terça-feira, 17 de abril de 2018

Rio Parnaíba: o velho monge agoniza

Trecho do braço mais oriental do Delta do Rio Parnaíba - o Rio Igaraçu, margeando a cidade de Parnaíba, no extremo Norte do Piauí. O rio encontra-se bastante assoreado e com suas margens desbarrancando devido à retirada de sua mata ciliar.


Rio Parnaíba: o velho monge agoniza 

Diderot Mavignier
Historiador e escritor 

A história das civilizações está sempre ligada à vida a beira de algum rio: o Tigre e Eufrates, na Mesopotâmia; o Ganges e Indo, na Índia; o Nilo, no Egito; o Mississipi e Colorado, nos Estados Unidos. No caso do Nilo, sua importância era tão vital para os egípcios, que se dizia ser o “Egito uma dádiva do Nilo”. Embora o Piauí também seja uma dádiva de um rio e dos seus afluentes - o Parnaíba, o piauiense não dá importância para essa fonte de vida. Segundo especialistas, o rio não viverá mais do que trinta ou cinquenta anos, se nada for feito em prol da sua preservação. 

Para os índios, os nossos rios eram fontes de alimentação e o seu principal motivo de lazer. A história da colonização do Piauí começa com a chegada de sertanistas atraídos pela perenidade do Parnaíba, com a intenção de desenvolver a pecuária, uma vez que, o litoral e as zonas mais próximas se destinavam a cultura da cana-de-açúcar, atividade que não combinava com o boi solto. No Piauí, seus campos de capim mimoso facilitaram essa cultura, e assim, a capitania se tornou o criatório de gado bovino, abastecendo o Brasil-Colônia e a Metrópole, de couro e carne, e de animais de tração. O boi era de pequeno porte e dotado de cornos desenvolvidos chamado piauí. Na linguagem dos vaqueiros, fazer piauí, era levantar e torcer o sabugo da cauda de um boi, para derrubá-lo ou encostá-lo ao mourão, a fim de ser facilmente ferrado. O Piauí se fez pela criação de gado, e a criação de gado, se fez pelo Rio Parnaíba e seus afluentes. 

Mapa que compõe a capa do livro História Secreta do Brasil, 2004, do português Vitor Manuel Adrião, onde o Rio Parnaíba aparece como um grande golfo entrando continente adentro. Isto explicaria o grande sítio arqueológico da Chapada do Araripe, entre os estados do Piauí, Ceará e Pernambuco, aonde se encontra fósseis de animais e peixes marinhos.

Apesar de ser um rio federal, o Parnaíba é um rio quase que piauiense, pois tem 75% de sua bacia hidrográfica no Piauí, ocupando 99,39% da área do estado. A maioria dos seus afluentes está em terras piauienses. Já no século XVIII, muitos percebiam a importância econômica do rio Parnaíba. Em 1814, Baltazar de Sousa Botelho de Vasconcelos foi o primeiro governante a subir este rio. De viagem a Oeiras, onde assumiria como governador, percebeu o isolamento da capital, e propôs a mudança da sede do governo do Piauí, para as margens do Parnaíba. Em 1844, o então presidente da província, Zacarias de Góis e Vasconcelos, em assembléia, deu início à idéia da navegação do Rio Parnaíba, considerando como a necessidade mais urgente do Piauí. Com a criação da Companhia de Navegação do Rio Parnaíba, constituída em 1858, o Piauí se tornou grande exportador de produtos vindos do extrativismo, e chegou a ocupar o 7º lugar entre os estados brasileiros em valor de exportação. Até a primeira metade do século XX, o rio foi a nossa estrada líquida, que promoveu, principalmente, o desenvolvimento das cidades ribeirinhas, com destaque para a cidade de Parnaíba, entreposto de exportação e importação. 

Trecho do Rio Parnaíba em Teresina, Piauí. O rio recebe esgoto sem tratamento de mais de 80% dos imóveis da capital piauiense. Imagem: Agência Senado.

