quinta-feira, 28 de janeiro de 2010
DIÁRIO INCONTÍNUO
28 de janeiro de 2010
Seguindo pela rua Olavo Bilac, vate parnasiano, um dos maiores sonetista da última flor do Lácio, como ele chamou a Língua Portuguesa, em direção ao centro, passei pelo antigo Bar da Encruzilhada, que pertencera ao falecido Mauri Mauá de Queiroz. Esse bar fica numa esquina, quase defronte à esquina do antigo e bem conservado casarão onde reside o professor e ator Paulo de Tarso Libório, que me deu a honra de interpretar o meu poema Sete Cidades no auditório do Tribunal de Justiça do Piauí, na solenidade de lançamento do livro de mesmo título, e de expor, em bela moldura, o meu poema sobre a cidade de José de Freitas, na Fazenda Ininga, tão prenhe de histórias e de lendas, de sua propriedade, que ele tão bem restaurou, transformando-a em verdadeiro museu. Lembrei-me de que estive algumas vezes nesse bar, com o saudoso poeta Jamerson Lemos, em agradáveis e longas conversas, sobretudo a respeito de poetas e poesia. Às vezes, degustávamos uma cuba libre, feita com Ron Montilla, em cujo rótulo há um velho pirata. O poeta era um navegador de longo curso, a desbravar valorosamente os sete mares da poesia. Por causa dessa saudosa lembrança, quero trazer para este diário o que escrevi sob o impacto da notícia de seu precoce falecimento:
Caro poeta Chico Miguel,
Ao abrir ontem o seu importante blog cultural e literário, fui surpreendido com a informação de que o Jamerson Lemos havia falecido. Era um poeta de muito talento, que trazia a poesia à flor da pele e da alma. Durante muito tempo fui seu amigo assíduo. Sempre nos encontrávamos, ocasião em que conversávamos longamente sobre a vida e sobre poesia. Em diversas ocasiões fui a seu sítio do Gameleira, onde tomava banho num riacho, que o cortava, serpenteando entre palmeiras e árvores frondosas, muitas das quais se debruçavam sobre o córrego. Ali havia uma pequenina ilha, que me lembrava as ilhas do Tesouro, da Fantasia e da Utopia. O poeta mergulhava nas frias águas, escarafunchava o fundo do riacho, e de lá voltava com um pequeno búzio, em que talvez ouvisse o murmúrio e o marulho do mar de sua terra natal. Muitas vezes, o poeta, com o seu sotaque pernambucano e o seu gestual de ator e intérprete de seus poemas, recitava-me seus belos versos, com muita emoção e encantamento. Às vezes, eu me "vingava", e revidava com um poema de minha autoria, apenas para variar, porquanto em nada me diminuía ficar como uma ave muda a ouvir o mestre e encantado Uirapuru, de mágico gorjeio. Seus versos eram cantantes, de-lirantes, musicais, cheios de ricos ritmos e de sólido conteúdo. Em algumas oportunidades, o vi e ouvi pedir uma caneta e um guardanapo de papel, e imediatamente escrever um poema, que já nascia perfeito, sem uma mácula, pronto para ser dado à estampa da publicidade. Era escrito num verdadeiro “repente” esferográfico, sem pausas, vacilações ou titubeios. Sua excelente matéria lhe fez justiça. Sentirei saudade desse grande bardo piauiense nascido no Pernambuco de Manuel Bandeira e Carlos Pena Filho. Sentirei saudade, sim, mas sempre poderei reler os seus versos, e ao relê-los, lembrar-me-ei de sua pessoa e de sua voz, a cantar lindas melodias e a recitar os belos poemas que sempre me encantaram.
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