José
Maria Vasconcelos
Cronista,
josemaria001@hotmail.com
Visita
ao cemitério pode não ser agradável, porém desperta reflexão
sobre a transitoriedade da vida. Ir e voltar, antes que seja último
e derradeiro passeio. Não adianta dissimular, bater na mesa, em
atitude mórbida, corpo mole e lânguido: você vai morrer, talvez
hoje, amanhã, em breve, anos mais. Sem exceções. Nada de medo e
assombrações de meia-noite. Visitei um cemitério em cidade
cearense, parece-me Redenção, ainda adolescente. Logo na entrada,
letreiro acima do portão: “Hodie mihi; cras tibi = Hoje, a mim;
amanhã, a ti.” Um epitáfio realista para nenhum vivente ou
defunto reclamar.
Quão
democrática a posse de terra no condomínio dos mortos, onde ricos e
pobres ocupam o mesmo espaço e profundidade, sem invasões, sem
carne, sem beleza. Só sete palmas, sem direito à conta bancária,
nem à chave da empresa, nem ao contracheque polpudo. Anônimos.
Felizes os que acreditaram, em vida, na eternidade. Que somos como
lagartas, presas à comida, depois o sono profundo, libertação da
carne em crisálidas, enfim o voo de borboleta.
Figurões
da política e do capital jazem, em túmulos de mármore, flores e
metais, foto e estátua, sobremesas do que lhes restaram. “Tu és
pó, ao pó voltarás.” Mais um bocado de tempo, eles desaparecerão
da memória coletiva. Conhece algum barão do dinheiro que ficou na
História além de cem anos? Privilégio apenas de inventores,
filósofos, descobridores, heróis, escritores e artistas,
missionários, líderes do bem, governantes comprometidos com a
pátria, não o prato.
Plotino,
filósofo espiritualista, nascido no Egito, viveu no início do
cristianismo, em Roma: “Se a vida e alma existem depois da morte, a
morte é para o bem da alma, porque esta exerce melhor sua atividade
sem o corpo”. Não há povo sequer, nem índios da América, que
não tenha cultivado o sentido da eternidade, com ritos próprios. Em
Madagascar, banquetes, danças, foguetório e alegria acompanham
cerimônias fúnebres.
A
principal missão de Jesus Cristo, neste planeta, foi romper o
mistério e as dúvidas dos humanos sobre a vida após a morte. Ele
devolveu vida a mortos, exerceu poder sobre o impossível aos olhos
da matéria, serviu de expiação até a última gota de sangue, para
ressuscitar no terceiro dia. Deu-nos a certeza de que a vida continua
após a morte. Nenhum profeta ou líder religioso conseguiu
espetacular comprovação. Ademais, Jesus adiantou como abrir
caminhos para um mundo melhor, de olhos para eternidade feliz.
Aceitar esse mistério não é fácil, especialmente quem se arvora
de conhecedor de princípios científicos de vã sabedoria. Talvez a
visitinha ao cemitério desperte a fé no infinito, antes que a morte
bata à porta e desligue aorta. Rima perfeita, dói, mas compõe o
soneto da existência.
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