domingo, 25 de julho de 2021

ELEGIAS INOMINADAS

 



ELEGIAS INOMINADAS


Elmar Carvalho

 

            I

 

Seus olhos

tinham a melancolia

profunda dos crepúsculos.

 

Por vezes se escondiam

detrás das venezianas

dos cílios impenetráveis.

 

Em seus olhos verdes

boiavam a tristeza

dos naufrágios

 

e a saudade

das naus que se foram

e não mais voltaram.

 

Seus olhos

tinham o sortilégio

e o mistério dos eclipses.

 

Nos seus olhos

meus olhos orbitavam

prisioneiros da gravidade

 

desses quasares binários

em que imergiam

e se perdiam.

 

            II

 

Sinto, às vezes,

rebentar de súbito

uma tristeza imensa e fugaz.

 

Uma tristeza tão funda,

tão inesperada, que surge

aparentemente sem razão.

 

De repente, como veio se vai.

 

Essa tristeza talvez seja a nostalgia

de não mais estar com Deus

ou de ainda não estar...

 

            III

 

Recordo os amigos mortos.

À proporção que entardeço

o número vai aumentando.

 

Já não tenho epitáfios

para tantas lápides

em meu peito.

 

Um dia a minha campa

estará entre essas lousas

e o cemitério já não existirá.

 

Quando eu não mais existir,

existirei em outra qualquer dimensão.

“Existem muitas moradas na casa de meu Pai.”

 

            IV

 

Meus olhos

são dois olhos d’água

de que já não escorrem

as gotas salobras das lágrimas.

 

São olhos d’água esgotados

de onde mina apenas o fio

viscoso da saudade.

 

 

 

A nostalgia do rapaz que fui,

tão emotivo, tão sentimental,

exauriu as vertentes lacrimais.

 

Meus olhos são cacimbas secas

de sertões comburidos,

de agrestes terras adustas,

de chapadas esturricadas.

 

Foram escavados até o osso

e nunca mais hão de chorar,

embora chorem um choro

seco, engasgado e sem soluços.

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