quarta-feira, 24 de novembro de 2021

ASSOMBRAÇÕES



ASSOMBRAÇÕES


José Expedito Rego

        

Não acredito em fantasmas, mas sei de alguns casos verídicos.

         

À margem direita da antiga estrada real que ligava Oeiras à vila de São Francisco, mais ou menos no meio do caminho, morava a viúva Minervina, senhora de muito respeito. Devota de São Sebastião costumava, todo dia 20 de janeiro, festejar o Santo preferido, com missa celebrada na varanda de sua residência campestre, onde armava florido altar, improvisado sobre mesa rústica, junto à parede da fachada principal. O padre vinha da cidade celebrar a concorrida missa, todos os vizinhos compareciam. Terminada a cerimônia religiosa, havia comes e bebes, dançava-se ao sm de sanfona.

      

Austera, D. Minervina trajava, nessas ocasiões, um vestido longo, de mangas compridas, feito de tecido branco de pretas estampas graúdas.

         

A viúva morreu, sem deixar herdeiros, a fazenda ficou abandonada, a casa virou tapera. Somente por ali andavam algumas cabras do morador mais próximo, pastando a vegetação ressequida do ingrato sertão.

       

O senhor Sebastião Barbosa, fazendeiro recursado, dono de carnaubais, morava em São Francisco e viajava muitas vezes a Oeiras, a fazer compras, visitar parentes, rever amigos. Montava um bonito cavalo de boa marcha e seguro passo. Regressando de uma dessas viagens, foi surpreendido por estranha avantesma. Era no mês de agosto, o luar uma beleza, toda a paisagem de garranchos desenhada nos mínimos detalhes. Quando se aproximou da velha casa em ruínas, onde havia morado a Minervina, viu, ainda a cerca distante, um volto que lhe fez arrepiar os cabelos da nuca. Contra a parede, no mesmo local onde outrora se erguia o altar, para as missas a São Sebastião, estava ajoelhada uma mulher, com vestido branco de estampas pretas. Só podia ser o fantasma da velha fazendeira. Sebastião Barbosa não era covarde. Aproximou-se cauteloso, benzeu-se, sacou o revolver da cintura e foi em frente. Emparelhado com a visão, indagou:


– Se for gente, fale, porque vou atirar: não obtendo resposta, disparou um tiro. Uma cabra manhosa, malhada de preto com branco, que se colocara de pé, as patas dianteiras apoiadas à parede, para lamber a cal ou o barro salgado, saiu em disparada, varanda afora.    

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