O rei
estava ensimesmado
Durvalino
Filho (1953)
O rei
estava ensimesmado,
de
sua boca nada se ouvia
– nenhuma
ordem para hoje,
nenhum
enforcamento.
Não foi
cobrado o dízimo da noite.
Um
escândalo arrebentou na economia
e não
foi liberado o pensamento
porque o
rei havia-se calado
e o país
inteiro adormecia.
O
enclausurado urrou por entre as grades.
Mil
acidentes com os bóias-frias.
O bispo
ficou celerado, possesso
e o diabo
rezou a ordem do dia.
Na
iniciativa privada
forjaram-se
as falências desastrosas
com a
mudez do rei que só ouvia.
Mataram
cães de estimação
em
mansões de beira-rio.
Comunidades
se desintegraram,
crianças
tornaram-se desafio
e a nudez
das mulheres
virou
prato do dia.
Adeus,
véus de Alexandria!
Não
houve festas nas periferias
e as
mentiras aumentaram em abril.
Até que
o rei declarou
num
assomo de agonia:
“Nada
mudou no Brasil.”
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