A VIDA LITERÁRIA BRASILEIRA SOB A
PERSPECTIVA DE AFRÂNIO COUTINHO
Cunha e Silva Filho
Afrânio Coutinho
(1911-2000), ao classificar os textos
reunidos na obra No hospital
das letras[1] de “panfleto,” (termo
usado por ele próprio), dá o
tom do tipo de discurso que
intenta imprimir a essa obra. Ele
próprio declara que foi buscá-lo na obra homônima de Francisco Manuel de Melo (1608-1666), famoso escritor
português do período setecentista que, não obstante ter falecido
aos cinquenta e oito anos, deixou uma
prodigiosa e multifacetada obra.
De resto, Coutinho fez uma leve alteração no
título da obra de D. Francisco Manuel
de Melo, que é Hospital das letras, acrescentado-lhe no início
a contração “No,”
inexistente no título do autor
luso.
D. Francisco Manuel de Melo foi um
intelectual prolífico de vida acidentada e aventureira, por sinal, na
condição de degredado, viveu três anos
no Brasil, no estado da Bahia
(p.483), punido, ao que tudo
indica, por um suposto assassínio de um dos mordomos
do conde de Vila Nova de Portimão. Melo
foi julgado e condenado,
recebendo “desterro perpétuo” a ser cumprido na África e,
depois, após ser-lhe comutada a
pena, veio ser degredado
no Brasil, no estado da Bahia em 1665 e aqui permaneceu até o final do degredo[2].
Num
memorial dirigido ao rei D.João
IV, escrito em linguagem
magistral, elogiado até pelo
célebre historiador e
romancista Alexandre Herculano, Melo pediu ao rei que
por ele intercedesse, mas de nada
lhe valeu seu esforço. Segundo o
historiador Joaquim Ferreira,[3] o rei D. João
IV não confiava na “lealdade de Melo, nem mesmo uma “carta de clemência”
do rei Luís XIV dirigido ao monarca luso surtiu efeito. Melo
amargou a prisão por seis anos
até embarcar para o Brasil. Afirma-se – inclusive esta é a
opinião do escritor Camilo
Castelo Branco que sua prisão se deveu
a um affair que Melo
teve com a esposa do conde e este, por vindima,
acusou Melo de ter sido o assassino
do mordomo, de nome Francisco Cardoso.
Segundo salienta Maria
Lourdes Belchior, professora da Universidade de Lisboa e autora do verbete sobre Francisco
Manuel de Melo incluído no
Dicionário de literatura dirigido por Jacinto Prado Coelho, Manuel de Melo fez “uma crítica de costumes,”[4] naturalmente se referindo a
um das quatro partes que
constituem a obra Apólogos
dialogais,designadas por ele como
“esquisitas”, as quais se
intitulam Relógios falantes, Visita
das fontes, Hospital das letras e Escritório avarento.
No entanto a sua
obra geral não se restringiu só a
isso. Foi poeta, prosador, historiador, dramaturgo, memorialista, arguto crítico literário, o que o tornou, na opinião de Rebelo da Silva,
citado no referido verbete, um
dos “primeiros eruditos de seu tempo e talvez o prosador mais substancial da língua portuguesa.”[5]
Não é, portanto, gratuita a escolha do autor português e do
título No hospital das letras de
Coutinho, alusivo a uma das obras de Melo, seja
por este ser igualmente um
crítico literário, seja porque a obra
Hospital das letras, em conjugação
com Visita da fonte – convém assinalarmos
para sermos mais coerentes e precisos
- mantém traços e pretensões comuns com o livro de Coutinho.
