Elmar
Carvalho fala dos desafios da Academia Piauiense de Letras como
fomentadora da literatura piauiense
Por
Naiane Rakel e Anna Jescika
O
juiz de Direito, bacharel em Direito e em Administração de
Empresas, poeta, cronista, contista e crítico literário, ocupante
da cadeira nº 10 da Academia Piauiense de Letras, campomaiorense,
José Elmar de Mélo Carvalho fala da importância da Academia como
incentivadora e fomentadora da literatura piauiense e da relevância
da revista acadêmica para os escritores. Ele é autor dos livros
Rosa dos ventos gerais, Cromos de Campo Maior, Noturno de Oeiras,
Sete Cidades - Roteiro de um passeio poético e sentimental e Lira
dos Cinqüentanos. Em entrevista às jornalistas Naiane Rakel e Anna
Jescika, relata sua trajetória literária, como a participação nas
principais antologias piauienses, organizadas por Assis Brasil,
Cineas Santos e o doutor Wilson Carvalho Gonçalves.
Naiane
Rakel - No portal Entretextos, do Dilson Lajes, o senhor publicou
uma síntese da literatura piauiense em que fala sobre os descasos
das autoridades culturais, do atraso do estado em não cultuar os
reais valores culturais. Nesse sentido, o que a Academia Piauiense de
Letras tem feito para contornar o descaso do estado?
Elmar
Carvalho - A academia é uma ONG, e depende de parcerias e
convênios. A atual gestão, presidida pelo advogado e historiador
Reginaldo Miranda, colocou praticamente em dia a Revista da APL. A
revista é importante porque oferece espaço para que os acadêmicos
publiquem crônicas, contos, artigos, pequenos ensaios e os discursos
de posse e recepção. A academia tem patrocinado e apoiado o
lançamento de vários livros e tem promovido diversos eventos,
sobretudo palestras, como uma espécie de serviço de extensão que
presta à comunidade.
Naiane
Rakel
- Quando
a APL aniversaria geralmente são realizadas palestras, exposições
abertas ao público. O que mais a APL tem proposto aos autores para
que suas obras cheguem ao conhecimento do público?
Elmar
Carvalho - A academia tem seu próprio site, no qual tem colocado
textos de autores piauienses. Ela não dispõe de grandes recursos
financeiros. Depende, sobretudo, da ajuda de órgãos públicos,
através de parcerias, convênios e de elaboração de projetos.
Entendemos que, tanto os órgãos públicos como a iniciativa
privada, devem dispor de mecanismos de logísticas, que façam uma
adequada distribuição dessas obras.
Naiane
Rakel
-
Vocês
têm desenvolvido algum projeto social para ajudar a comunidade?
Elmar
Carvalho - Quando eu fui presidente da União Brasileira de
Escritores do Piauí, com o apoio de minha diretoria, desempenhei uma
campanha para que a literatura piauiense fosse inserida no texto da
constituição de 1989, como disciplina obrigatória, e, contando com
o apoio do deputado Humberto Reis da Silveira, que era relator geral
da Constituição, essa obrigatoriedade foi posta na referida Carta
Magna. Isso é uma maneira eficaz de a literatura piauiense ser
percebida com mais força pela sociedade. Participamos de debates e
eventos. Entretanto, entendo que ajuda à comunidade deve ser
prestada por órgãos oficiais da assistência social, bem como por
entidades filantrópicas, e mesmo pelo voluntariado em geral.
Naiane
Rakel
-
O que
os estudantes de hoje podem esperar da Academia Piauiense de Letras
em termos de conhecimento literário?
Elmar
Carvalho - Cabe-lhes manterem contato com a entidade. A academia
não tem o papel de substituir os órgãos oficiais de cultura e nem
as entidades de ensino, porém a academia está pronta para colaborar
com as escolas e faculdades, disponibilizando acadêmicos para irem
conversar com os alunos, bem como recebendo em nossa sede comitivas
de estudante.
Naiane
Rakel
-
O que
os jovens devem fazer para tornarem-se os futuros escritores
piauienses e membros desta academia?
Elmar
Carvalho
– Lamentavelmente, o jovem vem caminhando mais para os
audiovisuais, para as letras de música de baixo calão. Para ser um
bom escritor o jovem deve ler muito mais do que escrever, tem que
estudar, se dedicar, pois literatura é um trabalho artístico, a
ser exercido por quem se aperfeiçoou na arte de escrever. O
interessado deve preparar-se para ser um escritor, através do
estudo, da prática e da reflexão. Não deve ser um mero diletante,
movido por problemas pessoais e apenas pelo desejo de notoriedade.
