ENTRE FARISEUS E SAMARITANOS
Elmar Carvalho
No domingo, degustando um chopp
no shopping, conversei com o Paulo Nunes, que foi meu colega no curso de
Direito da velha UFPI. Estávamos no simpático Botequim, de propriedade de sua
mulher. Ele é aposentado como agente da Polícia Federal e é o chefe de gabinete
da Secretaria de Segurança Pública.
Contou-me ele um caso curioso,
que bem mostra como às vezes pode ser difícil o mister de um julgador, e que
demonstra que cada caso é um caso, como diz o jargão jurídico, com as
peculiaridades e nuanças próprias. Ele fazia parte de uma blitz da PF, quando
os agentes abordaram um caminhoneiro gaúcho. Encontraram no veículo uma
razoável quantidade de maconha.
O motorista, desesperado, chorou
e soluçou copiosamente, e terminou confessando que fizera o transporte da droga
porque estava desesperado, com quatro prestações do carro em atraso, e que já
havia sido notificado de que a empresa concessionária iria entrar com uma ação
de busca e apreensão. Mostrou o carnê com as prestações atrasadas e o aviso de
que a ação seria ajuizada. Foi-lhe permitido fazer as ligações de praxe para os
seus familiares.
Posteriormente, no cárcere,
contou para o Paulo que a sua mãe iria vender o pequeno imóvel agrícola, do
qual seus parentes tiravam o sustento, para contratar um advogado do Rio Grande
do Sul. Condoeu-se Paulo com o drama que se delineava, e resolveu ligar para a
mãe do motorista. Pediu-lhe que tivesse paciência, e não vendesse a
propriedade, pois tentaria encontrar um advogado de Teresina, que cobrasse
honorários mais em conta e parcelasse o pagamento.
Contactou o César Feitosa, que
aceitou a causa do caminhoneiro, que acabou sendo solto três meses após. O
motorista e sua família cumpriram fielmente o acordado. Além disso, o
caminhoneiro tinha a virtude da gratidão, e todos os anos, na época do Natal,
liga para o seu benfeitor, ainda reconhecido pelo gesto de bondade e
compreensão.
Paulo cumpriu fielmente o seu
dever, mas soube compreender as vicissitudes e tragédias a que todos somos
suscetíveis, na fragilidade e instabilidade da condição humana. Sem dúvida,
entendeu que aquele homem não era propriamente um bandido, mas alguém que, num
momento de fraqueza e de desespero, cometera um crime, do qual se arrependera
amargamente.
Aposentou-se sem nunca ter
sofrido uma pena disciplinar. Certamente, muitos fariseus, que se acham mais
catões do que o próprio Catão, jamais fariam o gesto de solidariedade e
compreensão humana que o Paulo fez, sem outro interesse senão o de mitigar o
sofrimento do próximo, como se fora o samaritano da parábola de Cristo.
1º de junho de 2010
...e hoje, mais do que nunca a indiferença afastam possibilidades de empatia.
ResponderExcluirA indiferença, muitas vezes, é um mal terrível.
ResponderExcluirIndiferença, ranço, falta de empatia, maldade, petulância, egoísmo... Todos os dias desfilam nas avenidas do nosso destino, nas vilas da nossa iincompreensão.
ResponderExcluirWilton Porto
Senso de Solidariedade e Compaixão!... Durante a leitura do Caso, eu me transportei justamente para a parábola Cristã do "Bom Samaritano".
ResponderExcluirLindo Exemplo de Vida, Elmar!...
Infelizmente, o amigo Paulo Nunes de Almeida faleceu há três anos. Deus o tenha no seu Reino de Glória.
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