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UM CERTO CAPITÃO RODRIGO
Carlos Evandro M. Eulálio*
O capitão Rodrigo é a principal
personagem que surge em um dos capítulos do primeiro romance, O Continente, da
trilogia de Érico Veríssimo O TEMPO E O VENTO. Dessa trilogia fazem parte ainda
os romances O Retrato e O Arquipélago.
Saga de personagens gaúchos, cuja
trama se desenrola em torno do povoado Santa Fé e de uma família (os
Terra-Cambará), no período que vai de 1745 a 1945. Na obra O Continente,
aparecem as gerações Terra-Cambará, famílias da oligarquia local que participam
da fundação e desenvolvimento histórico do povoado Santa Fé.
A trilogia apresenta o conflito
das gerações: portugueses e castelhanos nos tempos coloniais; farrapos e
imperiais durante as lutas separatistas; maragatos e florianistas sob a Revolta
da Armada, em 1893. Nessa trilogia, vemos a história de duas famílias, os
Terra-Cambará e os Amaral, atravessando dois séculos de vida.
ESTRUTURA DA OBRA
Com narrador onisciente, a obra
constitui-se de 28 capítulos narrados linearmente, sem digressões. O cenário é
a cidade fictícia de Santa Fé, no Rio Grande do Sul. Santa Fé é uma construção
literária, um espaço criado pelo autor para dar vida à sua narrativa, e não uma
localidade real do Estado do Rio Grande do Sul.
O tempo é rigorosamente cronológico, marcado por datas e acontecimentos
históricos.
Tem como personagens o Capitão
Rodrigo Cambará, gaúcho exaltado, pândego, bravo, alegre e decidido; Bibiana,
filha de Pedro Terra. Criada para o casamento. Obediente ao pai, mas o
contraria quando se decide casar com Rodrigo Cambará. Aprendera com a avó Ana
Terra a avaliar as pessoas. Com ela também aprendeu a fiar, bordar e a fazer
doces; Pedro Terra, filho de colonos. Autoritário, íntegro. Muito parecido com
a mãe, Ana Terra, quanto ao modo de agir; Padre Lara, personagem que acompanha
de perto o conflito das famílias Amaral e Terra-Cambará, é apaziguador, amigo
de Rodrigo Cambará. Sente-se responsável pelo casamento de Bibiana; Juvenal
Terra, filho de Pedro Terra é sócio e amigo de Rodrigo que por sua vez é
desafeto de Bento Amaral; Coronel Ricardo Amaral Neto, autoridade do lugar, é
acusado de crimes de emboscadas e apropriação de terras alheias. Adversário
político de Pedro Terra.
UM CERTO CAPITÃO RODRIGO:
Sequências Narrativas
Em 1828, chega a Santa Fé o
Capitão Rodrigo Cambará, aos 30 anos de idade, causando apreensão ao povo do
lugar, por suas maneiras exóticas e arruaceiras. Da venda do Nicolau chama a
atenção dos detentores do poder da cidade:
Cel. Ricardo Amaral Neto, e do filho deste, Bento Amaral. Rodrigo é
aconselhado por Juvenal Terra e pelo padre Lara a deixar a cidade. O capitão
decide ficar por conta própria, principalmente porque se interessa por Bibiana,
filha de Pedro Terra e irmã de Juvenal, embora soubesse que Bento Amaral tinha
pretensão de casar-se com ela.
Na festa de casamento da filha de
Rosa, prima de Pedro Terra, Rodrigo convida Bibiana para dançar com ele. É
preterido por Bento Amaral com ameaças. Os dois se desentendem e partem para um
duelo com adaga. Na luta, num gesto de traição, Bento Amaral usa arma de fogo e
atinge o adversário. Gravemente ferido, Rodrigo é levado para a casa de
Juvenal, onde se recupera.
Rodrigo pede Bibiana em
casamento. Pedro Terra opõe-se, no que é persuadido a consentir, por
insistência do Padre Lara e Juvenal, que lhe garantem ser Rodrigo
bem-intencionado, disposto inclusive a pôr comércio em sociedade com o futuro
cunhado. Assim, Rodrigo Cambará casou-se pelo Natal de 1829 com Bibiana
Terra.
Os modos de Rodrigo fazem com que
Pedro Terra fique cada vez mais distante dele. No ano de 1830, nasce Bolívar,
primeiro filho do casal. A rotina do casamento e a atividade comercial começam
a entediar Rodrigo que propõe a Juvenal ir ao Rio Pardo, a fim de comprar o
próximo sortimento da loja. Juvenal acha que Rodrigo tem a intenção de correr
mundo e que provavelmente não retornaria.
No ano seguinte, Pe. Lara
escreveu no seu registro: “Aos vinte e oito de dezembro de mil oitocentos e
trinta e um nesta capela de nossa senhora da Conceição batizei e dei os Santos
Óleos a Anita, filha legítima do Cap. Rodrigo Severo Cambará, natural da freguesia
do Rio Grande, e de sua mulher Bibiana, natural desta freguesia”. Pedro Terra
não compareceu ao batizado.
Pedro Terra se afasta cada vez
mais do genro, cujo comportamento ultimamente se havia deteriorado de tal
maneira que era, por assim dizer, o assunto predileto de Santa Fé. Gastava o
que não possuía com jogo, bebida e mulheres. Morre Anita. No ano seguinte,
nasce o Leonor, a filha caçula do casal.
Em 1833 corre a notícia de que no
ano seguinte o povoado de Santa Fé seria elevado à vila. Politicamente o país
vive o período da Regência (1831 a 1840), durante o qual, sendo Pedro II menor
de idade, deveria ser governado por um Conselho de três regentes. Na falta da
figura centralizadora do Imperador, o Brasil passa por uma experiência que se
poderia chamar de republicana, com as províncias reivindicando autonomia de
governo, com rebeliões e revoltas eclodindo de norte a sul do País. Vários
desses movimentos lutavam pela adoção do regime republicano, como foi o caso da
Revolução Farroupilha que se instalou no Rio Grande do Sul em 1835 e que só foi
sufocada em 1845, já no II Reinado. Por esse tempo, Liberais (farroupilhas) e
restauradores (galegos, caramurus) confrontam-se nas ruas de Santa Fé.
Em 1835 começam os rumores da
guerra. O cel. Ricardo Amaral propõe na Câmara de Santa Fé que esta faça uma
proclamação jurando fidelidade ao governo. Pedro Terra é contra, sendo, por
essa razão, preso e libertado em seguida, na condição de não se afastar de
Santa Fé. Também é decretada a prisão do Cap. Rodrigo Cambará que se encontra
foragido, já como um dos líderes dos farrapos.
Em 1836 a revolução chega a Santa
Fé. Rodrigo Cambará lidera um contingente de revoltosos que toma de assalto o
casarão do Cel. Ricardo. Rodrigo é morto com uma bala no peito. O cel. Ricardo
também morre. Bento Amaral consegue
escapar e foge de Santa Fé.
* Carlos Evandro Martins Eulálio
é formado em Letras (Português-Literatura), com mestrado em Educação (UFPI).
Ocupa a cadeira 38 da Academia Piauiense de Letras.
Referência
VERÍSSIMO, Érico. Um certo capitão Rodrigo. 39ª ed. São Paulo: Globo 2000.
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