Obviamente guardadas as devidas
proporções de tempo e de alcance geral:
crítica acerba contra escritores
medíocres, importância dada à
obra de Aristóteles, de Platão e Sêneca, preocupações teóricas
com conceitos de
poesia, de linguagem, da decadência intelectual
da época, da falta de talento, do espírito rebelado
contra o meio literário, os gramáticos anacrônicos, a
natureza de libelo, algumas
apreciações nem sempre
justas contra escritores
de reconhecido valor, o tom moralista e didático de que se
revestem alguns textos.[6]
Tanto no Hospital
das letras de Melo quanto No
hospital das letras de Coutinho – urge considerar -
o lexema “hospital” aponta para
campos semânticos
relacionados a doença, a
cura, a reabilitação, a melhoria
do ambiente literário e a desejos
de aprimoramento e de reformulações
de novos valores estéticos no
campo da literatura, quer
considerados em julgamentos coerentes, quer em
julgamentos errôneos.
A
importância do pensamento
crítico de Melo, tendo em vista a
obra Hospital das letras, segundo argutamente
afirma a professora
Maria Lourdes Belchior, guarda
afinidades de situações no que tange
a algumas visões do
pensamento crítico enfrentadas por
Coutinho. São palavras dela: “Esta
obra é indispensável para o
conhecimento das correntes literárias do tempo
e dos juízos feitos sobre autores e obras, maiores e menores.”[7]
Desta forma,
temas e questões assemelhados entre Melo e Coutinho sinalizam propósitos de cunho polêmico e
de natureza panfletária, i.e.,
não é difícil deduzir que Coutinho
provavelmente fosse um admirador da obra de Melo, não só pela grandeza
de sua produção literária em vários gêneros, conforme já
frisamos, mas sobretudo porque Os apólogos dialogais constituíram, na visão dos historiadores portugueses de maior conceito, um dos
monumentos da literatura lusa, ou
para corroborarmos a opinião
do historiador Feliciano Ramos, “.. uma das obras-primas da literatura clássica.”[8]
Por outro lado, no deslindamento das questões
concernentes ao julgamento
crítico, a obra de Melo difere num
ângulo de tratamento destinado
aos autores analisados: ela
se pauta
pelo “equilíbrio crítico,” conforme assinala Feliciano
Ramos:
Há que destacar ainda o equilíbrio
crítico que Melo denota no Hospital das
Letras, o quarto dos Apólogos, dialogais. Não envelheceram as apreciações formuladas sobre Tito Lívio, Gil
Vicente, Luis de Camões, Rodrigues Lobo
e outros.[9]
No hospital das Letras de
Coutinho, consoante tivemos oportunidade
de acentuar, existe
um deliberado objetivo de desancar
e pulverizar o alvo principal
de sua acidez de linguagem contra
a vida literária viciada de imperfeições dos anos 1940, 1950 e
meados dos aos 1960. Referimo-nos ao
desenho caricato que faz de Lins,
trazendo-nos à mente aquele
período em que Sílvio Romero procurou
apequenar a figura crítica pessoal de José Veríssimo com a obra
Zeverissimações ineptas da
crítica numa tal semelhança de situação que valeria a pena aqui
citar a seguinte reflexão de
Brito Broca acerca do assunto:
A polêmica do tipo camiliano que encontrou
em Carlos de Laet um dos seus maiores
adeptos entre nós, já estava um tanto fora de moda por volta de 1909,
quando Sílvio Romero desfechou contra
José Veríssimo o violentíssimo ataque das Zeverisssimações ineptas da crítica. Tínhamos aqui de
novo agressão mais no terreno pessoal do que no das ideias, em termos rudes e brutais, com um requinte de plebeísmo a que nunca
chegara Camilo nem mesmo Laet.[10]
No hospital
das Letras, definido por Coutinho, conforme já assinalamos atrás,
como um panfleto, na realidade assume mais
caracterizadamente esta
forma de crítica e virulência de análise
e de linguagem no
derradeiro capítulo, ao
qual deu por título “O Impostor,”* capítulo este de resto iniciado
com duas parataxes com teor
pedagógico-moralista.[11] (p.179).
