EXPRESSÃO LITERÁRIA
Daniel C. B. Ciarlini
No ano de 2001, veio a lume, no Piauí, a obra condensada e organizada por Francisco Miguel de Moura: “Literatura do Piauí”. Com certa curiosidade, decidi, nesses últimos tempos, abri-la, como que esperando encontrar algo que se somasse às outras tantas pesquisas minhas, ora, é de praxe um autor-pesquisador, como o Sr. Moura, alavancar uma nova concepção; uma nova visão dos fatos.
O professor, integrante da geração moderna piauiense, então, usando-se das visões modernistas da crítica, oferece aos leitores algumas reflexões acerca do conceito de literatura e do fazer poético. Das tantas afirmações introdutórias, alguns deslizes geraram equívocos, como a própria significação latina de littera (“significa exatamente letra” [Op. Cit. p. 13]), sabemos, pois, que, embora littera tenha advindo de litteratura, sua real significação não mudou: Ensino das primeiras letras; eis aí o motivo de tantos filósofos e estudiosos da língua confundirem o termo com “gramática”.
Ainda dentro do mesmo conceito, o autor infere: “literatura é tudo o que se escreve” (idem), ferindo o verdadeiro conceito aristotélico; ora, sendo a literatura a expressão polivalente das palavras, dos signos linguísticos, “tudo que se escreve” não pode ser considerado literatura, uma bula de remédio, por exemplo, não expressa polivalência, avalie a emoção, o subjetivismo..., ingredientes estes fundamentais que exige a literatura como forma. Na condição de estudioso das letras, posso discordar do seguinte pensamento: “... há duas línguas e sua respectiva linguagem: a falada e escrita” (ibdem); no campo da literatura, nesse, e só nesse sentido, apontado pelo Sr. Moura, a construção e variação da arte não implica que a língua se fragmente, já que aplicada ao fazer literário, continua sendo apenas uma, promulgada, porém, em duas formas distintas, oral e escrita; e a oral, como sabemos, não implica literatura, tal qual o teatro, que só é literatura na sua condição impressa, logo, como advertiu, certa vez, o estudioso Massaud Moises, o teatro, ambiguamente, só interessa para a literatura quando não é teatro.
Analisar conceitos tão amplos como “literatura”, “moral”, “poesia”, “ética”, enfim, rege ao pensador e ao ensaísta reflexões profundas que visam observar as mudanças dos tempos e as transformações que uma dada ideia sofre, seja de forma positiva ou, até mesmo, não coerente com o sentido original. Como o Sr. Moura citou, “... na antiguidade, tudo o que se considerava ‘literatura’ era feito em poesia, com ritmo e metrificação” (Op. Cit. p. 14), sem dúvidas, mas é, também, sabido que esta regra vale-se para a antiguidade ocidental, que é o nosso caso. A propósito, a base do conhecimento, tanto antigo quanto contemporâneo, nunca deixou de se fixar nas artes, filosofias, religiões e ciências, sendo, aí, possível ainda, uma segunda classificação: As de base palpável, ou seja, física, concreta; e as de caráter abstrato, não-física, suposta, meditada; classificando-se, então, as ciências e as artes no primeiro caso e as religiões e filosofias no segundo.
