JOSÉ MARIA VASCONCELOS
josemaria001@hotmail.com
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Sou do tempo em que Papai Noel não passava de uma miragem infantil, como nos contos de fadas. Figurão de barbas e plumas brancas, touca e vestido vermelhos, saco nas costas e cajado nas mãos, não se exibia fartamente nas prateleiras, balcões, calçadas e praças. As crianças quase não tomavam conhecimento do bom velhinho "em tempo real".
Nossos pais nos obrigavam a dormir cedo, "senão Papai Noel não vinha deixar o presente de Natal". Papai forrava-me bem o pintinho, para não mijar no brinquedo. Aguardávamos a noite mais deliciosa do ano! Presente, coisa rara e pouco sofisticada. Quisesse um brinquedo, tinha de construir de madeira ou buriti. Hoje, presenteia-se por nonada e dezenas de motivos, variedades e sofisticação que, logo mais, se desfazem no lixo.
Na modesta Teresina dos anos 50, pouco mais de cem mil habitantes, ouvia-se, de qualquer canto da cidade, às nove da noite, o ronco surdo e bucólico da usina elétrica, hoje Cepisa. Ou o bimbalhar dos sinos da igreja de São Benedito para a missa das cinco. Carrilhões das velhas igrejas emudeceram com o barulho da metrópole. E desapareceram dos templos da modernidade. Só Papai Noel insiste em tocar sininhos que não convencem mais.
De manhãzinha, acordava-se, deparava-se com um carrinho, boneca ou fuzil de plástico, debaixo da rede, no chão. (Hoje, arma de fogo é que virou brinquedo de matar.) Uma festa entre os irmãos: cada qual e seu brinquedo. Todos tinham a mesma semelhança, "para não ter briga." Corríamos aos colegas vizinhos para exibir nosso raro troféu. Nossos pais, então, enchiam-nos a imaginação, do bom velhinho que entrara de madrugada pelo telhado ou chaminé. Doce ilusão que se completava com a missa de Natal. Menino Jesus ainda encantava as cabecinhas, porque nossos pais cuidavam de nos ensinar, sobretudo, sentimentos cristãos do que quintessências comerciais.
As crianças não dormem mais cedo, aguardando Papai Noel. Nem ouvem lições sobre Menino Jesus, episódios que antecederam o seu nascimento.
Um dia, já adulto, vesti-me de Papai Noel, no fundo quintal, começo da noite, sem que meus quatro filhos soubessem. Rita os entretinha, vendo televisão, casa fechada. Bati na janela, ensaiei um ô, ô, ô grotesco e uma voz embargada, convidando cada um, pelo nome, para receber o presente. Minha filha, Marta, abriu a janela, assustada, logo percebeu que os braços cabeludos só podiam ser meus. "É o papai!" A farsa caiu em risos e gargalhadas. Nunca mais me arrisquei a mentir o verdadeiro sentido da festa cristã. Natal não se veste de empulhação.
Papai Noel ainda seduz a criançada, mas, muito mais, o cartão de crédito dos adultos. Eu nem quero ver aquele saco repleto de ilusões e quinquilharias. Porque estou, mesmo, é de saco cheio. Talvez, porque se foi meu tempo encantado de criança.
Meu pai um dia resolveu se fantasiar, achei engraçado por que ele sempre foi magro, e tive a mesma reação que sua filha Marta. Mais se te serve de consolo, achei a atitude do meu pai muito legal, e guardo comigo essa lembrança até hoje.
ResponderExcluirPaula carvalho.