Antes de desenvolvermos uma discussão específica daquele capítulo, o que faremos mais adiante neste estudo, é preciso enfatizarmos
uma circunstância relacionada à
composição de No hospital das Letras, ou
seja, evidenciar que esta obra está
associada intimamente na maior
parte dos temas debatidos a uma obra,
por muitos ângulos, fundamental
ao pensamento crítico-teórico-historiográfico de Coutinho.
Ao fazer essa associação aludo ao grosso volume
Correntes cruzadas ( 19530, no qual
Coutinho reúne o que ele chama
de “crônicas, volume precedido
de um longo e bem elaborado
prefácio ou introdução, no qual Coutinho
traça os principais pontos
de seus objetivos não só em referência
às suas ideias polêmicas
envolvendo questões atinentes à
defesa de seu pensamento
crítico que o levaram até à
polêmica pessoal, como ainda
à situação, ao seu ver,
caótica, estéril e desatualizada do meio
intelectual brasileiro, do ensino de literatura e das urgentes demandas
de uma nova forma
de trabalhar em áreas
da teoria literária, da crítica literária, da
historia literária no ensino secundário
no ensino superior de Letras.
Para ele, esse grande salto só se daria
principalmente pelos efeitos sadios
de mudanças e renovação
no ensino universitário,
livrando o meio literário brasileiro
ainda muito preso ao conservadorismo que,
na sua visão, impedia o pleno
desenvolvimento dos estudos literarios
entre nós.
Não será preciso afirmar
ser No hospital das letras um livro no qual subjaz um fato determinante
da posição intelectual de Coutinho se excetuarmos o
último capítulo a que fiz
referência linhas atrás: o seu caráter
pedagógico, que ao leitor
atento não é lícito
passar despercebido.
Coutinho é, antes de tudo, um crítico-pedagogo, um crítico
educador que, para atingir
seus objetivos, não poupará esforços, ainda que para isso, utilize
da sátira e do panfleto demolidor,
no sentido de mostrar
caminhos e vias novos pelos quais
a crítica literária, o ensaio
literário, a história literária e especificamente o ensino da
literatura consigam ser
instrumentalizados por padrões de
técnica e de enfoques hauridos
nas fontes mais originais
da tradição universal.
Daí ser seu
alvo principal a atualização do saber
literário entre nós que
liberte formas anquilosadas
de ensino e de crítica dissociados
do estudo sério, profundo,
produtivo, como se desejasse aproximar
o pensamento literário brasileiro
o máximo possível dos níveis
avançados da literatura ocidental estudada e ensinada nos grandes
centros do mundo, seja nos Estados
Unidos, seja na Europa. A citação
seguinte dá a medida certa
desses objetivos a serem
colimados :
O melhoramento da literatura no
Brasil não resultará de arranjos na vida de alguns intelectuais, mas de medidas de ensino
literário; o enriquecimento de nossas
bibliotecas com instrumentos de
estudo e pesquisa, de modo a tornar
acessíveis as grandes fontes da cultura a fim de que não continuemos atrasados
cinquenta e cem anos...”[12]
No hospital das letras,
por ser, no geral, uma obra
acentuadamente detratora de erros e males de nossa vida literária, no conjunto de obras do autor, se torna um trabalho em que se constata uma queda no bom nível geral do livro, tendo em vista que o seu
último capítulo me parece
dolorosamente parcial para com o seu adversário, Álvaro Lins
(1912-1970). O intento caricatural de
que se reveste o capítulo em questão
- reforço - prejudica o todo da obra, particularmente pelas referências
por vezes exageradas e destemperadas no que concerne à figura de Lins. Esse tipo de caricatura, no
entanto - reconhecemos - é inerente à condição de alguém que se sentiu
injustiçado pelo seu opositor, o crítico Álvaro Lins.