Mesmo com a sua importância histórica, sendo fonte de vida para piauienses, maranhenses e por muitas vezes, salva-vidas nas secas do Nordeste, o Rio Parnaíba vem, há muito, sendo desprezado. O primeiro golpe veio com a desativação dos órgãos que cuidavam do rio, como a Companhia de Portos, Rios e Canais, e DNPVN – Departamento Nacional de Portos e Vias Navegáveis. O segundo golpe veio com a barragem de Boa Esperança que, ao contrário do que seu nome sugere, este barramento do rio, que deu origem a Usina Hidrelétrica Marechal Castelo Branco, é um vetor que tira a esperança de vida do rio. Inaugurada em 1970, foi outro duro golpe para o Velho Monge. O projeto não respeitou o Código das Águas, de 1934, que estabelece que o barramento projetado para aproveitamento da energia hidráulica deve satisfazer também as exigências de navegação, irrigação, conservação, livre circulação de peixes, perenização do rio e proteção contra inundações. A barragem de Boa Esperança seccionou o rio, para os peixes e barcos, comprometendo toda sua preservação. Não tem escada de peixe, nem eclusa. Para essas correções, a bacia do Parnaíba não pode continuar sendo objeto-penduricalho da CODEVASF, tem que ter a sua própria companhia. 

Assim, com a contribuição do homem, com os desmatamentos, queimadas, destruição da mata ciliar, poluição pelos esgotos, assoreamento, o rio agoniza e clama por socorro. O Piauí é um estado sempre na zona de rebaixamento quando o quesito é desenvolvimento, mas quanto o índice analisado é esgotamento sanitário, o estado é o lanterna, com pouco mais de 4% de cobertura. 

Com o assoreamento do leito do rio, o Parnaíba, onde o índio pescava com a mão, deixou de ser um rio piscoso. Nem a sua principal área de preservação não é respeitada, pois o Parque Nacional das Nascentes do Rio Parnaíba, com mais de 700 mil hectares, ainda não está instalado, está apenas criado no papel, desde 2002. A área das nascentes é o berço do maior rio genuinamente nordestino, um patrimônio brasileiro protegido pelo Código Penal. No Parque das Nascentes, estão os riachos formadores do Parnaíba, como o Água Quente, Surubim, Lontras, Uruçuí Vermelho e Parnaibinha. 

Mesmo estando bem representado nas Armas do Piauí: hino, brasão e bandeira, o Rio Parnaíba não tem a atenção dos piauienses e dos brasileiros, para o pedido de socorro que o Nilo Piauiense pede. Além de fonte de vida, ele poderia ser a nossa redenção econômica, através da navegação, da irrigação, da piscicultura, do turismo, e de outras atividades. O Rio Parnaíba ainda é a principal justificativa para a conclusão do tão sonhado Porto de Luís Correia, através da produção de alimentos e com a restauração da sua navegabilidade. Como o Rio Mississipi nos Estados Unidos, onde se escoa grande produção de grãos, o Rio Parnaíba pode deixar os nossos produtos competitivos, transportados por um custo módico, através de barcaças. 

Apesar de estarmos sobre aquíferos, o Piauí deve ter compromisso com os nossos mananciais, com as futuras gerações. Lembrar que a água doce e potável é um bem finito, e já é objeto de grandes debates internacionais. O Piauí deve se juntar ao Brasil e ao Mundo em busca de soluções, das mais avançadas tecnologicamente, para preservar esse patrimônio da humanidade. A água abundante e pura é o sangue da Terra. Salvemos, então, a nossa fonte de vida – o Rio Parnaíba! 

A Constituição Federal, no Capítulo VI, Art. 225, Inciso VI: 

“Cabe ao Poder Público promover a Educação Ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para preservação do meio ambiente”; ao “Poder Público e a coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. 
Como preservar o rio: 

É fácil, apenas é necessário desenvolver sua educação ambiental: 

X Não faça queimadas; não jogue lixo nas margens dos rios; 

X Não desmate as margens dos rios, riachos e córregos; 

X Não lance dejetos, animais mortos no leito dos rios; 

> Seja um defensor dos rios e avise as autoridades competentes que o rio está sendo maltratado. 

Informações / Alertas: 

IBAMA - linha Verde 

0800 61 8080 

linhaverde@ibama.com.br 

www.ibama.gov.br

Nenhum comentário:

Postar um comentário