e Amarante, mantiveram, por
longos anos, a tradição das Cantorias, por longos dias, arrecadando esmolas. Um
grupo de homens percorria os povoados, carregando a Pomba e a Bandeira do
Divino, entoando versos ao som de tambor, rabeca e viola. Nos últimos anos, a
Festa do Divino de Amarante tem influenciado as das cidades de Regeneração,
Valença, Floriano, Palmeirais, Agricolândia e, quiçá, Oeiras, devido à beleza
das celebrações nos bairros e na Igreja Matriz
Até mesmo no Hino de Amarante (letra de
Mons. Isaac José Vilarinho e música do maestro Luís Santos), faz-se referência
ao “Tambor do Divino”, mantendo viva a memória de grupos tradicionais como os
Divinos de Seu Manoel Paulo e de Seu Agostinho Felipe, que encorajaram o
surgimento de novos mestres divineiros, hoje reconhecidos nos exemplos dos
Divinos de Seu Odilon, de Seu Airton, de Dona Maria Peruca, bem como daqueles
grupos que já vieram à nossa cidade, como os Divinos de Seu Eduardo (São
Francisco do Maranhão); de Dona Joana (Demerval Lobão-PI), e as Pastorinhas do
Divino de Dona Francisca (Floriano). Além desses grupos tradicionais, é de
justiça lembrar os grandes mestres cantadores, rabequeiros ou caixeiros, como Benedito
França, Do Carmo, Gonçalo Basílio, Júlio Basílio, Manoel do Basílio e Zeca
Tatuzinho, bem como as famosas “segundeiras” (segunda voz), destacando-se,
ultimamente, Dona Maria e Dona Da Guia.
Em Amarante, a Festa se caracterizou
também, desde o início do Século (há registros de 1907), como encargo de
famílias de operários. A descendência de uma dessas famílias tem garantido a
continuidade da promessa, mas, nos últimos anos, a Festa ganhou maior expressão
e vem atraindo pessoas de várias localidades, especialmente pela beleza das procissões
e do Tríduo Preparatório, bem assim pelo fervor expressado na Missa Solene de
Pentecostes, tudo com acompanhamento de cantoria, de grupos orquestrais, de
corais e de representações das diversas associações e movimentos religiosos da
Paróquia. Esse conjunto mais expressivo das celebrações se consagrou com a
designação de Divino da Vila Nova ou, mais afetivamente, como Divino de Dona
Dedé, em homenagem à sua fundadora, Josefa Pereira de Araújo, conhecida
carinhosamente como Mãe Dedé, que intensificou sua prática devocional a partir
de 1954, ou seja, há exatos 70 anos.
O Tríduo Preparatório, que era realizado
em ambiente doméstico e em círculo restrito às pessoas mais próximas, passou a
desenvolver-se com procissões luminosas, em cujo trajeto é recitada a Coroa do
Divino, com paradas estratégicas em algumas residências, até se completarem os
Sete Mistérios. Escolhem-se três responsáveis, em cujas residências se dá o
pernoite da Pomba e da Bandeira, cada família ficando responsável pelo cortejo
do dia seguinte. Tal esquema foi afetado pela pandemia de Covid-19, mas deverá ser
retomado em breve. A partir de 2012, o Pe. Tertuliano Alves mandou incluir, na
programação, a Missa da Vigília de Pentecostes, encerrando a terceira noite do
Tríduo. No quarto e último dia, o Terço de Encerramento da Festa reúne muitas
famílias da Vila Nova e de outros bairros da cidade, após o que se distribuem
bolo, café e chocolate quente.
Vários pesquisadores têm estudado a
Festa do Divino de Amarante, sobretudo tornando-a objeto de trabalhos de
conclusão de cursos de graduação e de pós-graduação em várias Instituições de
ensino, públicas e privadas. Têm sido, também, publicados artigos, reportagens
e documentários nos mais diversos meios de comunicação.
Desde o início dos anos 1940 até sua
morte, em 1984, Josefa Pereira de Araújo (Mãe Dedé) se desdobrou para dar
continuidade à Festa do Divino e emprestar-lhe feição de festa para os pobres.
Pouco antes de falecer, pediu aos atuais festeiros que não deixassem o povo da
Vila Nova esquecer essa devoção, que atesta a importância da preservação das
tradições da cidade e da valorização das manifestações religiosas de seu povo.
A Festa do Divino de Amarante,
diferentemente das de Oeiras ou Valença, tem permanecido com a mesma família,
mas, nos últimos anos, outras pessoas e até grupos da comunidade passaram a
colaborar da organização com maior interesse. Assim, entre esses voluntários, crianças,
jovens e adultos passaram a postular maior participação como figurantes, nos
cortejos e solenidades, além de assumirem outros encargos artísticos ou
operacionais.
Finalmente, deve ser ressaltado o apoio
que a Festa do Divino de Amarante tem recebido de todos os párocos, desde a
introdução dos novos eventos, a partir de 2003, os quais são citados na ordem
de seu exercício ministerial na cidade: Pe. Sebastião Gonçalves da Silveira, Pe. Raimundo Nonato dos
Santos, Pe. Raimundo Nonato do Rêgo
Neto, Pe. Tertuliano Alves de Melo
e Pe. Francisco Ronaldo Santos Sousa.
Como tudo que o ser o humano faz é
imperfeito, pode ter sido omitido algum dado, fato ou indicação relevante para
uma pequena história do Divino de Dona Dedé, mas, felizmente, nada passa
despercebido aos olhos de Deus. Por isso é que algum grupo, instituição ou
pessoa que não tiver sido citado deve ficar ciente de que seu lugar está
preservado no panteão da glória eterna e recebe, neste momento, o certificado
de nossa eterna gratidão, sob o influxo dos dons e dos frutos do Divino
Espírito Santo.
Assim seja!
[1] Marcelino Barroso divide com a
Professora Mundinha Costa a coordenação da Festa do Divino da Vila Nova, desde
1984. Texto lido pelo Prof. Melquíades Barroso na cerimônia de Envio das
Bandeiras às Comunidades Eclesiais da Paróquia, realizada no dia 14/04/2024, na
Igreja Matriz de São Gonçalo do Amarante, em Amarante-PI.