Foto meramente ilustrativa |
Cunha
e Silva Filho
Não anotei o nome dele. Sei que tinha 45
anos, um jovem ainda na flor da mocidade produtiva, morto a
tiros por uma bandido “cruel.” Estou usando uma
palavra de um delegado onde o fato deplorável
foi registrado. Este marginal, com antecedentes criminais, ou seja,
era um delinquente, um menor há um ano.
Segundo
declarações do delegado, este energúmeno, que tem
atitudes frias e uma fisionomia na qual os
olhos indicam o que lhe ia no íntimo de sua alma
perdida, aproveitou-se do fato surpresa e tirou a vida de
quem estava no exercício de sua profissão,
certamente um professor eu complementava seu
salário com aulas particulares, pois era isso mesmo que
o mestre de inglês ia fazer.
Estacionou
numa das ruas de São Paulo e, quando se preparava
para deixar seu carro perto da casa onde
daria uma aula, de repente vê na sua frente
um espírito das trevas mefistofélicas que lhe exige o carro e
talvez alguma coisa mais. O professor, tendo saído
do carro, num átimo de reação mecânica,
não se intimidou e entrou em luta corporal com
o meliante, predador noturno da vida paulistana,
mais uma dessas feras (des)umanas espalhadas atualmente
pelas ruas da trepidante e sempre
perigosa capital paulista, a maior
cidade da América Latina.
Lutou
por pouco tempo com o facínora que, talvez mais
habilidoso e sendo mais novo, levou a melhor,
acertando, creio que à queima-roupa, o peito e outras duas
regiões do corpo do jovem professor. Foram, se não
me engano, cinco tiros. Morte imediata.
Uma
vida encurtada pela impunidade brasileira,
pelo código penal superado, pelas brechas
imorais de nossa legislação, pela desídia
de nossa estrutura jurídica de todas os níveis da
Federação e pela ausência de medidas governamentais
decisivas a favor de mudanças concretas
e duradouras. São
Paulo
agoniza não só nas águas tempestuosas das inundações
anuais e mortais, atingindo, sem piedade, sobretudo
as camadas desfavorecidas da população, mas
também no crime impune e contínuo.
São
Paulo, por suas qualidades, que são muitas,
e por seus defeitos que igualmente são inúmeros,
abriga cotidianamente todo tipo de crimes e
selvagerias praticadas contra seus habitantes que,
além disso, ainda têm que enfrentar uma
vida árdua nos transportes precários.
Com
demagógicas promessas de seus governos estadual e
municipal de melhorarem a qualidade da
educação pública sempre adiada, com seus
hospitais sem condições de atender à demanda
gigantesca de milhões de seus habitantes,
com seus moradores pobres sem teto
ou vivendo em favelas da periferia,
fruto dos desníveis sociais, São Paulo
atingiu seus limites de resistência e, assim , clama
por mudanças inadiáveis sob pena de ter que
enfrentar a indignação da sociedade.
São
Paulo e seus quatrocentos e sessenta anos de
fundação em 25 de janeiro de 1554, tendo à frente a
colaboração decisiva de dois eminentes padres jesuítas,
Nóbrega e Anchieta, o Apóstolo do Brasil. A São Paulo
de hoje, ameaçadora e a do passado, dos primeiros anos do
século anterior. Triste contraste! Esta
última, mais cordial, mais acolhedora,
praticamente em seu estado puro de província
com problemas, sim, mas de diferente
magnitude e, sobretudo, sem as agruras
causadas pela super-densidade populacional
sem freios, sem o trânsito caótico, os seus
ciclópicos engarrafamentos, os grandes males sociais
que deslustram as suas origens
histórico-religiosa-culturais, o seu progresso mais
ordenado, a potência de sua indústria e comércio, sua vida
universitária, seus centros de estudos, seus museus, enfim, a
sua condição de carro-chefe da economia brasileira.
Todo esse imbróglio de condições
positivas e negativas perdeu seu controle original, sua
estrutura de grande urbe, mas bem
administrada, com políticos mais
conscientes de suas funções públicas e não
frutos dos conchavos, compadrios na seleção dos candidatos
aos governos estadual e municipal e truques
baixos da política nacional.
Além disso, todos esses erros
imperdoáveis das instituições públicas são
causas que propiciaram a invasão do crime galopante, de
marginalidade certa de que não será
punida, seja por ser composta de menores meliantes,
seja por ser formada de adultos
irrecuperáveis, portadores de cérebros degenerados que
não podem estar em convívio com
a sociedade.
São autores de crimes
hediondos, abomináveis, de extrema crueldade
e frieza de sentimentos. São do tipo que
acabou com a vida do jovem professor de inglês,
deixando uma viúva para sempre psicologicamente
destroçada a cuidar de um bebezinho e de um filho
pequeno. Mais um número na estatística da cidade do crime e
da ausência de punição de uma espécie que
recomendaria sem restrições: a prisão perpétua.
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