Entretanto, conforme
assinalamos anteriormente, No hospital das letras Coutinho, ao analisar
a situação da vida
literária brasileira em muitos
aspectos possui o seu tanto de
obra saneadora e
identificadora de tantos
males por que atravessaram
a vida literária brasileira no
recorte temporal
selecionado por Coutinho. O
que, porém, diminui um pouco o seu
valor de comentários
candentes é o fato de que não
cita quase nomes
dos personagens aludidos
e dissecados nos seus comentários. Há uma
excesso de generalização de bons juízos
críticos acerca dos
males, do estado de
inércia e do clima arrivista que permeava
os anos visados pelo autor.
Desde o primeiro capítulo ,
intitulado intencionalmente de “A comédia da vida literária”
podemos antecipar o que
o livro nos revelaria da vida literária nacional e da
visão acerba de crítica que Coutinho passaria a nos transmitir
com a coragem que o caracterizou ao longo de sua vida
intelectual. Ponderações como a
seguinte apontam para o
tipo de vida literária dominante nos anos
1940, 1950 e 1960
aproximadamente: “A vida literária é, no Brasil, muito mais importante do que a
própria literatura”.[13] (grifos nossos)
Discutindo os desacertos da vida literária do seu tempo, Coutinho disso se aproveita para
compor um “panfleto” o mais abrangente
possível em temas e
situações do que podemos
definir como a política literária do baixo clero nacional a qual, por isso,
não se cinge apenas a atingir seu adversário de longa data, Álvaro Lins, mas também lançar setas
ferinas contra uma série de mazelas no campo
intelectual, quer da vida literária, quer do ensino da literatura, quer da crítica
literária e da teoria literária aaté
então não devidamente formulada como um corpus
teórico que seria
obrigatório conhecer.
Seu desiderato era
sanear a politicagem
literária, sentimento que
está encerrado no na
própria escolha do título do
livro onde os lexemas “hospital” e “letras” semanticamente
apontam para o lugar
de “cura”, de “tratamento, de
reabilitação de uma vida literária cheia de males, improvisações, mandonismo
e imperfeições flagrantes.
Para isso, não poupa
por vezes transmitir suas
opiniões em linguagem desabrida, como são ilustrativos
os vocábulos “chacrinha,
“cafajetismo,” “palhaçada,” “picaretagem”, “vigaristas” etc.
O seu espírito polêmico,
inconformado diante de
nossos deficiências culturais
isso tudo não poderia
passar incólume. Daí a sua maneira
beligerante de se contrapor
à estagnação de estudos literários e de um a vida literária feitas
por vezes de grupinhos, de camaradagem, de interesses políticos, de favores, de tráfico de influência, de mistura com um
arremedo de vida intelectual.
Qualquer desvio de conduta nos
nossos mores literários foi alvo das verrinas de Coutinho por longos anos. Por isso, chamara de “comédia da vida literária” ao
primeiro capítulo de sua
obra. Obviamente, nem sempre
alguns pontos de vista expendidos
por ele são justificáveis, porquanto em num
panfleto, como na polêmica
acirrada, os contendores cometem
muitas erros e exageros, hipertrofiam
os defeitos dos seus em êmulos, afirmam coisas
que nem sempre correspondem com rigor
à realidade dos fatos, exageram
na caricatura e se movem pela paixão
e, chegando a esse nível,
cometem disparates e, ao final, se tornam
amiúde parciais e passionais, perdendo o controle
e a lógica de suas argumentações.
A polêmica
tem essa dimensão menor, esse
lado burlesco, carnavalizado, em que
o polemista inverte
a verdade dos fatos,
escamoteia outros, perde-se
nos seus sofismas e na sua capacidade de
emitir suas ideias com equilíbrio e isenção.
Contudo,
em No hospital das letras, sem dúvida há
juízos ponderados, equilibrados,
voltados para a moralização
de nossa vida cultural e o que
Coutinho achava de ruim nela se afirma como denúncia
necessária, a meu ver, tem do em vista o objetivo de mostrar ao leitor daqueles anos do
século passado como
não deveria ser a vida literária
no país.
