Fonte: Google/Globo |
OS ARTISTAS E OUTROS CANASTRÕES
Antônio Francisco Sousa –
Auditor-Fiscal (afcsousa01@hotmail.com)
Aproximava-se
das dezoito horas daquele sábado. No cruzamento da via em que transitava, de
oeste a leste, com a outra, ambas, de fluxo intenso fluxo naquele horário, um
desses malabaristas, comuns por ali, atirava seus malabares para o alto, mas
não conseguia pegá-los de volta para executar a pretendida manobra artística,
tão drogado que estava, o que se podia perceber pela intensidade dos efeitos
alucinógenos.
Perdendo
a paciência, o “artista” atiraria os malabares para o lado e, inteiramente cego
e transtornado, aventurar-se-ia a atravessar, a esmo, os congestionados e
cruzados logradouros. Espantei-me ante o perigo iminente de ver o garoto morto,
e me aliviei quando ele atingiu o outro lado, ileso; situação que não ocorreu
em relação a alguns veículos que, evitando abalroá-lo, colidiriam entre si,
atrapalhando ainda mais o tráfego no local. Enquanto o jovem desaparecia em meio
à confusão que causara, eu e outros companheiros de pista mais tranquila
seguimos adiante, egoisticamente, deixando que as vítimas do abalroamento
coletivo cuidassem dos seus próprios problemas.
Domingo
seguinte, mesmo local, por volta das treze da tarde, seguia, então, no sentido
leste oeste; sob um sol causticante, encaixado em uma vala do canteiro central,
destinada ao escoamento das águas pluviais, lá estava o jovem malabarista,
deitado, dormindo, com o mesmo traje do dia anterior, e os malabares atirados
sobre o peito.
Naquele
momento, dividindo as quatro pistas do cruzamento, um pedinte e três pequenos
artistas dos malabares exerciam seu mister, atazanando a paciência de quem por
ali passava. O quase adolescente esmoler que se posicionara na minha pista
portava um cartaz em papelão, no qual, do seu jeito, tentava dizer que era um
pai de família que passava fome. De tanto trafegar por ali, percebi que aquelas
figuras não me eram estranhas. Confesso-lhes que, a despeito da tranquilidade
do trânsito, não consegui ficar tranquilo diante do que via; desacatando
conselhos da família – que comigo trafegava -, ainda que tentando aparentar
calma, indaguei meu pedinte: cidadão, veja o estado de sofrimento do seu
colega, deitado sob esse sol ardente, por que não o colocam embaixo de uma
daquelas marquises; a propósito, ele e aqueles ali – apontando para os outros
-, pelo menos, tentam prestar algum serviço artístico ou vender alguma
bugiganga, enquanto você, companheiro, que aparenta ter boa saúde, todo dia se
posta nas vias públicas, com esse cartaz, simplesmente pedindo, sem oferecer
nada em troca. Será que, em nenhum momento, sua consciência o faz sentir-se
mal? Você deve saber fazer outra coisa além de mendigar. Nem saberia dizer se
ele ouvira minhas admoestações, talvez em respeito aos que me acompanhavam,
tenha me deixado falando sozinho, enquanto já se punha a fazer os mesmos
pedidos aos motoristas que me sucediam. Fui-me, para alívio dos meus que,
possivelmente, se sentiram felizes por não haver sido atacado pelo profissional
da mendicância.
Não
sei de quem partiu, dos que comigo andavam, querer saber por que eu estava tão
irritado e irascível. Adiantei-lhes que não era por conta desses cidadãos que
se servem das ruas para amealhar o sustento de seus vícios, ou garantir a
subsistência de parentes que preferem ou têm que ficar em seus ninhos,
esperando pelas migalhas conseguidas; esses são uns coitados. Irritam-me
políticos falastrões, que buscam enganar eleitores incautos, mentirosamente,
tentando se considerar coparticipes em ações ou fatos públicos relevantes, nos
quais não tiveram nenhuma participação; outros que, reiterando inata e peculiar
ignorância, levianamente, ousam questionar se, para uma mulher, melhor seria
levar na bolsa um exemplar da lei Maria da Penha ou uma boa pistola; tipos como
os que, envidando esforços próprios e arregimentando alheios, tentam fazer com
que eleitores em dúvida ou com falhas de caráter, decidam-se por votar, não nos
indivíduos pelos quais nutram algum resquício de respeito ou admiração, mas
naqueles que os crápulas consideram como garantidores de validade ou utilidade
para seu voto; a propósito, com essa conotação de utilidade, dificilmente, um
voto útil pode ser feito por um eleitor inútil.
Como
último motivo, apontei-lhes uma constatação feita por um midiático “cientista
político”, para quem é um prazer quase orgástico atribuir falsos privilégios a
funcionários públicos, negando-os aos que, segundo sua míope visão, na
iniciativa privada, exerceriam as mesmas competências; o pior é que a figura
sabe ser inadmissível, orgânica, burocrática e funcionalmente, tal comparação.
Dia desses, demagogicamente, o sujeito confundiu piso com teto salarial, quando
disse que certas categorias profissionais – claro que do serviço público – têm
piso salarial diferente de outras igualmente dignas - da iniciativa privada.
Aquilo soava como se não soubesse que piso todo trabalhador público ou privado
possui - a partir de um salário mínimo -, mas somente o servidor público tem
teto salarial: a remuneração do Supremo Tribunal Federal.
Quer
dizer, enquanto o artista sofre, demagogos e outros canastrões se divertem,
tentando enganar homens de bem.
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