Fonte: Google |
AS GRANDES TRAIÇÕES DA HISTORIA DA HUMANIDADE
Valério Chaves
Desembargador
aposentado do TJPI
A história da existência do homem sempre foi marcada por traição de indivíduos que, apesar de aparentemente confiáveis, foram capazes de trair a pátria ou prejudicar seus melhores amigos como forma de obter vantagens pessoais no campo político, ideológico ou religioso.
Os registros históricos revelam que no curso da história do mundo muitas batalhas e guerras foram vencidas ou perdidas não só pela coragem de seus líderes, mas também por influência de espiões e traidores épicos que passaram para a História da humanidade.
Nos tempos atuais, apesar da rapidez com que se modificam os valores sociais, morais, éticos e políticos relacionados à prática de crimes de corrupção revelados através da chamada delação premiada existente no ordenamento jurídico brasileiro, impossível não lembrar de exemplos deixados pelas grandes traições que, pelo rigor de seu simbolismo, pela importância dos réus ou das vítimas, pela coragem ou a covardia do juiz, ultrapassaram as brumas do tempo e causaram consequências desastrosas para o mundo das gentes à custa de recompensas aparentemente desprezíveis.
Mas nem sempre a traição praticada por falsos amigos deu bons resultados.
Recordemos alguns episódios que tiveram desfecho trágico e entraram para a história tamanha a traição de seus protagonistas, como foi o caso de Judas Escariotes que, mesmo sendo um dos doze apóstolos de Jesus Cristo, virou sinônimo de traição ao beijar e entregar o Filho de Deus para os soldados romanos, recebendo como recompensa 30 moedas de prata.
Outro relato descrito no Evangelho do Novo Testamento diz respeito à negação de Pedro perante o Senhor, confirmando a profecia da Última Ceia: “Em verdade te digo que esta noite, antes de cantar o galo, três vezes me negarás” (Mateus, 26, 33-35).
Por esses relatos bíblicos, verifica-se que dois apóstolos de Cristo, apesar de terem tido destino diferentes, cometeram o mesmo erro contra a mesma pessoa (Cristo). Pedro que traiu por medo da agressão dos guardas romanos, tornou-se um dos principais líderes da Igreja Primitiva. Judas que traiu por ambição, foi capaz de suicidar-se por arrependimento.
Nesse contexto, podemos citar ainda aquele que é considerado o maior crime da humanidade cujo processo de prisão e julgamento do réu, culminou na Paixão e Morte de Jesus Cristo pregado na cruz, fato que serviu não só para indignar seus discípulos e seguidores cristãos, mas também para fazer de Pôncio Pilatos um símbolo de juiz covarde e submisso ao medo de perder o cargo de representante do Imperador romano Tíbério Cesar.
Quarenta e quatro anos antes da era cristã, o aristocrático romano Marcus Junius Brutus participou do mais conhecido atentado político da Antiguidade ao colocar em prática um plano para assassinar o então ditador e imperador Júlio César, tornando-se assim o mais famoso traidor da história.
Na época do Brasil Colônia, século XVII, Domingos Fernandes Calabar, por ambição de alguma recompensa ou melhorar de fortuna, traiu os colonizadores portugueses ao compactar-se com invasores holandeses na conquista de terras no Nordeste brasileiro. Depois de preso como desertor covarde, foi punido com a pena de morte na forca.
Em 1792, o coronel Joaquim Silvério dos Reis, movido por ganância, rompeu compromisso de lealdade aos companheiros inconfidentes, e mediante promessa de nomeações de parentes, uma pensão vitalícia do governo português e perdão de suas vultosas dívidas com a Coroa, delatou todos os planos da Inconfidência Mineira, culminando com a morte na forca e esquartejamento de Joaquim José da Silva Xavier – o Tiradentes.
No Livro Quinto das Ordenações Filipinas, promulgada no começo do século XVII incentivando a traição nos crimes de lesa-majestade, encontra-se a verdadeira origem da traição prevendo não só o mero perdão, mas também um prêmio ao indivíduo que apontasse o culpado (Títulos VI e CXVI).
Na sua obra imortal “Dei deliti e delle pene”, publicada no século XVIII, Cesare Beccaria expõe sua opinião contrária aos Tribunais que ofertam impunidade a delatores e traidores cúmplices no processo de um grave delito.
Na peça “Otelo” o Mouro de Veneza, de William Shakespeare (que sempre explorava a traição em suas peças), Desdêmona, a esposa de Otelo, perdeu a vida por causa da traição de Iago. Este sentindo-se injustiçado pelo seu comandante com a nomeação de outro para o posto de tenente, decide se vingar dizendo para o general Otelo que sua mulher Desdenha o traiu. Dominado pelo ciúme, o general mata a esposa. Após saber que tudo não passava de uma mentira de seu alferes Iago, suicida-se.
Noata-se, por fim, que a traição, o medo e a ambição, independentemente do tempo ou posição social de seus protagonistas, fazem parte das virtudes e imperfeições humanas como forças incontidas e inevitáveis que jamais compensarão os prejuízos causados à alma traidora.
(janeiro/2023)
Nenhum comentário:
Postar um comentário