Quer dizer,
Coutinho combateu ferozmente as
frivolidades do homem de letras sem qualificação, ou como ele define,
do pseudo-intelectual, dos
arrivistas, dos “profiteurs”,
das mediocridades cuja meta
era galgar posições
relevantes na vida
intelectual nacional, ainda
que fosse por
meios pouco escrupulosos. Lutou com veemência contra as
falácias perpetradas por aquelas nulidades, lutou contra a fanfarronice, a malandragem da baixa
literatura, a ausência de seriedade nos
estudos literários e no o preparo
constante exigido por quem
se dedica à produção literária
de qualidade.
Coutinho verberou
os malefícios decorrentes de
nossa descontinuidade no desenvolvimento da
literatura brasileira e dos
estudos literários, os quais segundo ele, sempre
lhe pareciam estar num
recomeço estéril por falta de
continuidade, de metas, de
projetos, de melhoramento
e de atualização. Para ele, o
país carecia de valorizar devidamente
os que realmente produziam algo de
alto nível no campo literário, e nos estudos teóricos embasados em técnicas,
metodologias, bibliografia
atualizada e em estudos sintonizados
com o que de mais avançado se ensinava
e se transmitia nos países
adiantados, tal como ele viu na sua permanência em solo
norte-americano, nas suas melhores
universidades onde figuras eminentes
da Europa ali lecionam.
A abrangência de seu panfleto
resumia-se no combate sem trégua às
deficiências de nossas cultura, de
nosso ensino, da necessidades de aperfeiçoamento de
nossas Faculdades de Filosofia
que datam do final da década de 30 do
século passado e, particularmente, dos seus cursos de letras, do ensino
secundário que deveria, segundo ele,
separar, os estudos de
língua dos de literatura.
Na sua luta contra a estagnação literária e espírito
crítico ainda apegado
ao impressionismo, entre tantas outras mazelas, Coutinho se refere aos chamados prêmios
literários concedidos a
escritores em concurso com todos os vícios e desmandos de seus julgadores, onde não havia por vezes
a mínima lisura, mas o domínio
deletério do capadócio da vida
literária deblaterado por ele com muito vigor como podemos perceber da citação seguinte:
É fácil comprovar sempre os resultados da
cobiça na disputa nojenta em torno dos
prêmios.Candidatos a um prêmio
que são, ao mesmo tempo, juízes no outro; barganhas;cálculos; acordos;
bate-bocas; cavações; transigências; faltas de critério e idoneidade para julgamento; de tudo o que a literatura está ausente.[14]
É nesse diapasão de crítica
demolidora de nossas imperfeições
culturais que Coutinho desenvolve seus
comentários e reflexões, suas análises da vida literária brasileira.
Fustiga nossos defeitos culturais mas
apresenta soluções de melhoramentos.
Não ri como se faz na comédia
para castigar os costumes, antes castiga
a vida literária pelo mau
uso que fazem
suas figuras em evidência, i.e.,
fantoches posando de escritores. Seus ataques ferinos desbancam as “bombachatas”
(termo empregado por Coutinho) de nosso cenário
literário de fancaria.
É pena que Coutinho não
revele os nomes da maior parte
dos personagens aludidos no livro. Provavelmente o faz desta forma
para não aumentar o número de seus adversários,
alvos de sua censura. Não se
utilizou da sátira camiliana ou
à moda de Agripino Grieco que,
por sinal, é duramente criticado
por Coutinho num artigo em defesa de Machado de Assis.*
O que expusemos até aqui constitui o cerne da visão
de Coutinho acerca da vida literária a partir, segundo acentuamos
anteriormente, pelo menos dos anos 1940
do último século até os anos de 1960. Seu propósito foi
dissecar, através do tom
polêmico, o mapa humano da deplorável realidade de
parte considerável de quem
se definia como escritor no
interregno recortado por Coutinho.
