quinta-feira, 4 de setembro de 2014

CARTA-PREFÁCIO



CARTA-PREFÁCIO

 Elmar Carvalho

              Prezado Gen. João Evangelista:

Estive em sua bucólica e simpática Piracuruca, de muita glória e tradição, hospedado nas proximidades da velha estação ferroviária, onde os trens não mais passam, onde só passam os longos comboios de saudade e solidão.

Acordei cedo e resolvi olhar a linha férrea. Era uma manhã de densas névoas. Os frondosos oitis se esvaíam, embranquiçados, no meio das brumas, como em certas pinturas impressionistas. Ao longe, na curva, a estrada férrea se dissolvia na neblina, despertando a imaginação para longas viagens no tempo e no espaço, feitas de pura emoção. O bairro sossegado mais parecia uma aldeia, em que só faltavam os repiques saudosos de um sino e o canto vibrante e melancólico de um galo, ambos anunciando e saudando o alvorecer.

De longe eu contemplava a pequena estação, de longa história, pois uma inscrição em suas paredes assinalava a sua construção como sendo de 1922. E eu lamentava que ao invés do progresso, com locomotivas mais ágeis e confortáveis, a velha ferrovia estivesse desativada, em completo abandono e desperdício.

O frio leve e gostoso dessa madrugada de muito sentimento e quietude era por vezes avivado pela carícia suave de uma quase imperceptível brisa, que perpassava como um leve toque sobrenatural, em que a gente se sente envolvido pela paz e proteção do Onipotente, em verdadeira sensação de êxtase e beatitude.
E como não poderia deixar de ser, lembrei-me do amigo, um dos mais ilustres e dedicados filhos de Piracuruca, sempre fidalgo nos gestos e no trato, e sempre em prontidão, na defesa dos interesses maiores da pátria, do Piauí e de sua cidade natal. É que a sua condição de militar, e de militar herói da guerra contra o nazi-fascismo, nunca lhe impediu de ser um perfeito cavalheiro e cidadão sensível e preocupado com a justiça social, com os desmandos administrativos, com a sorte dos miseráveis e com os valores artísticos e culturais de seu Estado natal.

O Sr. tem, com muita propriedade e argúcia, analisado em seus artigos e crônicas as mazelas que afligem o povo brasileiro, sempre com um elevado senso de justiça, e invariavelmente apontando sugestões e alternativas.

Embora não seja propriamente um crítico literário, em sentido estrito, todavia pela sua capacidade de análise e observação, embasada em larga cultura humanística e em profunda sensibilidade e empatia para com a arte literária, tem produzido comentários críticos com muita propriedade e pertinência, e desvelado ângulos e aspectos que os afoitos, apressados e superficiais nunca vislumbrariam.

Quando estive em sua Piracuruca, por força de minha nova função na magistratura, como forma de homenageá-lo, e talvez movido pelos incentivos que o Sr. sempre me dispensou, escrevi um longo poema sobre Sete Cidades, em que canto:

           Sete Cidades:
           Sonho feito
           De pedra
           Pedra feita
           De sonho
           Sonho que se fez sonho
           Na concretude da pedra.

E  a velha Piracuruca não ficou sendo apenas uma fotografia na parede, como no dizer do poeta, mas se tornou mais viva e presente, através da escrita e da memória do Gen. João Evangelista Mendes da Rocha, que lhe tem como permanente fonte de ternura e inspiração.
Agora só me resta dar um longo mergulho nas páginas de seu livro, de ricos e variados assuntos, e delas extrair a seiva rica e saborosa, para o salutar alimento e regozijo de meu espírito.          

3 comentários:

  1. Elmar Carvalho:

    Leio, agora, a sua crônica relembrando a figura simpática e cordial do Gen. João Evangelista, piauiense, pessoa, como V. tão bem caracteriza, de educação esmerada, militar preocupado com o nosso país, e sobretudo com a questão do nacionalismo brasileiro, com as nossas riquezas e os nossos bens naturais e culturais. Mostrava nosso males e nossos erros com coragem e patriotismo, e, principalmente, com sentimento cívico de querer sempre o melhor para o nosso povo.
    Não era gratuita a sua situação de militar ornado de bravura durante a Segunda Guerra Mundial nos campos da Itália.
    Conheci-o no auditório do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, por ocasião da sua posse, Elmar, como sócio correspondente do H.H.G.B. no Piauí Lembra-se? Foi no mesmo dia em que, no auditório da Academia Brasileira de Letras, V. recebeu o Prêmio Ribeiro Couto da UBE -Rio de Janeiro, pelo mérito da obra " Rosa dos ventos gerais". O Ribamar Garcia ali estava acompanhando V. na solenidade, na qual V. foi saudado pela historiadora Miridan Brito, que falou em nome da instituição.
    O Gen..João Evangelista, naquele dia, me foi apresentado e me dissera,então: "Cunha e Silva Filho, eu não pensei que V. fosse tão moço!." Naturalmente, naquele ano, julgara que fosse eu um senhor bem mais velho.
    Ele já tinha lido o meu livro sobre Da Costa e Silva que eu lhe enviara com uma gentil dedicatória.
    Tempos depois, lançando outro livro dele, "Nacionalismo tem sentido, sim!" Rio de Janeiro: Razão Cultural Editora, 2000), se não me engano em Copacabana, para onde me desloquei com a minha esposa, ele me falara para lhe remeter outro exemplar do meu livro sobre Da Costa e Silva, pois desejava doá-lo à Biblioteca do Exército, a Bibli-Ex, que fica no centro do Rio de Janeiro, no imponente Palácio Duque de Caxias, conhecido abreviadamente como PDC.
    No lançamento, que foi à noite, também encontrei o nosso amigo comum, o ficcionista Ribamar Garcia.
    Fiquei muito honrado em saber que meu livro iria fazer parte do acervo daquela conhecida e famosa biblioteca.
    Na citada obra, o General, faz referência à sua presença, Elmar( no texto de título "Elmar em grande estilo na tarde carioca") na solenidade do H.H.G.B, fala sobre sua poesia de temática histórico-geográfica e ainda alude ao ambiente naquela tarde carioca, tendo como cenário a a beleza do mar à altura da Praça Paris, no Parque do Flamengo. Belo dia!

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  2. Por engano de digitação, onde se lê H.H.G.B, leia-se: I. H. G.B
    Cunha e Silva Filho

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  3. Caro Cunha,
    Seu comentário foi magistral.
    Na verdade, é uma exímia crônica.
    Obrigado por suas belas e boas palavras.

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