Naiane
Rakel
-
O
senhor presidiu a União Brasileira de Escritores do Piauí, o
Conselho Editorial da Fundação Cultural Monsenhor Chaves, publicou
alguns livros. O que mais pretende fazer pela literatura e cultura do
Piauí?
Elmar
Carvalho - Tenho um blog em que publico textos meus e de outros
autores. São textos literários, de historiografia e pequenos
ensaios. Colaboro em alguns portais, tenho publicado alguns livros, e
certamente irei publicar outros, entre os quais um de contos, um
diário, cujos registros na verdade são crônicas, algumas
memorialísticas, e irei coligir meus ensaios, crônicas e discursos.
Naiane
Rakel - Fale um pouco da sua trajetória como escritor.
Elmar
Carvalho - Publiquei meus primeiros trabalhos literários no
jornal “A luta” de Campo Maior, quando tinha 16 anos de idade. A
partir dos 20/21 anos comecei a publicar nos jornais de Parnaíba e
nas revistas e jornais de Teresina. A Rosa dos Ventos Gerais foi o
meu primeiro livro individual, editado quando eu já tinha quase 30
anos. Participei das antologias A Poesia Piauiense no século XX,
organizada por Assis Brasil, Baião de todos, organizada por Cineas
Santos, e Antologia dos Poetas Piauienses, cuja organização foi de
Wilson Carvalho Gonçalves. Procurei não forçar barras e nem cometer
insolências. Trabalhei e perseverei, e esperei que isso rendesse
frutos. Tenho observado que na seara da literatura recebemos o
reconhecimento de muitos, mas, às vezes, sofremos o desprezo e a
má-vontade dos invejosos e ressentidos.
Anna
Jescika – O senhor já publicou alguns livros. Qual é o mais
recente? Do que fala?
Elmar
Carvalho - Bernardo de Carvalho, o Fundador de Bitorocara, que é
um ensaio histórico, em que tento resgatar a mais notável figura
histórica do Piauí Colonial, no entendimento do padre Cláudio
Melo, que lhe escreveu a biografia, com base em documentos
encontrados no Piauí e em Lisboa. Inseri alguns poemas referentes a
Campo Maior, bem como meu discurso de posse na Academia de Letras do
Vale do Longá. Esse livro, como disse, resgata a história de um
homem que talvez tenha sido a mais importante figura do Piauí
Colonial, mas que se encontrava quase completamente esquecido,
não obstante o seu valor, as obras que fez e o seu estofo moral.
Anna
Jescika - O que você espera da literatura piauiense nos próximos
anos?
Elmar
Carvalho - Eu não vejo muita perspectiva, a não ser que o autor
publique à sua própria custa. Com exceção da Universidade Federal
do Piauí, que vem mantendo seu plano editorial, relativamente
satisfatório, as demais entidades públicas culturais, sejam
estaduais ou municipais, quase nada publicam atualmente, pelo menos
de meu conhecimento. Antigamente, houve planos editoriais e projetos
editoriais, através dos quais importantes obras foram editadas, mas
hoje a literatura piauiense se ressente da falta de iniciativa desse
tipo. A geleia geral de hoje é um marasmo quase total, com as
honrosas exceções que sempre hão de existir, nem que seja para
contrariar a regra.
Anna
Jescika - O Salipi é o evento cultural que estabelece o maior
contato com a sociedade, é o mais divulgado. Para o senhor qual a
importância dele para a literatura e cultura piauiense?
Elmar
Carvalho - O Salipi é organizado uma vez por ano. É uma grande
feira comercial de livros, mormente de autores nacionais e
internacionais. São promovidas palestras, sobretudo de autores
famosos nacionalmente. Entretanto, não tenho dados concretos sobre a
contribuição efetiva que ele tem dado à literatura piauiense.
Creio que a mais importante contribuição para a Literatura
Piauiense seria a implantação efetiva e cabal do que determina o
artigo 226 da Constituição do Estado do Piauí, ou seja, o ensino
obrigatório de nossa literatura, com a publicação dos compêndios
necessários e o treinamento dos professores.
Anna
Jescika - O senhor é contra o Enem, visto que ele não prioriza
as obras piauienses, não contribui nesse sentido?