O autor age no livro
como doutrinador de suas ideias, divulgando o seu pensamento crítico, sua visão aberta do fenômeno literário
pondo sempre como condição
fundamental o valor da obra
literária como um produto
estético. Revela-se, assim, um
pedagogo do ensino da literatura que para ele deveria passar
do amadorismo para uma fase
madura de disciplina a ser
lecionada com método, base científica e rigor
de pesquisa, de análise e interpretação, de revisão bibliográfica e
de uma nova abordagem
a que denominou “nova
crítica”, aspecto que focalizaremos
ainda neste estudo.
No hospital das letras compõe-se de 37 pequenos capítulos, todos girando
em torno de temas correlatos desvelando os bastidores e os desvãos da vida
intelectual brasileira. O panfleto, pela
sua amplitude de assuntos levantados, em resumo, visa a
discutir a falsidade de nosso hábitos de
estudos, o pseudo-intelectualismo, o ensino de literatura ultrapassado e
ineficiente, os erros de nosso ensino superior de letras, a introdução de novas
abordagens crítico-interpretativas, a
história literária feita em geral sem
critérios e metodologias que
priorizassem a obra literária e
não a vida literária.
NOTAS:
[1] Coutinho, Afrânio. No
hospital das letras. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1963. Este ensaio faz parte de minha pesquisa de Pós-Doutorado
em Literatura Comparada, submetida e aprovada pela Coordenação dos Cursos de Pós-Graduação em
Ciências da literatura da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ.
Faculdade de Letras, 2014, 167 p. O texto, para os objetivos deste estudo, sofreu algumas alterações e
acréscimos face ao original..O objetivo deste ensaio
se deve, a meu ver, a uma
certa atualidade do assunto no tocante à vida literária e à história literária ainda vigorantes em certas partes do país. .
[2] FERREIRA. Joaquim. História
da literatura portuguesa, 3 ed. rev.
atual. pelo autor, Porto: Domingos
Barreira, 1971, p. 488-493.
[3] Idem, p. 490.
[4] Ver verbete: MELO, D. Francisco
Manuel de. In: PRADO COELHO, Jacinto do. (Dir.). Dicionário de
literatura.brasileira, literatura portuguesa, literatura galega e estilística literária. Porto: Figueirinhas, 1973, p.621.
[5] Idem, ibidem, p.622-623.
[6] RAMOS, Feliciano. História da
literatura portuguesa. Braga: Livraria
Cruz, 1950, p. 310-313..
[7] PRADO COELHO, Jacinto do.
(Dir.). Op. cit. 621.
[8] RAMOS. Feliciano. Op. cit., 313.
[9] Idem, p. 312.
[10] BROCA, Brito. A vida literária no Brasil – 1900.
Introdução de Francisco de Assis
Barbosa. 3. ed. Livraria José Olympio Editora, 1975. Coleção Documentos Brasileiros, p. 199.
[11] COUTINHO, Afrânio.
No hospital das letras, Op. cit., p. 179. São as seguintes as parataxes:
“E necessário uma mente
equilibrada e um mínimo de decência humana para se ter um bom escritor.”
“O processo de fazer de si um
melhor artista literário torna-se inextricavelmente ligado ao de fazer de si um
homem melhor.”
[12] Idem , p. 35.
[13] Idem, p. 27.
[14] Idem, p.37.
[15] COUTINHO, Afrânio. A filosofia
de Machado de Assis e outros ensaios. Rio de Janeiro: Livraria São José, 1959, p.162-181.O desenvolvimento
desta parte do livro vem indicado por seções de títulos por vezes irônicos e demolidores: “Machado e
Grieco,” “Livro de Negação,” “Machado e a Teoria do Molho,” “A Brasilidade de Machado” “O Idioma da
Crítica.”
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