Mudemos um pouco a análise do conceito de literatura e vejamos um pouco mais, aliás, como o Sr. Moura avalia a poesia, “palavra mais abrangente, na sua origem significava fazer” (idem). O verbo “fazer” pareceu empregado de forma insatisfatória, a palavra “poesia” vem do grego poiesis e significa, ao pé da letra, criar, no sentido de imaginar. O conceito sempre foi o mesmo. Muito me espanto quando percebo a secular confusão que existe entre a diferença de poesia para poema, talvez por serem palavras análogas; todavia, como o próprio sentido original nos dita, poesia é, na realidade, o elemento espiritual da arte, sendo refletida tanto na literatura quanto na escultura, pintura, fotografia etc., trocando em miúdos, a poesia é abstrata, individual, única, está em cada um de nós. Uma obra de arte, por exemplo, não possui poesia enquanto não for interpretada como poesia; o ponto de vista é que faz a diferença. O poema, então, é apenas uma ferramenta da qual o artista se utiliza a fim de expressar as suas emoções, ou seja, a poesia que sente no momento produtivo; o poema é o pincel, ou a tela, ou a tinta, do poeta. O Sr. Moura, na busca de entender e licenciar-se em tais conceitos, lança mão das palavras do diplomata e escritor mexicano Octávio Paz, quando cita: “o poema é poesia” (Op. Cit. p. 15); assim, desprezando o verdadeiro sentido já, aqui, descrito. Poema pode, ou não, ter poesia e a poesia pode, ou não, ser constituída em forma de poema. Vejamos a assertiva do brasileiro Hermes Vieira, quando em ensaio sobre Humberto de Campos, nos legou as palavras do mestre Orris Soares: “há, muito verso sem poesia e muita poesia sem verso. O verso propriamente dito não é arte, é artifício”; sendo todo poema um conjunto de versos, o conceito de forma generalizada aplica-se, logicamente, ao poema.
Não dando ouvidos ao alerta de Massaud Moises, Francisco Miguel de Moura entende, através de Fidelino de Figueiredo, que “a arte literária é, verdadeiramente, a ficção, a criação de uma supra-realidade” (Op. Cit. p. 16), e assim, como que tentando entender, fico nesta mesma linha, matutando o quê pode existir acima da realidade, já que ficção, por mais surreal que seja, busca na realidade as bases de sua construção. O certo, porém, é classificar, sim, a literatura como a “criação de uma” para-realidade, como bem reflexiona o mestre Moises: “o mundo ficcional não está ‘acima’ senão ‘ao lado’, paralelo à realidade ambiente, com ela realizando um permanente intercâmbio e nela se integrando inextricavelmente”, o intercâmbio de que fala é tão constante que sem ele jamais o artista poderia criar ou poderíamos interpretar uma criação à luz do raciocínio comparativo.
No aspecto de conteúdo, notamos que o livro carece de algumas reflexões e nomes únicos da literatura piauiense, como Berilo Neves (primeiro ficcionista científico brasileiro), Jonas da Silva (um dos três pilares do simbolismo piauiense), dentre outros, mas como o próprio autor registrou nas primeiras páginas: “é um livro prático [...] pretende ser também uma introdução ao estudo da literatura”, nada mais podemos nos queixar. Em suma, é uma obra boa, mas nada que uma adequada revisão e acréscimos, para reedição, não a torne melhor.
Daniel C. B. Ciarlini
No ano de 2001, veio a lume, no Piauí, a obra condensada e organizada por Francisco Miguel de Moura: “Literatura do Piauí”. Com certa curiosidade, decidi, nesses últimos tempos, abri-la, como que esperando encontrar algo que se somasse às outras tantas pesquisas minhas, ora, é de praxe um autor-pesquisador, como o Sr. Moura, alavancar uma nova concepção; uma nova visão dos fatos.
O professor, integrante da geração moderna piauiense, então, usando-se das visões modernistas da crítica, oferece aos leitores algumas reflexões acerca do conceito de literatura e do fazer poético. Das tantas afirmações introdutórias, alguns deslizes geraram equívocos, como a própria significação latina de littera (“significa exatamente letra” [Op. Cit. p. 13]), sabemos, pois, que, embora littera tenha advindo de litteratura, sua real significação não mudou: Ensino das primeiras letras; eis aí o motivo de tantos filósofos e estudiosos da língua confundirem o termo com “gramática”.