Elmar
Carvalho – Não
é que eu seja contra. Entretanto, sem dúvida, nesse aspecto, causa
um grande prejuízo à literatura
piauiense.
O que deve ser
trabalhado na escola é o prazer em ler livros literários e,
sobretudo, a leitura e divulgação dos livros de literatura
piauiense. O artigo 226 da Constituição Estadual manda que as
escolas ensinem a literatura piauiense. No entanto, esse dispositivo
é quase uma letra morta, pois raras escolas o cumprem. Infelizmente,
a Secretária de Educação não obriga as entidades de ensino a
cumprirem o que manda nossa Constituição Estadual. Nem mesmo ela o
cumpre, através de sua rede de escolas.
Anna
Jescika - Como é
feita a avaliação para que um literato se torne um membro da
Academia Piauiense de Letras?
Elmar
Carvalho - Não existe convite, tem que surgir a vaga, e esta só
surge com a morte de um acadêmico. O interessado tem que preencher
os requisitos para ser candidato e tem que requerer a sua inscrição,
de tal modo que nenhum acadêmico pode inscrever um candidato. O
escritor tem que requerer sua inscrição, tem que passar pelo quórum
mínimo de eleitores, para que possa assumir uma cadeira. Pode ser
candidato único, mas se não obtiver o mínimo de votos necessários
não poderá entrar. Ademais, ninguém é eleito por aclamação.
Anna
Jescika - A mídia tem grande influência na não divulgação
dos novos nomes da literatura piauiense. A mídia tem alguma
particularidade nesse sentido?
Elmar
Carvalho – Antigamente, os grandes jornais do Sul do país
tinham suplementos destinados à literatura. Havia a crítica de
rodapé, feitas por intelectuais da estirpe de Alceu Amoroso Lima,
Álvaro Lins, Antonio Cândido etc., que publicavam trabalhos de
crítica literária, que mostravam a receptividade da obra comentada.
Mas hoje praticamente não existe crítica literária, mormente nos
jornais. Outrora, nos grandes jornais do Piauí havia espaço
dedicado à literatura, nos quais os novos e os velhos autores
publicavam os seus poemas, as suas crônicas, os seus contos. Hoje,
só restam algumas poucas revistas, e alguns blogs e portais
dedicados à arte literária.
Anna
Jescika e Naiane Rakel - Que mensagem o senhor deixaria para os
jovens que porventura desejam ser escritores?
Elmar
Carvalho - Se o jovem tiver uma vocação para as letras, precisa ler
muito e, sobretudo, os grandes mestres da literatura. Tem que
escrever, todavia deve ler muito mais. Cabe a este jovem, que
porventura queira virar um literato, se esforçar, escrever, mas sem
a preocupação de imediatamente publicar livros. Ele pode publicar
nos jornais, em revistas, na internet, e ver a receptividade dos
textos. Deve pedir a um crítico literário para avaliar a qualidade
de sua redação, e verificar se tem condições de se tornar
efetivamente um escritor. Todos podem escrever, desabafar o que lhes
vai na alma. Mas literatura é um trabalho de linguagem, e nem todos
os que escrevem têm qualidades que lhes possibilitem ser um escritor
ou poeta. Todos nós devemos cultivar a autocrítica e a humildade.
Muitos jovens caem na armadilha de se julgarem gênios e novos
Rimbaud. E isso poderá ser uma encruzilhada fatal, um beco sem saída
ou mesmo uma cruz como ponto final.
Estimado Elmar:
ResponderExcluirTenho gosto por entevistas, principalmnte quando expressam a verdada dos fatos, sem camuflagens nem hipocrisias.
A enrevista que concedeu está nessa linha de meu gosto por este tipo de texto.
O que mias pesa na qualidade das entevistas sãos as informações, os dados, as dicas que orientam quem as lê. Sendo uma forma de diálogo entre quem pergunta e quem responde, a este último cabe sintetizar ângulos de visão do entrevistado, o que pensa sobre os temas levantados. Me agrada, pois, ouvir ou ler entrevistas. Nelas vou pinçando, aqui e ali, subs´kios para algum trabalho de pesquisa, ou mesmo nelas encontro uma maneira de compreender, no caso, o autor entrevistado.
As entrevistas são, paramim, verdadeiros documentos,momentos do pensamen to de um autor que, de outra forma, poderiam permancer desconhecidos. As entrevista têm algo de confissão cuidados, mas que diz muito nas entrelinhas.
Um abraço do amigo
Cunha e Silva Filho