Fonseca
Neto
“Eu
me resolvo que esta é a melhor terra do mundo, donde os naturais são
muito fortes e vivem muitos anos, e consta-nos que, do que correram
os portugueses, o melhor é o Brasil, e o Maranhão é Brasil melhor,
mais perto de Portugal que todo os outros portos daquele Estado, em
derrota muito fácil à navegação, donde se há de ir em vinte dias
ordinariamente.
E
por ser terra tal, a fez Sua Majestade governo separado do Brasil”.
Coisa
de marqueteiro? Sim. E escrevendo em 1624 sobre a recém-fundada
cidade de São Luís do Maranhão, seu primeiro “prefeito” – o
presidente da câmara municipal. De nome Symão Estacio da Sylueira,
capitão, nauta empresário, vindo ao Maranhão para empreender a
organização da cidade, consoante os interesses d’El Rei:
assegurar o domínio territorial pela colonização de negócios.
O
trecho acima é da “Relação Sumária das Cousas do Maranhão”,
feita por Sylueira – Silveira – e é mesmo uma peça promocional
dirigida aos reinóis ibéricos, conclamando a se mudarem para a nova
terra e enriquecerem. Dir-se-ia um “gestor” talentoso, que, por
exemplo, promoveu, a partir de 1619, a vinda para Upaon-açu de
centenas de famílias açorianas. Gente do arquipélago açoriano
para habitar outra ilha atlântica. Tão importante essa presença
fundadora em São Luís, que, quase cem anos depois – 1712/1717 –
eram açorianas as famílias que o governo maranhense mandou para
habitar a Mocha, primeira vila-município do Piauí.
São
Luís foi inventada para capital daquele “governo separado do
Brasil”: cabeça de colônia e de Estado e por isso sempre foi
governada por autoridades locais e gerais.
Quando
Joaquim de Melo e Póvoas assume o governo do Maranhão (1761),
encontra a capital – já sesquicentenária, por óbvio – com
características de protoburgo medieval e lidera um processo de
“modernização” dela sob as “luzes” daquele século.
Retirou-lhe as muralhas e franqueou os caminhos para dentro. O
famoso “caminho grande” da ilha foi prolongado até Pastos Bons,
através dos sertões, passando pelo Julgado de Aldeias
Altas,
futura Caxias: estrada real que integrou o sul do velho Estado
colonial, de Parnaguá, no Piauí, à capital ludovica.
Aliás,
como governador geral do Estado do Maranhão e Piauí, Póvoas esteve
muito preocupado com a capitania do Piauí, que, por volta de 1775
entrou em grave crise política. Saiu ele de São Luís e fez uma
espécie de governo itinerante, instalando-o na cidade de Oeiras por
algum tempo, pessoalmente operando a burocracia local, tensionada
pela Junta liderada pelo ouvidor Morais Durão. Também a vila de São
João da Parnaíba foi parte do interesse desse governador, por seu
papel portuário estratégico, no provimento da capital, e mais pelos
bons negócios que essa vila piauiense garantia no contexto da
atuação econômica da Companhia Geral do Grão Pará e Maranhão.
Póvoas fez a típica política do seu tio, conde de Oeiras, depois
marquês de Pombal.
A
São Luís edificada que hoje todos admiram – “cidade colonial”
– é a urbs do tempo de Symão, planejada na traça ortogonal pelo
engenheiro-mor Francisco Frias de Mesquita (1615/1616) e deve à
liderança de Póvoas seu adensamento físico e demográfico.
Demográfico inclusive pela agregação à vida da cidade, como seus
construtores, à base de suor e lágrimas, de mais milhares de negros
trazidos da África como escravos.
São
Luís é hoje um enorme núcleo urbano. A cidade dos três primeiros
séculos constitui seu “centro histórico”, tombado como
monumento cultural, nacional e mundial. É “colonial” por sua
concreção e espírito dados na expansão comercial ibérica. É
“colonial” pela representação de seus valores enquanto
patrimônio histórico da humanidade. Representação e realidade que
a movem no presente, sob a liderança de artistas, arteiros e
letrados, dentre tais distingo o acadêmico Luiz Phelipe Andrès
–que, tal Póvoas, esteve também em Oeiras a dignificá-la –e
agora é honrada pelo tombamento iphânico.
Claro
que toda cidade é obra coletiva. Mas não dana esse princípio
louvar homens e mulheres que a dignificam. Mulheres? Sim, São Luís
é póvoa marañaguara: “... poesia do nosso chão, cravo perfumado
de nosso amor”. E onde tem Camboa e Jordoa é a Maranhoa encantada
de Symão.
(Jomar:
perde-se a latinoparla mas não a neologia).
È sem dúvidas esse tipo de texto que promove a inteligência e motiva a intelectualidade. Gostei do texto. Parabéns!
ResponderExcluirFelisardo.