Ainda dentro do mesmo conceito, o autor infere: “literatura é tudo o que se escreve” (idem), ferindo o verdadeiro conceito aristotélico; ora, sendo a literatura a expressão polivalente das palavras, dos signos linguísticos, “tudo que se escreve” não pode ser considerado literatura, uma bula de remédio, por exemplo, não expressa polivalência, avalie a emoção, o subjetivismo..., ingredientes estes fundamentais que exige a literatura como forma. Na condição de estudioso das letras, posso discordar do seguinte pensamento: “... há duas línguas e sua respectiva linguagem: a falada e escrita” (ibdem); no campo da literatura, nesse, e só nesse sentido, apontado pelo Sr. Moura, a construção e variação da arte não implica que a língua se fragmente, já que aplicada ao fazer literário, continua sendo apenas uma, promulgada, porém, em duas formas distintas, oral e escrita; e a oral, como sabemos, não implica literatura, tal qual o teatro, que só é literatura na sua condição impressa, logo, como advertiu, certa vez, o estudioso Massaud Moises, o teatro, ambiguamente, só interessa para a literatura quando não é teatro.
Analisar conceitos tão amplos como “literatura”, “moral”, “poesia”, “ética”, enfim, rege ao pensador e ao ensaísta reflexões profundas que visam observar as mudanças dos tempos e as transformações que uma dada ideia sofre, seja de forma positiva ou, até mesmo, não coerente com o sentido original. Como o Sr. Moura citou, “... na antiguidade, tudo o que se considerava ‘literatura’ era feito em poesia, com ritmo e metrificação” (Op. Cit. p. 14), sem dúvidas, mas é, também, sabido que esta regra vale-se para a antiguidade ocidental, que é o nosso caso. A propósito, a base do conhecimento, tanto antigo quanto contemporâneo, nunca deixou de se fixar nas artes, filosofias, religiões e ciências, sendo, aí, possível ainda, uma segunda classificação: As de base palpável, ou seja, física, concreta; e as de caráter abstrato, não-física, suposta, meditada; classificando-se, então, as ciências e as artes no primeiro caso e as religiões e filosofias no segundo.
Mudemos um pouco a análise do conceito de literatura e vejamos um pouco mais, aliás, como o Sr. Moura avalia a poesia, “palavra mais abrangente, na sua origem significava fazer” (idem). O verbo “fazer” pareceu empregado de forma insatisfatória, a palavra “poesia” vem do grego poiesis e significa, ao pé da letra, criar, no sentido de imaginar. O conceito sempre foi o mesmo. Muito me espanto quando percebo a secular confusão que existe entre a diferença de poesia para poema, talvez por serem palavras análogas; todavia, como o próprio sentido original nos dita, poesia é, na realidade, o elemento espiritual da arte, sendo refletida tanto na literatura quanto na escultura, pintura, fotografia etc., trocando em miúdos, a poesia é abstrata, individual, única, está em cada um de nós. Uma obra de arte, por exemplo, não possui poesia enquanto não for interpretada como poesia; o ponto de vista é que faz a diferença. O poema, então, é apenas uma ferramenta da qual o artista se utiliza a fim de expressar as suas emoções, ou seja, a poesia que sente no momento produtivo; o poema é o pincel, ou a tela, ou a tinta, do poeta. O Sr. Moura, na busca de entender e licenciar-se em tais conceitos, lança mão das palavras do diplomata e escritor mexicano Octávio Paz, quando cita: “o poema é poesia” (Op. Cit. p. 15); assim, desprezando o verdadeiro sentido já, aqui, descrito. Poema pode, ou não, ter poesia e a poesia pode, ou não, ser constituída em forma de poema. Vejamos a assertiva do brasileiro Hermes Vieira, quando em ensaio sobre Humberto de Campos, nos legou as palavras do mestre Orris Soares: “há, muito verso sem poesia e muita poesia sem verso. O verso propriamente dito não é arte, é artifício”; sendo todo poema um conjunto de versos, o conceito de forma generalizada aplica-se, logicamente, ao poema.
