22 de junho
A SÉTIMA ESTRELA
Elmar Carvalho
Da porta de minha casa, vi as miríades de estrelas, que pontilhavam o céu sem nuvens. Através da tela da antena parabólica da casa vizinha, vi o brilho intenso de uma delas. Na minha imaginação, o equipamento era como se fosse um radiotelescópio a perscrutar os longínquos rincões do infinito, em busca de sinais de vida inteligente, sem nenhuma comprovação científica até hoje. Segundo tenho lido, já se captou até o ruído remoto e de fundo do big-bang, que ainda remanesce no universo em expansão, as pulsações dos pulsars, como se esses longínquos corpos celestes tivessem algum tipo de coração, e as inferências indicativas de que os buracos negros existem, ainda que não possam ser vistos. Porém, nada foi identificado como uma mensagem que pudesse haver sido enviada por alguma civilização evoluída; nada que pudesse lembrar música ou fala. Lembrei-me dos melancólicos versos do poeta Manuel Bandeira: “Vi uma estrela tão alta, / Vi uma estrela tão fria! / Vi uma estrela luzindo / Na minha vida vazia”. Contudo, a minha não era uma estrela solitária, como a do bardo, conforme disse acima. Nem tampouco era triste, em seu brilho intenso e pulsante.
Na minha infância, por volta de meus dez anos, morando por um breve tempo na zona rural, podia melhor contemplar as estrelas, que, na falta da luminosidade das lâmpadas elétricas da urbe, pareciam brilhar com muito maior intensidade. Meu pai me ensinou a distinguir as constelações. Apontava para elas e me mostrava as Três Marias, o Cruzeiro do Sul, o Compasso, o Sete Estrelo... Mostrou-me o Caminho de Santiago; é a Via Láctea, onde se localiza o nosso sistema solar, cujo poético nome significa caminho de leite. Eu, a contemplar a nebulosa, imaginava um grande rio de leite, espumante e agradável, em que não havia fome, ou um macio caminho que nos levasse a etéreas plagas, refertas de bem-aventurança e beatitude. Vendo o meu interesse por livros e a minha grande curiosidade, numa das viagens que fez a Teresina, papai trouxe um exemplar da revista Conhecer, recheada de ilustrações coloridas.
Nela estava escrito que algumas estrelas ficavam a milhões e mesmo bilhões de anos luz. Meu pai me explicava o que era um ano luz. Não sei ao certo se compreendia inteiramente a explicação; sabia apenas que devia ser uma distância muito grande, que nem a imaginação conseguia alcançar. Na revista constava que a nossa Terra era muito menor que o Sol, e que este era apenas uma estrela de quarta grandeza. Poucos anos depois, já adolescente, li, numa antologia, Fernando Pessoa chamar o nosso planeta de aldeola do espaço. Mas é nessa pequenina bola de gude que vivemos, e por isso devemos preservá-la e protegê-la, sobretudo de nós mesmos. Um dia fiquei com medo de morrer, porque, ao contar as estrelas do Sete Estrelo, notei a falta de uma delas, e a crendice popular advertia que, se o observador não visse as sete, era sinal de que estava prestes a morrer. Recontei mais algumas vezes, e fiquei aliviado quando vi a estrela fujona a brilhar fracamente, quase invisível, como ofuscada, em sua pálida humildade, pelo brilho mais acentuado de suas irmãs.
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