Não dando ouvidos ao alerta de Massaud Moises, Francisco Miguel de Moura entende, através de Fidelino de Figueiredo, que “a arte literária é, verdadeiramente, a ficção, a criação de uma supra-realidade” (Op. Cit. p. 16), e assim, como que tentando entender, fico nesta mesma linha, matutando o quê pode existir acima da realidade, já que ficção, por mais surreal que seja, busca na realidade as bases de sua construção. O certo, porém, é classificar, sim, a literatura como a “criação de uma” para-realidade, como bem reflexiona o mestre Moises: “o mundo ficcional não está ‘acima’ senão ‘ao lado’, paralelo à realidade ambiente, com ela realizando um permanente intercâmbio e nela se integrando inextricavelmente”, o intercâmbio de que fala é tão constante que sem ele jamais o artista poderia criar ou poderíamos interpretar uma criação à luz do raciocínio comparativo.
No aspecto de conteúdo, notamos que o livro carece de algumas reflexões e nomes únicos da literatura piauiense, como Berilo Neves (primeiro ficcionista científico brasileiro), Jonas da Silva (um dos três pilares do simbolismo piauiense), dentre outros, mas como o próprio autor registrou nas primeiras páginas: “é um livro prático [...] pretende ser também uma introdução ao estudo da literatura”, nada mais podemos nos queixar. Em suma, é uma obra boa, mas nada que uma adequada revisão e acréscimos, para reedição, não a torne melhor.
COMENTÁRIO DE “EXPRESSÃO LITERÁRIA” EM O PIAGÜI
Wilton Porto
Há, em Parnaíba, muitas pessoas com conhecimentos satisfatórios em literatura. Mas existem aqueles que precisam se aprofundar mais, com o intuito de crescerem na árdua tarefa de escrever bons textos, penetrarem com segurança no sensível e belo mundo da poesia.
Daniel C. B. Ciarlini, como estudante de Letras/Português (UESPI) e com uma boa experiência no reino do jornalismo impresso e virtual, interpretando o livro “LITERATURA DO PIAUÍ”, no texto “Expressão Literária” (Cf. Ed. n.º 28 – Fevereiro de 2010, de “O Piaguí”), do poeta Francisco Miguel de Moura, literato consagrado do nosso estado, membro da Academia Piauiense de Letras (APL), nos traz informações consequentes, o que facilita o nosso entendimento sobre literatura. Revela a diferença entre poema e poesia, em que ele leva em consideração nomes reconhecido nacionalmente, como é o caso de Massaud Moisés, em confronto com outros respeitados na área literária: Fidelino Figueiredo, Octávio Paz e não esquecendo Orris Soares.
No conceito de literatura, Daniel demonstra o erro que se comete, quando do uso do termo, de forma desavisada. Ou por confiar-se em literatos experimentados na arte de escrever e elogiados pela crítica.
É comum pensar-se: “Se ele tem projeção, devemos confiar”. Inclusive no tocante à gramática. Esse pensamento vem a lume, porque aqueles que se destacam, costumam aprimorar-se na língua, sem contar que recorrem a professores tarimbados no conhecimento da língua com que escrevem.
A palavra “literatura” vem do latim “littera” e significa “letra”. Assim, quando Daniel Ciarlini informa que, o teatro não é literatura, porque o repasse da mensagem é oral, baseando-se no conceito aqui visto, ele tem razão.
Ler a peça teatral é leitura de uma obra de arte, obra literária. Assistir a uma peça teatral não o é. A oralidade tira o sentido de literatura, conforme visto acima.
Tudo que se escreve é literatura? Tomando mão do Filósofo Aristóteles, Daniel tenta nos convencer de que não. Ele se vale da frase “expressão polivalente da palavra”. Quem lida com literatura conhece de cor e salteado os sentidos: conotativo e denotativo. Ouvimos com frequência a seguinte oração: “fulano deu um sentido conotativo à frase”. Isso nos remete para “um sentido de múltipla interpretação”. É o caso da poesia. Na crônica jornalística, em que se escreve sobre um acontecimento: briga de rua, pode-se aproveitar tanto a forma denotativa como a conotativa. A primeira, o autor (que quase sempre é um repórter do jornal) se prende aos fatos, registrando o que vê e ouve em terceira pessoa, não se envolvendo emocionalmente durante a preparação da matéria. Na segunda, ele (polivalentemente) pode tirar proveito das figuras de linguagem, tem liberdade de criar, usar o verbo na primeira pessoa, tornar o caso um ato literário, poético, porque leva o leitor à emoção, à subjetividade, em que imprime estética, funções...
Poema é a ferramenta para se construir o palacete onde brilhará a poesia com sua essência expressa em arte. Se na poesia verifica-se a criatividade, por isso subjetiva, no poema se distingue – pelo verso – a materialidade. Entretanto na estrofe abaixo, de Cruz e Sousa, é inegável a criatividade, em que se nota o jogo de palavras e a presença de figuras de linguagem, como o caso da aliteração e a sinestesia. Versos com uma poesia contemplada por todos os críticos.
Vozes veladas, veludosas vozes,
volúpias dos violões, vozes veladas,
vagam nos velhos vórtices velozes
dos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas.
Plausível que se diga, valendo-se de Orris Soares: “Há muito verso sem poesia e muita poesia sem verso. O verso propriamente dito não é arte, é artifício”. O artifício é o meio para se chegar ao objeto artístico. A arte e a capacidade de criar.
Daniel Ciarlini interpreta a “supra-realidade”. Francisco Miguel de Moura, com base em Fidelino de Figueiredo, diz que “a arte literária é, verdadeiramente a ficção, a criação de uma supra-realidade”.
Todo ficcionista bebe na fonte de uma realidade presente e passada. Usa de cenários reais: um parque, um rio, um palacete, um cemitério ou tudo isso juntos. Parte de algo que vivenciou, viu ou foi vivenciado por outro. Até quando a suprarrealidade se relaciona com o mundo invisível (já foi provado e comprovado que outros mundos existem e são habitados), dependendo do nível de dimensão, a realidade difere da nossa. São mais preparados, com vivência ética mais elevada. Ainda assim é um ambiente onde os moradores são seres que um dia passaram pelo que nós, do mundo visível, estamos passando agora.
Dessa forma é coerente a afirmativa de Massaud Moisés: “O mundo ficcional não está ‘acima’, senão ‘ao lado’, paralelo à realidade ambiente, com ela realizando um permanente intercâmbio e nela se integrando inextricavelmente”.
Wilton Porto
Há, em Parnaíba, muitas pessoas com conhecimentos satisfatórios em literatura. Mas existem aqueles que precisam se aprofundar mais, com o intuito de crescerem na árdua tarefa de escrever bons textos, penetrarem com segurança no sensível e belo mundo da poesia.
Daniel C. B. Ciarlini, como estudante de Letras/Português (UESPI) e com uma boa experiência no reino do jornalismo impresso e virtual, interpretando o livro “LITERATURA DO PIAUÍ”, no texto “Expressão Literária” (Cf. Ed. n.º 28 – Fevereiro de 2010, de “O Piaguí”), do poeta Francisco Miguel de Moura, literato consagrado do nosso estado, membro da Academia Piauiense de Letras (APL), nos traz informações consequentes, o que facilita o nosso entendimento sobre literatura. Revela a diferença entre poema e poesia, em que ele leva em consideração nomes reconhecido nacionalmente, como é o caso de Massaud Moisés, em confronto com outros respeitados na área literária: Fidelino Figueiredo, Octávio Paz e não esquecendo Orris Soares.
No conceito de literatura, Daniel demonstra o erro que se comete, quando do uso do termo, de forma desavisada. Ou por confiar-se em literatos experimentados na arte de escrever e elogiados pela crítica.
É comum pensar-se: “Se ele tem projeção, devemos confiar”. Inclusive no tocante à gramática. Esse pensamento vem a lume, porque aqueles que se destacam, costumam aprimorar-se na língua, sem contar que recorrem a professores tarimbados no conhecimento da língua com que escrevem.
A palavra “literatura” vem do latim “littera” e significa “letra”. Assim, quando Daniel Ciarlini informa que, o teatro não é literatura, porque o repasse da mensagem é oral, baseando-se no conceito aqui visto, ele tem razão.
Ler a peça teatral é leitura de uma obra de arte, obra literária. Assistir a uma peça teatral não o é. A oralidade tira o sentido de literatura, conforme visto acima.
Tudo que se escreve é literatura? Tomando mão do Filósofo Aristóteles, Daniel tenta nos convencer de que não. Ele se vale da frase “expressão polivalente da palavra”. Quem lida com literatura conhece de cor e salteado os sentidos: conotativo e denotativo. Ouvimos com frequência a seguinte oração: “fulano deu um sentido conotativo à frase”. Isso nos remete para “um sentido de múltipla interpretação”. É o caso da poesia. Na crônica jornalística, em que se escreve sobre um acontecimento: briga de rua, pode-se aproveitar tanto a forma denotativa como a conotativa. A primeira, o autor (que quase sempre é um repórter do jornal) se prende aos fatos, registrando o que vê e ouve em terceira pessoa, não se envolvendo emocionalmente durante a preparação da matéria. Na segunda, ele (polivalentemente) pode tirar proveito das figuras de linguagem, tem liberdade de criar, usar o verbo na primeira pessoa, tornar o caso um ato literário, poético, porque leva o leitor à emoção, à subjetividade, em que imprime estética, funções...
Poema é a ferramenta para se construir o palacete onde brilhará a poesia com sua essência expressa em arte. Se na poesia verifica-se a criatividade, por isso subjetiva, no poema se distingue – pelo verso – a materialidade. Entretanto na estrofe abaixo, de Cruz e Sousa, é inegável a criatividade, em que se nota o jogo de palavras e a presença de figuras de linguagem, como o caso da aliteração e a sinestesia. Versos com uma poesia contemplada por todos os críticos.
Vozes veladas, veludosas vozes,
volúpias dos violões, vozes veladas,
vagam nos velhos vórtices velozes
dos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas.
Plausível que se diga, valendo-se de Orris Soares: “Há muito verso sem poesia e muita poesia sem verso. O verso propriamente dito não é arte, é artifício”. O artifício é o meio para se chegar ao objeto artístico. A arte e a capacidade de criar.
Daniel Ciarlini interpreta a “supra-realidade”. Francisco Miguel de Moura, com base em Fidelino de Figueiredo, diz que “a arte literária é, verdadeiramente a ficção, a criação de uma supra-realidade”.
Todo ficcionista bebe na fonte de uma realidade presente e passada. Usa de cenários reais: um parque, um rio, um palacete, um cemitério ou tudo isso juntos. Parte de algo que vivenciou, viu ou foi vivenciado por outro. Até quando a suprarrealidade se relaciona com o mundo invisível (já foi provado e comprovado que outros mundos existem e são habitados), dependendo do nível de dimensão, a realidade difere da nossa. São mais preparados, com vivência ética mais elevada. Ainda assim é um ambiente onde os moradores são seres que um dia passaram pelo que nós, do mundo visível, estamos passando agora.
Dessa forma é coerente a afirmativa de Massaud Moisés: “O mundo ficcional não está ‘acima’, senão ‘ao lado’, paralelo à realidade ambiente, com ela realizando um permanente intercâmbio e nela se integrando inextricavelmente”.
(*) A publicação dos dois textos foi uma forma de homenagear o site e o jornal "O Piagüí, feitos por jovens talentosos e dedicados, que importante contribuição vem dando à cultura e à literatura piauiense.
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